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sexta-feira, 29 de maio de 2015

2863 - Em Obras


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5113                                 Data:  24 de maio de 2015

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SABADOIDO DA FESTIVAIA AO SENADO FEDERAL

 

Eu e Claudio fazíamos algumas observações sobre os festivais da canção dos últimos anos da década de 60.

-Muitos valores surgiram desses festivais.

-Sim, Claudio, mas, apesar disso, naqueles festivais, houve momentos de estupidez de uma infinitude de que Einstein falou. Uma dessas incontáveis burrices: vaiaram o Henry Mancini.

-Porque o Henry Mancini era americano e os Estados Unidos estavam em guerra com o Vietnã. - contemporizou.

-O que o “Passo do Elefantinho” e a “Pantera Cor de Rosa” têm a ver com a guerra?

Em seguida, protestei com mais seriedade.

-Astor Piazzolla foi vaiado quando se apresentou, como atração, no Maracanãzinho. Um compositor que é reverenciado até pelos músicos da Orquestra Sinfônica de Berlim, principalmente pelo naipe de violoncelistas, deve ser aplaudido de pé.

-Vaiaram “Sabiá”. - lembrou meu irmão.

-O maestro Isaac Karabitchevsky, que participou do corpo de jurados, declarou, num desses documentários, que “Sabiá” possui uma inventiva melódica, uma riqueza harmônica e outras qualidades que a colocavam muito acima das outras canções que concorriam com ela nacional e internacionalmente.

-Musicalmente falando, não há nem comparação.

Enquanto o Claudio se distraía com uma tangerina que apanhou na geladeira, passei para outro assunto.

-Eu ficaria menos surpreso lendo nos jornais a notícia que o Barcelona perdeu de 8 a 0 do Rayo Vallejano do que a que li na coluna do Ancelmo Gois: o filme “Chatô, o Rei do Brasil” irá para as telas de cinema.

-Só você se surpreendeu?!... Creio que o Brasil todo.

-O Spike Lee, no meio da filmagem do “Malcolm X”, ficou sem recursos; ele, então, procurou Magic Johnson, Mike Jordan, Kareem Abdul-Jabbar e outros negros milionários que enfiaram a mão no bolso e lhe deram o dinheiro necessário.

-Aqui, no Brasil, isso é impossível acontecer.

-Será que o José Dirceu, que é muito amigo do Fernando Morais, não pingou uns 5% do que ele ganha com assessoria, entre aspas, na conta dos realizadores do “Chatô, o Rei do Brasil?” - elucubrei.

-Carlinhos, no bolso do José Dirceu, o dinheiro só entra, não sai.

-Na época do lançamento do livro do Fernando Morais, alguns volumes ficavam expostos nas gôndolas de livro do Wal Mart. Enquanto a mamãe fazia as compras, eu lia.

-E, assim, leu todo o livro sem comprar. - pilheriou.

-Claudio, na época, o Fernando Henrique Cardoso se lançou candidato à presidência da República e o Rubens Ricupero assumiu o ministério da Fazenda. Como ministro, ele aconselhava a população a poupar porque, agora, declarava, a nossa moeda tinha valor.

E concluí:

-Alguém me emprestou o livro “Chatô, Rei do Brasil”, creio que o Luca, e eu terminei a leitura confortavelmente em casa.

-Ele, finalmente, me ligou felicitando pelo dia do meu aniversário. - era a Gina que aparecia na cozinha juntamente com o Daniel.

-Ligou com um mês e um dia de atraso. - assinalou o seu filho.

-No dia 23 de abril, há duas referências mnemônicas poderosíssimas: o aniversário do Pixinguinha e o Dia do Choro. - manifestei-me.

-Ele me contou que, nesse dia, não me telefonou porque esqueceu o celular na Hebraica, e, quando apareceu a filha com o dela, já passava das 11 horas da noite.

-E o telefone fixo? - indagou o Claudio.

-Ele ficou três dias sem o telefone fixo. - respondeu a Gina.

-Quando roubaram os cabos, em Del Castilho, nós ficamos mais de uma semana sem telefone, e, isso, por duas vezes. - intervim.

-O Luca me contou que tem jogado tênis de mesa pela equipe sênior do Fluminense, vestido com a camisa do clube e tudo. - retomou a Gina a palavra.

-Quando enfrentar os velhotes do Flamengo, o Luca tem de estar “endiabraaaaaaaaaado”. - procurou o Daniel imitá-lo quando ele contava as suas façanhas na época em que as sessões do Sabadoido se realizavam na vaga do antigo fusquinha da Gina.

-Vocês dois estão vestidos para sair?... - expressei a minha curiosidade.

-Vamos pegar o resultado de um exame de imagem no Nova América. - esclareceu a Gina.

-Fique tranquilo, Carlão, que não são as imagens da terça-feira de carnaval.

-Aquelas que você postou, na mesma hora, no Facebook com o comentário que o Shopping virou cinzas antes da quarta-feira? - ironizei.

Os dois saíram e eu e o Claudio voltamos a ser os únicos na cozinha.

-Eu assistia à sessão do Senado que debatia o ajuste econômico do governo...

-Assistia às Medidas Provisórias 664 e 665?... Eu vejo a TV Senado, às vezes. - cortou-me. 

-Em dado momento, reclamaram que havia ainda onze oradores inscritos, que, assim, a votação atravessaria pela madrugada. Surgiu, então, na mesa do Renan Calheiros, um requerimento de dois líderes para passar logo à votação no painel.

-E passaram?... Pelo que sei, foi adiada.

-Chiaram, e com toda razão. O regimento interno concede o tempo de dez minutos a cada orador, mas a Gleisi Hoffmann, antes desse imbróglio todo, falou por uns vinte e cinco minutos.

-A Narizinho? - chamou-a pelo apelido dado por seus pares.

-A oratória dela é articulada, mas sem consistência racional; comparou o governo de um estado com o do Brasil, enquanto defendia os trabalhadores ao mesmo tempo em que justificava as medidas que vão incidir no lombo deles.

-Deixaram que ela discursasse por vinte e cinco minutos e queriam barrar os restantes?- revoltou-se.

-Entre esses onze, Claudio, estava o Cristóvão Buarque que, em menos de dez minutos, logo depois da oratória da Narizinho, mostrou que havia vida inteligente no Senado.

-Ela nada tem de loura burra, está levando vantagem com essa situação toda; como aqueles dois milhões de reais mal explicados na conta dela.

Depois desse comentário, fez-me uma pergunta:

-Você assistiu a todos os discursos?

-Não; gravei e, no dia seguinte, vi os oradores que me interessavam, entre eles aquele do PSOL que tem cara de garoto e fala fina.

-O Randolfe Rodrigues?... Você gosta do que ele fala?

-Claro que não; mas eu tinha de ouvi-lo porque ele falou grosso, e eu não podia perder.

-Ele votou contra o governo?

-Votou, Claudio; por isso, ele engrossou a voz.

-Do jeito que está esse governo, Carlinhos, não é vantagem alguma falar grosso contra ele.

Com essas palavras, levantou-se e foi observar as obras da Prefeitura que tomam a frente da sua casa.

 

quinta-feira, 28 de maio de 2015

2862 - Ligações históricas, umas perigosas, outras, não


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5112                                 Data:  21 de maio de 2015

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CARTAS DOS LEITORES

 

   -Lendo uma das conversas do redator deste periódico com os taxistas que o levam para a Praça Manet, deparei-me com a citação do filme protagonizado pelo John Malkovich, “Relações Perigosas”; não seria “Ligações Perigosas”?  Terminando, gostaria de dizer “Quero ser John Malkovich”. Francis

BM – Pierre Chordelos de Laclos, general francês, se tornou bem mais famoso como autor do livro “Liaisons Dangereux” (“Relações Perigosas”), que muitos críticos consideram o melhor romance do século XVIII escrito na França.  Transformado em filme, recebeu, no Brasil, de fato, o nome “Ligações Perigosas”.

Quanto ao desejo do nosso remetente de ser John Malkovich, nós, aqui, aplaudimos, pois se trata de um dos melhores atores do cinema. Quem deve achar lastimável essa sua vontade de ser John Malkovich é o pastor Marcos Feliciano, entre muitos outros.

 

 

-Li a entrevista que o redator do Biscoito Molhado fez com Stefan Zweig, uns dez dias atrás, quando, por ele, foi visitado em casa. Não vai, nessas linhas, nenhuma falta de respeito com o ínsígne escritor austríaco, mas, ao lê-la, veio-me à mente o filme “Bagunceiro Arrumadinho”. Explico-me: Jerry Lewis, nessa comédia, era um enfermeiro que, ao ouvir os sintomas das pacientes do hospital onde trabalhava, passava a senti-los, configurando-se um caso de síndrome de empatia compulsiva.

Stefan Zweig não sofreria desse mesmo mal ao sentir, no Brasil, até mesmo no carnaval de 1942, os mesmos padecimentos dos europeus, principalmente do povo judeu, com a Segunda Guerra Mundial? Fernão

BM: Nessa época, precisamente fevereiro de 1942, Orson Welles chegou ao Brasil e os Estados Unidos já lutavam na Segunda Guerra Mundial; ele, praticamente, caiu no samba. Não digo que Stefan Zweig deveria fazer o mesmo; a cultura europeia tão entranhada nele, o seu povo sendo exterminado, entre outros dramas, impedem quaisquer comparações com o artista americano. Mas não era para ele, no Brasil carnavalesco, sofrer a tal ponto com a guerra. Que não lesse os jornais, que não ouvisse rádio. E o fato de a televisão não existir ainda no Brasil já era uma grande vantagem, pois nos deixava ainda mais distantes dos acontecimentos funestos.

Síndrome da Empatia Compulsiva?... Não; Stefan Zweig sofria mesmo de depressão.

 

No calendário do dia 12 de maio, o Homem-Calendário do Rádio Memória, o Sérgio Fortes, citou a conclusão da primeira Ferrovia Transcontinental ligando o leste ao oeste da América. Como tudo acaba em cinema, nos Estados Unidos, eu pergunto: fizeram um filme sobre esse acontecimento histórico? Cabral

BM: Sim. Em 1939, o diretor de fitas faraônicas, Cecil B. DeMille lançou um filme chamado “Union Pacific”, que não foi muito luxuoso – o dinheiro não sobrava – que retrata, no gênero faroeste, a ligação ferroviária da costa do Pacífico com a costa do Atlântico do grande país da América do Norte. O gênero é faroeste porque os bandidos adoravam assaltar trens, vide Jesse James, Frank James e mil outros assaltantes.

O filme foi estrelado por Barbara Stanwick, a atriz preferida do Jonas Vieira, e por Joe McCrea.

A obra ferroviária, a maior do mundo, iniciada em 1862 e finalizada com a fixação do Golden Spike (O Prego de Ouro) na Comunidade de Promontory, em Utah, dinamizou sobremaneira a economia americana.

Enquanto isso, no Brasil, só temos até hoje, o “Trenzinho Caipira”, do Villa Lobos, para apresentar ao mundo.

 

-No meu tempo de curso ginasial, estudei História do Brasil na primeira série, História da América, na segunda e História Geral, nas terceira e quarta séries. Destaquei-me mais na História da América e gostaria que este periódico, que insiste em repercutir a injustiça feita ao Cristóvão Colombo, esclarecesse que o navegador genovês cometeu um erro continental, o que não aconteceu com Américo Vespúcio que soube onde pisava. Obrigado. Vasco

BM: Se considerarmos América o que viria a ser os Estados Unidos, quem chegou primeiramente na sua costa leste não foi nem Cristóvão Colombo, nem Américo Vespúcio, e sim Lucas Vásquez de Avilón, que lá esteve em 1524-1527. Hernando de Soto, navegador espanhol, porém, foi o primeiro a explorar o que viria a ser o mais pujante país do mundo a partir do século XX.

Hernando de Soto, antes, participou das incursões ao Peru, na expedição de Pizarro e retornou à Espanha, enriquecido. Lá, pediu autorização ao Rei Carlos V para conquistar a Flórida e as terras adjacentes, e recebeu a permissão sob a condição que o fizesse às suas próprias custas, sem uma moeda do tesouro espanhol ou, como não é hoje no Brasil: sem juros subsidiados do BNDES.

Hernando de Soto, empreendedor valente, aceitou as condições e seguiu adiante com os seus planos. Assim, desembarcou na Baía de Tampa e explorou o sudeste do hoje chamado Estados Unidos, a Geórgia, a Carolina do Sul, a Carolina do Norte, o Tennessee, a Alabama e a Louisiana. Em seguida, 1841, transpôs o Rio Mississippi, feito que, até então, nenhum europeu realizara.

Hernando de Soto sonhou o sonho americano e ganhou muito dinheiro, mas, infelizmente, não durou muito, pois contraiu uma doença insidiosa, junto ao mencionado rio e nele seu corpo defunto foi imerso.

Quanto a Cristóvão Colombo, voltando atrás algumas décadas, na sua primeira viagem, chegou às terras que viriam a ser Bahamas, Cuba e Haiti; na segunda viagem, pisou o chão de Porto Rico e Jamaica; ainda veio mais duas vezes. Julgando-se na Índia, Cristóvão Colombo cometeu, de fato, um erro continental.

Américo Vespúcio, por sua vez, publicou em 1503, o livro “Mundo Novo” em que defendeu a ideia que as terras descobertas eram parte de um continente que estava muito longe de ser a Ásia, enfim, que aquilo nada tinha a ver com a Índia.

Em consideração à lucidez desse navegador que provou a sua tese por meio de estudos e viagens, os cartógrafos batizaram o novo continente de América.

A rigor, não houve injustiça alguma.

 

-No minidicionário-autobiográfico, não vimos referência alguma aos sapatos de Van Gogh no verbete “calçado”, em que até a engraxataria Cataldo foi citada. Bartolomeu.

BM: O par de sapatos de Van Gogh, pintados por ele em 1886, estavam tão rotos, esgarçados e puídos, que um mendigo o recusaria e também os recicladores do lixão. No entanto, a arte do pintor deu ao seu calçado - o mercado das artes plásticas também - um valor pecuniário muito superior às fábricas de sapato de cromo italiano ou alemão.

Não, nós, de fato, não pensamos em Van Gogh, quando escrevemos sobre os nossos sapatos.

É só por hoje.

  

 

 

quarta-feira, 27 de maio de 2015

2861 - esfregão matemático


 

 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5111                                 Data:  20 de maio de 2015

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SABADOIDO DA MATEMÁTICA À CHUVEIRADA

 

Quando o Claudio abriu o portão para mim, disse-lhe que, a cada sábado, ficava mais difícil de chegar a casa dele por causa dos tapumes das obras da Prefeitura.

-Agora, deixaram essa passarela do meu portão até o meio-fio. - disse-me ele.

-Deviam colocar um tapete vermelho. - brinquei.

 Na cozinha, o Daniel se juntou a nós.

-E, então, Carlão?

-Meu resfriado voltou; ontem, eu tossi mais do que a vaca da Dilma.

-Pelo menos, você não tossiu no brejo, porque a vaca da Dilma está lá. - comentou meu irmão.

-Tossi muito no meu trabalho; lá, não limpam o sistema de ar condicionado. Soube que ainda há fuligem do incêndio que ocorreu lá uns três anos atrás na aparelhagem do ar condicionado.

-O ministro Serjão do governo FHC morreu por causa da má conservação do ar condicionado do escritório dele.

-Sim, Cláudio, mas ele sofria de uma doença pulmonar que baixou a imunidade dele.

Daniel quase atropelou as minhas palavras:

-Carlão, e as combinações possíveis das senhas.

-Daniel, eu deveria me concentrar alguns dias no livro de Matemática do Ary Quintella nas páginas que tratam de Análise Combinatória, Permutação e Arranjo.

-Na Loteria Esportiva, havia treze jogos com três resultados possíveis, coluna 1, coluna do meio e coluna 2, quantas combinações são possíveis?

-Eu já calculei isso antes, é 3 (as opções) elevado à potência 13 (o número de jogos).

Peguei a maquininha de calcular que se achava sobre a mesa e lhe disse o resultado.

-São 1.594.323 combinações possíveis.

-Nem tudo é matemática nisso, Carlinhos; há os times favoritos, as zebras. - interveio o meu irmão.

Enquanto eu concordava com a cabeça, ele prosseguia:

-Lembra-se daquela vez que o Seu Renato acertou os treze jogos da loteria esportiva e já se julgava um milionário, futuro dono de uma Ferrari? Milhares de pessoas também acertaram todos os jogos e ratearam uma merreca para cada um?

-Claro que me recordo. Creio que, depois dessa ilusão dos apostadores, surgiu o matemático Oswald de Souza, na TV Globo, prevendo o número de acertadores considerando o grau de favoritismo dos clubes nas partidas. E ele, como os matemáticos que surgiram depois, não chegava a um número certo e sim a uma margem de possibilidades. A coisa era complexa.

-No caso do Seu Renato, antes, o Dudu da Loteca ficou milionário, e a partir de então todo o mundo pensou que também ficaria se acertasse os 13 jogos, não pensaram que o Dudu da Loteca acertou várias zebras e ganhou sozinho. - fez o meu irmão esse adendo.

E prosseguiu:

-Em 2009, os matemáticos deram 98% de chances de o Fluminense cair para a segunda divisão, o Fluminense não caiu e, no ano seguinte, foi campeão brasileiro. Portanto, isso de matemática...

-Certo, velho, nesses casos ela não reina absoluta, mas nos casos das senhas, por exemplo, não entram fatores extracampos. Se você tem, por exemplo, uma senha de 5 caracteres só de letras, as combinações possíveis são 26 vezes 26 vezes 26, vezes 26, vezes 26 e fim de papo. - manifestou-se o Daniel com veemência.

Com a maquininha na mão, fiz o cálculo.

-Daniel, são 11 milhões, 881 mil, 376 combinações possíveis.

-Nas senhas, é pura matemática; clonagem de cartões à parte. - manifestou-se meu sobrinho.

-Daniel, depois de topar com senhas criptografadas que não me deixavam abrir arquivos, busquei o significado de criptografia e soube que é uma técnica de transformar uma informação original em outra ilegível de forma que só o destinatário possa conhecê-la, e, para tanto, tem de saber a “chave secreta”. Também soube que há utilização de números primos...

-Carlão, o que é um número primo?- interrompeu-me com o seu costumeiro jeito folgazão.

-Número primo é aquele que só é divisível por ele próprio e por um; exemplos: dois, três, cinco, sete, nove...

-Carlão, já que você não tem mais o livro de matemática... de quem mesmo?

-Do Ary Quintella, Daniel.

-Já que você está sem o Ary Quintella, eu vou lhe ensinar. Pra você saber se um número é primo, você, em primeiro lugar, calcula a raiz quadrada dele, em seguida, passa à fatoração com números menores do que o resultado encontrado. 

Sem tomar fôlego, jogou-me a questão?

-O número 8 quintilhões 333 bilhões 413 é primo?...

-Daniel, nesta maquininha só cabem 12 dígitos.

 -Então, passemos para outro. 12 milhões 767 mil e 143 é primo?

-A raiz quadrada é 3 mil 573 vírgula alguma coisa.- respondi.

-Você tem de fatorar com números abaixo desse para saber se é primo.

-Para mim, seria uma trabalheira, mas os computadores descobririam os números primos.

-Nem os mais potentes, Carlão, porque os números são infinitos como o universo.

-Einstein dizia que o universo e a estupidez humana são infinitos, mas, quanto ao universo, ele tinha dúvidas. - manifestei-me.

-É isso aí, Carlão.

-Eu assisti ao discurso da bonitinha, a Gleisi Hoffmann, no Senado...

-A Narizinho. - cortou-me o Claudio rindo.

-Ela defendia a política econômica da Dilma e do Guido Mantega mesmo com toda essa lambança que se vê, enquanto comparava o governo do Paraná com o do Brasil, comparação esdrúxula. Então, eu constatei a veracidade da frase do Einstein.

-No caso da Gleisi Hoffmann, ela ganha em defender o PT, haja vista os 2 milhões da Petrobras que foram para a sua conta. Estupidez infinita mesmo é dos petistas que acreditam no Lula, na Dilma, etc, sem nada ganhar com isso.

-Tem toda razão, Claudio. - reconheci.  

-Como vai, Carlinhos? - era a Gina que entrava na cozinha.

-Hoje, tossindo menos.

-Há um andaço de resfriado por aí. - disse-me ela.

-Vou tomar banho. - informou o Daniel caminhando para dentro da casa.

-Falando em banho, eu assisti a um programa no Canal Viva, com duas médicas, que confirmou o que eu li no Globo quando eu estava com uns 15 anos de idade.

-O que você leu? - indagou o Claudio sem mostrar muito interesse.

-Naquela época, imprimiam artigos de médicos da Clínica Mayo, e, num deles, eu li que se deve tomar só um banho por dia e sem muita esfregação para não se perder a proteção natural da pele.

-E o que essas duas médicas falaram? - interessou-se a Gina.

-Disseram que o banho, um só por dia, não deve passar de 5 minutos de duração.

-E no calorão, como vai ser?

-Chuveiradas, apenas chuveiradas, recomendaram elas.

-Essa gente não sabe de nada. - bateu a Gina o martelo.

terça-feira, 26 de maio de 2015

2860 - Uma avenida no Meier


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5110                                 Data:  24 de maio de 2015

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ACONTECEU NO DIA 24 DE MAIO

 

No dia 24 de maio, o Rádio Memória caiu da cama, ou seja, foi ao ar às 5 horas da manhã; por isso, a coruja que fica na redação do Biscoito Molhado só conseguiu gravar o calendário. Sim, o Homem-Calendário já estava recuperado da dor no nervo ciático e compareceu no trabalho, embora possa sofrer uma recaída por causa das pessoas que, com o Q.I. de hidrante, lhe deixam estressado. “Me too” - como dizem os fleumáticos ingleses.

-Jonas, no dia 24 de maio de 1337, tem início a Guerra dos Cem Anos entre a Inglaterra e a França.

-Terminou, então, em 1437.

-Não, Jonas, ela durou 116 anos; parece que incidiram juros e correção monetária.

-Em 1819, zarpa de Nova York o navio Savannah, o primeiro barco a vapor que atravessa o Atlântico Norte.

-Um acontecimento, Sérgio: as viagens não ficavam mais rápidas apenas na Europa.

-Em 1839, em Buenos Aires, é firmado um tratado entre a Argentina e a Grã-Bretanha em que se abolia o tráfico de escravos. A Grã-Bretanha, por ser a maior potência, na época, impôs isso, não por ser boazinha, mas por interesse econômico.

-Mas no Brasil, o tráfico de escravos continuou. - rebateu o Jonas Vieira.

-Os brasileiros davam um jeitinho de enganar os ingleses, quando traziam os negros da África para cá. O Regente Feijó fez uma lei que declarava livres todos os escravos que desembarcavam no Brasil. Mas aqui, a realidade era bem outra, daí, surgiu a expressão que essa lei era “para inglês ver”.

 -Em 1844, Samuel Morse emite a primeira mensagem telegráfica enviando-a de Washington a Baltimore. O Código Morse, Jonas, representa caracteres que correspondem a impulsos elétricos.

-Eu assisti, na televisão, Sérgio, a uma disputa de rapidez entre o Código Morse e o Fax, ou outro invento da tecnologia moderna, e o Código Morse venceu.

-Jonas, menos de 30 anos depois, ou seja, em 1872, o continente americano já era cruzado por mais de 300 mil quilômetros de linhas telegráficas.

-Puxa!

-Em 1866, é travada a Batalha de Tuiuti entre Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai, que resultou em 16 mil homens mortos ou com ferimentos graves. Impressionante.

- Para um país enfrentar, sozinho, três das maiores potências da América Latina, era porque tinha um progresso razoável. A que ponto caiu o Paraguai, Sérgio.

Mas os outros três estão também caindo.

-Um mau governante pode causar malefícios a uma nação difíceis, quase impossíveis, de serem contornados, Jonas.

-Em 1883, ocorre a inauguração da ponte do Brooklyn, a primeira construída com cabos de aço por John e Washington Roebling.

-Sem superfaturamento. - acrescentou o Jonas Vieira.

-Em 1913, realiza-se, em Berlim, o casamento do príncipe-herdeiro Ernesto Augusto de Hanover com a princesa Vitória Luísa da Prússia, filha mais nova do Kaiser Guilherme II da Alemanha.

-Foi capa da Revista Caras da época. - brincou o Jonas Vieira.

-Por que eu destaco esse acontecimento? Porque foi a última ocasião social que reuniu todas as dinastias europeias do século XX. No ano seguinte, 1914, o pau quebrou entre elas.

-Em 1933, o Reichstag concede amplos poderes a Hitler por quatro anos, nos quais ele aproveita para governar a Alemanha a seu modo.

Voltou-se, em seguida, para o titular do programa Rádio Memória.

-Ele estendeu por mais oito anos e só não foi mais além porque os russos, os americanos, os ingleses e os franceses entraram em Berlim.

-Em 1940, o primeiro voo bem sucedido de um helicóptero monomotor é realizado por Igor Sikorski.

-Lembra-se que o Collor, quando presidente, ia trabalhar de helicóptero, Sérgio?

-Não; a minha memória, depois da dor do nervo ciático, tem estado seletiva.

-Em 1941, o cruzador de batalha HMS Hood é afundado na Batalha do Estreito da Dinamarca pelo encouraçado alemão Bismarck. Com isso, Jonas, partiu a ordem de Winston Churchill: “Afundem o Bismarck”; e afundaram.

-Foram se meter com a marinha mais poderosa do mundo...

-Em 1993, a Eritreia se torna independente.

-Ela era ligada a Etiópia, não era isso, Sérgio?

-Sim, Jonas; não sei, agora, se a Aída de Verdi eram uma princesa etíope ou da Eritreia.

-Em 2001, é encontrado na China o fóssil mais antigo parente dos mamíferos. Muito interessante, pois, até, então, os seres vivos nasciam com um envoltório, o ovo de casca dura. Com os mamíferos foi diferente, eles já nasceram prontos, doidos para mamar.

-Muitos começaram a mamar e não pararam mais. - comentou o Jonas Vieira.

-Nascimentos. - impostou a voz o Homem-Calendário.

-Em 1686, Gabriel Fahrenheit, físico e engenheiro alemão. Jonas, ele ainda influencia os Estados Unidos, que insistem em medir a temperatura em Fahrenheit. No Colégio Santo Inácio, nós tinhamos de decorar a fórmula de conversão para Celsius.

-Em 1743, nasce Jean-Paul Marat, revolucionário francês. Jonas, foi aquele que morreu esfaqueado pela Charlotte Cordy dentro de uma banheira.

-Depois dizem que francês é avesso ao banho, Sérgio.

-Ele tinha de ficar de molho na água por causa de uma doença de pele, Jonas, uma erisipela ou coisa parecida.

-Em 1819, nascia a Rainha Vitória da Grã-Bretanha. Não vou fazer, hoje, comentários sobre a sua beleza porque o Carlos Nascimento do Biscoito Molhado não gosta que zombem da rainha.

-E também, Sérgio, porque hoje seria o aniversário dela.

-Em 1900, nasce Eduardo De Filippo, ator, roteirista; um importante artista italiano do cinema e do teatro.

-Em 1936, nasce Canário, ponta-direita do América que, depois, jogou no Real Madrid. Canário, Del Sol, Di Stéfano, Puskás e Gento; lembra-se desse ataque, Jonas?

-Eles ganhavam tudo, Sérgio.

-Em 1941, nasce Bob Dylan, músico e compositor norte-americano. Bob Dylan é considerado um expoente da música POP, ficando atrás apenas dos Beatles e do Michael Jackson. Mas ele não é da minha enfermaria.

-Nem da minha, Sérgio.

-Em 1946, nascia o ator José de Abreu, aquele que contribuiu para pagar a multa do José Dirceu no crime do Mensalão. Quanta ingenuidade! O José Dirceu embolsou milhões de reais com umas assessorias esquisitas.

-Falecimentos.

-Vamos aos mortos, Sérgio.

-Em 1543, Nicolau Copérnico, astrônomo polaco. Grande personalidade.

-Bárbara Heliodora...

-Morreu outra vez?!... - espantou-se o Jonas Vieira.

-É a Bárbara Heliodora poetisa, musa da Inconfidência Mineira. Ela morreu em 24 de maio de 1819.

-Em 1974, morre Duke Ellington, músico norte-americano. Foi um gênio, Jonas.

-Gênio. - confirmou.

-Jonas, santos do dia: Nossa Senhora Auxiliadora; Santa Sara Kali, padroeira dos ciganos, e é o Dia do Coração Abrasado.

-Eu tenho o coração em brasa, Sérgio.

-É o Dia do Coração Abrasado pela Igreja Metodista.

-Bem, que eu achei esse dia meio diferente.

-24 de maio é o Dia Nacional do Café.

-Então, vamos tomar uma cerveja para comemorar, Sérgio.

 

 

 

segunda-feira, 25 de maio de 2015

2859 - Decepcionado Dicionário Biográfico, em hora errada


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5109                                 Data:  19 de maio de 2015

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MINIDICIONÁRIO AUTOBIOGRÁFICO XXXVI

 

DECEPÇÃO - De vez em quando, aparecia para reuniões, aqui no meu trabalho, Roberto Galli; um senhor alto, empertigado, sempre trajado de terno. Houve um tempo em que suas visitas foram mais constantes e eu me perguntava: será que ele se lembra de mim?...

Não vinha tratar de assuntos do meu campo de atuação, por isso, não nos encontrávamos nessas reuniões, eu o via apenas passando, com alguns acompanhantes, pela minha baia, rumo a uma das salas onde era aguardado.

-Veio tratar de afretamento? - indagava dos colegas.

-Não sei, pois ele é do Syndarma – Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima. - era a resposta que invariavelmente me davam.

Um dia, aguardando o elevador para ir almoçar, ele surgiu sozinho no saguão. Era a minha oportunidade de lhe dirigir a palavra.

-O senhor não foi um dos professores do curso de afretamento na Fundação do Estudo do Mar em 1981?

Seus olhos faiscaram.

-Você se recorda? - surpreendeu-se positivamente.

-É evidente; os representantes da Petrobras e da Docenave, que tinham uma vivência incrível na área de afretamentos, nos proporcionaram aulas antológicas e o senhor foi um deles.

-O Comandante Parga Nina também foi extraordinário na sua aula. - assinalou.

-Ele era o meu chefe no Bureau de Fretes na SUNAMAM. - disse-lhe isso já dentro do elevador que descia.

-Naquele tempo, havia SUNAMAM, Lloyd Brasileiro, Conferências de Fretes... - relembrou.

E uma indústria naval com crescimento que não era autossustentável e logo se desfaria como um castelo de cartas, igualzinho a hoje. - pensei, mas sem me manifestar.

Quando chegamos ao térreo e cada um seguiu o seu caminho, a sua expressão era radiante, estava orgulhoso da minha lembrança transcorridos 30 anos.

Se eu fosse escoteiro, fiz a minha boa ação do dia. - imaginava enquanto comia.

Então, fui designado, com uma companheira de serviço, a comparecer num simpósio sobre Marinha Mercante, em Botafogo.  Muitos gostariam de estar no nosso lugar, pois nos intervalos - americanizados para break coffee - era servida uma fartura de guloseimas.

Na sala, onde ocorriam as conferências, nos deparávamos com palestrantes que pretendiam atrair a máxima atenção para o tema de que tratavam e com aqueles aqueles que, ao contrário, usavam a sua matéria como escada para o seu ego sobressair. Constatava-se, entre os assistentes, a mesma coisa: aqueles que aparteavam para salientar a importância de um fato, e aqueles que interferem apenas para aparecer; nessa hora, eu ia ao banheiro.

Roberto Galli estava lá, divisei-o quando girei o pescoço em busca de pessoas conhecidas na plateia. Ele interrompeu uma vez, apenas, um palestrador para realçar um ponto e disse que desenvolveria mais esse ponto no momento da sua fala.

-Será de tarde; não percam de jeito nenhum. - informou descontraidamente, arrancando risadas de todos.

Chegou a hora do almoço, esse gasto não era coberto pelo simpósio, nós tínhamos uma hora e meia para procurar um restaurante, nas cercanias, restaurar as forças e voltar para a segunda sessão.

A minha colega que tinha algum traquejo em transitar por Botafogo me levou, sem perda de tempo a um lugar onde comemos bem.

Na parte da tarde, não houve a mesma vivacidade da manhã, mais por culpa da digestão do que dos falantes.

Então, foi anunciado o Roberto Galli como o próximo palestrante. Ele deu início à sua oratória e eu me ajeitei na cadeira. Ele falava e as minhas pálpebras pesavam. Percebi que toscanejava; arregalei, então, os olhos em luta contra o sono, mas não por muito tempo, a modorra me dominava.

-Fui sacudido quando o Roberto Galli saiu do texto para, decepcionado, fazer uma observação que me despertou:

-Tem gente que está dormindo...

-Será que ele me viu?... - perguntei à minha colega.

-Outras pessoas estavam também cochilando. - intentou tranquilizar-me.

Semanas depois, quando ele retornou para mais uma reunião no local onde trabalho, viu-me e desviou o olhar. Não havia mais dúvidas, ele me surpreendeu na minha sesta. Eu o decepcionara. (*)

Bem, aquelas aulas de 1981, na Fundação do Estudo do Mar – FEMAR – iam das 20 às 22 horas; eu as assistia depois de um expediente das 8 até 17 horas e de um deslocamento de ônibus da Avenida Rio Branco até a Rua Marquês de Olinda. Se o Roberto Galli tivesse visto os meus cochilos, naquele tempo, também durante as suas aulas, não se decepcionaria tanto 30 anos depois.

 

(*) O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO pode afirmar, categoricamente, que esta impressão foi causada pela pesadíssima consciência do redator. Se Roberto Galli desviou o olhar foi porque era o caso e não porque mais um assistente de suas palestras havia roncado. É um palestrante traquejado.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

2858 - Dia das Mães especial


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5108                                 Data:  18 de maio de 2015

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DOIS PERDIDOS NO DIA DAS MÃES

 

Ao almoço do Dia das Mães na casa da minha sobrinha Luciana, a minha mãe não poderia ir, mas eu não poderia faltar. Ela tinha justificativas convincentes para a sua ausência: dificuldade em se locomover, com quase 90 anos de idade, e a impaciência com a barulheira de crianças pequenas – haveria duas lá, sem contar um bebê. Quanto a mim, que desculpa eu apresentaria para faltar? A transmissão pelas Rádios Cultura e MEC do Metropolitan Opera House de Nova York  do Baile de Máscaras”, de Verdi?... Isso não seria desculpa pois, mais cedo ou mais tarde, tudo é colocado no You Tube para ser visto e ouvido.

Eu tinha a obrigação de marcar presença, mas pegar um táxi no Dia das Mães na hora em que todos os filhos do Rio de Janeiro vão almoçar com elas em restaurantes ou na casa de parentes, como era o meu caso, seria uma batalha. Haveria muita demanda e pouca oferta, porque os taxistas não são, como costumava dizer o comentarista João Saldanha, filhos de chocadeira; almoçariam muitos deles com suas mammas. Telefonar para uma cooperativa de táxis e requisitar um estava fora de cogitação; nesses momentos de muita procura, como me informaram os profissionais da área, eles preferem pegar os passageiros “na maçaneta”, que são aqueles que estendem os braços para os táxis nas ruas.

Prometi à minha mãe que traria o almoço da casa da sua neta até ela numa substanciosa quentinha e fui à luta.

A Praça Manet, aos domingos, nessa hora, está tomada de peladeiros quarentões no campo Sangue e Areia, que perdeu esse nome depois que um político, em época de eleição, o cobriu de carpetes. Havia táxis estacionados por lá, mas era a hora de lazer dos seus donos; eu teria de descer a Rua Renoir e tentar a sorte na Avenida Suburbana. Desci essa rua atento a todo ruído de motor e nada, era tudo carro particular.

A uns 15 metros da Avenida Suburbana, constato que a velocidade média dos veículos era por volta de 5 quilômetros por hora. Já pisando a calçada da Suburbana, o sinal fechou e vários táxis pararam naquele trânsito encruado. Caminhei com o braço estendido, mas nenhum deles estava livre. Então – que beleza! - um taxista de cabelos brancos me fez sinal com a mão para entrar. Estou com sorte, pensei. Que ilusão!...

Eu ainda colocava o cinto de segurança, quando ele me disse:

-Como eu saio daqui?... Esta confusão toda é por causa da igreja do Bispo Macedo?...

Respondi à segunda pergunta e o velhote prosseguiu;

-Acostumei-me a dirigir pela zona sul somente.

Nesse instante, o sinal abriu.

-Vou para a Rua Camarista Méier.

-Eu posso sair daqui por Maria da Graça?

-Sim, o senhor entra numa dessas ruas à direita, pega a Ferreira de Andrade e, daí, a Aristides Caire.

-Eu peguei uma passageira na Gávea que deixei no Méier; agora, eu estou enrolado. - explicou-se.

Meu cunhado é também taxista; sai antes das 4 horas da manhã de casa com o objetivo de rodar só na zona sul. Às 11 horas da manhã, ele larga. - disse-lhe.

-Eu trabalho por diária. Uma senhora é dona deste carro; eu lhe dou 65 reais e outro diarista lhe dá o mesmo valor.

-Meu cunhado também tem um motorista, que trabalha no seu carro de tarde.

-Meu filho tem táxi, inclusive com ponto no aeroporto do Galeão, e insiste que eu trabalhe para ele.

Não bastou o tempo em que seu filho era criança? ...- pensei sem me manifestar.

-Eu trabalho segundas, quartas e sextas e já está bom para a minha idade.

-E no Galeão, o tráfego anda pesado. - lembrei.

-Nem fale. Vou continuar como estou.

-O senhor vai, depois, entrar na Rua Dias da Cruz.- disse-lhe quando nos aproximávamos do Viaduto Castro Alves.

-Aos domingos, não há uma área de lazer num trecho da Dias da Cruz?...

-Sim. - respondi animado de ele não ser tão ignorante, como propalava, dos logradouros da Zona Norte.

-Vou na direção da rua do canal, lá, entro na Dias da Cruz.

-E sai em frente do Mackenzie. - entusiasmei-me ainda mais.

-Há muitos anos, eu fui motorista do ônibus 679 que tem ponto final lá.

-Ponto que fica próximo de uma escola pública?... Foi lá que a minha sobrinha fez parte do primeiro grau. Para casa dela que estou indo. - expressei o meu contentamento.

No outro lado do Méier, ele alterou o seu itinerário e entrou na Rua Magalhães Couto.

-Daqui, nós saímos, com toda certeza, na Dias da Cruz, depois, eu não sei mais como se chega à Rua Camarista Méier.

Com essa revelação, saquei o celular e liguei para o meu cunhado, que já se achava na casa da filha.

-Júlio, estou na esquina da Magalhães Couto com a Dias da Cruz. O taxista não sabe chegar aí.

-Ele tem GPS?

-Não.

-Manda comprar um.

Depois dessa estocada, passou às instruções: seguir pela Dias da Cruz rumo ao Engenho de Dentro e, onde houver um pardal, dobrar a esquerda na Rua Doutor Bulhões. Como me pareceu confuso o caminho a seguir daí, disse-lhe que telefonaria depois.

Sem maiores dificuldades, o taxista encontrou a Doutor Bulhões, e, lá, calçou salto alto, como se diz na gíria futebolística.

-Agora, eu sei. Deixa comigo.

Então, ele titubeou.

-Acho que deveria ter dobrado à esquerda.

Eu deveria ter dobrado à esquerda em Albuquerque – dizia o coelho Pernalonga quando se perdia nas suas escavações. Lembro-me disso agora, em que escrevo, pois, naquela hora, eu não estava com cabeça para pensar em desenho animado.

-Há uma referência – disse-lhe – o Hospital Marcílio Dias.

-Lá, eu sei chegar. - reanimou-se.

Acercamo-nos do hospital e nada. Veio-me, então, à mente, que esse hospital ficava próximo do antigo endereço da minha sobrinha.

Ele parou o carro na calçada de um posto de gasolina, e eu, que havia religado para o meu cunhado, lhe passei o celular.

-Temos de ir para a Dias da Cruz de novo, entrar na Doutor Bulhões e procurar a Rua Maria Paula à esquerda; assim, chegaremos à Camarista Méier. - disse ao devolver-me o celular.

Que agonia o trânsito com duas fileiras de veículos transformados em tartarugas de motores à explosão pelos semáforos!

Quando, depois de muito tempo, voltamos a Doutor Bulhões, fiquei mais alerta do que marinheiro das naus portuguesas  naquilo que os estudiosos do idioma garantem se chamar “casa do caralho”.  Foi quando vi um cartaz pregado num poste com três letras: UPP.

-Entre nesta rua. - ordenei praticamente.

Entramos, e, mais adiante, outro cartaz igual.

-Pode seguir o cartaz que não tem erro. - garanti.

Chegamos, finalmente, à Rua Camarista Méier e vi a minha irmã com uma das suas netas na calçada.

Pedi ao taxista para parar, paguei a corrida, despedi-me, enquanto a minha irmã me abordava:

-Quanto ele cobrou?

-42 reais.

-Ele te roubou. O problema era dele de não saber o caminho. Você não deveria ter pagado isso tudo.

-Suzete, acabou o estresse. Vamos almoçar e, depois, assistir ao jogo São Paulo e Flamengo.

Espero que o juiz apite muito bem esse jogo, pois a mãe dele não merece ser lembrada, logo hoje, pelos torcedores. - pensei enquanto caminhava para o prédio da minha sobrinha.