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quarta-feira, 30 de setembro de 2015

2948 - doce melodia


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5198                                    Data:  27 de setembro de 2015

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DIA 27 DE SETEMBRO NO RÁDIO MEMÓRIA

 

Por causa dos arrastões, em Copacabana, Sérgio Fortes se mudou para uma rua onde a incidência de assaltos é menor, no bairro, pois lhe é impossível sair do Brasil, do Rio de Janeiro e de Copacabana, e a mudança se deu justamente no Dia do Rádio Memória. Esta foi a versão do Jonas Vieira para a sua ausência no meio da apresentação musical dos convidados do programa trazidos pelo Simon Khoury, Antônio Guerra, compositor inspirado até em big band de frevos, mais a cantora paulistana Márcia Cabral.

-O Sérgio não veio porque está se mudando lá mesmo em Copacabana, por isso está mais enrolado do que...

Como a palavra não saía da memória do Jonas Vieira, a Márcia Cabral o socorreu:

-Ele está mais enrolado do que serpentina.

Jonas Vieira, conhecedor do espírito carnavalesco do seu parceiro, ficou com a comparação da ótima cantora.

Na verdade, Sérgio Fortes faltou porque, nesse dia, correu atrás de doces, deixando o calendário gravado, que não foi ao ar, mas os nossos leitores não ficarão sem ele.

-Jonas, devido à data de hoje, eu vou começar com um falecimento, logo em seguida, eu entro nos eventos históricos.

-O calendário é seu.

-Em 295, época do Imperador Diocleciano, Cosme e Damião, irmãos gêmeos de origem árabe, eram martirizados. Jonas, santos católicos de origem árabe, pouca gente sabe disso.

-E eles são muito reverenciados também na umbanda. Eram médicos que não cobravam a consulta. - assinalou o Jonas Vieira.

-Agora, os eventos históricos. Em 489, Odroaco ataca Teodorico, na Batalha de Verona e perde mais uma vez.

-Era freguês do Teodorico. - pilheriou o Jonas Vieira.

-Odroaco foi o rei da tribo germânica dos hérulos que derrotou o Império Romano do Ocidente.

-Puxa!

-Jonas, sabe como se chamava o filho de Teodorico, que sucedeu o pai, morto no campo de batalha? Tarismundo. Com esse nome, não poderia dar certo. 

-Sofreu muito bullying, Sérgio.

-Em 1066, o normando Guilherme I consegue um feito que Napoleão e Hitler não conseguiram por mais que tentassem: invadiu a Inglaterra. Ele partiu do rio Somme com seu exército.

Uma façanha extraordinária.

-Em 27 de setembro de 1480, uma data terrível: início das atividades da Inquisição, em Sevilha, na Espanha.

O fanatismo religioso só promove crueldades.

-Em 1540, Inácio de Loyola funda a ordem religiosa Companhia de Jesus, sob autorização do Papa Paulo III.

-E o Papa Francisco seria o primeiro jesuíta a se tornar papa. - lembrou o Jonas Vieira.

-Jonas, uma ótima data para nós dois: em 1589, o duque alemão Guilherme V funda a Hofbräuhaus, especializada na produção de cerveja marrom.

-Não tenho preconceito de cor: gosto da loura, da preta e da marrom.

-Pena que a marrom não tem aparecido no bar da General Glicério. - lamentou.

Nem a cerveja, nem a Alcione.

-Jonas, no dia 27 de setembro estrearam várias óperas, mas eu vou citar apenas uma; em 1732, em Nápoles, é apresentada pela primeira vez a ópera “O Frade Apaixonado”, de Pergolesi. Ele, que viveu apenas 26 anos, obteve o seu maior êxito com a deliciosa ópera “La Serva Padrona.

-Em 1825, é inaugurada a primeira ferrovia pública, construída por George Stephenson, que também criou a locomotiva a vapor. A ferrovia ligava as cidades inglesas de Stockton e Darlington.

-Puxa!

-A Revolução Industrial progredia na Inglaterra desde a invenção da máquina a vapor, por James Watt, por volta de 1770.

-Em 1938, foi lançado à água o Queen Elizabeth, o maior navio de passageiros de todos os tempos. Com suas 83 mil toneladas, podia transportar 2285 passageiros.

-Já imaginou, Sérgio, se afundasse como o Titanic?

-Com esse nome, Queen Elizabeth, só podia durar muitos anos; atuou até 1968.

Aposentou-se depois  de 30 anos de bons serviços.

-Em 1950, é inventada a secretária eletrônica.

-Prefiro a de carne e osso, Sérgio.

-Ih!... Há controvérsias, Jonas.

-Em 1953, A TV Record, segunda emissora de televisão brasileira, é inaugurada em São Paulo.

-A primeira foi a TV Tupi de São Paulo em 1950. - lembrou o Jonas Vieira.

-A concorrência é sempre bem-vinda. Não seria bom ficar só o Assis de Chateaubriand, a entrada de outro empresário nesse ramo, o Paulo Machado de Carvalho, foi boa.

-Mas, de muitos anos para cá, são muitos canais e muita porcaria. - criticou o Jonas Vieira.

-Em 1964, a Comissão Warren torna público o informe sobre o assassinato de John Kennedy, na qual Lee Oswald é o único responsável do atentado ocorrido em Dallas. Jonas, muitas suspeitas ficaram no ar.

-Sérgio, há mil perguntas que não querem calar.

-Em 1994, dois brasileiros entram com uma ação contra Michael Jackson. Numa turnê brasileira, em 1993, eles foram atropelados pela comitiva do cantor.

-Eu me lembro, Sérgio.

-Eram dois irmãos, um jornalista e uma nutricionista. Disseram eles que gastaram muito dinheiro com os custos hospitalares, mas só receberam 500 dólares do cantor.

-Jonas, em 27 de setembro de 1998, uma data impactante: foi criado o Google. Há gente que não sai de casa sem, antes, consultar o Google.

-É o oráculo do tempo da Grécia antiga.

-Muito mais do que isso, Jonas.

-Mas ele é traiçoeiro, Sérgio; não se pode confiar cegamente no Google.

 -Nascimentos. Em 1389, Cosimo, o Velho, fundador da dinastia dos Médici. Apareceu um por aqui, Jonas.

-Este você conhece bem, Jonas; Bud Powell, pianista de Jazz, nasceu em 1924.

-Muito bom músico. - aprovou.

-Em 1944, Jonas, nasce um goleiro que lhe traz boas recordações: Raul Plassmann.

-Grande goleiro do Flamengo! - vibrou o Jonas, esquecendo-se que o goleiro da camisa amarela, também foi goleiro do Cruzeiro, de Minas Gerais.

-Em 1952, morre em um acidente de automóvel, na Rio-São Paulo, Francisco Alves, o Rei da Voz.

-Francisco Alves é de uma importância fundamental na música popular brasileira não só como cantor. - acentuou o titular do programa Rádio Memória.

-Em 1964, nasce Vera Mossa.

-A minha jogadora de vôlei preferida, Sérgio.

-Falecimentos. - soou a voz do Sérgio Fortes em ré menor, a mesma entonação do Réquiem de Mozart.

-Já falamos da morte de Cosme e Damião... Em 869, falece Marcellus, monge do Monastério de São Galo, na Suíça.

-Sérgio, eu não sabia que um Galo foi santo.

-São Galo, Jonas, é o santo padroeiro do Peter.

-Ele não fica no altar, fica no poleiro.

-Em 1917, morre Edgar Degas, pintor impressionista francês.

Mais um nome de rua, em Del Castilho, que os moradores estropiam.

-Em 1940, Walter Benjamin, filósofo alemão que merece ser lido.

-Em 1965, morre Clara Bow.

-Minha atriz de cinema mudo favorita.

-Em 2005, morre um ator que me divertiu muito na infância: Ronald Golias.

-Muito bom comediante. - aprovou o Jonas.

-Jonas, 27 de setembro é o dia do cantor.

-Certamente, Sérgio, por causa da morte do Francisco Alves.

-Mas o Dia 13 de julho também é o Dia do Cantor, Jonas.

-Vamos fazer, então, que 3 de outubro, dia e mês da morte de Orlando Silva, seja também O Dia do Cantor.

-Jonas, é o dia da festa litúrgica de São Vicente de Paulo.

-Sim.

-Também o Dia das festividades de São Cosme e Damião.

-Acabou o calendário, Sérgio?

-Acabou; agora, vou atrás de doces.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2947b - um roqueiro na multidão


MESMA VELHICE

Justiça se faça ao rock: nenhuma outra música envelheceu tão bem. Tome alguns artistas do Rock in Rio e veja como eles eram em começo de carreira, nos anos 60: jovens, magros, bonitos, "rebeldes", contestadores, com longas e louras cabeleiras. Na Califórnia, as moças se furavam mutuamente os olhos pelo simples direito de contemplar Jim Morrison, o líder dos Doors.

Morrison morreu ao tomar banho, em 1971, aos 28 anos, em Paris. Se tivesse sobrevivido, teria hoje 71, e como estaria? Talvez igual à maioria dos seus companheiros de geração: velho, gordo, feio, desdentado (cocaína faz mal aos dentes), careca ou com restos de cabelo branco, botina, calça de lona, munhequeira e colete aberto sobre a barriga branca e insubmersível.

Mas, agora, vem o lado bonito da coisa. O fato de esses homens terem hoje mais de 70 anos e serem, quem sabe, diabéticos, não incomoda seus jovens fãs. Sim, os caras envelheceram, e daí? – dirão os garotos. Está certo. A idade provecta não lhes tira o direito de se apresentarem. E a mídia continua apaixonada por eles.

Bem diferente do que aconteceu quando eles surgiram nos anos 60. Naquela época, nos EUA, no Brasil e em toda parte, os artistas tradicionais, os grandes cantores, que se apresentavam bem vestidos e mal tinham passado dos 50 anos, foram varridos de cena pela chegada do rock. Os empresários e a mídia os abandonaram. Tiveram de se aposentar. Eram "velhos". O público jovem de então os desprezava porque, entre outros defeitos, eles eram adorados por seus pais – e não se admitia a um garoto de 1968 admirar o mesmo artista que seus pais.

No Rock in Rio, é comum ver avós, filhos e netos admirando o mesmo artista – três gerações incrivelmente niveladas pela mesma velhice. É inédito – nem a polca, a habanera e a umbigada conseguiram isso.

Ruy Castro (da Folha de São Paulo)

 

 

terça-feira, 29 de setembro de 2015

2947 - Eu não sei escrever


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5197                                    Data:  26 de setembro de 2015

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SABADOIDO

 

-Claudio, trouxe o doce do Daniel. – disse logo que ele abriu a porta para mim.

-O aniversário do Daniel é amanhã.

-São Cosme e Damião também, mas já trouxe o presente da minha mãe e o meu.

-Foram todos para o Parque da Cidade. – informou-me.

-Nunca fui lá, Claudio. Onde fica?

-Em Niterói; de lá se tem a melhor vista da cidade.

-Os niteroienses têm a vantagem das vistas da própria cidade e do Rio de Janeiro. – concluí.

-Sim; mas os assaltantes daqui estão indo para lá.

Este foi nosso diálogo enquanto rumávamos para a cozinha.

-Posso sentar na sua cadeira de ler jornal?

-Claro, eu já li; o entregador passou cedo.

Sentei-me e ele, que antes pegara alguma coisa na geladeira, sentou-se na sua cadeira de chupar laranjas.

-Carlinhos, o Luca deixou um envelope aqui para você; já lhe entregaram?

-Sim; eram cartas da Rosa; numa delas, ela conta que fez o supletivo de 1974, quando o Romualdo Carrasco aprovou todo o mundo, em Matemática, com a nota 4,5.

-Foi o mesmo que eu fiz. Eu me lembro até da escola da prova de Matemática.

Não prestei atenção quando revelou o nome da escola, pois me detive no que ia dizer a seguir.

-Ela se viu em palpos de aranha nessa matéria; beneficiou-se desse meio pontinho do “Bourreau”, como ela chama, de brincadeira, o Carrasco.

-E as outras matérias?

-Ela tirou com os pés nas costas. Claudio, a erudição da Rosa é espantosa. Ela envia para o Luca, para mim também, recortes de jornais, principalmente os artigos da Folha de São Paulo e corrige os erros com que se depara. Certa vez, corrigiu o Carlos Heitor Cony; ele escreveu que o mito da Fênix era grego; a Rosa sublinhou em vermelho e pôs ao lado: “mito egípcio”.

-Na Academia Brasileira de Letras, ele se tornou amigo do Roberto Campos e os dois recitavam poemas em grego. – lembrou-se.

-É verdade; os dois foram seminaristas e ensinavam um pouco de grego nos seminários. Mas a Rosa estava certa.

-Diferentemente do Doutor Sardinha, o negócio da Rosa não são os números, são as palavras. – deduziu o Claudio.

-Sim, mas quando ela diz que passou em Matemática chutando todas as questões está sendo modesta, pois ela estudou, alguns anos no Instituto de Educação, onde até o Ary Quintella deu aulas.

-Às vezes, Carlinhos, você fica na dúvida entre uma alternativa e outra, então, a sua chance de acertar é 50%.

-Lembra-se de uma época em que, nas provas de português do vestibular, só apareciam trechos do Carlos Drummond de Andrade para serem interpretados?

-Claro; os formuladores das questões se fixaram nele. – respondeu.

-Isso deu uma confusão danada, pois muitos candidatos não concordavam com as respostas oficiais. Assim, o telefone do Carlos Drummond não parava de tocar...

-Queriam que ele dissipasse as dúvidas. – atalhou.

-Sim; e para acabar com essa aporrinhação, o Drummond declarou: “Não sei me interpretar”.

-Carlinhos, não é raro um leitor enxergar uma coisa que o autor não percebeu.

-Concordo. Ao ouvir a leitura que o maestro Toscanini dera ao “Bolero”, Ravel reclamou que ele dera um andamento acelerado; réplica do Toscanini: “Você não entende nada sobre a música que compôs”. É claro que não é isso, pois o criador não é médium, mas uma obra pode ter interpretação diferente de quem a pôs no mundo, é subjetiva.

-Estou cortando uma roseira e está pior do que quando podei a árvore. -mudou de assunto, em termos, pois a Rosa não saiu inteiramente da conversa.

-Todo o cuidado é pouco com as roseiras; sempre nos espeta um espinho camuflado.

-Estou cortando os galhos com luvas, mesmo assim não estou protegido.

-Falando em proteção. Claudio, o que você tem a dizer sobre os arrastões?

-Grande parte da culpa é dessa juíza com aquele parecer de não abordar os suspeitos, a não ser com a constatação do flagrante delito. A PM fez uma espécie de greve branca,

-Há um internauta no Facebook que postou um vídeo em que se vê como a polícia trata os ladrões em via pública na Índia.

-Imagino.

-Dois, às vezes três policiais, agarram o infeliz, enquanto um espancador, com uma enorme vara de bambu, castiga inapelavelmente; são mais de dez varadas nas nádegas e nas pernas. Não sei se isso está resolvendo a criminalidade na Índia, mas esse internauta, que mora em Copacabana, pede esse corretivo para os que fazem arrastões no Rio de Janeiro.

-Vara de bambu deve doer pra burro.

-Claudio, esse internauta chama o Obama e o Papa Francisco de comunistas.

-Ele quer, então, o Bolsonaro para a presidência da República.

-O Capitão Bolsonaro... Cláudio, só na ditadura da esquerda um capitão pode chegar ao poder na América do Sul. Na Venezuela, por exemplo, o Chaves, que criou a ditadura bolivariana, era coronel.  A missão do Bolsonaro é defender os interesses dos militares e para por aí. Nas Forças Armadas, a hierarquia é um tabu, apenas generais chegariam ao poder maior.

-O Luís Fernando Veríssimo diz que os saem à rua para protestar contra o PT são adeptos do Bolsonaro.

-O Veríssimo está com hemorragia desatada de neurônios.

-Viu algum filme? – saiu, em boa hora, da política.

-Eu assisti, no Telecine Cult, a um filme do Ettore Scola “Que Estranho Chamar-se Frederico”; uma espécie de cinebiografia sobre o Fellini.

-O Ettore Scola dirigiu aquele filme que eu tenho em DVD, “Nós Que Nos Amávamos Tanto”.

-Ele narra que suplicou ao Fellini para atuar nesse filme, que você tem e venceu pelo cansaço.

-O Fellini já havia contracenado com a Anna Magnani, no papel de um pastor, que ela toma por São José, num filme de Roberto Rosselini, de 1948. A partir de então, ele só queria ficar atrás das câmeras, mas o Ettore Scola o convenceu abrir uma exceção.

-“Nós Que Nos Amávamos Tanto” é de 1975, por aí. - puxou pela memória.

-No filme “Que Estranho Chamar-se Frederico”, Ettore Scola conta que Fellini sofria de insônia, por isso, pegava o carro e saía pela noite, levando-o no banco do carona. Certa vez, Fellini levou, no banco de trás, pois o da frente já estava ocupado, uma prostituta. Ela fala animadamente, enquanto ajeita a maquiagem. Dizem que essa carona o inspirou a filmar “Noites de Cabíria”.

-Bem Carlinhos, fique aí, com o jornal, que vou cortar a roseira de novo.

-Não se esqueça das luvas de borracha.

   

 

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

2946 - ações no cadafalso


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5196                                    Data:  24 de setembro de 2015

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CARTAS DOS LEITORES

 

“Nos Sabadoidos que li, meses atrás, topei com o redator desde BM portando-se como consultor de investimento do sobrinho. Como eu sei que ele, o redator, tem ações da Petrobras, não deveria ficar quieto e palpitar sobre outras matérias? Paulo Fernando

BM: Na minha época de frequentador assíduo da Corretora Caravello, nos anos 80, não comprei uma só ação da Petrobras. Excesso de leitura de artigos do Roberto Campos, do Eugênio Gudin, do Simonsen?...  talvez. Porém, em 2003, recebi 21 mil reais do FGTS e, separei 18 mil reais para adquirir ações da Petrobras. Transcorridos 12 anos, não toquei nelas, nem quando deu filhotes, apenas recolhi os dividendos. Hoje, eu tenho 7950 ações. Feita uma conta apressada, a ação teria de cair abaixo de 2,26 reais para eu ter prejuízo. Ocorre que, nesses 13 anos transcorridos, a inflação, na nossa moeda, foi de 127%. Assim sendo, se o preço cair abaixo de 5,13 reais, começam as minhas perdas? Ainda não, pois não foram contabilizados os dividendos nesse período. Grosso modo, se ela despencar para menos de 4,20 reais, eu fico no prejuízo.

O que eu quis mostrar ao meu sobrinho é que, comprando ações na hora certa, a longo prazo não se perde dinheiro mesmo que uma organização criminosa esteja no governo. E qual é a hora certa? – perguntará o leitor. Eu sei que a hora certa de venda, quando eu acompanhava os seus preços negociados na Bolsa de Valores, era vender por 42,00 reais, mas, infelizmente, eu não me desapeguei delas. Logo eu, tão patrulhado (agora, bem menos) por ser admirador do Roberto Campos, do Eugênio Gudin e do Mário Henrique Simonsen, não vendi os títulos da Petrobras. Talvez alguém diga que eu não perdi, deixei de ganhar, mas para quem está na minha situação, pouco importa a diferença. Meu arrependimento só será maior se o preço da ação cair para menos de 4,20 reais pelas razões já expostas.

Finalizando, o investimento que eu sempre aconselhei como o melhor de todos é a educação. É ganho certo.

 

“... o seu supletivo me trouxe à combalida memória o meu, em 1974. Precisava completar os 4 anos do ginasial do Instituto de Educação da Mariz e Barros. Tive duas aulas de Matemática e saí chutando os quadradinhos. Consegui 4,5 pontos e fui salva pelo fulano Carrasco que deu ½ ponto a “tout le monde et son père”, o resto foi uma barbada. Retribuí esse meio ponto quando o “bourreau” foi candidato sei lá a quê e votei nele; o que a Dona Gioconda lhe contou e o deixou felizinho. “Noblesse oblige”.

Releve-me a letra; Calígula (o gato) bate com o apêndice caudal na minha cara e tenho os dedos dormentes de manhã. É a mocidade que chega, porque a velhice já chegou há muito tempo.

Amplexos”

R.

 

BM: Nossa querida Rosa de volta a esta seção, o que me obriga a ter ao meu lado o dicionário de francês-português que comprei na Rua Luís de Camões. Assim, tratemos logo dos seus francesismos. “Tout le monde et son père”, expressão recorrente nas cartas da nossa amiga, provém do provérbio francês: “On ne peut contenter tout le monde et son père” – não se pode contentar todo o mundo (na tradução ao pé da letra, não se pode contentar todo o mundo e seu pai). Pois o Carrasco (Romualdo Carrasco, diretor do supletivo no governo Chagas Freitas) contentou. Rosa aproveita e o chama de “bourreau”, que é o carrasco, mesmo, aquele de baixar a guilhotina nos pescoços desprotegidos na língua de Robespierre.

Prosseguindo com o Carrasco – não o “bourreau”, ele seria deputado pelo MDB nas eleições de 1978 e contou, como lemos, com o voto da Rosa. A gratidão exigia, mas para ela, fica mais contundente a expressão “noblesse oblige”.

O meu irmão Claudio fez essa mesma prova e conta que, além desse meio ponto, houve questões anuladas, duas, parece, que contribuíram para vitaminar a nota dos candidatos que enfrentavam a temida matemática.  Não, ele me garantiu que não votou no Romualdo Carrasco para deputado, mas no MDB sim.

Creio que a Rosa está sendo modesta quando diz que “saiu chutando os quadradinhos”. Segundo os matemáticos e estatísticos, craques em Análise Combinatória – arranjo, permutação e combinação – a nota média para quem chuta 20 questões numa prova com cinco alternativas cada, ou seja, cem no total, é 2,5. Aliás, a nota mais comum das provas de Física, no Vestibular da Cesgranrio era 2,5, porque “tout le monde et son père” (não resisti ao francesismo) chutava.  Rosa estudou no Instituto de Educação, a melhor escola feminina da época, tinha, portanto, uma boa noção de matemática, embora ame muito mais as palavras do que os números e essas duas aulas refrescaram a sua memória que nunca ficou combalida.

O seu depoimento me conduz de novo ao cidadão que, encerrada a prova de matemática, no supletivo de 1975, ao entrega-la ao fiscal, disse que não havia razão para tanta maldade (apenas 6% foram aprovados nessa matéria e 11% em geografia). Muitos dos candidatos precisavam do diploma do 2º grau, no caso, para progredir no emprego ou retornar às salas de aulas após alguns anos de afastamento, como foi o meu caso e do meu irmão. Digamos que uma prova para acertar a vida de 20% dos candidatos já estava dentro dos padrões do supletivo, mas exames arrasa-quarteirões, como foram os citados, não se justificavam. Dos responsáveis, o menos “bourreau” foi o Carrasco, o Romualdo.

Já imaginaram a Rosa, no Itamaraty, com mais erudição do que os diplomatas, marcando passo porque não tinha o diploma do 2º grau?

Transcorrido algum tempo, abriram a porteira, no ensino em geral, no Brasil e a aprovação automática ocorre como geração espontânea, e muitos alunos atoleimados chegam `a faculdade como analfabeto funcional, sem entender o que leu.

Como dizia a Dona Isaura, a mãe da Rosa: “Nem tanto ao céu, nem tanto à terra.”

Ah, sim, a Gioconda da carta é a irmã da nossa amiga, aquela que revelou ao Carrasco o voto da irmã nele, para deputado, por causa daquele meio ponto tão precioso. “Preciosíssimo” – diria José Dias, personagem do “Dom Casmurro.”

 

 

 

 

 

 

 

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

2945 - E o Tio Sam, quem diria?


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5195                                 Data:  21 de setembro de 2015

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CARTAS DOS LEITORES

 

-“Na edição do Biscoito Molhado em que o redator pegou o ônibus errado, ele se referiu a uma questão de teste de inteligência sem pôr a resposta. Recordo-me que isso aconteceu anteriormente quando ele apresentou uma charada em que um motorista para num ponto onde havia um monte de gente, uma explosão genética, segundo o Dieckmann no seu asterisco. Nessa ocasião, ele também não apresentou a solução e quem o fez foi o distribuidor deste periódico. Dessa vez, porém, nem ele se manifestou. Qual é a resposta certa? Ah, sim, eis a questão formulada: “Quando João estava passeando com seu cachorro, encontrou o filho do marido da filha única de sua sogra. Qual o parentesco dele com João?”Mossa

BM: A política editorial deste hebdomadário (não, hebdomadário é semanal e este jornalzinho sai quatro ou cinco vezes por semana, dependendo dos anunciantes)... A nossa política é deixar que o leitor, que consideramos muito inteligente, reflita, mas o Dieckmann estraga tudo, colocando a resposta nos seus asteriscos. No caso citado, ele não se manifestou, ainda bem, pois os nossos leitores exercitaram os neurônios e chegaram à resposta certa: João se encontrou com o filho.

 

´”Quando o Sérgio Fortes apresentou o calendário do dia 13 de setembro, ele omitiu uma personalidade histórica, principalmente nos Estados Unidos, o nascimento de Samuel Wilson em 1766. Estranhei também porque o Jonas Vieira, que é um americanófilo, nada disse.” Isabel

BM: Antes de ser americanófilo, Jonas Vieira é orlandofófilo e, nesse domingo, ele apresentava músicas que foram cantadas por Orlando Silva, o que deixou o Sérgio Fortes com o tempo muito escasso para atuar como Homem-Calendário. Mas como o tempo não é o nosso problema, vamos tentar suprir essa lacuna.

Samuel Wilson, como você escreveu, veio ao mundo em 13 de setembro de 1766, Ele foi um comerciante que, na guerra entre os Estados Unidos e a Inglaterra, conseguiu um contrato de fornecimento de carne para os seus compatriotas americanos. Porque eram propriedades do governo, os barris de Sam Wilson eram identificados com as iniciais “U.S.” (United States) e os soldados brincalhões diziam que “U.S.” significava Uncle Sam. Com o transcorrer do tempo, caiu no gosto popular: tudo que levava “U.S.” era chamado de Uncle Sam.

Em 15 de setembro de 1961, uma resolução do Congresso dos Estados Unidos reconheceu oficialmente Samuel Wilson como o inspirador do “Tio Sam.”

Assim, se você olha uma fotografia de um senhor carrancudo, de barbicha, com uma cartola, apontando em sua direção, com as palavras I Want You For U.S. Army, não tenha dúvidas, é o Samuel Wilson, embora o que ele quisesse mesmo era lucrar com a venda de carne para o exército.

 

-“Eu assisti ao filme de Ettore Scola sobre Fellini, “Que Estranho Chamar-se Frederico” e me lembrei de um Sabadoido. Nesta fita, ele conta a chegada de Fellini, em 1939, a Roma, vindo da cidade de Rimini. Fellini se apresentou, com 19 anos de idade, com um portfólio de desenhos seus na redação do jornal humorístico “Marc’ Aurelio”. Cinco anos depois, era o próprio Ettore Scola que levava os seus desenhos. Fellini começava, então, a despontar no cinema e Ettore Scola continuou a lhe seguir os passos.

  Ah, sim: lembrei-me de um Sabadoido, porque Ettore Scola, ao apresentar seus desenhos pela primeira vez, o diretor do “Marc’ Aurelio” lhe disse que pareciam de Steinberg, e ele respondeu: “Quem me dera!.” Jacqueline

BM: A leitora se refere à sessão do Sabadoido em que meu sobrinho e minha cunhada se preparavam para visitar a exposição de obras de Picasso no Centro Cultural Banco do Brasil. Na ocasião, eu disse que alguns cartunistas do Pasquim, desse hebdomadário (agora, a palavra se encaixou bem) afirmaram que o Saul Steinberg era superior a Picasso.

Após a visita, os dois criticaram tanto as pinturas expostas que eu acredito que eles gostariam mais de uma exposição de Steinberg.

 

-“Eu li, numa dessas edições do BM, que Hitler, ao assistir a “O Grande Ditador”, se divertiu muito com as gagues sobre a baixa estatura do ditador italiano; eu, quando vi o filme, me diverti mais com as cenas em que Napoleoni/Mussolini exigia o tapete vermelho para descer do trem, este andava, e ele se esborrachava no chão com a sua comitiva. Será que o Hitler não se divertiu mais com essas cenas que se repetem, se a memória não me falha, umas três vezes no filme?

Outra coisa: Mussolini também via o Führer com desprezo? Gabi

BM: Creio que Hitler não caiu na gargalhada com as cenas do tapete, porque, como escrevemos, mordia o tapete quando tomado pela ira. Ele era um teppichfresser (mordedor de tapete) segundo os mais íntimos.

Mussolini era o Duce, posava como herdeiro dos imperadores romanos. Trajava um impecável uniforme fascista quando se entrevistou com o ditador austríaco pela primeira vez, na Villa Pisani, na cidade de Stra. Mussolini portava um punhal de cerimônias e calçava esplêndidas botas com esporas prateadas. Hitler, que veio com seus homens da SS, sob o comando de “Sepp” Dietrich, deixou uma péssima impressão no Duce com seu corpo desmedrado, cabelos mal cortados e apresentando-se com calças listradas, sapatos de couro envernizado e uma capa de chuva nada protocolar.

Nesse encontro, Mussolini teve de disfarçar os bocejos, quando ele se pôs a ler trechos do seu livro “Minha Luta”. Encerrada a sessão de tédio, para o líder italiano, ele desabafou com as pessoas mais próximas:

-Hitler é um palhaço ridículo, um autêntico macaco falastrão.

Ao contrário do Pitigrilli, nós preferimos Hynkel e Napoleoni aos originais.

 

-“É verdade que Hitler chegou a ter um guru?” Fofão

BM: Sim, e por incrível que pareça, judeu; chamava-se Hermann Steinschneider, mas usava o pseudônimo Erik Jan Hanussen. Eles se conheceram num evento social no término dos anos 20. Nessa oportunidade, ele insinuou que Hitler poderia aprimorar sua oratória. Como este se mostrou receptivo, o seu futuro guru lhe disse que ele tinha ritmo e dicção, mas precisava apurar a linguagem corporal e gestual de maneira tal que arrebatasse a audiência. O que viria acontecer.

Com o passar dos anos, Erik Jan Hanussen cresceu em prestígio com seus conhecimentos de astrologia e dons premonitórios, aconselhando o Führer até na escolha dos seus assessores.

Antes que se tornasse o Rasputin do Terceiro Reich, foi sequestrado em frente a um teatro e assassinado num bosque nos arredores de Berlim.

No Brasil, tivemos a fonoaudióloga Glorinha Beutenmüller, cujo dom era, apenas, ensinar a emitir a voz. Assim, ensinou Carlos Lacerda a ser o melhor orador da política brasileira, que, por sua vez, tinha ideias e era comedido na gesticulação, não tinha nada do histrionismo do Hitler/Hynkel.

 

 

 

 

 

 

 

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

2944 - quem ama Virginia Wolff?


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5194                                 Data:  20 de setembro de 2015

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20 DE SETEMBRO NO RÁDIO MEMÓRIA

 

O programa que antecede Rádio Memória é Almanaque e o desse último domingo foi de antologia – uma das músicas que tocou “Hi-Lili Hi lo”, do filme de 1953, “Lili”, com Leslie Carol e Mel Ferrer, foi de estremecer as estruturas de uma amiga minha que, bebê, era embalada pelo pai que entoava essa canção.

Assim, a responsabilidade dos apresentadores do Rádio Memória era grande, a de manter o nível de agrado dos ouvintes lá em cima, a começar pelo calendário que, aqui, vai, com duas ou três datas que não foram editadas.

-Sérgio, o que aconteceu no dia 20 de setembro?

-Jonas, em 1276, houve a eleição do Papa João XXI. Sabe qual é a importância do Papa João XXI?

-Não, rapaz.

-Ele era português. Foi o único papa português da História.

-E foi um bom papa segundo consta, não?

-Não sei, Jonas.

O titular do Rádio Memória se corrigiu rapidamente, pois a distração o fizera avançar no tempo quase 700 anos:

-Não! João XXIII.

Sérgio Fortes concordou:

-João XXIII foi muito importante. Ele foi sagrado papa já com muita idade. Todo o mundo achou que era um papado de transição e ele botou pra quebrar. Foi renovador, divulgou encíclicas importantes. Eu me lembro bem disso; eu estava no primário do Santo Inácio na ocasião.

Quanto a nós, Sérgio, estávamos no primário da Escola 9-10 Manoel Bomfim, em Del Castilho, e ouvíamos, na hora da saída, as nossas mães, pesarosas, lamentando a agonia do Santo Padre.

Mas o assunto sobre o papa português não estava ainda esgotado.

-O que ele fez, Sérgio?

-Não sei, não sei.

-Comeu muito bacalhau, Sérgio.

-Deve ter comido um bocado de bacalhau. - aproveitou a deixa o seu parceiro de piadas.

-Em 1519, Fernão de Magalhães inicia, a partir da Espanha, a primeira viagem de circum-navegação da terra.

Coisa de macho.

-Jonas, essa eu aprendi no Santo Inácio.

-O que você aprendeu?

-Circunstâncias históricas, socioeconômicas e a estreita relação dos gaúchos com o Uruguai, contribuíram para que o sul conservasse a autonomia em relação ao governo do Império.

-Mas em que ano você está, Sérgio?

-Em 1835, quando, em 20 de setembro, eclodiu a rebelião mais longa do período regencial, que ensanguentou o sul do Brasil.

-Puxa!

-Até o Giuseppe Garibaldi esteve por aqui.

-E levou a Anita.

-A Anita e muito dinheiro pago por Bento Gonçalves e outros estancieiros separatistas.

-Em 1898, Santos Dumont realiza o primeiro voo de um balão com propulsão própria. Eu queria entender isto: propulsão própria (*). Existe propulsão imprópria, emprestada?... Não sei.

Se o Sérgio Fortes trabalhasse na Marinha Mercante, teria de lidar com embarcações sem propulsão, com propulsão até 2000 HP, ou mais.

-Em 1919, o Marechal Rondon é nomeado Diretor de Engenharia do Exército.

No Brasil, ninguém mais sabe quem foi o Marechal Rondon que, sobre a aproximação com os índios, disse: “Morrer se preciso for, matar nunca”. Mas Buffalo Bill, que matou índios como moscas, todos conhecem e o têm como herói.

Em 1929, foi lançada a chapa da Aliança Liberal, tendo Getúlio Vargas como candidato a presidente. Aí, mudou tudo, Jonas.

-Mudou tudo, Sérgio.

-Em 1930, é patenteada a lâmpada elétrica.

-Olha só! - admirou-se o Jonas, talvez com a demora, pois ela já havia sido inventada há muito tempo.

-Em 1958, Martin Luther King, que lutou pelos direitos civis dos negros, é ferido por uma mulher que sofria de problemas mentais. Ela o esfaqueou durante uma sessão de autógrafos de seu livro “Caminhando para a liberdade: a história de Montgomery”.

-Dez anos depois, ele seria assassinado, Sérgio.

-Em 1972, uma plantação de maconha foi encontrada na fazenda de Paul e Linda McCartney na Escócia. Jonas, se fosse hoje, no Uruguai, não haveria problema algum.

-E como disse o Ministro Barroso do STF: aspas, se o usuário fuma um baseado entre o jantar e a hora de dormir, não é dever do Estado criminalizá-lo, fecha aspas.

Dos eventos históricos, o Homem-Calendário passou para os nascimentos de 20 de setembro.

-Em 1767, Padre José Maurício Nunes Garcia, um grande compositor brasileiro.

-Certamente.

-Foi mestre da capela real da corte no exílio.

-E fazedor de neném. - mexericou o Jonas Vieira.

-É mesmo?

-Dizem as más línguas.

-Nasceu um bocado de sacristãos. - entrou o Sérgio Fortes no espírito da coisa.

-Ele era negro. - lembrou o Jonas.

-Um grande músico, Jonas. Maior ainda com a edição da sua obra.

-Eu tenho ouvido muita coisa dele, Sérgio.

Formidável compositor que deixou enciumados os que vieram com Dom João da Europa para o Brasil, mormente Marcos Portugal.

-Jonas, botei isso aqui para lhe perguntar: em 1885, nascia Jelly Roll Morton, inventor do Jazz. É isso mesmo?... Consta aqui: inventor do Jazz.

Treze anos atrás, no “Clube da Ópera”, programa que o Sérgio Fortes apresentava na Rádio MEC, ele recorreu ao Nelson Tolipan, o especialista em Jazz, da emissora, para comentar 'Porgy and Bess”, de George Gershwin, mas, agora, lançava mão do Jonas Vieira.

-Pelo menos ele deu...

-Um formato. - concluiu o Sérgio.

-Em 1896, nascia o Brigadeiro Eduardo Gomes. Figura importante da política; candidato duas vezes a presidente da República.

Hoje, mais conhecido pelo doce de festas infantis de aniversário.

-Em 1897, um ano depois, nascia Humberto de Alencar Castelo Branco.

O único militar que soube governar. Um estadista.

-Em 1917, Obdúlio Varela, capitão da celeste olímpica na Copa de 50, de más recordações.

-Em 1917, nasce Fernando Rey. Sabe que é, Jonas?

-Não. (*)

-Um ator espanhol, excelente. Você viu aquele filme “Operação França”?

-Não vi.

-Ele dá um show, Jonas; grande atuação.

-Agora, eu vou dizer uma atriz que você vai se lembrar, Jonas: Sofia Loren.

-Essa eu me lembro.

-Lembra, não é?... Entendi.

-Lembro com a maior clareza.

-Muito marcante a carreira dela.

-Puxa!

-Talentosíssima. Eu ia ao cinema para ver o talento dela.

Momento de candura do Biscoito Molhado. Será que os dois se referiam à voz da Sofia Loren no filme em que ela, achocolatada pelos maquiadores, atuou como Aída na ópera de Verdi? Mas aquela voz era da Renata Tebaldi.

-Em 1934, nascia Carlos Kroeber, ator brasileiro.

-Grande Carlos Kroeber!

-Amigo do Simon Khoury, amigo do Jonas Vieira.

-Carlos Kroeber, o Carlão.

-Em 1945, nascia uma grande figura: PC Farias. Esse foi da pá virada.

-Certamente. - disse o Jonas.

Um trombadinha comparado com os corruptos que brotaram dos governos petistas.

-Em 1953, Jonas, nasce a sua economista favorita: Zélia Cardoso de Mello.

-Genial! - pilheriou.

Peter, até então posto em sossego, foi citado, no momento mais impróprio para ele, pelo Sérgio Fortes.

-Peter adora a Zélia Cardoso de Mello.

O Homem-Calendário partiu para os falecimentos.

-1863, Jacob Grimm, um dos irmãos Grimm.

-1957, Jean Sibelius, grande compositor.

Momentos de encantamento: Sinfonias nº 1 e nº 2, e o Concerto para Violino e Orquestra de Sibelius.

-Em 2005, morria uma figura que eu acho formidável, Simon Wiesenthal, arquiteto austríaco, caçador de nazista. Ele dedicou a vida a pegar criminosos de guerra. Um episódio incrível foi a prisão de Adolf Eichmann na Argentina. Era funcionário da fábrica Volkswagen.

-Exatamente. - ratificou o Jonas Vieira.

Jonas, dia 20 de setembro é o Dia do Engenheiro Químico. Eu conheço alguns engenheiros químicos.

-Conhece?... Não me recordo de nenhum.

E o calendário foi dado como encerrado.

Mais tarde, na parte musical, Sérgio Fortes comentaria que a margarina sai de uma maçaroca que, por muito pouco (algumas moléculas) não é um plástico. Culpa de alguns engenheiros químicos que não merecem festejos.

 

(*) Pode parecer estranho, mas “propulsão própria” faz sentido. Uma charrete com cavalos não tem propulsão própria, não é autopropulsada. Uma catapulta pode lançar um planador, que voará sem propulsão própria. Entende-se a autopropulsão como um meio de locomoção onde não haja nenhum agente externo ao veículo.

 

(**) Fernando Rey está muito além do mafioso de Operação França. Fez quatro filmes com o Buñuel, incluindo o ótimo “O Discreto Charme da Burguesia” e uma infinidade de filmes, sendo praticamente o Wilson Grey espanhol. Muita coisa para quem estudava Arquitetura quando aconteceu a Guerra Civil Espanhola do lado dos derrotados (nacionales) e ficou preso um bom tempo.

 

 

                                                                                      

 

     

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

2943 - desejos e repulsas


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5193                                   Data:  19  de setembro de 2015

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CONVERSAS NO METRÔ

 

A minha ida para o trabalho, nessa última sexta-feira, já foi complicada, começando no ônibus e terminando no táxi, a volta não seria também normal.

Na estação Carioca, o trem, com direção a Pavuna era daqueles que vieram da década de 80. Parece que guardam os trens chineses, cujos termostatos estão mais preservados para o verão que se se aproxima - pensei.

As portas do trem se abriram e eu entrei com uma leva de pessoas. Um cidadão, que descia o último lanço da escada correu, mas, sem a aceleração do Usain Bolt, não chegou a tempo; a porta se fechou com estrondo na sua cara, No entanto, o trem, em vez de seguir em frente, continuou parado e as luzes se apagaram. Em seguida, as portas reabriram. O retardatário aproveitou a oportunidade para sair, enquanto umas dez pessoas no vagão em que eu me encontrava retornaram para a plataforma. Em poucos minutos, várias pessoas se abanavam, algumas, dramaticamente.

O que houve?... Com a falta de notícias, que a direção do metrô teria a obrigação de dar aos usuários, muitos palpitaram. Os engraçadinhos não fugiram do clichê: “o pneu furou”. Finalmente, soou dos alto-falantes a informação que “estamos parados devido à sinalização à frente”.

Mais passageiros passaram para a plataforma, inclusive o retardatário. Então, a luz voltou ao trem e, com ela, os que haviam saído. As portas se fecharam e, dessa vez, o trem partiu.

-Estivemos parados devido à queda de luz na estação da Central. - ouvimos dos alto-falantes.

Estranho! Antes, era a sinalização, agora a queda de luz na Central... - dei tratos à bola.

Quando o trem parou nessa estação, houve o habitual fluxo e refluxo de passageiros, dessa vez mais intenso, às 4 horas da tarde, por causa do inesperado atraso. 

Duas senhoras que embarcaram ali, com frases truncadas falavam do que realmente atrapalhou o trânsito: uma tentativa de suicídio.

-Vou saltar porque não aguento esse calor; o ar aqui está desligado. – disse uma delas.

-Eu ainda vou até São Cristóvão. - disse a outra.

Quando ficou sem a sua interlocutora, tratei de puxar conversa com ela.

-Quando estávamos na Carioca, a informação que deram foi queda de luz na Central.

-Que nada! Um sujeito se jogou na linha férrea para ser esmigalhado por este trem.

-O metrô nunca fala em suicídio e já houve alguns. - disse-lhe.

-Quando ele pulou para a linha férrea, parou tudo. Vieram uns dez seguranças para tirá-lo de lá.

-Uns dez... – estranhei a quantidade.

-Que luta eles tiveram! A força do sujeito era descomunal.

-Pelo tempo que esperamos, imagino o trabalho que os seguranças tiveram.

-Quando ele já estava na plataforma e tudo parecia resolvido, ele correu para se atirar na outra linha férrea.

-A do trem sentido zona sul ou Tijuca?

Ela confirmou com a cabeça.

-Os seguranças do metrô têm de ter, entre seus equipamentos de resgate, camisa de força. – disse-lhe, mas ela mal me ouviu, pois correu para a porta que se abrira em São Cristóvão.

Mais um depressivo.

-Que calor! – grasnaram atrás de mim.

Sem se preocuparem com a deficiência do ar condicionado e menos ainda com a tentativa de suicídio, que ocorrera duas estações atrás, um casal que não aparentava mais de 40 anos de idade, conversava animadamente. Peguei a conversa no meio.

-A sua mulher já está na fase dos desejos?

-Já, infelizmente, está.

-E você está conseguindo cumprir a sua missão de marido?

-Por enquanto estou, mas não sei até onde vou aguentar.

-Tem de aguentar; é a sua obrigação. - disse ela com uma entonação sádica na voz.

-Para você ter uma ideia, ela, que não queria ver copo de leite na sua frente, que afirmava que sofria de intolerância à lactose, deu para beber leite. Eu até pensava que ela não fosse mamífera, agora, sei que é.

-Você, então, teve de ir ao supermercado para comprar as caixas de leite para ela.

-Quanto a isso, não houve problema, porque tenho o meu estoque, só que, agora, são dois a consumirem. Trabalho eu tive quando ela cismou em comer gomos de jaca.

A moça riu.

-Ela me dizia que o cheiro da jaca já lhe embrulhava o estômago, dando-lhe ânsia de vômito; engravidou e quer comer jaca. Se nós morássemos numa casa, eu não duvido que me obrigaria a plantar uma jaqueira no quintal.

-Mas depois de o bebê nascer, ela mandaria você arrancar com raiz e tudo.

-Esse desejo da jaca passou, o do leite também, mas não sosseguei ainda dos desejos que ainda virão. Também há coisas de que ela gostava e que, agora, tem repulsa.

-Eu, quando engravidei, tomei aversão pelo meu marido.

-A minha mulher não entrou nessa fase.

-O barulho dos passos dele pela casa me irritava, a voz, então... Coitadinho, sofreu nas minhas mãos.

Infelizmente, o destino da grávida irritadiça com o marido era a estação do Maracanã e o diálogo foi interrompido.

Mas aquela viagem era mesmo inusitada, pois nem todos estavam fixados nos seus celulares e smartphones; passageiros conversavam e eu direcionei os meus ouvidos para dois senhores que trocavam ideias.

-Por que você não vai para o Shopping Nova América e, de lá, pega uma condução para casa?

-Não. Não, vai atrasar a minha vida. Eu tenho de encarar mesmo aquele corredor e pegar a Avenida Suburbana.

-Eu soube que tem havido muitos assaltos por lá.

-Para lhe ser sincero, nunca vi ninguém ser assaltado por lá. O horror são aqueles pedintes de esmola, eles grudam em você como visgo e, enquanto não receberem, pelo menos dois reais, não desgrudam. Já andei mais de cem metros com um pendurado em mim. Querem dinheiro para se matarem com o craque. É a miséria.

-A miséria, a pobreza; tudo a mesma coisa. - acrescentou o outro.

Saltei em Maria da Graça, enquanto eles prosseguiam naquele trem, pensando no que os dois disseram. Li “Crime e Castigo”, de Dostoiévski uns trinta anos atrás, mas atualmente releio e estava bem viva na minha memória as palavras do miserável Marmieládov, viciado em álcool, para Raskólnikov, quando se encontraram numa taverna: “Na pobreza, o senhor ainda preserva a nobreza dos sentimentos inatos, mas, na miséria, ninguém nunca o consegue.”

Não é a mesma coisa, aqueles pedintes não pobres, são miseráveis.