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terça-feira, 30 de junho de 2015

2884 - flagrantes da vida real


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5134                         Data:  30 de junho de 2015

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CALENDÁRIO DE 30 DE JUNHO

 

-Falecimentos. Uma perda para você discorrer, Jonas. Sei que isso o abalou muito. Em 572, morreu Alboíno, o rei dos Lombardos.

-Até hoje não consigo dormir. - confirmou o Jonas Vieira a sua profunda depressão e acrescentou mortificado:

-A humanidade chora copiosamente a morte do Alboíno.

Verdi compôs a ópera “Os Lombardos”, mas se esqueceu do Alboíno. Falha grave do gênio da ópera.

-Em 1360, Maomé VI torna-se o décimo rei nasrida de Granda após assassinar o seu cunhado o Ismail II. Jonas, eles se matavam lá na Espanha. Se Shakespeare fosse muçulmano, provavelmente escreveria uma peça sobre esse caso.

-Sérgio, já dizia o Brizola: cunhado não é parente...

-Maomé VI para presidente. - completou o Homem-Calendário.

-Em 1491, nasce Henrique VIII, fundador da Igreja Anglicana.

 -Jonas, você sabe quem foi Rubens?

-Claro, excepcional jogador do Flamengo; formou o inesquecível ataque Joel, Rubens, Índio, Evaristo e Esquerdinha.

-Não, Jonas, eu falo do Rubens que nasceu em 1577, o grande pintor barroco flamengo.

-Eu sabia que tinha alguma coisa a ver com o Flamengo, Sérgio.

-Em 1635, Guadalupe se torna colônia da França. Aqui, tornou-se bairro da zona norte.

-Em 1762, um golpe de estado depõe o Czar Pedro III e a sua esposa, a Grã-Duquesa Catarina sobe ao trono como Catarina II da Rússia. Ela ficou conhecida como Catarina, a Grande porque, durante o seu reinado, a Rússia se revitalizou extraordinariamente.

-Puxa!

-Uma pegadinha para as provas de História Geral, Jonas: Catarina II da Rússia era alemã.

-Em 1712, nasce Jean-Jacques Rousseau. Ele não foi só um grande filósofo, compôs a ópera “Le Devin du Village”, “O Adivinho  da Aldeia”. Ele não só escreveu o libreto, como compôs a música.

-A ópera é boa, Sérgio?

-Creio que nem o Mário Barreto, que era a enciclopédia operística do meu programa “Clube da Ópera”, escutou.

-Como filósofo, Jean-Jacques Rousseau enaltecia o “bom selvagem”, pregava a volta do homem à natureza.

-Sim, Jonas. Ao ler o seu livro, Voltaire teria comentado: “Muito bom, mas eu já estou velho demais para andar de quatro.”

-30 de junho de 1807, segunda invasão no Rio de la Plata; John Whitelocke chega em Ensenada na tentativa de recapturar Buenos Aires e é derrotado pela resistência local. Jonas, o nome do clube argentino é River Plate. Você que é professor de inglês, está certo traduzir Rio de la Plata como River Plate?

-Errado; o certo seria Silver River.

-Pois é, Jonas, são controvérsias fomentadas pelos torcedores do Boca Juniors. Os torcedores do River lembram que a batalha naval travada lá, em 1939, entre as marinhas britânica e alemã ficou conhecida na Inglaterra como “The Battle of The River Plate”.

-Se é assim, Sérgio...

-Os historiadores dizem que um dos fundadores do clube, em 1901, propôs esse nome, que foi logo aceito, porque se sentiu atraído pelas enormes caixas que chegavam da Escócia ao porto de Buenos Aires com a inscrição “River Plate”. Jonas, só podia ser uísque.

-Então é River Plate mesmo e não se discute mais o assunto.

-Em 1848, morre Jean-Baptiste Debret, pintor francês. O que existe de documento, sobre como se vivia no Brasil no início do século XIX foi graças a Debret.

-Isso no Rio de Janeiro. - assinalou o Jonas Vieira.

Debret veio para o Brasil, com outros artistas franceses, depois da derrocada do império napoleônico. Ele era primo de David, o pintor oficial de Napoleão Bonaparte.

-Em 1867, nasce o escritor italiano Luigi Pirandello. Sua obra mais conhecida é a peça de teatro “Seis Personagens À Procura de Um Autor.” Quanto ao nosso teatro, Jonas, são “Duzentos Milhões À Procura de Um Presidente”.

Sérgio, serve o da Câmara?... E o do Senado?...

-Em 1886, inauguração da ferrovia Canadian Pacific, entre Montreal e Port Moff (na costa do Pacífico) que, evidentemente, alavancou o desenvolvimento do Canadá.   Enquanto isso, no Brasil, transcorridos uns 130 anos, aparece mais uma peça de ficção dos nossos políticos: uma estrada de ferro ligando o nosso país até o Pacífico através do Peru.

-Um dos culpados é o Juscelino Kubitscheck; eu já falei disso em programas passados, e não quero voltar ao assunto. - irritou-se o Jonas Vieira.

-Em 1913, morre Manuel Ferraz de Campos Sales, presidente da República. Ele tem um paralelo com os dias de hoje: veio moralizar as finanças, porque encontrou terra arrasada.

-Sérgio, ele fundou um partido, o PRP, Partido Republicamo Paulista.

-Jonas, ele era arqui-inimigo do Ruy Barbosa.

O presidente Campos Sales, com o ministro Joaquim Murtinho, sanearam as finanças nacionais depois da lambança feita por Ruy Barbosa, que redundou no Encilhamento.

-Em 1914, Francisco Ferdinando, Arquiduque da Áustria e herdeiro do trono austro-húngaro, é assassinado em Sarajevo pelo nacionalista sérvio Gavrilo Princip, o que desencadeou a Primeira Guerra Mundial.

-A culpa, então, da Primeira Guerra Mundial foi desse sérvio.

-Aqui, no Brasil, Jonas, há uma turma que acha que a culpa é do Fernando Henrique Cardoso.

-Em 1918, o governo soviético nacionaliza a indústria. Jonas, é aquela história de que falávamos na semana passada; a insistência do ser humano de repetir os erros do passado.

-Uma data especial que tem a ver com o que aconteceu, 10, 20, 30 anos depois: em 1919,  a Alemanha é obrigada a assinar o Tratado de Versalhes em termos muito duros.

-Exatamente, Sérgio, enquadraram a Alemanha.

-Jonas, o economista Keynes, que seguiu de perto as negociações entre as potências, escreveu o livro “As Consequências Econômicas da Paz” em que criticou duramente os representantes das nações vencedoras quando trataram dos desdobramentos relacionados às reparações e demais cláusulas do Tratado de Versalhes. Não se podia arruinar um mercado como o alemão, disse Keynes.

-Esse erro, Sérgio, as nações aliadas não cometeriam no fim da Segunda Guerra Mundial.

-O filósofo Bertrand Russell julgava que Keynes possuía o intelecto mais afiado e mais claro que ele havia encontrado na vida.

-Em 1922, é instituído no Brasil, pela primeira vez, o Tribunal do Júri. O Simon ficou muito ativo daí pra frente.

-En 1926, nasce o ator e cineasta norte-americano Mel Brooks, um cara por quem eu tenho profunda admiração.

-Olha que fato estranho, Jonas: em 1929, o Instituto Alemão de Física concede a “Medalha Max Planck” ao próprio Max Planck e a Albert Einstein. Por que não concedeu a “Medalha Albert Einstein” a Max Planck e ao  Einstein?...

-Concordo com você, Sérgio.

-1930, nasce Itamar Franco. A dúvida: ele era mineiro... ele era baiano... Ele não era nada disso, nasceu num navio.

-Nasceu em alto-mar. - completou o Jonas Vieira.

-Em 1939, a companhia Pan American Airways inicia o primeiro voo regular de viagens sobre o Atlântico entre Long Island e Marselha.

-Um acontecimento. - vibrou o Jonas Vieira.

-Essa é terrível: em 1942, inicia-se a Batalha de Stalingrado.

-Em 1945, nasceu Raul Seixas.

-Em 1950, Seul é capturada pelas tropas da Coreia do Norte.

-Se os americanos não tivessem chegado lá, Sérgio... Já imaginou como seria Seul hoje?

-Eu olho a Coreia do Norte, aquele ditador Kim-Jong-un, Jonas, e imagino o alívio de toda a Coreia do Sul.

-Em de junho de 1958, o maior júbilo que o futebol nos trouxe: o Brasil ganha a Copa do Mundo de futebol ao vencer, em Estocolmo, a seleção da Suécia por 5 a 2.

O grito que estava preso na garganta dos brasileiros desde 1950 irrompeu com a força da alegria.

-Em 1966, golpe de Estado instaura a ditadura na Argentina.

-Mais uma. - manifestou-se o Jonas Vieira.

-Uma ideia de jerico como outra qualquer. - acrescentou o Homem-Calendário.

-Em 1969, frequentadores do bar Stonewall Inn, em Nova York, voltado para o público homossexual e transexual, reagem à ação policial ali ocorrida, fato que desencadeia mais dois dias de protestos e culmina na marcha ocorrida no dia 1º de julho de 1970 em lembrança do aniversário do motim. Jonas, foi o embrião da Marcha do Orgulho Gay.

-Sérgio Porto, que morreu antes, em 1968, já dizia que o terceiro sexo passaria a ser o segundo.

-Já passou, Jonas.

-Em 1972, o Congresso Nacional aprovou a criação da Empresa Telecomunicações Brasileiras S/A, a Telebrás.

-Que o Roberto Campos chamaria de Telessauro. - lembrou o Jonas Vieira.

-Com a estatização, telefone era bem declarado no imposto de renda e custava até 5000 reais. Quando veio a privatização, houve uma gritaria dos diabos daqueles de que falávamos há pouco, os que repetem os erros do passado. - concluiu o Sérgio Fortes.

-Em 1997, Mike Tyson arranca um pedaço da orelha direita de Evander Holyfield. Lembra isso, Jonas?

-Lembro.

-Eles estão se engalfinhando, de repente, o Tyson tacou uma dentada que tirou pedaço.

-Que dentada! - exclamou o Jonas admirado com aquele maxilar de pit bull.

Na ópera “Cavaleria Rusticana”, Alfio morde a orelha de Turiddu, um costume siciliano que significava um desafio para o duelo, não havia nada de mordida de arrancar pedaço, se não, a ópera não prosseguia.

-Em 1997, numa vala comum, na cidade de Vallegrande, na Bolívia, são descobertos os restos mortais de Che Guevara sem as mãos.

-Sem as mãos?... - abismou-se o Jonas Vieira.

-Sim, para dificultar a identificação. Eles foram trasladados para Cuba e o enterro foi de chefe de estado.

-Em 2000, após intensa batalha jurídica entre Cuba e Estados Unidos, Elián Gonzáles, sobrevivente de um naufrágio na costa norte-americana, retornou ao seu país de origem. Lembra-se, Jonas?

-Claro; foi um novelão mexicano.

-É mais novelão cubano, Jonas, já que o gênero novela foi criado, em Cuba, em 1939 e foi exportado para os demais países da América Latina.

-É verdade; esqueci que a mais famosa de todas foi escrita pelo cubano Félix Caignet, “O Direito de Nascer”.

-Também conhecida, Jonas, como “O Direito de Encher”.

-Hoje, é dia de Santo Ireneu, com “e”, não com “i”. Santo Ireneu de Lyon.

-Ele deve andar desocupadíssimo, Sérgio.

-Tirando um e outro devoto, as reivindicações do Simon...

Jonas Vieira não perdeu a oportunidade:

-Simon tem uma fotografia dele em casa, aliás, um poster.

-Hoje, é Dia de São Paulo I, papa e mártir.

Jonas relembrou, então, o outro São Paulo, o mais reverenciado pelos católicos, dizendo, corretamente, que foi ele o criador do cristianismo, e não São Pedro. São Paulo era um erudito, que se correspondia com o filósofo Sêneca, enquanto São Pedro era um pescador de pouca cultura.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

2883 - peladeiros e rivais


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5133                          Data:  24 de junho de 2015

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203 ª CONVERSA COM OS TAXISTAS

 

Embora gagueje muito, o 009 é um ótimo interlocutor para assuntos de esporte em geral. Seu irmão, o 202, me disse, cera vez, que ele foi muito bom de bola, mas o pai, que também é taxista, podou o seu talento. Disse-me, também, que ele é vascaíno doente. Fui eu que puxei conversa.

-Tempos atrás, as câmeras do metrô davam notícias com semanas de atrás, agora, não, as notícias são frescas.

-Que bom.

-Eu vi, na viagem para cá, a informação do Eurico Miranda, presidente do Vasco, que o Léo Moura telefonou para o Romário porque queria jogar no Vasco.

-E foi isso mesmo. O Léo Moura sofreu ameaças da torcida do Flamengo, ficou com medo e desistiu. - disse o Gaguinho com a sua língua travando só no momento em que pronunciou Flamengo.

-Ele é profissional, não tem de dar satisfações a torcedores fanáticos.

E Prossegui:

-Morreu o Carlinhos, grande jogador do meio de campo do Flamengo, aposto que 90% desses torcedores não sabem quem é; eles só vivem do presente.

-O Carlinhos jogou com o Gérson, não foi?

Depois de confirmar, disse-lhe que os rubro-negros reverenciam apenas o Zico. Ele me contestou:

-Nem ele. Recorda-se quando o Zico foi assessor do Zagalo na Copa do Mundo de 1998 e o Romário, que jogava no Flamengo, não foi convocado? Os flamenguistas rasgaram os cartazes com a figura do Zico. - gaguejou mais, dessa vez, porque foi tomado pela exaltação dos polemistas.

-Outra notícia que vi na câmera do metrô foi a que dizia que o Eurico Miranda pedia a torcida vascaína para não comparecer à partida contra o Fluminense, e, em seguida, duvidava de a torcida tricolor lotar o estádio.

-O Eurico Miranda é dado a essas provocações, mas é porque o Fluminense está fazendo ruído nas negociações do Vasco com o Ronaldinho Gaúcho.

-O problema dele é acirrar os ânimos sem medir as consequências. Muitos bandidos, de um tempo para cá, passaram a participar de torcidas organizadas, e o Eurico Miranda, já nos anos 90, provocava os flamenguistas. Quando chegou à presidência, acirrou os ânimos entre as torcidas rivais e, não há dúvidas, que ele tem sua parcela de culpa nas mortes que ocorreram nessas brigas entre torcedores do Vasco e do Flamengo.

-Eu também acho. - concordou.

-Roberto Dinamite pode não ter sido um bom presidente do Vasco, mas quando substituiu no cargo tomou um gesto digno de aplausos: confraternizou-se com os dirigentes do Flamengo num almoço.

-Mas os torcedores não fumaram o cachimbo da paz, não. - manifestou-se, enquanto me deixava na Rua Modigliani.

 

No táxi do 151, aquele que me chama de “Meu Nobre”, quem me deu o pontapé inicial na conversação foi ele.

-Tenho sérias dúvidas de que esta cidade fique pronta para as olimpíadas.

-Quando foi anunciado o Rio de Janeiro como sede das olimpíadas de 2016, em 2009, eu almoçava com uns amigos no Jirau, um restaurante do início da Rua São José, e parecia que o Brasil tinha feito um gol na decisão da Copa do Mundo.

-Uma euforia louca. - imaginou.

-Apenas na minha mesa, onde estávamos eu, dois amigos e uma amiga, não houve vibração. Essa amiga até comentou que todos ali pensariam que éramos espanhóis, pois Madri era uma das favoritas.

-Tóquio era uma das concorrentes, tenho certeza. - assegurou.

-Chicago também concorreu, e o presidente Barack Obama até foi lá, se não me engano, na Dinamarca, no dia da votação do Comitê Olímpico. A cidade não tinha chances, mas era seu reduto político, a capital do estado em que ele foi senador. Ele não podia se descuidar, pois viria a eleição de 2012. - comentei.

-Sediar uma olimpíada é muito mais complexo do que uma Copa do Mundo; virão países de quase todo o mundo e os atletas não ficarão espalhados pelo Brasil. Todo o mundo vai ficar no Rio de Janeiro, que parece uma cidade bombardeada na Segunda Guerra Mundial. Logo agora, que tudo que é esporte passou ser olímpico até o rugby. - manifestou-se.

-Li muitos anos atrás uma crônica do João Saldanha em que ele escreveu que o nosso futebol surgiu do rugby.

-Mas o futebol tem mais de dois mil anos. - retrucou.

-Sim; mas o futebol era jogado de qualquer maneira, valia tudo, até usar o crânio do inimigo como bola. O futebol com regras, que se tornaria o esporte mais popular do planeta, nasceu na Inglaterra. No rugby, todos podem segurar com as mãos a bola, no futebol, só dois, e dentro de um espaço demarcado, a grande área. Enfim, nessa crônica do João Saldanha, ele mostra as modificações que levaram os ingleses a criarem o nosso futebol.

-Aquele esporte truculento, o futebol americano, eu sei que foi inspirado no rugby. Eu nunca consegui entender as regras.

-Eu consegui entender alguma coisa lendo as memórias do Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos.

-Aquele da estagiária que fez boquete? - interrompeu-me.

-Ele foi muito mais do que isso. Mas voltando ao que eu dizia, aprendi alguma coisa sobre futebol americano com ele. Escrevendo sobre um confronto entre um time do Arkansas e outro do Texas, ele explica que cada um tem quatro tentativas para avançar na defesa adversária, se conseguir, ganha mais quatro tentativas, se não, a bola passa para o adversário. Se o tradutor não errou, nessas quatro chances tem-se ganhar, pelo menos, 10 jardas do terreno inimigo.

-Chegamos, meu nobre.

Ele já tinha percorrido todas as jardas até a minha casa.

 

Quando entrei no táxi do 017, resolvi poupar a garganta como os protagonistas de uma ópera em dia de récita, mas ele quebrou o silêncio com uma pergunta:

-Você está assistindo aos jogos da Copa América?

-Só vi os do Brasil e da Argentina que começaram antes das 18h 30min.

-Então, você não viu o jogo Brasil e Colômbia?

-Não vale as minhas horas de sono.

-Não perdeu nada. O Neymar todo nervosinho... mas isso é culpa da mídia que endeusa esses caras.

-Um amigo meu ficou indignado porque um intelectual comparou da Academia Brasileira de Letras comparou os pés do Neymar com as mãos do pianista brasileiro de maior projeção internacional que, com 3 anos de idade, já tocava piano. “O que o Neymar fazia com os pés aos 3 anos de idade?” - bradava esse meu amigo no telefone.

Ele ficou quieto, e eu continuei:

-Quebrava a cristaleira da casa em que morava dando pontapé em bola de borracha.

-E o Messi?... O que você tem achado dele nessa Copa América?

-Sonolento. - respondi.

-Mas quando ele acorda... - colocou a ênfase nas reticências.

-No time do Barcelona, ele está em vigília quase sempre, mas não o vejo tão motivado na seleção. Mas prefiro o Messi ao Neymar, porque não debocha dos adversários, quando derrotados e não sofre de crises de chilique.

O silêncio retornou até a chegada do táxi na minha rua.

 

 

 

 

 

sexta-feira, 26 de junho de 2015

2882 - A mosquitinha asseada


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5132                          Data:  23 de junho de 2015

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SABADOIDO COM O DANIEL TRABALHANDO

 

Estranhei o silêncio.

-E o Daniel?

-Foi trabalhar. -respondeu-me meu irmão.

-Trabalhar num sábado... - coloquei o dissabor nas reticências.

 -Pior quando tem de ir também no domingo, mas, dessa vez, trabalha só no sábado.

-Naquele poema do Vinícius de Moraes sobre o sábado, trabalhava-se neste dia. - lembrei.

-Lembra-se, Carlinhos, que o papai chegou a trabalhar nas segundas-feiras de carnaval?... Era trabalho na redação de jornal, não era trabalho de rua. 

-O jornalismo sugou o sangue do pai e pensar que a pensão dele pelo INSS é uma mixaria...

-O DNER, onde ele trabalhou dez vezes menos do que como jornalista, é onde a pensão dele é dez vezes maior, até mais. - seguiram-se as palavras do Claudio às minhas.

-Querer o quê?... O Brasil segue as leis trabalhistas do Mussolini, a CLT e os sindicalistas não admitem que mexam nelas porque ganham muito. - comentei.

-Voltando ao Daniel, os programadores só podem fazer manutenção nos computadores quando os que trabalham com eles não estão, por isso, ele é escalado sábado e, às vezes, domingo. Mas a Casa da Moeda paga o táxi até Santa Cruz.

-Deve dar uns 150 reais. - calculei.

-”Um Corpo que Cai”, que você encomendou pelo Mercado Livre já chegou?

-Há muito tempo, Claudio.

-Você não havia assistido a esse filme no cinema? - perguntou-me.

-Claudio, você deve se recordar...

-De quê? - cortou-me.

-Hitchcock recomprou os direitos de cinco dos seus filmes para deixá-los de legado à sua filha. Eles ficaram conhecidos como “os cinco filmes perdidos de Hitchcock”. Foram relançados, em 1984, cerca de 40 anos depois do primeiro lançamento. Nessa época, eu via, pelo menos, um filme por semana; logicamente, assisti a todos os cinco.

-Não diz os nomes, eu vou dizer.

Puxando pela memória, pôs-se a citá-los.

-”A Janela Indiscreta”, “Festim Diabólico”, “O Homem Que Sabia Demais”, “O Terceiro Tiro”. Falta um.

-Está na cara, Claudio.

-Claro! “Um Corpo Que Cai”.

A seguir, desafiou-me:

-Você pode dizer os nomes dos artistas desses filmes?

-Eu só sei, Claudio, que “O Homem Que Sabia Demais” não foi com o Lula.

-Carlinhos, na última pesquisa entre os críticos de cinema, “Um Corpo Que Cai” desbancou “O Cidadão Kane” como o maior filme de todos os tempos.

Disse-lhe que discordava terminantemente.

-Para o Bernard Herrmann, se estivesse vivo, não importava, pois ele musicou os dois filmes.

-Ele estava inspiradíssimo em “O Cidadão Kane”, mas conseguiu se superar em “Um Corpo Que Cai”. - manifestei-me.

-Bernard Herrmann era descendente de família russa, o Henry Mancini, de família italiana, Miklós Rózsa, da Hungria, e por aí vai.  O que havia de melhor na Europa foi para os Estados Unidos ou se refugiou lá, para o Brasil, não sobrou quase nada.

-No momento, Claudio, eu só me recordo do Radamés Gnattali.

-Se rebuscarmos bem, deve haver outros compositores, não muitos.

-Eu diria, Cláudio, que há trilhas sonoras no cinema tão criativas, que os filmes deveriam ser citados como as composições da música popular; por exemplo: “Um Corpo Que Cai”, de Hitchcock e Bernard Herrmann; “Amarcord”, de Fellini e Nino Rota.

-Na ópera, só se cita o nome do compositor, o libretista fica esquecido. - contrapôs.

-Porque os libretos ficam muito aquém da música. Com “A Flauta Mágica”, por exemplo, todos ficam abismados como Mozart conseguiu pôr música tão genial em um enredo tão maluco.

-Tudo bem, Carlinhos? - era a Gina que se fazia presente na cozinha do Sabadoido.

-Sentindo muito frio. - respondi.

-Eu acho que peguei dengue com essas obras em frente daqui de casa.

-Mas, Gina, a água empoçada dessas obras são imundas, e o mosquito fêmea da dengue só desova em água limpa. - estranhei.

-Então, essa “mosquita” e seus rebentos eram imundos, porque tenho certeza que peguei dengue e até reclamei com os trabalhadores, que já aterraram as poças.

-Você já pegou dengue uma vez, não foi?

-Naquela vez, arrasou comigo. Creio que fiquei com alguma defesa no organismo porque agora a doença foi mais fraca, e eu me recuperei em poucos dias.

Nesse instante, o celular do meu irmão tocou, e ele atendeu. Era o Daniel avisando que chegou ao trabalho.

-Hoje, Gina, você está sem o seu companheiro de almoço no restaurante.

-Comprarei duas quentinhas para mim e para o Claudio.

-Eu, que tinha a carona do Luca, perdi, hoje, a do Daniel. Tudo bem: uma caminhadinha daqui à minha casa esquenta um pouco com esse frio.

-Não tenho visto mais jogos de pingue-pongue, no Facebook, com o Luca. - disse a Gina.

-Tênis de mesa. - corrigi.

-Pingue-pongue.- teimou.

-O Luca me disse, pelo telefone, que ele é novo na turma dos veteranos do Fluminense, que não deixariam um novato se sobressair logo de cara.

-Houve, então, mutreta. - deduziu a Gina.

-Pelo que entendi, sim, mas ele foi muito reticente.

Claudio passou para as artimanhas mais cabulosas.

-Eu não entendo por que, até hoje, não prenderam o Lula, a Dilma e o Antônio Palocci.

-Claudio, eu estranharia se os três tivessem agido nos Estados Unidos, na França, na Alemanha e, até mesmo, em Portugal, onde prenderam o Primeiro-ministro José Sócrates.

-O José Sócrates ainda teve o decoro de não aceitar a liberdade com tornozeleira eletrônica.

-Mas você tem razão, Claudio, até a Argentina colocou na prisão o Carlos Menem; no Brasil, enquanto isso, o “Brahma” está solto.

-Nem engarrafado ele foi. - não perdeu a Gina a piada.

Meu irmão se levantou da cadeira e foi cuidar dos seus afazeres. A Gina passou a rememorar os tempos de Visconde de Cairu.

-Você conheceu, Carlinhos, a “Caverna do Batman”?

-No meu tempo de Cairu, não havia sido batizada com esse nome. Era apenas o local dos banhos coletivos de dezenas de alunos depois das aulas de Educação Física.

-Nós tínhamos de nos enxugar na própria roupa de ginástica – reclamou – e eu sofri muito com essas aulas, pois colocavam as mulheres para se exercitarem com os homens e eles eram mais fortes.

-Havia uma professora para as meninas, e um professor para os meninos, a ginástica era separada, mudou, então, depois. - retruquei.

-Tivemos aulas até com o Admildo Chirol.- reclamou.

-Ele já era da minha época; excelente, não como professor, mas como ginasta. O Carlos Alberto Parreira dizia que era o melhor da geração deles, o único a fazer o Cristo nas argolas. O vício do cigarro matou o Chirol.

Continuamos a conversar sobre o Visconde de Cairu dos anos 60 até que chegou a hora de eu ir para a casa, e a Gina, de comprar as duas quentinhas.

  

 

quinta-feira, 25 de junho de 2015

2881 - de marré de si


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5131                          Data:  22 de junho de 2015

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CARTA DA ROSA

 

INTRODUÇÃO

 

Rosa Grieco nos enviou uma carta, que segue abaixo, em que comenta os biscoitos que lhe enviamos logo que saíram do forno e foram devidamente molhados, apesar da crise hídrica, acompanhados de uma carta manuscrita.

Não vamos colocar asteriscos no seu texto para, em seguida, tecermos comentários no rodapé, porque o Dieckmann patenteou esse método e não queremos correr o risco de uma acusação de plagiário.

Isso posto, interromperemos alguns parágrafos para enxertamos nossas observações para, depois,  seguir com as palavras da nossa remetente. Vamos a ela ou a elas.

“Galhardo missivista:

Dedicando um primeiro olhar à sua epístola, só traduzi “Cara Rosa” e Beijos, Carlos”. De permeio, nada captei até que convoquei Champollion e recorri às minhas apostilas de Paleografia, curso realizado em 1951 (Vossência era miúdo) e, auxiliada por escritas  lombardas e merovíngias, consegui traduzir seus hieróglifos.”

Nossa irônica Rosa compara a nossa missiva à Pedra de Roseta, que foi descoberta a 30 quilômetros de Alexandria, em 1799, por um dos sábios franceses que acompanhavam o exército de Napoleão Bonaparte na sua campanha no Egito.

Em 1822, Jean-François Champollion, que conhecia 12 idiomas, mais a língua coopta do Egito antigo, buscava o sentido oculto em tudo que parecia, para os comuns mortais, meros rabiscos. Ele, com todo o seu cabedal, comparou as escritas demótica e hieroglífica com o grego e decifrou os escritos da Pedra de Roseta.

Quase ao mesmo tempo, em 1823 precisamente, um médico britânico, Thomas Young, apresentou um entendimento diferente da escrita hieroglífica. Durante 40 anos, houve defensores de uma versão e de outra. Quando um novo texto hieroglífico foi descoberto, o Decreto de Canopus de autoria de Ptolomeu III Evergeta, de 237 a.C, que impunha uma reforma no calendário para introduzir o ano bissexto, a questão foi decidida: o sistema de Champollion foi decisivo na sua decifração. Thomas Young comparado a  Jean-François Champollion era um fraco abusado.

Um professor meu de Estudos dos Problemas Brasileiros, que ficava a anos-luz da erudição da Rosa, quando se deparava com uma prova em que ele não entendia o que estava escrito, esbravejava: “Isto é letra de veterinário!”. Qual é o problema? - eu me perguntava; os animais não vão ler a receita.

Para que nossa amiga continue pondo em prática seus conhecimentos de egiptologia, nós lhe enviaremos exemplares do Biscoito Molhado também manuscritos.

“Agradeço seus agradecimentos.”

“Cantigas de roda: muitas foram trazidas pelas freiras gaulesas. “Eu sou pobre, pobre, etc” é “je suis pauvre, pauvre, pauvre, je m' en vais d' ici.” Colega minha no Sion falava sobre a “Mère Delphine”, grande cacófaton...”

Rosa alude ao Biscoito Molhado que repercutiu o programa Rádio Memória em que o centenário do Carequinha foi comemorado e muitas cantigas de roda entoadas por ele e a criançada foram tocadas.

Segundo a Rosa, “je m' en vais d' ici.” - eu me vou daqui – se transformou em “de marré de si”. No nosso idioma, há muitas expressões provenientes de combinações fonéticas malucas, por exemplo: “cara esculpida em mármore Carrara” se transformou em “cara cuspida e escarrada”. Será que “Je m'en vais d' ici” virou “de marré de si”?

O Departamento de Pesquisa do Biscoito Molhado entrou na internet em busca de outras versões. Duas foram encontradas, a primeira guarda alguma semelhança com a da Rosa. Diz que “marré” se origina, após inúmeras corruptelas, de um diminutivo do nome Maria, “Marie” em francês. Quanto a “deci”, foi extraído do verso “dans ce jeu d' ici”, que significa “neste jogo daqui”, na variante belga. A conclusão tirada é que estas palavras aparentemente sem sentido “de marré deci” significa, na cantiga de roda, “paupérrimo”.  A segunda, é de um internauta que cita a irmã que ouvia a professora de francês ensinar às alunas “Je Suis pauvre, pauvre, pauvre  du Marais, Marais, Marais.” Um terceiro internauta completou: “Je suis riche, riche, riche de La Mairie d' Issy.” E explicou que se trata de dois bairros de Paris: Marais, bairro de pobres, e Mairie d' Issy, bairro de ricos.

Nós cantamos essa inocente cantiga de roda, quando crianças e chegamos à idade adulta sem desconfiar de tanto francesismo nelas. Pena que a Rosa não se estendeu mais sobre as freiras francesas, esperamos que ela o faça na próxima oportunidade.

“Sua roda-gigante com direito a “Um Corpo Que Cai”, me trouxe à combalida memória a mãe do Inesquecível; perguntada se entendera o filme, declarou que sim. “Mas quem era aquela outra mulher?” E “Psicose”? Entendeu tudo, era um homem que cuidava da irmã dele numa cadeira de balanço. Dotada de uma sábia ignorância, gostava muito de mim e filosofava: “Quando a Rosa diz “Mata!”, meu filho diz “Esfola!” Bons tempos...”

Trata-se de capítulo do meu Minidicionário Autobiográfico sobre a minha experiência na roda-gigante com quase 30 anos de atraso, quando tentei satisfazer um desejo de infância na idade adulta. Com esse descompasso de tempo, sofri uma acrofobia que comparamos à do personagem James Stewart no filme “Um Corpo Que Cai” de Alfred Hitchcock.

Falando nesse filme, na última pesquisa com críticos de cinema, ele tirou o primeiro lugar de “O Cidadão Kane”, de Orson Welles. Nós discordamos inteiramente, preferimos aqueles críticos que há mais de 50 anos dão a primazia à obra-prima do cineasta americano.

Se a quase sogra da Rosa não entendeu “Um Corpo Que Cai” e “Psicose”, nós imaginamos qual seria a reação dela se assistisse a “O Cidadão Kane” com a sua narrativa não linear. 

“O John Malcovich estava um atentado, feio e bom professor de latim, o livro é tão bom que o cinema não conseguiu derrotá-lo.

A enxurrada de BMs foi um deleite para mim; estou demais solitária, supérflua como o trema da reforma ortográfica.  Merci.

Ósculos (não em latim).”

Rosa Junho 2015

 

Ela agora fala do filme “Relações Perigosas”, que foi baseado numa peça homônima que, por sua vez, se baseou no consagrado romance de Choderlos de Laclos publicado em 1782.

Para não escrevermos em tintas bocagianas, no Biscoito Molhado, a cena de sexo que surpreendemos no meio da calçada da Rua Van Gogh, nós recorremos a uma palavra latina escorando-nos no sedutor personagem de John Malcovich, do filme mencionado, que avisa a uma ninfeta da nobreza que iria lhe ensinar uma palavra dessa língua.

Com essa citação, Rosa fez a festa.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

quarta-feira, 24 de junho de 2015

2880 - Dia do Aperto


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5130                          Data:  21 de junho de 2015

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ACONTECEU NO DIA 21 DE JUNHO

 

 Sérgio, depois do Simon Khoury, quem mais gosta da sessão histórica do Rádio Memória sou eu, assim sendo, vamos ao calendário.

-Jonas, hoje, 21 de junho, começa o inverno. É o dia mais curto e a noite mais longa no hemisfério sul.

E prosseguiu o Sérgio Fortes:

-A primeira referência do calendário é para você, profundamente versado nesse tema, esclarecer: em 524, Godomar, rei dos Burgúndios, derrota os Francos na Batalha de Vézeronce.

Suely Franco, Luciene Franco, Generalíssimo Franco, todos foram derrotados.

-Não se fala outra coisa. - manifestou-se o Jonas Vieira.

-Em 1226, nasceu Boleslau V. Você sabe quem foi, Jonas?

-O filho do Boleslau IV. - quebrou o seu silêncio o Simon Khoury, relembrando o seu tempo de brilhante aluno de História Geral.

-Jonas, no dia 21 de junho de 1604, chega à Bahia, vindo de Lisboa, a esquadra com o Marquês de Montalvão, primeiro vice-rei nomeado para o Brasil.

-O rei só viria em 1808.  Passaram-se, então, Sérgio... O Peter está dizendo 204 anos.

-Durante 204 anos, o Brasil foi um país vascaíno, eram os vices. - gozou o Sérgio a torcida do Vasco apesar de não ser flamenguista e sim, tricolor.

-Em 1662, Padre Antônio Vieira é intimado a depor perante o Tribunal da Inquisição e redigiu a “Resposta aos 25 Capítulos” da acusação instituída contra ele.

-Padre Antônio Vieira, meu parente, foi um mestre do idioma português e da oratória.

-Sim, Jonas, e como foi jesuíta, tínhamos de ler muito Antônio Vieira no Santo Inácio. Era dureza enfrentar o seu estilo barroco.

-Em 1732, nasce Johann Christoph Friedrich Bach, um dos vinte filhos de Bach.

-Jonas, a Constituição dos Estados Unidos da América, criada em 17 de setembro de 1787, foi ratificada em 21 de junho de 1788.

-Lá, a constituição é ratificada, Sérgio, no Brasil, é revogada.

-Aqui, nós estamos na quinta ou na sexta?... O Peter vai pesquisar... Mas considere só as do período republicano, Peter.

-Vamos lá. - disse o titular do programa.

-Em 1813, Guerra Peninsular: Wellington vence Napoleão na Batalha de Vittoria; dois anos depois, eles se confrontariam em Waterloo. Perdeu também a revanche.

-Em 21 de junho de 1819, nasce Jacques Offenbach, compositor francês de origem alemã.

-Popularíssimo com as suas operetas. - comentou o Jonas Vieira.

-Quando eu fazia o “Clube da Ópera”, na Rádio MEC, em 2002, levei o Fiani, um professor de Economia, para comentar a ópera “Os Contos de Hoffmann” e ele registrou o fato de o compositor não explorar o seu imenso talento, e ter feito música para agradar o gosto pelas futilidades no período de Napoleão III.

 -Em 1837, dá-se a proclamação de Vitória I como Rainha da Inglaterra. Começa o período vitoriano que vai até 1901.

-Como duram as rainhas da Inglaterra! - abismou-se o Jonas Vieira.

-Jonas, a Rainha Vitória viveu 82 anos, e ficou 64 anos no cargo. O fator previdenciário dela foi 146. Impressionante!

-O da Rainha Elizabeth deve chegar a 200. - completou o Jonas Vieira.

-Rejubile-se, Jonas: em 1839, nasce Machado de Assis, o nosso maior escritor.

Rejubilamo-nos todos.

-Em 1905, nasce Jean-Paul Sartre, escritor e filósofo francês. Jonas, De Gaulle disse, em certa ocasião, que não prenderia Sartre, porque não se prende Voltaire.

-Mas prenderam Voltaire, Sérgio e ele passou uma temporada na Bastilha.

-Jonas, Sartre estava muito longe da lucidez de Voltaire.

-Em 1906, o Senado norte-americano aprova a construção do Canal do Panamá.

Se fosse depender do Senado panamenho... Nem sei se existia senado lá.

-Jonas, antes, em 1903, o Panamá, com a ajuda dos Estados Unidos, se separou da Colômbia. O presidente Theodore Roosevelt tinha interesse na construção desse canal.

-Em 1908, duzentas e cinquentas mil mulheres se reúnem em Hyde Park, londres, para reclamar o direito ao voto. Lá, em casa, com a Bete, eu é que não tenho direito ao voto.

-Sérgio, falavam aquela bobagem que a revolução comunista havia sido a maior revolução do século XX. Qual!... A grande revolução do século XX foi a das mulheres. Elas vieram para ficar.

-Em 1908, morre Rimsky-Korsakov, grande compositor russo.

-Paulo Fortes cantou óperas de  Rimsky-Korsakov, não foi?

-Papai cantou “Le Coq d´or”, “O Galo de Ouro”; e também dançou. Disse ao corpo de baile do Teatro Municipal que abrissem espaço para mais um dançarino.

-Como diria você: um talento poliédrico.

-Em 1911, Porfírio Diaz, presidente do México, se exila em Paris. Jonas, por que todo mundo se exila em Paris?

-Em Havana, ninguém quer se exilar?... Em Caracas, também, não.

-Em 1919, os alemães afundam 70 barcos de guerra de sua frota, em Scapa Flow, norte da Grã-Bretanha, para não entregá-los aos ingleses, violando, assim, as condições do armistício.

-Puxa! - assombrou-se o Jonas Vieira.

-Em 1919, nasce o cantor Nélson Gonçalves.

-Em 2019, vamos comemorar o seu centenário. - prometeu o Jonas Vieira.

-Em 1921, Jonas, nascia uma das suas 67 atrizes americanas favoritas, Jane Russell.

-Em 1933, um negócio horroroso: Adolf Hitler proíbe a existência de partidos não nazistas na Alemanha. Pela perspectiva histórica, vemos a capacidade que o ser humano tem de repetir as coisas erradas... O que se assiste agora, na Venezuela, é a repetição.

-E na Coreia do Norte. - acrescentou o Jonas.

-Em 1935, Jonas, nasce uma das suas 36 escritoras preferidas, Françoise Sagan.

-”Bonjour Tristesse” - caprichou o Jonas na pronúncia.

-1940, Segunda Guerra Mundial: o governo do general Pétain autoriza os exércitos franceses do Leste a entregar as armas, quando as tropas ficam cercadas por seis divisões e dois mil carros alemães.

-Terrível!

-Nessa época, Jonas, Stalin era aliado de Hitler, e os comunistas franceses não se sentiram muito motivados a lutar.

-1941, a Alemanha nazista declara guerra à União Soviética.

-Agora, os comunistas franceses se motivaram. - concluiu o Jonas Vieira.

-Nessa mesma data, nasce o político brasileiro Eduardo Matarazzo Suplicy.  Eu vou morrer sem fazer um juízo do Suplicy, se gosto ou não dele.

-É um suplicício. - fez o Jonas o seu trocadilho.

O jornalista Paulo Francis o chamava de Mogadon Suplicy por causa da sua fala sonífera. Maldade, porque o Mogadon, como o Lexotan, cria dependência e o Eduardo Suplicy, não.

-Em 21 de junho de 1948, um grande acontecimento: o disco LP é apresentado pela Columbia Records no Hotel Waldorf-Astoria.

-10 polegadas. - aparteou o titular do programa.

-O disco era maior, Jonas?

-Não; 10 polegadas, depois, cresceu para 12 polegadas.

Simon Khoury, até então hibernando, interveio:

-O primeiro disco foi do Edu da Gaita.

-Foi o primeiro no Brasil, em 1951/1952. No mundo, o primeiro LP foi o dos Estados Unidos em 1948. - ratificou o Jonas Vieira o registro do calendário.

-Em 1964, morte de três ativistas que deu num problema racial louco e resultou no filme “Mississipi em Chamas”. Um grande filme.

 -Em 1970, um fato que nos leva a soltar foguetes até hoje: o Brasil vence pela terceira vez uma Copa do Mundo de futebol, ao derrotar a Itália por 4 a 1 no México.

-Quando o Brasil terá uma seleção como aquela, Sérgio?

-Em 1982, John Hinckley,Jr é declarado culpado pela tentativa de assassinato do presidente Reagan. Ele está preso até hoje.  Se fosse no Brasil...

 -Estava solto há muito tempo.

-Apresentando-se nas melhores casas do ramo.

-Sendo homenageado pelas escolas de samba. - previram os dois.

-Em 1989, o Botafogo vence o Flamengo por 1 a 0, com gol de Maurício e se torna campeão carioca após um jejum de 21 anos.

-Um gol roubado. - requentou o seu choro de 1989 o rubro-negro Jonas Vieira.

-Em 1990, os Parlamentos da República Democrática Alemã e da Alemanha Federal aprovaram o Tratado de União Monetária, Economia e Social para a reunificação.

-O marco alemão era bem mais valorizado do que o marco da Alemanha Oriental, mas, no fim, tudo deu certo, Sérgio.

-A Alemanha capitalista carregou nas costas, durante um tempo, a Alemanha que deixava de ser comunista até o desenvolvimento chegar para ela também.

-A Angela Merkel era da Alemanha Oriental, está lembrando o Peter.

-Jonas, hoje é duplamente o nosso dia.

-Por que?

-Porque é o Dia do Profissional da Mídia e o Dia do Intelectual.

-Dia do Intelectual?...

-Jonas, quando entregaram ao Nélson Rodrigues um manifesto de intelectuais brasileiros com mais de mil e quinhentas assinaturas, ele ironizou aquele número absurdo, eram mais intelectuais no Brasil do que em todos os países europeus somados e não assinou.

-Bastava assistir a um filme no Cinema Paissandu para virar intelectual.

-Dia de São Luís Gonzaga.

Nós, do Biscoito Molhado, que julgávamos que ele é o padroeiro do baião, aprendemos, com o Sérgio Fortes, que, na verdade, é o padroeiro da juventude.

-Eu passei todas as manhãs de sábado cantando...

E o Sérgio Fortes meio que cantou, meio que recitou:

“Ó São Luís Gonzaga, patrono da nossa juventude/Modelo de virtude, flor do jardim celeste/Hoje, no eterno trono, rogai por nós piedosos/ Dê-nos Jesus Bondoso, o amor que lhe tiveste.”

-Mais piegas é impossível. - reagiu o Jonas Vieira.

-É o meu passado sombrio, Jonas.

-Serginho chegava em casa e recitava isso para o papai e para a mamãe. - imaginou.

-Eu cantava.

-E o Paulo Fortes ficava exultante.

-Ele dizia assim: desafinou aqui, desafinou ali.

Mas o Sérgio não encerrou com São Luís Gonzaga o calendário.

-Hoje é também o Dia do Aperto de Mão.

-Dia do Aperto, Sérgio?

-Dia do Aperto são os 365 do ano, Jonas. Hoje é o Dia do Aperto de Mão.

-Então, Sérgio, vamos instituir o Dia do Demorado Abraço.