Total de visualizações de página

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

2309 - o império do Imperial

------------------------------------------------------------------
O BISCOITO MOLHADO
Edição 4109                                         Data: 08  de janeiro de 2013
-----------------------------------------------------------------

O PRIMEIRO SABADOIDO DE 2013
PARTE II

Falava-se do Carlos Imperial.
-Carlos Imperial se queixava porque atribuíam a Nélson Rodrigues uma frase que era dele.
-Sá a vaia consagra. - completou o Claudio as palavras do Luca.
Recordei-me de o Carlos Imperial sendo apupado pela plateia e curvando-se em agradecimento como se ouvisse uma ovação. Era a época da febre dos festivais nacionais e internacionais da canção popular, quando artistas do estofo de Henry Mancini, Astor Piazzola, Antônio Carlos Jobim, Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso, entre outros, receberam furiosas vaias. Carlos Imperial, sempre esperto, procurou, a meu ver, ficar na companhia dessa elite. Quanto a Nélson Rodrigues, depois da consagradora estreia do “Vestido de Noiva” no Teatro Municipal, apresentou as peças que ele mesmo denominava de “teatro desagradável” e o público, não entendendo, o apupava ferozmente, e ele reagiu com algumas considerações sobre as gritarias da plateia, por isso tenho dúvidas se a frase não é mesmo sua.
-E o Carlos Imperial compôs boas músicas. - continuou o Luca.
-Ele foi até parceiro do Ataulfo Alves. - disse meu irmão.
-Qual foi mesmo a música que eles compuseram?...- puxei pela memória.
-”Você passa e eu acho graça.”.
Depois de citar o nome do samba, Claudio trauteou um trecho acompanhado pelo Luca:
-... E agora, você passa, eu acho graça,
Nesta vida tudo passa, e você passou pra mim.”
-O Carlos Imperial combinava brigas com outros compositores, como Juca Chaves e Erasmo Carlos, para que os holofotes ficassem sobre eles.
-Lembro-me da “Praça.” - interrompi o Luca que, por sua vez, me interrompeu.
-Uma boa música.
Retomei a palavra:
-Ele compôs sozinho “A Praça”, mas inventou um sujeito que aparecia na mídia afirmando que a composição era dele. Recordo-me que o Sérgio Porto tinha um programa na televisão e levou os dois, é claro que ele sabia que aquilo era uma patranha do Carlos Imperial e brincou com o assunto.
-Carlos Imperial teve importância na nossa música popular e merecia mais citações.
Ouvimos o Luca, mas, infelizmente, nem um de nós três se lembrou do programa animado por Blota Júnior, no final dos anos 60, “Esta Noite se Improvisa”, em que Carlos Imperial exibia um conhecimento enciclopédico de música popular, derrotando, algumas vezes, Caetano Veloso e Chico Buarque. Saiu-me, sim, do local da minha memória empoeirada parte de uma entrevista que ele concedera, e a narrei.
-Perguntaram, certa vez a ele, quem era o Carlos Primeiro entre Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Carlos Imperial.  Ele mostrou traquejo de político, pois conseguiu coroar os três. Disse que, como cantor, Roberto Carlos era o Carlos Primeiro; sobre o Erasmo Carlos ser o Carlos Primeiro, não me recordo quais as razões que apresentou. E arrematou dizendo que, como os dois foram lançados por ele, Carlos Imperial era o Carlos Primeiro.
-A nota dez retumbante, dita no resultado das escolas de samba, que o filho do Aérton Perlingeiro imita, foi criada pelo Carlos Imperial. - disse o Luca.
-Até candidato a prefeito do Rio de Janeiro ele foi.
-Pois é, Claudio, o vice foi o Claudio Polila, aquela figura folclórica que dizia que viu o General Newton Cruz matando o jornalista Alexandre Baumgarten. - manifestei-me.
Ainda falamos da experiência do Carlos Imperial nos concursos de fantasia do Teatro Municipal, citando o seu desfile como “Libélula Deslumbrada” e passamos para outro tema.
-Quando saio com a Glória, levo sempre a Kiara.
-A Kiarinha. - referiu-se carinhosamente a Gina, que se aproximava, à neta do Luca.
-Eu disse para ela, que dormia quando fomos ver a glicose do Carlinhos lá em casa, que o Daniel também veio.
-Mas eu não fui. - disse meu sobrinho, que acompanhava a mãe.
-Eu falei, Daniel, para ela reclamar porque não a acordei.
-As crianças adoram o Daniel. - comentei.
-A Kiara é uma boa menina também. - registrou a Gina.
-E a Rosa Grieco ainda diz que você confiscou a neta? - provoquei.
-Ela pensa...
-Essa questão de educar é muito complicada, eu li uma vasta literatura sobre o assunto, mas sei que, na prática, é difícil... - acrescentou ele.
-E tem de ter preparo físico para acompanhar a energia das crianças. - disse o Claudio.
Nesse instante, a Gina interferiu:
-O Eduardo Paes deu um trato no busto do pai da Rosa. Tiraram as sujeiras, a careca do Agripino Grieco até brilha.
-Eu me coloquei à disposição da Rosa para levá-la de carro até a praça que homenageia o pai dela.
-E então?
-Rosa não demonstra o menor interesse de ir lá. - disse ele.
Claudio, que saíra, retornou com dois copos de bebida, o que quebrou o fluxo da conversa. Gina saiu, e eu indaguei do Luca sobre o seu primeiro contato com a Rosa.
-Apontaram-me uma senhora e disseram que era filha do Agripino Grieco. Interessei-me logo em conhecê-la.
Logo veio à minha mente um caso que ocorreu em 1970, quando ele me conduzia com o meu pai a um médico da Rua Dias da Cruz. Ao subir o viaduto Castro Alves, Luca comentou que aquele viaduto se chamaria Agripino Grieco, mas este recusou a homenagem afirmando que ninguém passaria por cima dele enquanto fosse vivo.
Luca não quis saber do que passava pela minha cabeça e prosseguiu:
-Aproximei-me dela e falei do Agripino Grieco. Ela não enalteceu o pai. Disse-lhe, então, que gostava de ler. “Posso até lhe dar uns livros”. - falou-me ela.
-Até eu, que não conheço pessoalmente a Rosa, ganhei vários livros dela; livros de Natal, livros de aniversário, livros de desaniversários (os dias em que nós não fazemos anos, segundo Lewis Carol). - manifestei-me.
-Eu tenho de reconhecer que o meu relacionamento com a Rosa Grieco me enriqueceu muito intelectualmente.
E concluiu:
-Ela não só dá livros como recortes de jornais que valem a pena ler.
-A vida da Rosa é a leitura. - afirmei.
-Eu creio que ela leu mais do que o pai.
-Sim, Luca, o Agripino Grieco tinha ainda de dedicar um tempo à escrita. - frisei, enquanto o Claudio sorvia um gole de uísque.




Nenhum comentário:

Postar um comentário