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terça-feira, 31 de março de 2015

2823 - Encostado Dicionário Biográfico


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5073                              Data:  26 de março de 2015

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MINIDICIONÁRIO AUTOBIOGRÁFICO

PARTE XXIII

 

TREM – Acostumei-me a andar nos trilhos; deslocava-me sempre de bonde. Eu, na adolescência, só percorria, praticamente, três caminhos:  Méier, onde ficava a escola; Centro,  para o tratamento dos dentes e compra de livros -  o ônibus ficava, então, esquecido por mim - e quanto ao terceiro, que era São Cristóvão, não havia jeito, eu tinha de pegar o ônibus, comumente o 292, pois seria alongar acentuadamente as distâncias se eu optasse pelo bonde.

Assim, quando o governador da Guanabara, Carlos Lacerda, acabou com os bondes em 1965 (*), foi um baque para mim.

-Voltei aos trilhos com o trem, uma década depois.

Eu tinha encerrado as provas do segundo grau do artigo 99, quando acompanhei um colega e vizinho até o trabalho dele no escritório do tio que ficava na Central do Brasil, fomos de trem. Perguntei-lhe se havia uma faculdade por perto (o vestibular para as escolas do governo já havia passado, e eu não queria perder tempo). Damião apontou o dedo para os lados da Praça da República:

-Lá tem o “Siri Cozido”.

O Google só apareceria décadas depois, por isso tive de consultar diversos conhecidos para saber o porquê daquele cognome depreciativo. A maioria dos consultados disse que os alunos do Colégio Pedro II criaram esse apelido porque as alunas da escola técnica em contabilidade usavam vestidos rubros e blusas encarnadas. Mas ali não era uma faculdade em que se andava à paisana? - intriguei-me. Soube, então, que lá não só havia uma faculdade de direito, uma de economia, como esse colégio do 2º grau e que o apelido se estendeu até os cursos superiores. Quando o meu médico, Dr. Jerônymo, relembrando os seus velhos tempos, me contou que estudava Medicina na Praia Vermelha, mas se desviava, às vezes, do caminho, para namorar as meninas uniformizadas do “Siri Cozido”, não tive mais dúvidas: as faculdades nada tinham a ver com isso.

Ainda assim, a fama de boate de tudo aquilo, abrangido no acrônimo S.U.E.S.C., me desanimava.

-Rapaz, foi lá que o Mário Henrique Simonsen se formou. - incentivavam-me.

Na verdade, aquele que, para mim, era o maior economista do Brasil, dava aulas de economia na Fundação Getúlio Vargas e já assessorara o ministro do Planejamento, Roberto Campos, na área da economia, com o diploma de engenheiro, apenas. Necessitava do diploma de economista, assim, matriculou-se lá, no “Siri Cozido”, onde aparecia apenas nos dias das provas, haja vista que os seus conhecimentos excediam em muito os dos professores. Em 1968, conseguiu o seu diploma, que era apenas um papel para aquele que tinha como discípulos economistas com doutorados em universidades dos Estados Unidos e da Europa.

-O que faz o aluno não é o colégio, é ele próprio. - garantiram-me, quando eu me mostrei dubitativo.

Acredito que o maior motivo para eu iniciar meus estudos na área econômica, na Praça da República, foi o trem. Eu pegava o ônibus Méier-Maria da Graça na porta da minha casa, saltava perto da estação do Méier, pegava o trem até Central do Brasil de onde rumava para a faculdade.

As primeiras aulas se iniciavam às 7 horas da manhã, então, uma hora antes lá estava eu espremido nos vagões pelos trabalhadores em sua grande maioria. Eu me sentia confortável em estar misturado entre aquele pessoal que falava baboseiras em alto volume e gargalhavam com piadinhas idiotas comportando-se mal educadamente? Evidentemente que não. Muitos eram trabalhadores, repito, contribuíam para levar o Brasil para frente, enquanto alguns milionários o levavam para trás, mas eu não me sentia bem entre eles. Não me recordo quem disse que não era uma pessoa do povo e sim uma pessoa que pensa para o povo, que luta para que as pessoas tenham acesso pleno à cultura e educação, e saiam da situação em que se encontram, subentenda-se que, assim, melhorariam o seu comportamento.

Contudo, não desisti do trem; durante todo o meu primeiro ano na Faculdade de Economia.

Havia, nos vagões, umas argolas para os passageiros se segurarem, que eram chamadas de chupetas. Só vim a revê-las agora nos trens chineses do metrô. Ao procurá-las, atualmente, reporto-me aos trens da Central do Brasil, quando, ao apoiar-me nelas, eu enfiava a mão espalmada com os cinco dedos unidos na chupeta para abri-los, em seguida, quando ela envolvesse o meu pulso. Certa vez – retorno aos anos passados - um sujeito de maus bofes agarrou a chupeta de tal maneira que impedia a retirada da minha mão. Notei que seu gesto foi proposital, que era uma provocação. Tudo bem, eu não vou saltar antes da última parada e deu para ignorar o ignorante e evitar um aborrecimento naquela hora da manhã.

Quem saltou antes do tempo foi uma senhora; a leva que saiu na estação de São Cristóvão foi de uma intensidade de correnteza de rio que eu só ouvia os seus gritos desesperados: “Eu não vou saltar aqui... Eu não vou saltar aqui...”. A coitada teve de esperar o trem seguinte.

Lugar vago no banco era impensável quando eu me enfiava nos trens a partir da estação do Méier; eram tantos os passageiros que mal se via os bancos, o que dizer em se sentar num deles. O problema maior dessas aventuras, para mim, de me deixar agoniado, era evitar que os meus órgãos genitais se encostassem em alguém e vice-versa, principalmente, o vice-versa. Um dia, encontrei-me na estação do Méier com o Cosme, irmão gêmeo do Damião, e nos metemos juntos num daqueles vagões. Em determinado ponto da viagem, um senhor reclamou que ele o assediava sexualmente (na década de 70, não se dizia assédio sexual, e sim “você está encostando em mim”.

-”Você precisa sentir o que está atrás de mim”. - respondeu o meu amigo, encerrando o assunto.

Na volta da Central do Brasil para o Méier, havia o problema do “mudou a seta”. Lá, toda a atenção era pouca para saber em que plataforma sairia o trem para o nosso destino. A seta indicava que o trem parador de Deodoro sairia de tal plataforma, mas gritavam, muitas vezes “mudou a seta”, e uma pequena multidão se deslocava para outra plataforma.

A vantagem do trem era a rapidez, mas o problema estava nos sábados, quando eu assistia a duas aulas no horário da tarde. Nesse dia e nessa hora, eu conseguia sentir o banco sob o meu traseiro, isso seria uma vantagem não fosse a espera. Se eu tivesse ido de ônibus, estaria a essa altura em São Cristóvão – imaginei muitas vezes, enquanto sofria no Méier com a demora junto com umas poucas pessoas. Num desses sábados, o trem não veio e satisfação alguma foi dada.

Depois de um ano, desisti desse meio de transporte. Quase duas décadas depois, voltei a ele, mas só por uma vez. Foi no governo do Itamar Franco, quando entramos em greve, e uma assembleia foi marcada para a tarde de sexta-feira. Eu soube que um dos meus colegas voltaria para casa de trem e me ofereci para acompanhá-lo.

-Vamos ver como estão os trens. - disse-lhe.

Constatei que estavam a mesma coisa de antes.

 

(*) O fim dos bondes no Rio de Janeiro ocorreu em tempos variados. Na Zona Sul, em 63 e na Zona Norte, onde residia o redator do seu O BISCOITO MOLHADO, em 65. No Alto da Boa Vista, só acabou em 67 e em Santa Teresa, como o bonde é do povo, deverão circular em breve. Quem quiser saber mais sobre bondes deve entrar em:

http://www.bondesrio.com/paginas/basicas/frame_home_novo.html

 

 

segunda-feira, 30 de março de 2015

2822 - dormindo com cobras e lagartos


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5072                              Data:  25 de março de 2015

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CONVERSAS DO METRÔ

 

Anos atrás, este periódico reproduzia as conversas que eram testemunhadas no metrô. Dia desses, pediram que elas voltassem às nossas páginas. Eis um pedido muito difícil de atender, porque as pessoas, ultimamente, fixam as vistas nos seus celulares, tabletes ou outro desses objetos modernos e ficam alheias a tudo que se encontra em volta. Se vivesse nos dias de hoje, Nélson Rodrigues atualizaria a sua frase “mais só do que Robinson Crusoe sem radinho de pilha” para “mais só do que Robinson Crusoe sem celular”. Ainda há aqueles que, conseguindo sentar, dormem. Se for, então, um invasor dos bancos de cor laranja destinados aos idosos, aos portadores de deficiência física, às grávidas e às pessoas com criança de colo, ele dormirá mais profundamente do que a Bela Adormecida depois da picada e antes do beijo do príncipe.

Assim, ninguém proseia mais no metrô, acredito que nas outras modalidades de transportes coletivos também. No entanto, numa sexta-feira, quando retornei do trabalho para casa, por volta das 16h, houve uma exceção. Vamos a ela.

Entrei no trem, que estava mais ou menos lotado e procurei o balaústre junto aos bancos de cor laranja para me segurar, evitando a dormência nos braços que as barras elevadas provocam. Bem sucedido, deparei-me com duas senhoras que conversavam animadamente. Falavam sobre animais. Uma delas, quando me viu, levantou-se e me ofereceu o seu lugar. Ela, mesmo com a cabeleira tingida da cor da asa da graúna, aparentava, pelas rugas e bolsas ao redor dos olhos, uns 70 anos; eu, se aceitasse o seu oferecimento, admitiria estar com uns 75 anos no mínimo. Não aceitei, evidentemente, mas não adiantou; ela tomou a resolução de ficar de pé e, com aquele banco vazio, vi-me obrigado a sentar antes que um aventureiro lançasse bunda naquele lugar.

Mesmo com essa mudança de posição, o fluxo da conversa prosseguiu; é verdade que a mais tagarela era aquela que se achava acomodada no banco. Referia-se aos seus cachorros, que dormiam na cama entre ela e o marido.

-Meu marido é doido por bicho.

-O meu também – disse a outra – mas ele não admite os cães em cima da cama, reclama dos pelos que eles soltam.

-Que importam os pelos?... Só o carinho que eles nos transmitem compensa tudo.

-Meu marido não pensa assim.

Intuí que ela também não pensava assim, mas, para não ir de encontro ao gosto da sua interlocutora, jogou todo o problema para o marido.

Sem inibição alguma, identificou a parte do seu corpo em que os cachorros dorminhocos mais gostavam de apoiar a cabeça: a bunda.

-Essa bunda-travesseiro deve dar para uns cinco cachorros apoiarem a cabeça. - tive de imaginar, pois, como foi dito, a mulher dos cachorros estava sentada.

-O bassê gosta, o vira-latas, o poodle... eles roçam pelos meus braços e param na minha bunda.

-Porque tem mais carne. - pensaram, talvez, uns dez passageiros em volta, pois ela falava alto, mas sem incomodar nossos tímpanos.

Quantos cachorros moram com ela? - perguntei-me. Não precisou o número, mas os de gato, sim.

-Tenho três gatos.

-Todos convivem bem? - quis saber a senhora de pé.

-Convivem sim, mas se brigarem, eu não bato.  Aliás, eu não consigo mais matar nem barata.

-Nem barata? - abismou-se ela como todos os que a ouviam.

-Eu penso que é uma vida, que eu vou tirar uma vida... Não consigo mais matar uma barata.

Voltou aos seus animais de estimação.

-Eu compro ração para os gatos e para os cachorros...

Um rapaz de uns 30 anos de idade, que se segurava numa daquelas barras altas, entrou na conversa.

-Eles comem a ração normalmente?

-Sim, comem, mas misturo também a ração com um pouco da comida da gente. Às vezes, os cachorros comem a ração dos gatos, até uma certa idade, não há problemas.

-Eu não sabia. - confessou ele.

-São tanto os bichos que passaram pela minha vida que já os conheço bem.

-Eu ainda tenho muito a aprender. - revelou a senhora de pé.

-Depois de tantos cachorros, tantos gatos que tive, eu já os conheço como a palma da minha mão.

Sem tomar fôlego, acrescentou:

-Gosto de todos os animais, até de cobras.

-Cobras? - abismou-se a sua interlocutora de novo.

-Por que não? Deixo que elas passeiem pelo meu corpo como aquela artista, como é o nome dela mesmo?...

Puxou pela memória por poucos segundos:

-Luz Del Fuego, a diferença é que eu não fico nua.

-Não há perigo?

-É claro que não pego cobras peçonhentas, mas não tenho nada contra elas. Deus as fez assim e teve as suas razões, não serei eu que vou criticar.

E passou a descrever o passeio das cobras pelo seu braço, pescoço, os cafunés que faz nelas.

-As cobras veem a senhora e sobem pelo seu corpo? - indagou o rapaz.

-Todas as cobras são cegas – explicou – elas se guiam pela língua.

Notei um esgar no rosto da sua interlocutora, talvez a imaginasse sendo lambida por esses répteis.

-Como a senhora consegue tempo para cuidar de tantos animais em casa? - demonstrou o rapaz curiosidade.

-É difícil, muito difícil, mas consigo, mesmo sendo casada.

-Eu, que sou solteiro, encontro dificuldades para cuidar de um cachorro.

-Mas o solteiro tem uma vida muito boa, sem hora certa para chegar em casa, sem a obrigação de fazer comida; se for o caso, vai a um restaurante ou lanchonete e resolve o problema da fome.

-Tem suas vantagens. - admitiu ele.

Com esse novo rumo da conversação, os animais passaram para o segundo plano.

-Eu trabalho e ainda faço um curso, chego, muitas vezes, às 10h da noite em casa.

E continuou a senhora dos gatos, cachorros e cobras:

-Minha filha chega pelas 9h da noite e meu marido já está em casa há mais tempo, aprontando-se desde  cedo para assistir aos jogos do Flamengo. Cheguei uma vez, no meu horário e eles me perguntaram o que iríamos jantar. “Eu é que quero saber o que vocês fizeram para a janta, ou vocês pensam que eu trabalho, estudo, e ainda vou cozinhar?... Vocês já chegaram há muito tempo. O que fizeram para o jantar?”

Apesar da sua reação bem a propósito, ficamos, pelo menos eu fiquei, com o sentimento de que, no fim, ela acabou indo para o fogão.

O trem já estava a poucos metros da estação de Maria da Graça, quando a sua interlocutora lhe pediu a bolsa, que ela segurara quando se pôs de pé, pois ia saltar. Era a minha estação de destino também. Levantei-me do banco e saí do vagão, animado por ter ouvido, enfim, passageiros conversando no metrô.

 

 

sexta-feira, 27 de março de 2015

2821 - Enfarolado Dicionário Biográfico


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5071                               Data:  24 de março de 2015

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MINIDICIONÁRIO AUTOBIOGRÁFICO

PARTE XXII


ALVORADA – Comumente, dá-se mais valor aos pores do sol. Quantas vezes foram notícia nos jornais os aplausos do uma pequena multidão ao crepúsculo no Arpoador?  Outras praias também já foram aplaudidas.

Não faz muito tempo, uma minissérie televisiva ambientada no Rio Grande do Sul, no tempo da Guerra dos Farrapos, mostrou lindas imagens do sol partindo para a chegada da noite. Uma amiga minha gaúcha me garantiu que é para ser visto ao vivo, que não existe pôr do sol mais bonito do que os da sua terra.

E a alvorada? Nunca li uma só linha no jornal sobre aplausos ao nascer do sol, seja no Arpoador, no Leblon, ou qualquer outro lugar.  Talvez todos estejam ainda dormindo, com a exceção dos trabalhadores e dos alunos do Colégio Militar que estão espremidos em trens, metrôs, ônibus lotados ou mesmo em carros particulares, sem condições de contemplar quaisquer coisas no céu que não sejam as nuvens para saber se vai ou não chover.

O compositor Carlos Gomes deu o devido valor à Alvorada, transformando-a numa peça sinfônica da sua ópera “Lo Schiavo” - “O Escravo”, que seria sua obra-prima caso ele não deturpasse a história, transformando o africano em índio para atender às exigências argentárias do seu editor. Na música popular, Cartola compôs um belo samba, “Alvorada”. O que mais?... Não me recordo. Enfim, a chegada do sol não atrai a mesma atenção do que a sua partida.

As minhas corridas, depois caminhadas, feitas nas horas em que a noite se transforma em dia, tornaram as alvoradas tão corriqueiras para mim que nem me detenho para olhá-las mesmo cansado.

No entanto, há uma alvorada que a minha irmã narrou que nunca esqueci. Nós já tínhamos saído da segunda infância, que se encerra com cinco anos de idade, estávamos com sete, oito anos de idade, quando, não sei por que cargas d' água, acordamos os dois muito cedo. Meu pai colocou a minha irmã sentada no parapeito da janela e ficou ao seu lado, enquanto eu, no chão da casa, nada via do que se passava lá fora. Então, a minha irmã começou a falar do sol que nascia, de como era belo e a minha imaginação se inflamou. Privado de assistir a ele, eu fantasiava que perdia o mais belo de todos os amanheceres. Guardo até hoje essa sensação comigo, mesmo não me recordando de uma só palavra da minha irmã, mas, caso me recordasse, talvez estragasse tudo.


FAROLEIRO – Dia desses, bati as vistas numa notícia de 22 de março de 1995: um cosmonauta russo bateu o recorde de permanência no espaço, ao ficar por lá durante 438 dias. Logo fui conduzido para um conto que li, já adolescente, na casa da minha avó.

Lá, havia uma estante que transbordava de livros. O pai da minha mãe, até a sua morte, em 1946, adquiriu bons livros para abastecê-la e a minha avó, que não tinha gosto tão apurado, guardou nela romances água com açúcar e mesmo novelas da Rádio Nacional que eram impressas e editados em fascículos como “O Direito de Nascer”. Naquela idade, eu não era seletivo: abria as portas envidraçadas de correr da estante e pegava livros que estivessem mais à mão. Com essa falta de critério, tanto dediquei a minha leitura à mencionada novela cujos fascículos foram encadernados em quatro volumes, como contos de Machado de Assis, como “Noite de Almirante”.

Um conto não saiu da minha mente mesmo que nunca mais o tenha visto, embora o buscasse no correr destes anos. Tratava-se de um faroleiro que, sozinho numa ilha, guiava os navios mercantes que se aproximavam. Ele fazia o seu trabalho e, com o passar do tempo, acostumou-se a ficar só, em deixar de ser gregário. Estava, assim, longe dos aborrecimentos provocados pelas pessoas, pouco se importando com as alegrias que também vêm delas. Ele sentiu a volúpia da solidão.

Quis revisitar esse conto, captar ideias que o meu cérebro de adolescente não foi capaz de perceber, mas, como disse antes, nunca mais o encontrei. Com o surgimento da Internet, a mais completa das bibliotecas, porque também recebe muitas bobagens, a minha esperança de encontrar essa obra se intensificou. Teclei “conto O Faroleiro”, e surgiu o nome do escritor (polonês, pelo número de consoantes), Henryk Sienkiewicz. Com mais algumas pesquisas, descobri (*) que ele nasceu em 1951; não, com 12, 13 anos de idade ninguém conseguiria redigir uma história como aquela.

Para se sentir a volúpia da solidão, é preciso viver muito tempo  entre os nossos semelhantes.


PAU DE SEBO – Nunca enfrentei um pau de sebo, mas oportunidade para isso eu tive. A maior delas aconteceu numa festa junina promovida pelo Maurício, o banqueiro de jogo de bicho e corridas de cavalo do bookmaker da Rua São Gabriel. A festividade, que foi de manhã a tarde, ocorreu num terreno que, anos mais tarde seria ocupado pelos supermercados Coma Bem, Casas da Banha e São Jorge de Cascadura.

Lá estavam  a molecada da redondeza, os bicheiros e  demais adultos que nada tinham o que fazer naquela hora e outras também. A grande atração era um pau de sebo em cujo topo o chefão colocou uma nota preta, ou seja, uma cédula de elevado valor.

Pessoas de todas as idades se apresentavam para a subida formando uma fila indiana que nunca acabava, pois quem fracassava na tentativa podia tentar novamente desde que se dirigisse para o final dela. Nem mesmo a boazuda do 108, número do prédio da Rua São Gabriel, amante do chefão, cobiçada por todos discretamente, afastou os nossos olhos para os escaladores do pau de bebo. Mas ele deveria ter sido untado com toda a gordura do açougue do pai do Joaquim, pois ninguém conseguia subir mais do que 2 metros. Os concorrentes, atracados com pés e braços no pau de sebo, subiam um pouco, escorregavam, intentavam de novo, até que as suas forças se esgotavam, e desciam até os pés baterem no chão.

Meu irmão Claudio tentou, subiu, desceu, subiu de novo, e se deu por derrotado.

-Não vai tentar? - cobraram de mim.

Não me atrevi, subir em pau de sebo só em Pasárgada como o poeta.

Meu irmão chegou de noite imundo, em casa, como se tivesse sido pintado para atuar no papel do Grande Otelo com 13 anos de idade em algum filme sobre a vida desse artista. Ficou horas no banho.

Não tive conhecimento de alguém que tenha alcançado o topo do pau de sebo.

(*) Asterisco do Redator:
ERRATA:

O conto "O Faroleiro", citado na edição nº 2821, foi escrito, de fato,por Henryk Sienkiewcz, autor polonês que viveu de 1846 a 1916. Ele não nasceu em 1951 como consta na mencionada edição."

Abraços e Obrigado.
Biscoito

quarta-feira, 25 de março de 2015

2819 - Barateante Dicionário Biográfico


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5069                                Data:  21 de março de 2015

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MINIDICIONÁRIO AUTOBIOGRÁFICO

PARTE XXI

 

BARATA – No casarão da minha avó, construído no início do século XX, eu me deparei com baratas cascudas. Eu sofria com elas o terror que, poucos anos depois, me causariam os vampiros das telas de cinema. Na casa da sua irmã, de onde, reza a lenda dentro da família, o Ary Barroso transmitiu uma partida de futebol, porque a direção do Vasco proibiu a sua entrada no estádio de São Januário, também havia cascudonas. O meu pai, sobrinho dela, contava que, na festa do casamento dessa minha tia-avó, uma barata posou na parte de cima do seu vestido. Quando descobriram que não se tratava de um broche, foi um Deus nos acuda; tropeçaram no tripé para câmara fotográfica do Ibrahim Sued, na época, um simples fotógrafo.

-Nascimento, uma velha cega quase quebrou a minha câmara. - queixou-se ao meu avô, colega dele de jornal.

Como fui carregado pela minha mãe à casa dessa tia-avó poucas vezes e, principalmente, nunca dormi lá, não houve problemas para mim, mas no casarão da vovó... Eu tinha de dormir lá. Ela enviuvou muito cedo, nem conheci meu avô, que faleceu em 1946; por isso, para que não ficasse sozinha, a minha  mãe escalava ora a mim, ora a minha irmã, para lhe fazer companhia quando estávamos em férias escolares.

Havia lá duas salas: uma, na altura da metade da casa, a de jantar, e a outra, com janelas que se abriam para a Rua General Padilha, era a de lazer, onde ficavam a televisão, poltronas e sofás. Entre as duas salas estavam os quartos. Um corredor estreito, onde se achava uma estante repleta de livros, ia de uma sala a outra; em seguida, vinha a cozinha e, depois, o banheiro que era pequeno, cabia nele apenas a privada e a pia para lavar o rosto. A casinha, de tamanho dos apartamentos de hoje, se localizava no meio do quintal, perto da jaqueira e era lá que se tomava banho.

No corredor e na cozinha, à noite, as baratas cascudas faziam a festa, Atravessá-los, nas horas noturnas, requeria de nós, crianças indefesas, uma coragem dos soldados que desembarcaram na Normandia em 6 de junho de 1944. O que fazer se sentíssemos uma necessidade fisiológica no meio da noite?... Previdente, a minha avó deixava penicos para ela e os convidados. Sempre considerei aqueles vasos de louça, ferro ou do material que fosse, nojentos, mas preferia tapar o nariz do que sentir o meu corpo transformado em aeroporto de cascudonas.

Nas casas em que residi, eu me deparei com duas ou três baratas dessa espécie, se tanto; havia, isso sim, as de cor de verniz, que pareciam subdesenvolvidas comparadas em robustez com aquelas. Apareceu, é verdade, na nossa casa na Rua Chaves Pinheiro, uma barata branca que a minha irmã, sempre romântica, disse que estava vestida para se casar.

O pavoroso era que, entre as baratas envernizadas, surgiam algumas periplanetas americanas, as voadoras.

Voltando à Rua Chaves Pinheiro. Certa tarde, acomodado numa poltrona, eu conversava animadamente com um colega de trabalho, quando a minha atenção convergiu para algo que entrou voando pela janela. É um pássaro? É um avião? É o Super-Homem?  Não. É uma barata. O telefone caiu das minhas mãos, corri em busca de abrigo, enquanto o meu interlocutor não tinha a mínima ideia do que acontecia comigo.

A chegada intempestiva dessas voadoras provocava um rebuliço dos diabos, pois elas se desfaziam da virilidade de todos os homens lá de casa, inclusive a do meu pai. Ele, ao tentar matar uma delas, que pousara na parte alta da janela da sala, na Rua Chaves Pinheiro, usou uma força desproporcional, provocada pelo medo e estilhaçou o vidro sem matar a dita cuja. A minha mãe, que sofria e ainda sofre de fobia de lagartixa, era a única, entre nós, a enfrentar as periplanetas americanas até matá-las. Houve, então, uma espécie de pacto entre os meus pais: ele matava as lagartixas e ela, as voadoras; o meu pai ainda contemporizava com argumentos que as lagartixas são úteis aos humanos, que comem os mosquitos, mas não adiantava. O jeito era afastar, com a vassoura, as lagartixas para o lugar mais distante possível e dizer para ela, depois, que foram exterminadas.

Não sou casado, mas já dormi no sofá da sala algumas vezes. Isso acontece quando entra uma barata voando pela janela do meu quarto.

 

PÁSSAROS – Não sou como aquele personagem de “Os Pássaros”, de Alfred Hitchcock, que confundiu melro com corvo. No entanto, não entendo muito de pássaros, embora sempre houvesse gaiolas penduradas nas cozinhas ou nas varandas das casas em que morei.

Os mais remotos, aqueles que se fixaram na minha retentiva, foram um sabiá e uma jandaia. O meu avô se mudou do Cachambi para o Jardim Botânico e deixou as aves silvestres para o filho, no apartamento 103, que ocupamos saindo do 201.

Embora eu não saiba diferenciar o canto do sabiá de algumas aves canoras, digo que ela tem a mais bela voz entre os pássaros. A explicação para essa incongruência eu creio que está no fato de o canto daquele sabiá ter se entranhado tanto nos meus ouvidos infantis, que eu disse que não havia nada mais bonito e fui pelos anos afora repetindo isso mesmo não o ouvindo mais. Sim, embora a minha vida fosse povoada de gaiolas, não apareceu mais uma só sabiá; eram só canários, curiós e coleiros. Da jandaia, só me recordo dos sons estridentes que emitia.

Mortas essas aves que meu pai herdou, ele as substituiu por coleiros, e os batizava com nomes dignos de um livro de autoestima para aves canoras: “Possante”, “Caruso”, Gigli”, “Schippa”.

A preferência da minha mãe recaía sobre os canários. Quando já morávamos na Rua São Gabriel, ela teve um canário belga que tinha o design (se assim podemos dizer) do avião Concorde; e ela, naturalmente, lhe deu esse nome.

O meu irmão Claudio preferia os curiós, e na sua casa, já casado, batizou uma fêmea de Tia Hilda – xará de uma das tias das crônicas do Mauro Rasi; e um macho, de Boticão de Ouro, homenagem a um craque do hipódromo da Gávea que foi sacrificado porque fraturou uma pata em uma corrida domingueira.

Tivemos três gatos, inúmeros cachorros, muitos passarinhos, e, hoje, onde moro, só resta um bicho: uma canária, já idosa, que a minha mãe chama de Maria Chiquinha.

 

2820 - pras calendas


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5070                            Data:  22 de março de 2015

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O RÁDIO MEMÓRIA NO DIA MUNDIAL DAS ÁGUAS

 

Os ouvintes do Rádio Memória devem ter levado um susto, quando, depois de abrir os trabalhos com Sérgio Fortes, Jonas Vieira anunciou a gravação de “Mês de Maria”, do Ary Barroso, com o cantor Jorge Goulart. E o calendário? - devem ter perguntado. Tratava-se apenas de um toque hitchcockiano do titular do programa, pois, após o último agudo do cantor, ele perguntou ao Sérgio o que aconteceu no dia 22 de março.

-Em 1848, ocorre a revolução popular – Os Cinco Dias de Milão – quando os austríacos foram expulsos de Milão, que se torna a capital do Governo Provisório da Lombardia.

-Puxa!

-Jonas, os italianos cantavam o “Va Pensiero”, da ópera Nabucodonosor, e Verdi se torna um acrônimo subversivo: V.E.R.D.I. - Victorio Emmanuele Re D' Italia.

-Em 1888, a Football League é formada. Foi um marco, Jonas.

-Em 1895, a primeira exibição de filmes por Auguste e Louis Lumière.

Simon Khoury estava na plateia.

-Em 1903, os Estados Unidos instalam uma base militar em Guantánamo, Cuba.

-E não saíram mais de lá. - comentou o Jonas com uma risada.

-Estão lá há mais de cem anos...

-Cento e caquerada, Sérgio.

Só o Rambo para tirá-los de lá, mas o Rambo é americano...

-Em 1933, o presidente Franklin Delano Roosevelt assina a lei que legaliza o consumo de bebidas alcoólicas acabando com a Lei Seca.

Os mafiosos sentiram o baque, mas não por muito tempo, pois os seus negócios foram diversificados ainda mais, inclusive com a introdução de novas drogas, como a cocaína, o ouro negro recentemente no Brasil, etc.

-Em 1935, o primeiro programa regular de televisão no mundo é transmitido através de uma antena no alto da Torre de Rádio de Berlim. Jonas, o primeiro programa sistemático, regular aconteceu na Alemanha e eu pensava que fosse nos Estados Unidos.

-Em 1939: Segunda Guerra Mundial: a Alemanha toma Klaipeda da Lituânia. Veja: com quatro anos de intervalo os alemães vão de um grande feito da inteligência humana para a barbárie.

-É verdade, Sérgio.

-Em 1941, a Represa Grand Coulee, em Washington, começa a gerar eletricidade.

-E a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, Sérgio?

-Até agora, só gerou propina.

E o Homem-Calendário, após o comentário acima prosseguiu:

-Em 1960, Arthur Schawlow e Charles Hard Townes recebem a primeira patente para um laser. Que grande invenção!

-Sérgio, o raio laser, a videoconferência, tudo isso já existia nos gibis de ficção científica de décadas atrás.

E a minha professora primária aconselhando os seus alunos a não lerem histórias em quadrinho...

-Em 1963, Please Please Me, o primeiro álbum dos Beatles, é lançado no Reino Unido.

-Puxa!...

-O Peter tem esse álbum autografado pelos Beatles. - acrescentou o Sérgio.

-Em 1995, o cosmonauta Valeri Polyakov retorna à Terra depois de estabelecer o recorde de 438 dias no espaço. Jonas, você teria coragem de ficar todo esse tempo no espaço sozinho?

-Nem se eu tivesse o direito de carregar todos os discos do Orlando Silva comigo.

-Eu me recordo de uma crônica do Nélson Rodrigues em que ele escreveu que encarar o espaço sideral cara a cara era de enlouquecer, de a pessoa rasgar dinheiro na esquina. Eu sou um Jonas, que voltaria de uma viagem dessas rasgando dinheiro na esquina, menos o dólar que valorizou muito.

Em seguida, o Homem-Calendário impostou a voz:

-Nascimentos. Em 1599, Anthony van Dyck, pintor flamengo. Grande pintor, mas eu pensava que ele fosse vascaíno.

-Em 1867, Guimarães Passos.

-Foi contemporâneo do Olavo Bilac?

-Sim. Jonas, e nós tivemos de aprender versos deles no Santo Inácio.

-Em 1884, nascia Glauco Velásquez compositor brasileiro. Algumas peças dele ainda são tocadas até hoje.

-Em 1887, nascia Leonard Marx. Sabe quem era? Dos Irmãos Marx era o Chico, o mais velho. Tocava piano. Fantástico. Todos eles tinham formação musical.

-Eram geniais. - afirmou o Jonas com a concordância de todos.

-Em 1923, Marcel Marceau, ator e mímico francês.

-O maior mímico do mundo, Sérgio?

-Ele dizia que o maior mímico do mundo era o Charles Chaplin.

Tinha toda razão.

-Em 1930, nascia Stephen Sondheim, compositor americano. Gênio, Jonas: não só compunha como escrevia letras.

Escreveu as letras do West Side Story, a música, não, pois ali estava nada mais nada menos do que Leonard Bernstein.

-Em 1933, nasce Michel Hidalgo, ex-futebolista e treinador de futebol francês.

-Ele não era o técnico da França na decisão da Copa do Mundo de 1998?

-Aquele jogo em que o Ronaldo teve um siricotico não explicado até hoje? Não; Michel Hidalgo treinou os “Blues” na década de 80 e por pouco tempo.

-Em 1945, Jorge Ben-Jor, músico e compositor brasileiro. É um nome respeitado na música popular brasileira.

-Sem dúvida; há muitas influências nas composições dele, antigas e modernas.

Ele sofreu até influências árabes e africanas trazidas pela sua mãe, que nasceu na Etiópia.

-Em 1848, Andrew Lloyd Webber, compositor britânico. Cobrérrimo.

-Agora, Jonas, os falecimentos. Em 752, o Papa Zacarias.

-Papa Zacarias?... E os papas Mussum, Dedé e Didi?

-Naquela época, Jonas, era uma atrapalhada atrás da outra no papado. - aproveitou a piada.

-Em 1687, Jean-Baptiste Lully, compositor francês, mas nasceu em Florença. Foi um dos grandes nomes da música da França.

-Foi aquele que morreu por causa de uma gangrena no pé?

-Ele estava conduzindo um Te Deum em louvor do Rei Luís XIV, com um bastão, quando acertou o próprio pé; a ferida gangrenou, ele não quis amputar a perna e morreu com a infecção. Surgiu, então, a batuta, o bastão saiu de cena.

-Puxa!...

-Em 1832, morria o escritor, filósofo alemão Johann Wolgang von Goethe.  Gênio absoluto.

-Em 1955, Guido Caloi, industrial brasileiro. Ele nasceu em Verona em 1896, veio para este país e fez a primeira bicicleta no Brasil.

-Em 1974, Peter Revson, piloto de Fórmula 1 que, ao morrer, criou a maior confusão pois era o último herdeiro da “Revlon Cosméticos”. Ele tinha bilhões de dólares, mas se meteu a correr a 300 km por hora e encontrou um muro pela frente.

-Em 1980. Hélio Oiticica, pintor, escultor e artista plástico brasileiro. Vamos aproveitar que ninguém nos escuta, Jonas... Ele deve ter sido um gênio, mas eu não consigo entender nada. Aquelas instalações, aquelas coisas... se eu levar para casa, apanho. Mas deve ser bom, a culpa é minha.

-Em 1984, Laura Alvim.  Foi uma moça que tinha pretensões de ser artista, de ser isso e aquilo; não realizou nada, mas deixou uma casa que virou centro cultural importantíssimo na Vieira Souto.

-Em 1994, Walter Lantz, cartunista americano. Ele é simplesmente o criador do Pica-Pau, o desenho preferido do Peter.

-Em 1998, Brandão Filho, ator brasileiro. Filho de Brandão, o Popularíssimo, também modestíssimo.

-Ele era excelente, Sérgio.

-Moacyr Augusto Soares Brandão; ele fazia o programa da Rádio Nacional “Tancredo e Trancado”, com o Apolo Correia, patrocinado pelas “Pílulas de Vida do Doutor Ross”.

E voltou-o o Sérgio Fortes para o operador de áudio.

-Peter, você tomou muitas “Pílulas de Vida do Doutor Ross”?

-Em 2001, William Hanna, animador americano.Em dupla com Joseph Barbera  criaram Tom e  Jerry, Os Flinstones, Zé Colmeia e outros.

-Em 2003, o escritor Geraldo França de Lima. Escreveu o romance “Jazigo dos Vivos” entre outros.

-Em 2011, Artur Agostinho, jornalista, radialista, escritor e ator português. Jonas, você sabe quem é?

-Não.

-É aquele locutor de futebol que o José Vasconcelos imitava.

-Ah, sim.

Locutor do jogo Áustria 9 x Portugal 0, em que o “goleiro português jogava de costas”: era o Costa Pereira – dizia o José Vasconcelos.

Já no encerramento do calendário, foi lembrado pelos dois apresentadores do Rádio Memória o centenário do nascimento do Haroldo Barbosa que ocorrera um dia antes, 21 de março. Como ele mostrou um extraordinário talento em diversas áreas, os muitos elogios ainda foram poucos, inclusive os escritos numa inspirada crônica de João Máximo a que o Sérgio Fortes aludiu.

Bem, senhores leitores, o Homem-Calendário esqueceu de dizer que o dia 22 de março era o Dia Mundial da Água. E parece que São Pedro não gostou, pois, de noite, mandou uma chuva bíblica, que até interrompeu, por 40 minutos, o jogo Vasco x Flamengo no Maracanã.

terça-feira, 24 de março de 2015

2818 - Assustadíssimo Dicionário Biográfico


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5068                                Data:  20 de março de 2015

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MINIDICIONÁRIO AUTOBIOGRÁFICO

PARTE XX

 

CAÇA-GAZETEIROS- Meu pai comprava muitos gibis com personagens da Disney, mas eu e meus irmãos nos identificávamos mesmos era com as revistas do Bolinha e da Luluzinha; no entanto, eu nunca imaginaria que, no ginásio, me depararia com um caça-gazeteiro parecido com o Seu Miguel da revista, até o nome era o mesmo.

1963 foi o ano em que o Visconde de Cairu mais se aproximou da disciplina militar que a direção do colégio buscava há três anos (provavelmente há mais tempo, pois eu entrara lá em 1961). Seu Miguel, o novo inspetor, contribuiu muito para isso. No meu primeiro ano lá, quem inspecionava os alunos era o Seu Oscar. Ele, sempre com um charuto fedegoso na boca, tinha mania de monitores; escalava um monitor por cada turma e que responderia por ela. Não era uma delegação de poder e sim uma maneira esperta de diminuir o seu trabalho. Lembrou-me uma professora do curso primário ordenando que a turma de 40 alunos juntasse as carteiras, como se mesas fossem de restaurantes, em grupo de 5. Cada quinteto ficava sob a responsabilidade de um aluno designado por ela. Assim, eu fiquei com o dever de controlar o Joaquim, filho do açougueiro da Rua Honório, que já mostrava, desde garoto, que não seguiria o bom caminho.

Pelo menos, com Seu Oscar, nunca fui monitor. No segundo ano ginasial, ele continuou, mas, em 1963, entrou no seu lugar o Seu Miguel, bem mais novo e com muita disposição para executar a sua função. Ele era o nosso Inspetor Javert.

O que fazíamos nos anos anteriores ir para o pátio e por lá ficar proseando por um bom tempo, enquanto não se encerrava uma aula aborrecida, acabou. Retardar a entrada na escola porque a traquinagem estava muito boa, nem pensar. Em 1963, a sirene tocava antes da 7h da manhã e tínhamos de entrar, colocando nossas cadernetas numa cesta de tamanho industrial, sob a vigilância implacável do Seu Miguel e elas só seriam devolvidas com o carimbo de “compareceu”, ao meio-dia em ponto. Não havia um só buraco nas cinco aulas diárias.

Eu fumava, com 15 anos de idade já era viciado e a hora do recreio era o momento em que eu me enfiava no banheiro, onde havia fileiras de privadas, com as suas respectivas portas, para satisfazer o meu vício. O fedor da nicotina neutralizava o cheiro da merda. Mas como fumar se o Inspetor Miguel era onipresente? Meus maços de Continental levavam mais tempo para terminar, houve isso de bom.

Estudando de manhã, eu costumava acordar cedo. O meu pai fazia o café e eu já estava de pé rumo ao chuveiro. Eu lhe fazia companhia no café com leite, que ele gostava pelando. Para esfriar a minha bebida, eu buscava um sopro comparável a do Lobão, quando tentava derrubar a casa dos Três Porquinhos; ainda assim, a pele do meu céu da boca descascou umas três vezes.

Um dia madruguei. Eu estava no topo da Rua Felipe Camarão, onde havia uma das entradas do colégio, quando a escuridão da noite ainda se fazia presente. Encostei-me numa árvore e vi chegando o Inspetor Miguel. Ele não me distinguiu nas sombras; para ele, ali estava um vulto, talvez de um marginal, pois quebrou o ritmo das suas passadas e passou a caminhar vagarosamente, com toda cautela.

Eu meti medo no Inspetor Miguel e tinha de contar o meu feito para todo o mundo.

 

RATOS – Bastava ver ratos, desde criança, para ficar assustado. Diziam-me que, encurralado, ele atacava com fúria. Embora eu não tivesse coragem para perseguir um rato até deixá-lo sem saída, eu ficava ainda mais temeroso com essa reação.

Estivemos fora da nossa casa da Rua Cachambi, em 1957, por um mês, talvez um pouco mais, talvez um pouco menos, devido a um mal sucedido parto da minha mãe daquele que seria o seu quinto filho quando ela quase partiu com ele. Nesse período, ficamos todos na casa da minha avó e, depois, houve uma divisão: Claudio e Lopo foram para a moradia de um tio, na Urca, eu e minha irmã continuamos onde estávamos.

Meu pai ia, esporadicamente, ao nosso lar para averiguar como andavam as coisas. Nessas idas, ele se assombrava com o número de ratos, até mesmo ratazanas, mortos no quintal. Os nossos vizinhos espanhóis do 203 alimentavam diariamente o Big e o Veludo, também o Chiminho, o nosso gato, e a rataria faminta se achegava aos pratos com restos de comida.

Encerrado o tratamento da flebite da minha mãe com lâmpadas de luz infravermelha, retornamos à nossa casa. Era noite e me recordo de ter vislumbrado a vizinha do 101,  espionando a nossa chegada pelas frestas da janela. Na manhã do dia seguinte, meu pai, com uma pá de pedreiro, recolhia os ratos mortos no quintal e os varejava, com muita força, sobre o muro, para o terreno baldio.

Dentro de casa, notávamos ruídos estranhos, eram camundongos; eles se esticaram ao máximo, numa flexibilidade impressionante e conseguiram passar por baixo das portas. A grande maioria deles se achava na cozinha, e meu pai preparou, então, uma festa. Ele me colocou com meus dois irmãos sobre uma mesa, chamou o Big, que prontamente se apresentou, e trouxe também o Chiminho. 

Com todas as saídas da cozinha vedadas, meu pai passou uma vareta comprida entre os móveis e a parede, e os camundongos caíam no chão, guinchando e correndo sem rumo. Big e Chiminho tratavam de agir. Nosso cachorro impressionava pela agilidade, matava ratos numa proporção de 3 por 1 para o Chiminho. O Big nos impressionava pela precisão, por acabar com aqueles animais com uma só dentada, como se acertasse sempre no ponto vital. Meu pai alardeava que, mesmo as ratazanas mortas pelo Big no quintal, não sangraram, que não havia uma só estraçalhada. Matar ratos era um esporte para o Big e nós tivemos a felicidade de vê-lo em ação. Foi um espetáculo.

Com o número crescente de cachorros e gatos em casa e a nossa presença, os ratos ficaram longe de nós. Vi, anos depois, muitos ratos, nas minhas corridas, depois caminhadas, feitas antes de o sol vir do oriente. Corriam para os bueiros ou saíam deles, alguns pareciam as ratazanas das crônicas do Nélson Rodrigues: “gordas e prenhes caçadas a pauladas”.

 

 

segunda-feira, 23 de março de 2015

2817 - o monarca do samba


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5067                                   Data:  17 de março de 2015

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A DUPLA DINÂMICA DE VOLTA

PARTE II

 

Encerrado o calendário do dia 15 de março, Jonas Vieira anunciou uma homenagem à Portela e ao Monarco, seu amigo querido, “um dos cobrões da Velha Guarda”. Os dois apresentadores, antes da primeira gravação, revelaram que a Portela era a sua paixão e que, no desfile deste ano, a águia só faltou falar, porque voar ela voou. Concordaram que foi injustiçada pelos jurados e fizeram menção a um ressentimento por ela ter ganhado tantos títulos, embora o Jonas Vieira reconhecesse que o presidente da escola, Natal, em anos pretéritos, “pegou pesado”.

Foi anunciado o samba “Quantas Lágrimas”, de Manacéa da Velha Guarda da Portela, que logo passamos a ouvir.

Monarco chegou com uma gravação de atraso, sendo louvado pelo seu bom estado físico, embora octogenário. Sérgio Fortes se apresentou a ele (já não se conheciam?) como “Sérgio Fortes, defensor dos fortes e dos opressores”.

-Melhor do que defensor dos frascos e dos comprimidos. - deveria ter pensado o Dieckmann, no seu Jaguar, rumo ao Posto 5 de Copacabana com a Branca.

Renovados os louvores ao desfile da Portela com a presença do ilustre convidado, Jonas Vieira anunciou a segunda gravação: “Poeta Apaixonado”, de Monarco e Mário Lago.

Da música para a conversação.

-Monarco, há quanto tempo você está na Portela?

Ele respondeu que desde 1947, quando veio de Nova Iguaçu com 13 para 14 anos ressaltando que, na época, a escola foi campeã por sete vezes consecutivas.

-Trabalhei na ABI, o doutor Moses (Herbert Moses) me mandou embora; depois me arrumou um emprego com o Vicente Lima no “Lux Jornal” (ele era fundador e irmão de Alberto Lima, diretor por mais de 30 anos desse jornal).

-Aquele que trazia recortes de jornais? - quis saber o Sérgio Fortes.

Depois de confirmar, Monarco voltou ao seu tempo de ABI, e falou do jornalista Paulo Magalhães que o chamava de Ademar de Barros por causa da sonoridade com o seu nome verdadeiro: Ildemar.

-O doutor Moses dizia: “Esse menino me deixou de cabelos brancos.”

Narrou, em seguida, da colaboração que deu às cãs do presidente da ABI.

-Eu peguei uma toalha e uma vassoura, e o Tupi, uma lata. Tupi era um escurinho, Tupinambá, trabalhava como engraxate. Havia uma barbearia, na ABI que está lá até hoje, e uma cadeira de engraxate. Tupi engraxou muitas vezes as botas do Villa Lobos. Não tinha ninguém, as salas de estar só abriam às 2 horas, e nós fizemos a nossa farra. Abriu a porta do elevador silenciosamente, ela só fazia barulho quando fechava, e apareceu o doutor Moses com o presidente dos Estados Unidos, o Truman; ele mostrava as dependências da ABI.

-Rapaz! - espantaram-se o Jonas Vieira e o Sérgio Fortes.

Enquanto o Monarco evoluía de toalha e vassoura, seu amigo de estripulias gaguejava:

-O doutor Moses... Eu olhei, e ele estava com uma cara amarrada.- alongou bem as vogais de “amarrada” para nos dar uma ideia da indignação do seu chefe.

- Quinze dias depois, fui chamado e me mandaram embora. O Paulo Guimarães preocupado comigo: “O que a gente faz com o Ademar de Barros?...”

Deram um jeito, e o Ademar de Barros, no caso, o Monarco, foi levado para o “Lux Jornal”, periódico que se destacava pelos “clippings”, como se diz no jornalismo americano.

Empolgado, Jonas Vieira interveio.

-Essa história me lembra de uma que o César de Alencar me contou. Ele começou na Rádio Nacional num programa noturno. Como fazia muito calor, e não havia ninguém, ele ficou pelado. Quem aparece?... Renato Murce, o diretor, com uma trupe. No dia seguinte, quando reclamaram dele, o César disse: “não me avisaram antes; até que eu estava meio vestido”.

Depois desses causos, chegou a vez da música, e ouvimos “Levanta Cedo”, de mestre Rufino com Monarco e a Velha Guarda da Portela.

-Trabalho extraordinário do Paulinho da Viola. - salientou o Jonas Vieira.

Faltava uma história do Sérgio Fortes e ele não nos decepcionou. Aludiu à época em que as partidas do campeonato carioca eram disputadas nos estádios dos clubes participantes, em 1964, precisamente.

-O Fluminense jogava contra o Madureira, na Rua Álvares Chaves, fez 1 a 0, mas o Madureira empatou. Havia uma dupla de área que infernizou a defesa do Fluminense, Batata e Peixe Galo; nunca vou me esquecer desses dois. Quem estava na tribuna de honra?... Natal.

-Natal era Fluminense. - acrescentou o Monarco.

-Ele, na tribuna de honra, de pé, parecia um lord inglês. Era uma figura impressionante.

Entrou mais uma gravação, “Tristonha Saudade”, de Monarco, cantando em duo com a botafoguense Beth Carvalho.

Depois da crônica do Fernando Milfont, na locução do José Maurício, Jonas Vieira disse para o Monarco que o conhecia desde os velhos carnavais.

-Eu tenho um jornal lá em casa, guardado, “A Notícia”, em que você escreveu “Monarco, a cadência bonita do samba”.

-Exatamente.

-Havia “O Dia” e “A Notícia”. - rememorou o sambista.

-Eu não sabia quem era, mas havia um crítico importante de música clássica em “A Notícia”. - interveio o Sérgio Fortes. Era um belo jornal.

-Eu trabalhei em muitos jornais, um deles foi “A Notícia”, e lá, eu fiz muita matéria com o pessoal da música.

-Sei... sei... sei... - intervinha o Sérgio Fortes na fala do seu parceiro.

-O primeiro trabalho do João Nogueira fui eu que promovi. Outro trabalho que fiz, o da Elza Soares com o Garrincha, quando ela morava num casarão na Lagoa; entre outras figuras.

Foi interrompido pelo Sérgio:

-Jonas, “A Notícia” tinha capa colorida?

-Não me lembro mais.

-Tinha um jornal colorido...

-A “Última Hora”. - afirmou o Monarco.

-Tinha um jornal que era verde e claro... - insistiu o Sérgio Fortes em explorar a experiência jornalística daqueles dois veteranos.

-O verde e claro não era “A Notícia”. - disse o Jonas.

-”A Notícia” era normal e vespertino. - acrescentou o Monarco.

-”O Dia” de manhã, e “A Notícia”, a tarde; ambos do Chagas Freitas. Ele comprou os dois jornais: “O Dia” para explorar a criminalidade.

E prosseguiu o titular do Rádio Memória:

 -O crime, naquela época... eram mais de quinze jornais e os principais , o Globo, o Diário de Notícias, o Correio da Manhã não davam uma nota de criminalidade na primeira página; hoje, o Globo estampa o que há de pior da criminalidade. Naquela época, o Dia era considerado o jornal de sangue.

Sérgio Fortes interrompeu a digressão do Jonas Vieira para citar a “Luta Democrática” do Tenório Cavalcante.

-O pessoal dizia: se espremer sai sangue.

Monarco fez a intervenção acima e continuou com as reminiscências.

-Havia um jornalzinho que eu gostava “A Gazeta de Notícias”, ficava na Rua Teófilo Otoni. Eu levava correspondência para lá quando trabalhava na ABI, depois das 2 horas da tarde. Na portaria, eles me davam a Gazeta de Notícias.

E seguiu adiante:

- Tinha ”O Jornal”, tinha “A Democracia” na Rua do Lavradio. Tudo acabou. Tinha um jornal comunista que ficava na Rua Silva Jardim. Eu cheguei lá, uma vez, e o pau estava comendo; a polícia estava lá.

Aludiu à frase do Barão de Itararé “Entre sem bater” colocada na portaria do “Diário do Povo” quando ele foi sequestrado e agredido por oficiais da Marinha por causa da publicação, em fascículos, da história do marinheiro João Cândido. Monarco citou o jornalista Pedro Motta Lima, que trabalhou com o Barão de Itararé, houve apartes e uma pequena confusão se formou:

-Eu estou falando da Tribuna da Imprensa. - disse o Jonas.

-Eu me refiro à Tribuna Popular do Pedro Motta Lima. - esclareceu o compositor.

-A Tribuna da Imprensa era do Carlos Lacerda.

-O Dia não foi do Ademar de Barros? - indagou o Sérgio.

-O Dia e a Notícia eram dele, o Chagas Freitas comprou os dois jornais. - disse o Jonas Vieira.

-O controle mudou e ficou proibido para menores de 18 anos. - não perdeu a piada o Sérgio Fortes.

Os três relacionaram os nomes de todos os jornais que lhes vinham à mente, até o Jonas Vieira concluir:

-O mercado de trabalho era imenso.

Um adendo do Biscoito Molhado: o mercado de trabalho era imenso, mas a vida do jornalista era dura. O meu pai trabalhou no Informador, na Vanguarda, no Diário de Notícias, entre outras publicações, e eu me lembro dos constantes atrasos de salário, de pagamentos através de vales e até de recebimento de aparelhos elétricos em vez de dinheiro. Mas o Jonas Vieira aludiu aos seus colegas que tinham de trabalhar num jornal de dia e em outro de noite (Será que ele conheceu o meu pai?)

Monarco se manifestou porque lhe saiu da memória mais um jornal:

-Diário Carioca do Danton Jobim.

-O Stanislaw Ponte Preta começou lá. - informou o Jonas.

Sérgio Fortes citou o Jornal dos Sports, a sua cor de rosa e seu proprietário, Mário Filho, irmão do Nélson Rodrigues.

Jonas Vieira contou mais um causo, agora relacionado a um jornalista que trabalhava, ao mesmo tempo, num jornal e na revista “O Cruzeiro”. O meu pai, aliás, falava de um colega seu que trabalhava tanto que diziam que, ao pegar o bonde para casa, ele fazia o trabalho do trocador.

-Essas coisas dos jornais são extraordinárias. - afirmou, saudoso, o Jonas Vieira com a concordância de todos.

Após a lembrança de ter trabalhado com o Sérgio Cabral no Diário da Noite, voltou para a música e anunciou a Velha Guarda da Portela cantando, de Heitor dos Prazeres e João da Gente, “A Tristeza me persegue”.

Monarco fez referência à voz de João da Gente, que ele prescindia de microfone para cantar, e da grande admiração do Carlola, que compareceu ao seu enterro, pelo cantor.

Seguiram-se “Estação Primaveril”, de Monarco e Quininho, com a participação da Marisa Monte; “Passado de Glória”, samba do Monarco sobre a Portela, na voz de Jair do Cavaquinho.

O Rádio Memória se encerrou musicalmente com o primeiro samba composto por Monarco “Crioulinho Sabu” , que o deixa orgulhoso do filho, que elaborou o arranjo com vozes infantis.

Um demorado abraço.