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quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

2300 - Momento Mágico: o Biscoito Sem Sapato

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4101                   Data: 28  de dezembro de 2012
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SABADOIDO GLICOSADO (*)

Na minha sacola, havia objetos tão inusitados quanto a do personagem de Woody Allen, em busca de uma religião, no filme Hannah e suas irmãs: três mangas encorpadas, uma fornada de Biscoito Molhado para a Rosa, um texto de De Gaulle de 6 de março de 1959 sobre os muçulmanos e um aparelho medidor de glicose. Com ela, fui para a derradeira sessão do Sabadoido de 2012.
Fui recebido pelo Daniel que me anunciou a sua ida, dentro de minutos, para Itaboraí.
-Lá tem piscina?...  Porque Itaboraí é uma fornalha.
-Carlão, eu não iria para lá, sem as condições normais de temperatura e pressão. Não precisa nem da pressão, mas da temperatura, sim. - respondeu com o seu costumeiro jeito travesso.
-Está um calor de derreter catedrais, com o dizia o dramaturgo. - manifestei-me, enquanto caminhava para a cozinha, onde o Claudio acabava de ler o Globo.
-Claudio, eu perseguia um documentário sobre o Jerry Lewis e, ontem, por uma sorte que caiu do céu, soube que estava programado para o Cine Max, às 13h 45min. Telefonei do trabalho para o Lopo, que gravou para mim.
-Que documentário é esse?
-O nome é Método e Loucura, na tradução fidedigna, seria Método para a loucura, o título foi inspirado na loucura simulada do Hamlet para dizer algumas verdades, o que provoca a frase de Polônio: “É loucura, mas tem seu método.”
-Eu tenho minhas restrições ao Jerry Lewis.
-Com este senso crítico, Claudio, você terá restrições ao Charles Chaplin, pelo sentimentalismo exagerado; ao Buster Keaton, pela expressão do rosto imutável...
-Há alguns filmes dele com o Dean Martin que têm deficiências.
-Jerry Lewis explorou o seu talento ao máximo quando a dupla foi desfeita e ele passou a dirigir, a escrever e até atuar nos seus próprios filmes.
-Mas Dean Martin também tinha talento. - frisou.
-Os dois reuniam multidões que nem os astros do rock, naquele tempo, conseguiam. O problema entre os dois é que Dean Martin não conseguia acompanhar o ritmo frenético de trabalho do Jerry Lewis. Houve a separação em 1956 e a reconciliação, em 1976, feita pelo Frank Sinatra. Ficaram os dois uns cinco minutos abraçados e a gente constata que o laço mais forte que une as pessoas é a amizade.
-Esse documentário é recente?
-Sim, o Jerry Lewis aparece com mais de 80 anos, extremamente lúcido e com uma memória fotográfica. Algumas vezes, ele está no palco, ouvindo as coisas mais insólitas ditas por integrantes da plateia e improvisando sobre elas, sem nunca deixar de ser engraçado.
-O nosso primo Dudu imitava o Jerry Lewis. - lembrou-se.
-Alguns dos depoentes imitam uma ou outra característica dele. Falaram sobre ele o Steve Spielberg, o Quentin Tarantino, o Eddie Murphy e outras personalidades de destaque de Hollywood.
-Do Jerry Lewis, eu gosto mais de O Professor Aloprado. - disse o Claudio.
-Um dos depoentes chama a atenção para o fato de ele extrair o humor de um clássico dramático de Robert Louis Stevenson.
-O filme em que Jerry Lewis faz um papel sério, O Rei da Comédia, de Martin Scorsese, com o Robert de Niro, eu vi em DVD a preço de banana no Carrefour.
-O Jerry Lewis se sentiu inconformado com a crítica americana; foi a fita em que ele só teve o trabalho de ler o script e interpretar a si mesmo, e os críticos se derramaram de elogios a ele. Nos filmes em que ele se matou de tanto trabalhar, não recebeu esse reconhecimento, a não ser da crítica francesa (**). No filme Cinderelo sem Sapato, de 1960, ele sobe em oito segundos uma escadaria enorme e tem uma parada cardíaca.
-Soube disso.
-Foi para a tenda de oxigênio e lá recebeu a visita do pai que, metendo a cara para dentro da tenda, disse para ele: “Viu o que você fez com sua mãe”. Jerry Lewis, então comenta com os espectadores: “Coisa de judeu,”
-É um negócio parecido com a mamma siciliana.
-Jerry Lewis criou o vídeo monitor que facilita sobremaneira as filmagens, pois o diretor assiste ao que está sendo rodado em um monitor. Ele teve a ideia, viajou para o Japão, mostrou-a ao Akio Morita, inventor do walkman, que a transformou em realidade. Todos os diretores passaram a utilizá-lo até hoje.
Sem pausas, prossegui:
-Ele deu aulas de cinema e teve discípulos como o Steven Spilberg.
-Ele está bem com todos os 80 e poucos anos?
-Até contou uma piada, depois daqueles diálogos surrealistas, mas engraçadíssima, com a plateia.
E passei a reproduzir a piada com o meu jeito tosco:
-Numa viagem de avião, um rabino e um padre se encontram lado a lado. Surge a atendente de bordo e pergunta ao rabino o que deseja, ele responde que queria um copo de uísque com pedras de gelo. Em seguida, ela se volta para o padre, que diz preferir o adultério ao álcool. O rabino escuta e intervém: “Eu não sabia que havia outra opção; suspenda o uísque.”
Nesse instante, meu sobrinho reaparece de tênis, bermuda e camiseta.
-Carlão, o computador está à sua disposição. Lá vou eu para Itaboraí.
E saiu.
Olhei para o relógio e vi que ainda era cedo, alonguei, por isso, a conversa com o meu irmão.
-A Gina foi ao supermercado?
-Volta daqui a pouco.
-Eu trouxe um aparelho medidor de glicose, mas tenho bloqueio para entender o manual de instrução.
-Nunca vi a Gina usando um aparelho desses. - mostrou-se cético.
-Se ela não souber, o Luca sabe, pois ele monitora a diabete da Glorinha.
-Vou alimentar as rolinhas. - anunciou.
Diante do ecrã do computador, encontrei apenas os e-mails que foram bloqueados no computador do meu trabalho; um deles mostrava astros da dança da outrora Hollywood, como Rita Hayworth e Fred Astaire, bailando com uma música mais atual, Staying alive, do Bee Gees. As músicas que eles dançaram eram diferentes, os compassos e ritmos eram outros, trocá-las para fundir duas épocas diferentes me pareceu o que os populares chamam de forçação de barra. Ainda assim, valeu a pena rever a arte dos dois artistas citados.
Em seguida, revi os palácios do Kremlin. Era uma festa para os olhos tanta opulência, e para os ouvidos, pois a música era o segundo movimento do concerto para violino e orquestra de Tchaikovsky, canzoneta, andante.
Eis que surge na minha caixa eletrônica uma mensagem eletrônica do Dieckmann. Quando a acessei, vi que, no anexo, encontravam-se fotografias da Linha Maginot, que foi citada na edição 2287 deste periódico. Depois de examinar detidamente cada slide sobre a frustrada defesa dos franceses contra o ataque das forças nazistas, desliguei o computador e fui para a cozinha onde estava o meu medidor de glicose.

(*) O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO queimou as pestanas para encontrar um título à altura do texto e da história de Jerry Lewis. A primeira opção foi O Biscoito Aloprado, mas a ligação com os Aloprados do Lula seria uma péssima alusão, para o Biscoito e para o Jerry Lewis. Como o Cinderelo sem Sapato foi mencionado, a escolha ficou mais tranquila.

(**) A crítica francesa tem lá as suas razões. Acha que um dos melhores momentos do cinema americano é quando John Wayne pega Natalie Wood no colo, um segundo depois de quase mandá-la para o beleléu dos comanches, e diz: Vamos para casa! Esse “Vamos para casa!” é considerado um momento mágico pelos franceses.






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