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quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

3094 - FM Valsa de Uma Cidade

O  BISCOITO  MOLHADO
Edição 5354 FM                           Data: 1 de março de 2018

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXV


RIO, MAIS UM ANO!

É hora de esquecer as mazelas que tumultuam a vida da cidade – os assaltos nas ruas, as balas perdidas, os bandidos do tráfico de drogas, o povo amedrontado, os assaltantes da coisa pública para tornarem-se ricos da noite para o dia, os tais que envergonham a cidadania com as trapaças da Operação Lava-Jato, pois hoje é dia de festa,  quando se deve celebrar o aniversário desta cidade espetacular, com uma epifania  em homenagem  ao Rio de Janeiro,  que merece todos os mais festivos cantos.
  
“Rio de Janeiro
                            Gosto de você...” 
    
   É ler cantando, que a cidade é um encanto, louvada em canto pelos poetas, prosadores, seresteiros, cantadores e boêmios, encantados pela magia que confunde, transforma, extasia, é só alegria, dia e noite, em todos os meses, o ano todo. E agora, mais ainda, que tudo é festa, para comemorar honrosos 453 anos de fundação, desde que aqui chegou o capitão-mor Estácio de Sá com seus 150 expedicionários, vindos de Portugal para recuperar a baía, tomada 10 anos antes por 500 franceses e 20 mil índios, seus aliados, no dia primeiro de março de 1565. Ele desembarcou no istmo entre o Morro Cara de Cão e o Pão de Açúcar, logo ali, diante das praias do Flamengo e de Botafogo. De uma paliçada defensiva armada, o fundador enfrentou os franceses, liderados por Nicola Durand de Villegagnon, que se haviam estabelecido com a pretensão de fundar a França Antártica, uma colônia, e a cidade de Henriville. Aliaram-se aos Tamoios, conhecidos como Tupinambás, expulsaram os Temiminós, que fugiram para outras plagas e baixaram em terras do vizinho (hoje Espírito Santo), território sob domínio português, com os quais fizeram  uma aliança,  que culminou na derrota dos atrevidos e enxeridos franceses.

 Daí, surgia na baía da Guanabara a Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Um pouco mais da história conta que antes, lá pelo ano 1000, a maior parte do litoral do Rio de Janeiro foi invadida pelos povos de língua Tupi, vindos das lonjuras da Amazônia. Chegaram, terão gostado do clima, expulsaram os Tapuias. Para esclarecer sobre as tribos, é bom dizer que, no início do século XVI, o território do Rio de Janeiro era dominado, em sua maior parte, pela tribo dos Tupinambás, também, chamados de Tamoios, que ocupavam a aldeia carioca. Os Tupinambás eram maioria, apareceram de surpresa detrás de Paquetá, liderados por Guaixará, principal de uma aldeia de Cabo Frio, formavam uma tropa que ocupava entre 80 e 180 canoas. Cercaram os portugueses, que eram minoria e logo viram que iriam ser derrotados e mortos, caso não recebessem socorro. Conta a lenda que, em 13 de junho de 1566, São Sebastião teria visitado o Rio de Janeiro, poucos o viram, senão alguns índios Tupinambás, durante a chamada Batalha das Canoas. O Rio era ainda a vila velha, uma paliçada incrustada entre o Pão de Açúcar e o Morro de São João, onde havia um casebre que fazia as vezes de Igreja de São Sebastião. De lá saiu uma canoa pela baía, levada por Francisco Velho, responsável pelo casebre, que logo foi cercado, a luta entre índios e portugueses se desenrolava. De uma das canoas explodiu um barril de pólvora. A explosão aterrorizou a mulher de Guaixará, que soltou um grito, todos fugiram, foi um verdadeiro milagre, a batalha chegara ao fim.  Depois, quando os portugueses já haviam vencido, alguns perguntaram quem teria sido aquele soldado ataviado em uma armadura, que saltava de canoa em canoa, lutando ao lado dos portugueses. Entre as poucas testemunhas, uma delas conhecida: Martim Afonso de Souza, o Arariboia.

Tenha ou não sido apenas lenda, no dia 20 de janeiro, o santo foi  transformado em Padroeiro da cidade. Durante o século XVII, a cidade passou por desenvolvimento urbano, que contava com uma modesta rede de ruelas, as quais davam às igrejas, ligando-as ao Paço Imperial e ao Mercado de Peixes, à beira do cais, na hoje Praça XV.  Dali, aos poucos, foram surgindo novas ruas, o número de habitantes aumentava, chegando a 30 mil, na metade do século. Hoje, segundo o Ibge, são 6,5 milhões. Com o desenvolvimento da economia, mormente devido à indústria do açúcar, a cidade passou a ser a mais populosa do país, ganhando importância fundamental para o domínio colonial, mais ainda com a chegada da Corte Portuguesa, com d. João VI, em 1808.
 


sábado, 17 de fevereiro de 2018

3093 - FM Intervenção já!



O  BISCOITO  MOLHADO
Edição 5353 FM                           Data: 17 de fevereiro de 2018

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXV


NOVOS CAMINHOS



    Vou enveredar por novas sendas, esperando não encontrar pedras no meio do caminho, em que tropece, desorientado, carregando o peso de idade provecta e possa chegar sem percalços são e salvo ao destino: a Padaria onde se produz a massa que alimenta o cérebro, que é a alma.  Pelo atrevimento, espero não sofrer uma indigestão nesse caminhar onde tudo acontece em extrema velocidade. É a Era Digital, da Globalização, da Supertecnologia nas comunicações.
  
    O mundo encolhe, está à mão e à vista, o futuro é agora. O que vier adiante, não será surpresa, ao se reconhecer que, por mais juntos que estejamos uns dos outros, vivemos apartados, satisfeitos com o que vai e vem via Internet. A Cultura, que o dicionário traduz como atividade e desenvolvimento da intelectualidade, o saber ou a instrução,– isso quando se trata  da ilustração  do espírito,  é o assunto em pauta.

     Há mais a dizer, porém o dito já é suficiente, para citar apenas o complexo dos padrões comportamentais.  Nesse item, a coisa complica. Fica difícil entender, para poder explicar. É de estarrecer o comportamento de certos “Alguéns” instalados nas elevadas cúpulas do Poder e ao seu derredor. Para não ir longe  em divagações e ficar perdido nas digressões filosóficas, o que se tem visto é a mais extrema falta de caráter de certos cidadãos e cidadãs, de nada ilibada conduta – estão assaltando os cofres públicos, invadindo as estatais, num verdadeiro arrastão de delinquentes chinfrins, metendo as mãos nas burras públicas, levando o que o popular chama de propinas, suavizando a terminologia da apropriação indébita, ou seja, roubo descarado. É lamentável o que acontece, com a desculpa de que é tradição, vem dos velhos e carcomidos tempos coloniais. Que seja, não terão inventado nada, a não ser a o uso de artifícios modernos. São tão canalhas como os de antigamente, ponto parágrafo. É possível que tenham pensado, com seus botões e suas adoráveis companheiras, que poderiam viver à larga, pelo facilitário do Caixa 2,  que lhes facilitou o uso de joias caras, de ternos de grife feitos sob medida, para ligeiro disfarce da barriga já passando dos limites, alimentada por comidas exóticas, vinhos refinados, servidos com requinte, em restaurante de alto luxo, coisa de dar inveja a potentados. Por enquanto, estão sofrendo a desdita dos malfeitos, cumprindo confinamento no “resort” de Bangu, alguns amargando a companhia de meliantes chinfrins, que, comparando-se uns e outros, constata-se que são todos da mesma laia (Uff!). Como já estando caindo na real, partiram e outros seguirão o mesmo roteiro, sem outra solução, senão abrirem o bico, isto é, negociarem “delação premiada”, revelando as falcatruas bilionárias, de si próprios como dos companheiros e companheiras de safadeza. Embora, no íntimo, estejam na expectativa, quem sabe, de uma anistia ampla, geral e irrestrita, vinda de quem tem o Poder, embora muitos estejam também enredados nas teias da roubalheira. Todos se dizem inocentes, de nada sabiam, consideram-se perseguidos pela imprensa e por “inimigos” políticos e invejosos. Em suma, uma canalha só, um bloco dos sujos, metido num beco sem saída.
   
     O assunto pretendido seria, como o é, Cultura, porém o que foi dito, numa extrapolação de catarse, pode ser, no final, uma verdadeira explosão atômica. Para completar, vale dizer que a Cultura teria surgido no princípio da Era Paleolítica, quando o homem passou a ser capaz de transmitir os modos de conduta não herdados geneticamente e usado o intelecto para descobrir o que terá surgido e transformado o mundo. E as transformações continuam a uma velocidade  descomunal. A cada minuto tudo se altera, o que virá, pode ser de estarrecer. Será que estamos preparados?






quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

3092 - FM Os Jetsons



O  BISCOITO  MOLHADO
Edição 5352 FM                           Data: 15 de fevereiro de 2018

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXV


NOVO MUNDO
           

O  mundo de amanhã já está chegando, faltam apenas alguns milhares de anos para que a Terra seja “descoberta” pelos extraterrestres e que os terráqueos do futuro se aventurem pelo espaço, se façam conhecer e sejam novidades lá  para  os de outra galáxias. Por enquanto, só há, mesmo, especulações e pretensões científicas.
    
    Convém lembrar que há pouco foi lançado ao espaço um carro vermelho para ser encontrado daqui a, quem sabe, um milhão de anos, pouco tempo, mesmo traduzindo-se esse tempo em anos-luz mas, de lá para cá, atravessar   a escuridão do Universo, isso seja café pequeno para os extraterrestres, que poderão encontrar esse Tesla Roadster perdido no espaço, levando uma placa metálica onde está escrita mensagem de efeito: “Feito na Terra pelos humanos.” Pela pretensão expostas, os de cima deverão estar aprendido em outras línguas, principalmente o inglês. Em outra mensagem, extraída de livro de ficção científica “O mochileiro das galáxias”, uma expressão de paz: ”Não entre em pânico.” O  mochileiro  “fake” sideral sentado ao volante do belo carro vermelho, vestido como um astronauta, chama-se Starman, tem o dom de escutar uma canção de David Bowie que diz poeticamente que “Há um homem das estrelas esperando no espaço.”

  Tudo muito bem bolado. Eles, os extraterrestres, deverão reunir linguistas, matemáticos, argutos interpretes conhecedores de semiologia e poderão passar alguns séculos para compreender as mensagens dos também argutos terrestres e ficar satisfeitos de encontrarem por aqui um verdadeiro paraíso, ambiente de povos fraternos unidos, sem guerra, sem armamentos nucleares de arrepiar, sem poluição, verdadeiros irmãos em pensamentos, palavras e obras, sem ladrões, sem corruptos de alto nível governamental nem na raia miúda, sem assaltantes chinfrins, sem facções criminosas que dominam o ambiente com drogas e propinas, para ter o direito de agir livremente, com segurança total, e muito mais - hospitais sem filas, gente sadia, sem doenças modernas ou as já esquecidas, que estão voltando e matando  “De vagar, de vagarinho”, como diz a música do lá da Vila.

   Por enquanto, tudo é escuridão lá por cima. Mas, daqui a uns milhões de anos, quem sabe! Quando tudo estiver nos eixos por aqui, o que for encontrado deverá encantar os extraterrestres ou, tudo depende, estarrecidos com coisas tão insignificantes  como as que estão sendo enviadas  para o espaço, até agora, como o grande feito da Nasa, em 1972, ao despachar duas naves, Pioneer 10 e 11, com mensagens escritas em placas metálicas para serem traduzidas e entendidas por outras civilizações. Cinco anos depois outras duas naves subiram sem destino, a não ser a possibilidade de um encontro sensacional, ao serem ouvidos ou lidos o que consta do pequeno mas evoluído conteúdo em disco de ouro com informações e mensagens dos seres humanos de elevado conhecimento científico, um desenho de um homem e uma mulher nus, com indicações matemáticas de onde teriam partido, levados pelas Voyager I e II, nesta com o casal já vestido, para não causar espanto aos pundonorosos extraterrestres. Outro disco (que terá de ser descoberto como poderá ser ouvido),  há sons da natureza e a canção “Johnny Goodie”, cantada pelo roqueiro Chuck Berry. Tudo bem elaborado e arquitetado, se os extraterrestres,  em vez de “siderados” com o distinto casal e encantados com a música   resolvam descer à Terra para mostrar o que terão feito enquanto eram por aqui apenas imaginação dos felizes terráqueos com seus carros e música de roque, vão provocar, no mínimo, um choque de civilizações. Podem desembarcar de suas naves trazendo veículos ultramodernos, de causar espanto, e bandas de música de entontecer os modestos ouvintes do nosso planeta. Por enquanto, o carro vermelho enviado pelo empresário sul-africano Elon Musk como mostra de alta tecnologia de transporte, não passará de inútil propaganda e um gesto fútil de quem tem grana para gastar à toa. Mas, questão de gosto não se discute. O que for encontrado por aqui, será decepcionante, coisa que considerarão do “arco da velha”, e, se tiverem paciência e disposição, vão ter muito o que ensinar.  





segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

3091 - SX Nota preta pra todo lado



O  BISCOITO  MOLHADO
Edição 5351 SX                           Data: 12 de fevereiro de 2018

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXV


TEM QUE TER SACO

Um dia como outro qualquer. Começa com o café da manhã ao som da Rádio CBN, acompanhado pela leitura de "O Globo". Dois hábitos que, um mínimo de reflexão, de bom senso, deveriam me conduzir a abandonar.

A CBN surgiu duas décadas atrás, com um jeitão de promissora novidade. O rádio, então, já caía pelas tabelas. Programas voltados para a pregação religiosa ganhavam cada vez mais espaço. A pauta musical se deteriorava a olhos vistos, dando início a uma escalada que resultou no panorama assustador que prevalece nos dias de hoje. Os refúgios eram a MEC e a Jornal do Brasil. Mentes doentias podiam optar pela "Patrulha da Cidade", programa policial transmitido pela Rádio Tupi.

O surgimento de uma estação voltada para a divulgação de notícias, repito, parecia ser um bom sinal. E foi, durante algum tempo. Hoje, a coisa segue ladeira a baixo. A CBN ainda conta com bons cronistas e também com "âncoras" de grande categoria. Mas está infestada de estagiários fraquíssimos, que a prudência recomenda manter afastados de um rádio de pilha, quiçá de um microfone. Cronistas há, também, dedicados a temas completamente desinteressantes, quando não incompreensíveis.

Essa programação matinal conduz à depressão e, em dias especiais, à loucura. Começa com um panorama dos assaltos, crianças vitimadas por balas perdidas e PMs assassinados. Atenção especial também é dedicada às condições do trânsito. O tal do WhatsApp é uma desgraça. Os ouvintes, especialmente os motoristas, são incentivados a entrar em contato com a CBN para relatar o que está acontecendo em seus deslocamentos. Informam que estão engarrafados na Linha Vermelha, na Ponte Rio-Niterói ou no Túnel Lagoa-Barra. Como se isso fosse uma grande novidade. Por vezes, um colaborador mais intrépido resolve passar para a rádio uma notícia bombástica : "Alguns pingos de chuva começam a cair na Praça da Bandeira!" O recorde de babaquice foi batido recentemente. Semanas atrás, a CBN dedicou imenso espaço a um cão que estava transitando na Ponte Rio-Niterói. O evento foi sobrevoado por um helicóptero e motivou uma dezena de intervenções do repórter. Haja emoção!

Ainda impactado por esse besteirol, fiz a opção de destruir meus neurônios com a leitura do Globo. Infelizmente, foi o jornal que sobrou. "Jornal do Brasil",  "Correio da Manhã", "Última Hora" e "Diário de Notícias" são coisa do passado. Nos bons tempos -essa é uma expressão que não paro de repetir- meu pai cantava uma ópera no Municipal e, no dia seguinte, saía à cata dos jornais que fariam a apreciação do espetáculo, encargo confiado a críticos de altíssima categoria: Renzo Massarani, Andrade Muricy, Magdala da Gama Oliveira, Marques Porto... isso desapareceu. Faz poucas semanas, o mundo da ópera perdeu o extraordinário barítono russo Dmitri Hvorostovsky, jovem, em plena forma, vitimado por um tumor cerebral. Repercussão imensa, no mundo todo. Sobre o assunto, "O Globo" não deu uma linha.

Certamente, impactado pela crise cultivada pelo "Poste Dilma", o jornal está minguando. Cada vez com menos páginas, se aproxima das publicações gratuitas distribuídas nas estações do Metrô. Esse espaço reduzido poderia não resultar necessariamente em mau gosto e falta de discernimento, o que está acontecendo. Não há espaço para anunciar a morte de um grande artista lírico da atualidade. Ele é todo tomado pelo bloco da Preta Gil, pelas idiotices que envolvem o casal Neymar e Bruna Marquezine, pelas aparições da Gretchen no "Domingão do Faustão" e por cronistas que o livro dos recordes destaca no quesito "Coisas idiotas a dizer".

Abandono o jornal, naquele dia especialmente voltado para as maravilhas do mundo LGBT. Busco socorro na televisão. Entendo que sou um privilegiado, que paga uma fortuna à NET para ter acesso a centenas de canais. Ledo engano. Não há nada o que assistir. No Multishow, como sempre, música de arrepiar os cabelos. Um monte de programas culinários, crianças chatíssimas cantando num tal "The Voice Kids" e programas de humor que servem para lembrar o quanto eram talentosos o Chico Anysio, o Walter D´Ávila e a Nádia Maria. O "grand finale" é uma mulher horrorosa, mais feia que o dragão de Komodo, esclarecendo dúvidas sobre práticas voltadas para o sexo selvagem.

Sou salvo pelo telefone. Quase salvo, melhor dizendo. Tratava-se da primeira das dezenas de ligações que recebo diariamente, ofertando o "chip" da OI, o limite que posso acessar no crédito consignado ou as maravilhas de um plano de auxílio funeral. Cumpridas as imprecações que sempre transmito a essa corja, imagino que os consultórios dos proctologistas estejam botando gente pelo ladrão.

Feitos meus xingamentos, sou alertado por minha mulher para a necessidade de pagar o plano de saúde, que vencia naquele dia. E também fazer uma breve incursão ao supermercado.

Não posso contar com a ajuda da Beth, abalroada que foi no domingo por uma skatista que "voava" na faixa de pedestres da Avenida Atlântica. O acidente aconteceu no momento em que ela se viu obrigada a desviar de um ciclista que ali transitava a 100 km/h. O que é proibido pelos regulamentos em vigor. Possivelmente mais preocupados em se bronzear, disso não tomam ciência os guardas municipais. O que conduz à permanente repetição da pergunta que vale um milhão de dólares: "Afinal, para que serve a Guarda Municipal?"

Não serve, por exemplo, para evitar que a entrada do supermercado se assemelhe a um acampamento do MST. O que, de resto, acontece em todas as marquises de Copacabana.

Constato nas minhas compras que meu biscoito recheado favorito, praga dos gordinhos, sofreu uma nova redução de peso. É a terceira ou quarta vez que isso acontece, o que também se aplica especialmente às barras de chocolate e às caixas de bombons. Por gentileza, poupem-me de responder se aconteceu uma redução proporcional no preço desses produtos.

Em consequência, chego pré-emputecido ao Itaú para pagar o tal plano de saúde, reajustado segundo um percentual dez vezes maior do que aquele concedido aos aposentados. Sou um cara bacana, minha agência é "Personnalité". Talvez por isso deva enfrentar no caixa uma fila descomunal. O Itaú divulga um lucro de 24 bilhões de reais, não suficiente para contratar funcionários que atenderiam à multidão que está à minha frente. Mas só eu estou furioso. A idade média dos meus companheiros de fila é de 106 anos. Eles conversam animadamente. Penso que fazem seus pagamentos e depósitos e, depois, voltam para o final da fila. Só eu, jovem sexagenário agitado, permaneço furioso.

Retorno ao lar. Preciso a todo custo me acalmar. Projeto inviabilizado pela Beth, com duas informações relevantes: verão do Rio de Janeiro, ar condicionado sempre ligado, a conta de luz, por conta das trapalhadas do "Poste" , foi para a casa do chapéu. Recebo a informação número dois, referente ao IPTU. Sobre o assunto, não vou falar nada, tenho especial apreço pelas coronárias dos leitores do "Biscoito Molhado".

Chego ao final dessa gloriosa manhã disposto a pular pela janela. Desisto do projeto, Beth observa que as telas que instalamos em todas as janelas do apartamento por conta dos nossos netos custaram uma nota preta.



segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

3090 - FM cabeluda



O  BISCOITO  MOLHADO
Edição 5350 FM                           Data: 5 de fevereiro de 2018

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXV

 OS PELINHOS (modificado)
                  

Meu amigo J. já  está na chamada terceira idade mas ainda em pleno (quase) vigor, equilibrando-se corajosamente no corpo de uns 70 quilos, 1,75m de altura, que vai diminuindo conforme o avanço da idade, já além dos 70 anos, equilíbrio mantido à custa de constantes exercícios físicos pela manhã, completados com longas caminhadas à beira mar, no sofisticado Leblon onde os mais ricos se deleitam, com o que a sorte lhes deu ou, de outro modo, o que a falta de caráter  lhe proporcionou, abrindo-lhe as portas das trapaças, metendo a mão nas burras das empresas governamentais, em conluio descarado com empresários inescrupulosos, que pagam à vista o que tiram dos superfaturamentos nas obras realizadas.
O detalhe, para ele, não tem importância, que disso cuide a Justiça,  que tem os aplicativos merecedores. Para o meu amigo, importa apenas o bem bom da vida que leva, sem atribulações, vai levando sem pensar no futuro. Isso ele faz com prazer,  pois é quando consegue estar só, isolado do mundo, para pensar e criar histórias. Sempre nos encontramos nos fins das tardes calorentas, para discutir as misérias do mundo, durante dois ou três chopes gelados. É um consolo e um conforto para nós ambos, durante agradáveis momentos de relembranças. Vale a pena, porque sempre me divirto com suas histórias, não sei se inventadas ou se terão sido acontecimentos verdadeiros. Pois hoje é dia, aí vem ele neste lusco-fusco de pleno Verão.
- Eis que chega o varão do Verão!
- Olá, meu caro, tudo bem, por aqui?
- Como sempre. Abanque-se, que seu chope está chegando...
- Ótimo, é dele que preciso.
- Saúde!
-Tim tim.
- Sem falar em política, sem mencionar a vida agitada, os assaltos, a crise de moral, e por aí vai, que o rosário de maldades é interminável.
- Sinal dos tempos, meu caro. Mas tudo acontece como se fosse programado. É o “Eterno Retorno”, do  filósofo.
- Você acredita?
- Claro! De um modo ou de outro, tudo se repete, na vida. Pelo menos nas minhas lembranças. O mundo gira, a bolinha cai sempre no mesmo lugar... ou quase. A propósito,  neste exato momento, a minha memória me leva de volta a 52 anos passados.
- E o que houve, nesse dia?
- Algo que aconteceu, de que sempre me lembro  e  do que jamais comentei com alguém. Cumpri na risca, uma promessa.
- Posso saber?
- Pode, sim. Mas não me pergunte o nome do santo ou melhor da santa, que é segredo.
- Alguém que eu conheça?
- Não posso dizer. Do nome, vai apenas a primeira letra: L.
- E o que aconteceu com essa Luíza?
- Não é Luíza nem Laura, é Lindinha, como eu a chamava carinhosamente. Era linda, belo corpo, longos cabelos e olhos castanhos, pele muito clara, fina, suave...olhar terno, simpática, um encanto de pessoa.
- E o que houve com a sua Lindinha?
- Vou contar tudo, desde o começo, para ir remoendo nos neurônios o que se passou entre nós.
- Mais um caso de amor...
- Apenas um caso.
- Diga lá!
- Era uma jovem entrando nos seus 18 anos,  como já disse, lindinha, amiga da família desde há muito tempo. Tudo aconteceu por acaso, não sei explicar se obra do destino, ou... sei lá. Eu já estava casado há uns três anos.  Pela amizade, visitava a L. e sua irmã, casada, cujo marido saiu dos trilhos, passou a mão na cunhada, levou um tapa com a advertência de  que jamais repetisse. O caso caiu no esquecimento, mas logo a cunhada conseguira um bom emprego, disse à irmã que ia “dar uma folga”, decidira morar com duas outras colegas de trabalho. E Foi. Geralmente nos encontrávamos nos fins de semana, íamos ao cinema, até que um dia desses, ela chegou à porta e me recebeu com um lindo sorriso, docemente perfumada, abracei-a e dei-lhe um beijo.
- E ela?
- A surpresa foi tão grande que quase desmaiou.
- Repeliu?
-Não. Segurei-a pela mão, saímos como se nada houvesse acontecido.  No cinema, durante o filme, dei-lhe mais deliciosos beijos.
- E aí?
- A história é longa, vai para mais de três anos de duração.
- De beijos e...
- Nada mais. Jamais comentamos o que vinha acontecendo. Eram momentos deliciosos. Nunca pude imaginar o que estava acontecendo. E acontecia aos sábado e  às vezes, também aos domingos. O cinema era o recanto preferido.
- E você nunca ousou ir um pouco além?
- Não tive coragem, a não ser vez ou outra, um pouco de ousadia, quando ela permitia deixar que o seio pequeno, de pele fina e veias azuladas, pelo sangue quente que o tornava intumescido, coubesse na palma de minha mão, penetrada suavemente por sua blusa. O calor que dominava nossas emoções era maior que a tentativa do controle do pudor. Faltam-me palavras para descrever os breves e deliciosos momentos que continuam nas minhas doces lembranças, ainda encantado pela sensação do leve carinho entre meus dedos, que sinto como se fosse hoje. Além disso, os beijos eram tão deliciosos que satisfaziam os nossos sentimentos. Aliás, ela era virgem. Talvez por isso...
- Três anos de beijação!
- É como lhe digo. Até que... aí é que vem o inacreditável. Um dia, ela estava só, em casa, quando cheguei.
- Entra, espera um pouco.
- Entrei,  uns dez minutos depois ela surgiu envolta numa toalha, saíra do banho...
- Aí deu-se o imbróglio...
- O quê?
 - ... Você endoidou!
- Quase. Aproximei-me, dei-lhe um longo beijo, passei a mão por seu belo corpo, tentei ir adiante ela afastou-se um pouco, disse “Não”, estranhei, perguntei por quê, e ela:
- É que vou casar.
- Como?
- Verdade. E hoje é o nosso último encontro.
- Então, me dá um presente.
- Depende...
-  Uma lembrança
Ele enrolou-se novamente na toalha, perguntou o quê, e eu, cinicamente:
     - Quero uns pelinhos para guardar.
    Ela sorriu, apanhou uma tesoura, cortou  um pouco, pôs numa caixa de fósforo e disse: “Um pouco de mim, guarde para sempre, jamais comente com quem quer que seja. Promete? “ Eu respondi que sim, ela disse “ jure”, jurei. E guardei a lembrança.
- E daí?
- Despedimo-nos...  e os anos se passaram.
- Nunca voltaram a se encontrar?
- Nunca mais. Uns dois meses depois, houve   o seu casamento com o gerente do laboratório farmacêutico  em que trabalhavam. Conheceram-se, em pouco tempo aconteceu.
- E depois?
. Em casa, colei fita plástica, guardei o presente até ontem. Era a data do seu aniversário, apanhei a caixa do meu segredo, a Caixa de Pandora. Era apenas um segredo que tinha em volta muitos segredos, parte da minha vida e da dela, a L. que alimentou meus sonhos por três anos e por mais 52. Não resisti, telefonei:
- Olá, Sabe  quem está falando?
- Claro!
- Parabéns.
- Obrigada.
- Você se lembra?
- Lembro-me e tudo.
- Sente saudades?
- Não sei, talvez.
- Você é feliz?
- Penso que sim. Sou religiosa, sou abençoada, acho que tenho sido feliz. E você?
É difícil definir o que seja felicidade. Para o filósofo Aristóteles - se você permite a citação, a felicidade é o maior desejo dos seres humanos. E a melhor maneira de ser feliz é através da virtude. Cultivando-a, alcança-se a felicidade. Francamente não sei se fui uma pessoa virtuosa. Mas, pelo que alcancei ao longo dos anos, não tenho o que reclamar. Terei sido feliz, pois consegui, a duras penas, realizar muitos dos meus sonhos.
- Eu também, disse ela.
Perguntou pela minha mulher, disse-lhe que havia morrido três dias depois do seu casamento.  Teve um problema cardíaco. Ela disse que lamentava muito, fez uma peque pausa,  deu um longo suspiro, disse: “um beijo”, deu tchau e desligou.
- É o que eu sempre digo, as mulheres são um grande mistério.
- Concordo.
-Sua mulher, não desconfiou?
-Jamais desconfiou, não terá visto a caixa. Devo dizer que fomos felizes, sempre. Dela tenho saudades, como também da Lindinha, que encantou meus sonhos.
- E a Caixa de Pandora?
- Logo depois do telefonema, queimei-a.
- Abriu-a?
-  Hein?
- Viu novamente os pelinhos?
- Meu caro, aqui vale recordar o poeta francês Félix Arvers:
“Mon âme a son secret,
   ma vie a son mystére.”
 - Interessante, mas acho que ficaria melhor, o contrário: "Mon âme a son mystére..."
 - É verdade, mas isso fica por conta dos mistérios e dos segredos da vida.
 - É isso. Então, vamos ao nosso penúltimo chope, que o tempo passa…
 - E as lembranças ficam!