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quarta-feira, 30 de abril de 2014

2599 - Os Coelho Bisnetos



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4849                                    Data: 12   de  abril de 2014
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129ª  VISITA À MINHA CASA

Coelho Neto, não sei se li ou se é delírio mnemônico: você invadindo o gramado em um jogo do Fluminense e distribuindo golpes de capoeira nos adversários agressivos?
O escritor, que me lisonjeava com  sua visita, esboçou um sorriso antes de falar.
 -Fui torcedor do Fluminense...
E rapidamente se corrigiu:
-Sou Fluminense; sempre que o Nélson Rodrigues, nas suas crônicas, convocava os tricolores vivos e mortos para assistir a um Fla x Flu ou a outro certame que envolvia o tricolor das Laranjeiras, eu me erguia da tumba para atender ao seu pedido.
Enquanto eu o olhava deslumbrado, ele ia em frente:
-Vestia meu terno branco, pegava o meu chapéu de coco, a minha bengala, e partia para o Maracanã.
-Para o Maracanã. - repeti o fim da sua frase como se fosse o Eco mitológico.
-É verdade que, no início, eu me perdia, materializando-me no estádio da Lagoa ou das Laranjeiras.
E justificou-se:
-O Maracanã foi construído bem depois da minha morte.
-Você foi presidente do Fluminense?
-Não; presidi as reuniões que trataram da construção do novo estádio, participei do conselho deliberativo e fui diretor de artes.
-De uma coisa tenho certeza, Coelho Neto, você é o autor da letra do hino oficial do Fluminense  com a melodia do It's a long, long way to Tipperary, de H. Williams.
-De fato; o hino estreou em 1915 na solenidade de inauguração da terceira sede do clube.
-”O Fluminense é um crisol...”
Interrompi no primeiro verso, crispando o rosto ao pronunciar a última palavra, o que foi notado por ele, observador arguto.
-Não gostou do verbete “crisol”?
-Não é uma palavra que os torcedores aceitem; eles a julgarão humorística ou pedante.
-Não me conformo que haja verbetes mortos no dicionário; todos têm direito à vida; de viver na boca das pessoas ou nos seus escritos. Tentei, o mais que pude, palestrando ou escrevendo, dar vida a todas as palavras.
-Assim, escreveu mais de 120 romances.
-Mais ou menos.- intentou mostrar-se modesto.
-Recordo-me que o Nélson Rodrigues confessou, numa crônica, que, garoto, trabalhando numa redação de jornal, falou com você, pelo telefone, assombrado pelas dezenas de milhares de páginas da sua lavra.
-Também trabalhei em jornal.
Era a oportunidade de eu abordá-lo com perguntas biográficas e não a deixei passar.
-Seu primeiro trabalho foi no Jornal do Comércio?
-Sim; eu estava com 17 anos e me julgava poeta.
-Isso, aqui no Rio de Janeiro, mas seu estado natal é o Maranhão.
-Sou maranhense como tantos outros literatos.
-Nasceu em que cidade?
-Nasci em Caxias. A insídia política do estado obrigou meu pai a sair de lá com a família. Eu contava com seis anos de idade.
-Seu pai era português como o pai de Gonçalves Dias?
-Sim; sua atividade era no comércio. A minha mãe era índia, chama-se Ana Silvestre Coelho.
-Ainda jovem você foi do Rio de Janeiro para São Paulo?
-Eu fui estudar Direito em Campinas. Antes, aqui, nesta cidade, cursei o Colégio Pedro II e me matriculei na Faculdade de Medicina.
-Como a carreira de médico não lhe interessou, partiu para Campinas. - deduzi em voz alta.
-Lá, cursando Direito, as coisas não correram muito bem, pois me envolvi num imbróglio com um professor. Transferi-me, então, para a Faculdade de Recife, onde tive Tobias Barreto como mestre.
-E como foi, Coelho Neto?
-Concluí o primeiro ano e retornei a São Paulo, onde me juntei aos abolicionistas e aos republicanos. Sem concluir o curso de Direito, vim de volta para o Rio de Janeiro em busca de um emprego na Gazeta da Tarde de José do Patrocínio.
-Você narra essa passagem da sua vida no romance “A Conquista”. Li um trecho dele na “Nova Antologia Brasileira”, do Clóvis Monteiro.
-Chegando à cidade, ao influxo da grande vida, resfoleguei desafogadamente.
-E como foi trabalhar com José do Patrocínio, que os amigos chamavam Zé do Pato?
-Os artigos do José eram como imensos jequitibás que vêm possantemente arrastados do fundo da selva virgem.
-Cinco anos depois, ou seja, em 1890, você se casa com Maria Gabriela Brandão, filha do professor Alberto Olympio Brandão.
-Tivemos quatorze filhos.
-Seu sogro era um educador de renome relacionado com a alta sociedade fluminense.
-Não vou negar que o prestígio dele também foi responsável pela minha nomeação para diversos cargos públicos.
-Você foi secretário do governo do estado, ocupou o magistério de História da Arte na Escola Nacional de Belas Artes, lecionou literatura no Colégio Pedro II. Depois, foi nomeado para as cátedras de História do Teatro e Literatura Dramática. E ainda foi deputado federal pelo Maranhão por duas vezes.  Como você encontrou tempo para escrever tantos romances?
-Para quem é disciplinado, como eu, sempre se encontra tempo. A minha principal fonte de renda, até então,  era a atividade jornalística.
-Quatorze filhos para criar...
-Na realidade, sete. Perdendo meus filhos na infância por doenças, desisti de mantê-los em ambientes fechados e expus os sete que sobreviveram à vida ao ar livre; coloquei-os para praticarem educação física e a tornarem-se grandes atletas.
-Seu filho João Coelho Neto, o Preguinho do Fluminense, campeão em várias modalidades de esporte, foi considerado pela revista Placar o atleta mais completo do século.
-Minha filha Violeta, com dez anos de idade, já era uma das maiores do nado crawl do Rio de Janeiro derrotando os adultos.
-Mais tarde, ela se tornaria a mais consagrada intérprete brasileira da ópera Madame Butterfly.
-O fôlego dela veio da piscina. - afirmou.
-Seu filho mais velho, Emmanuel, o Mano, tricampeão pelo Fluminense, campeão sulamericano de 1919, sofreu um acidente no jogo entre o Fluminense e o São Cristóvão que lhe custou a vida aos 24 anos de idade.
-Sublimei a minha dor em um  romance que dediquei à sua memória e em um poema.
-Esse drama não arrefeceu o seu ímpeto pela prática de esportes?
-Minha paixão continuou; em 1923, chefiei a delegação do Fluminense que foi à Bahia jogar futebol e tênis.
-Coelho Neto, você recebeu o título de “Príncipe dos Prosadores Brasileiros”, em votação realizada pela revista “O Malho” em 1928; no entanto, eu não via romances seus nos sebões que eu frequentava umas três vezes por semana, apesar de eles passarem de uma centena.
-Talvez o fato de a minha editora, a Lello, ser portuguesa...
-Conheci “O Turbilhão”, isso porque foi lido em capítulos num programa da Rádio Ministério da Educação nos anos 60. Não me esqueço da personagem que se envolve com o espiritismo e enlouquece.
-Eu fui um intransigente adversário do espiritismo, mas me converti depois de ouvir, na extensão do telefone, um diálogo entre a minha neta, morta com pouca idade, e a mãe dela. Em 1923, no Salão da Guarda Velha, proferi um discurso expressando a minha conversão ao espiritismo.
-Você se disse o último dos helenos, em polêmica com os modernistas de 1922, e isso lhe custou caro. Segundo o acadêmico Arnaldo Niskier: “A vitória do modernismo se fez como se houvesse necessidade de abater um grande inimigo, no caso, Coelho Neto”.
-Mas se procurarem bem, encontrarão meus livros. - disse antes de partir.

terça-feira, 29 de abril de 2014

2598 - Os Dragões de Navarone



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4848                                    Data: 11   de  abril de 2014
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SABADOIDO DO ESTUPRO À REVOLUÇÃO
PARTE II

Luca chegou para mais uma sessão do Sabadoido perguntando pelo Vagner.
-Ele não telefonou, não sei se vem. - manifestou-se o Claudio.
E o Luca prosseguiu depois de depositar um envelope sobre a mesinha mais próxima dele cujo conteúdo não era difícil adivinhar: cartas da Rosa e seus recortes de jornais que merecem leitura.
-Vocês tomaram conhecimento dessa menina epiléptica que tinha mais de oitenta convulsões por semana?
-Anny Fischer.
-O nome não importa muito, Carlinhos; o interessante é que ela melhorou extraordinariamente com um derivado da maconha.
-O canabidiol.
-A memória do Claudiomiro está ótima; conseguiu guardar o nome.
Mal foi elogiado pelo Luca, saiu-se com uma piada infame:
-Será que a menina dá umas tragadas para se sentir melhor?...
-E criticaram tanto o Gabeira quando exaltou a cannabis sativa, dizendo que, com a planta, se fazia até sapato. – lembrei.
-Ele iria fumar o sapato. – não perdeu o Claudio a piada, arrancando mais risos dessa vez.
-E o capitão da Copa de 58, o Bellini, que morreu. – lamentou o Luca.
-Ele já vinha sofrendo do Mal de Alzheimer; a família doou o cérebro dele para estudos. – manifestei-me.
-Os cientistas desconfiam que há uma relação entre as cabeçadas na bola com essa doença.- interveio o Luca.
-Então, apesar de o Luca ter dito que tenho ótima memória, vou ter Alzheimer.
-Ora, Claudio, você não cabeceava tantas bolas assim. - discordei.
-Como não?... Pergunte ao Reinaldo (cunhado do Luca). E a bola que eu cabeceava era a G8 de couro, e não essa bola de hoje.
-Há muitos casos de boxeadores com Alzheimer; o que eles receberam de pancada na cabeça...
-É verdade, Luca; o Maguila, que é novo, está com essa doença.
-E continuei:
-Éder Jofre, por mais que batia, quando lutava, também recebeu golpes na cabeça e está doente.
-O Bellini, como zagueiro, por mais que cabeceasse aquela bola pesadona, principalmente molhada, de couro, não sofreu tanto quanto um boxeador. - disse o Claudio.
-Se falarem em Bellini com a Rosa, ela vai pensar que se trata do pintor italiano. - disso o Luca com um sorriso.
Aqui, um parêntese: os casos citados vêm sendo diagnosticados como Encefalopatia Traumática Crônica, e não Alzheimer.
A voz de baixo-barítono do Vagner soou do portão. Claudio se apressou em pegar o molho de chaves para franquear o quintal da casa para ele.
-A Celma o trouxe, Cumercindo?
-Sim, Luquinha. - respondeu-lhe o Vagner.
-E as obras na Chaves Pinheiro, Vagner, como você está lidando com ela?
-Pior é quando a obra é na nossa própria casa. Quando houve, lá em casa, a primeira a morrer foi a pequinês.
-Falando em pequinês, não se vê mais; foi até bom, pois os cachorros dessa raça são temperamentais. Agora, o que mais se vê são poodles.
-Mas há muitos poodles temperamentais, Carlinhos; uns fracos abusados. - retorquiu o Vagner.
-Com essas obras na rua, voltamos à Chaves Pinheiro sem trânsito; até daria para jogarmos vôlei, como nos velhos tempos, não fossem os buracos. - manifestou-se meu irmão.
-Lembram o bloqueio do Renato a uma cortada do Olavo; Renato caiu de bunda no chão xingando os gozadores?
 Às palavras do Luca, Claudio e Vagner, testemunhas da cena, riram com ele.
-E a pesquisa do IPEA sobre o estupro? - mudou o Luca de assunto.
-Um órgão como o IPEA, paradigma das pesquisas relacionadas com economia, metendo-se com estupros. - indignei-me.
-Saíram os técnicos e entraram os petistas. Por onde a corriola do PT passa, não nasce grama. - irritou-se mais ainda meu irmão.
-O pior é que eles estão, ainda não passaram. - observei.
-E erram; falaram que 65% dos brasileiros concordam com o estupro de mulheres com roupas ousadas, quando são 26%. - afirmou o Luca.
-Mesmo 26% é um número elevadíssimo. - acentuei.
Até então quieto, Vagner se manisfestou:
-Mas há umas mulheres que se vestem para o estupro...
-Ou que se despem para o estupro. - aparteou o Luca.
Tomei a palavra, pois pedi-la, no Sabadoido, é uma tentativa vã.
-Recordam-se que há pouco mais de um ano, o Gerald Thomas, o diretor de teatro, enfiou impetuosamente a mão por entre as pernas de uma mulher que estava com um vestido curto arrochado no corpo?
Não aguardei pela resposta e segui adiante.
-Ela, como era atriz, com ambições, provavelmente na carreira, não apresentou queixa. A mídia, ao noticiar o fato, não desancou o gesto tresloucado do Gerald Thomas. 
Claudio, talvez por enfaro por já ter falado sobre estupro, uma hora antes, mudou bruscamente de assunto:
-Luca, você não criticou o Caetano Veloso até agora, e ele bateu com o carro. - instigou.
-Ele bateu com o carro... Li essa crônica dele. - reagiu sem muito ânimo.
-Ele tem muito a aprender com você em matéria de direção. - provoquei.
-O Caetano aprendeu a dirigir muito tarde: 36 anos...
E concluiu o Vagner, apaixonado por carros, com mordacidade:
-Nessa idade não se aprende mais.
-Pela descrição que ele faz da batida, vê-se que poucas vezes ele dirige. - julgou o Luca.
-Dessa vez, ele não falou do filho. - comentou o Vagner.
-Se falasse era para elogiar.
-Luca, o Veríssimo e o Zuenir Ventura dedicam parte das suas  colunas para contar as gracinhas das suas netas, e o Caetano não pode falar do filho? - defendeu-o o Claudio.
Luca se desviou de mais uma polêmica infrutífera, e passou a tratar de uma citação errada da presidente, na matéria música popular brasileira, também mencionada pelo Caetano Veloso em uma das suas colunas dominicais.
-A Dilma disse que o “Samba do Avião”, do Tom Jobim descreve a chegada dos exilados ao Galeão. Como, se a música foi composta em 1962?
-Tom Jobim também tinha o dom do Nostradamus. - pilheriou meu irmão.
-A Dilma, vez ou outra, cita o Nélson Rodrigues e é uma lástima, erra tudo. - lembrei.
-Ela confundiu o “Samba do Avião”, do Tom, com o “Samba de Orly”, do Chico Buarque, Vinícius de Moraes e Toquinho. - disse meu irmão.
-O Caetano também aventou essa hipótese.
Mal o Luca se manifestou, ouviu-se a voz da Celma chamando pelo Claudio.
-Hora de eu ir embora. - ergueu-se o Vagner da cadeira.
Enquanto a esposa do nosso amigo o levava para a casa, nós voltamos a falar do canabidiol.





segunda-feira, 28 de abril de 2014

2595 - Os Canhões da Independência



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4845                                    Data: 06   de  abril de 2014
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SABADOIDO DO ESTUPRO À REVOLUÇÃO

-Já cometeu o seu estupro, hoje? - perguntou-me meu irmão sentado na sua cadeira de ler jornal.
-Ainda não, o metrô no sábado não costuma ficar lotado. - entrei no espírito da galhofa.
-O problema de assédio às mulheres é bem maior no metrô de São Paulo do que no Rio de Janeiro. - disse-me ele.
-Lembra-se, Claudio, que, em meados dos anos 60, o Oduvaldo, irmão do Olavo, dizia que viajava nos trens da Central só para se encostar nas mulheres?
-Claro que me lembro.
-Deu sorte de não encontrar uma Rosa Grieco pela frente, se não, levaria com um Dom Quixote no meio das fuças. Se fosse “Guerra e Paz”, ele iria a nocaute.
-Ela só viajava de trem da Central?
-Sim, Claudio; Rosa trabalhava no Itamaraty, na Visconde de Inhaúma e o seu transporte era o trem. Afirmou ela que gostaria de ser um mico de cauda preênsil para pendurar-se numa daquelas barras, e poder, assim, ficar com as duas mãos livres para ler.
-E você viu, Carlinhos, o IPEA divulgando uma pesquisa em que 66% das pessoas são favoráveis ao estupro das mulheres que vestem roupas ousadas?
Era uma pergunta retórica, pois foi adiante:
-Corrigiram, agora, para 26%.
-Claudio, um quarto da população ainda é muita coisa.
-Esse número não é, totalmente, de homens, algumas mulheres são a favor dos estupros, os “canhões”, com certeza. - observou. (*)
-Também lamentável foi o erro estatístico. - assinalei. O IPEA era um órgão sério, vinculado ao Ministério do Planejamento, que realizava pesquisas econômicas; agora, que passou para a Presidência da República, comete essas lambanças.
-Carlinhos, onde entram os petistas, você não pode esperar boa coisa. Para arrematar essa pesquisa, faltou a frase da Marta Suplicy: “Se o estupro é inevitável, relaxa e goza.” Seria o fecho de ouro da pesquisa desse IPEA.
-Nessa questão de estupro, temos de refletir. A sociedade está extremamente erotizada pela mídia; apareceram, por exemplo, os seios de uma torcedora, num estádio de futebol, quando pegava um celular, e ela se tornou uma celebridade.
-Sim, Carlinhos; essa brasileira que foi presa pelo Putin, porque foi realizar protestos ecológicos no Ártico, despiu-se agora para a Playboy.
-Recorda-se, Claudio,  daquela jovem do Movimento Sem-Terra que também posou para a Playboy. De Sem-Terra passou para Sem-Roupa?
-Quem está sem-roupa? - interrompeu-nos o Daniel com o seu ânimo travesso.
-O rei. - respondi.
-Carlão, quer andar de pedalinho na Lagoa?
-Daniel, 80% da minha energia para este sábado já se foram na caminhada madrugadora que realizei há três horas.
-Daqui a pouco, irei para lá.
-Vai pedalar com a sua amiga da Casa da Moeda? - tive a curiosidade.
-Não; a minha mãe irá comigo.
Deduzi, então, que os ruídos que eu ouvira, enquanto dialogava com meu irmão, advinham dos preparativos de mãe e filho para saírem.
-Vou pegar o carro. - anunciou.
O nosso diálogo foi, então, reiniciado, mas com outro assunto.
-Você viu o Almino Afonso, ministro do Trabalho do Jango, entrevistado no Roda Viva?
-Carlinhos, a televisão da sala, com os canais abertos, escangalhou.
-Ele se referiu a uma pesquisa do IBOPE que apareceu agora, 50 anos depois, que dava mais de 60% de apoio popular ao João Goulart.
-Deve ser uma dessas pesquisas iguais às do IPEA. - não perdeu a oportunidade para a piada.
-Inquirido, o Almino Afonso não soube identificar a entidade que contratou o IBOPE para tal pesquisa. - acrescentei.
-Falam dos militares, mas muitos civis contribuíram para o golpe de estado. - bradou.
-Sim; os três principais governadores participaram do golpe: Carlos Lacerda, Magalhães Pinto e Ademar de Barros. E o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, quando o João Goulart estava no Brasil, declarou o cargo da Presidência da República vago, sendo chamado de canalha, na frente de todos, inclusive repórteres, pelo Tancredo Neves.
E prossegui:
-Sou anti-Brizola, como todos sabem, mas, para mim, ele acertou em cheio quando afirmou que foram dois golpes, que houve um golpe dentro do golpe.
Meu irmão, apesar de brizolista, discordou.
-Apresentei, então, minhas razões para desconcordar com o que o Brizola declarara.
-Basta comparar o governo do Castelo Branco com os ditadores que o sucederam para constatar-se que houve outro golpe. Ele tentou implementar, entre outras medidas de caráter social,   o “Estatuto da Terra”, mas os latifundiários do PSD e da UDN, como o deputado Bilac Pinto, barraram a pretensão dele no Congresso. Ainda bem que o FGTS passou...
-Carlinhos, o Castelo Branco baixou o AI nº 2 que terminou com os partidos políticos, criando a ARENA e o MDB. -contrapôs.
-Claudio, ele sofria as pressões da linha dura das Forças Armadas; se não fizesse isso, Negrão de Lima não tomaria posse na Guanabara, e Israel Pinheiro, em Minas Gerais.
Como não se mostrasse convencido, aludi ao fato de o Castelo Branco ser uma liderança moderada, nas Forças Armadas e à sua morte suspeita.
-Falam que o Lacerda, o Juscelino e o Jango foram assassinados pela ditadura militar, fizeram mil investigações e nada foi provado. É puro delírio dos que se dizem preocupados com o bem-estar social, os esquerdistas. Por que não investigam a morte do Marechal Castelo Branco?... Pelo contrário, nem sequer falam dela. 
Nesse instante, surgiu a Gina pronta para o passeio na Lagoa Rodrigo de Freitas.

(*) Canhões, no sentido utilizado e segundo pesquisa do Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO, também é aplicável o termo “dragões”. Recentemente foi veiculado que o navio Dragões do Mar foi inaugurado com pompa, circunstância e exatidão pelas senhoras Maria das Graças Foster e Dilma Rousseff.