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quarta-feira, 30 de novembro de 2011

2053 - de táxi pelo mundo

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3873 Data: 29 de novembro de 2011

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DEPOIS DO METRÔ, O TÁXI

Há quem não goste dos taxistas porque eles recolhem os seus táxis quando chove (*) e há aqueles, mais empedernidos, que chova, ou faça sol, os rejeitam. Por quê?... Na Primeira Guerra Mundial, com o exército alemão às portas de Paris, os taxistas, conduzindo os seus veículos da marca Renault, levaram milhares de soldados para a linha de frente e contribuíram para a vitória dos aliados (**). Fato histórico que já aludimos em algum Biscoito Molhado de antanho.

Como são trabalhadores e, às vezes, heroicos, não devem passar despercebidos pelos observadores da alma humana, tento, por isso, lê-los, seguindo o ensinamento de Darcy Ribeiro que dizia que devemos ler pessoas.

Depois de descer a última rampa da estação do metrô de Del Castilho, não tive dúvida: a corrida se daria no carro do Botafoguense. Ele já me aguardava com a porta do carro aberta. Olhei-o de relance e percebi que guardava semelhanças com Paquito de Rivera, um destacado músico de Jazz; a mesma cara rechonchuda, o cabelo com fios curtos e um corpo que faz o ponteiro ir de 0 a mais de 95 em menos de 5 segundos (o ponteiro da balança e não do carro, evidentemente, pois o veículo do Botafoguense sobe a ladeira da rua São Gabriel com alguma dificuldade).

Mal encaixei o cinto de segurança na cintura, ele expressou todo o seu desgosto pelo time do Botafogo no campeonato brasileiro.

-É para não ter essas decepções que não assisto a mais jogos de futebol, na televisão. - menti.

-Eu tenho ido até ao Engenhão. - arrependeu-se.

-Vejo até pesca, mas nada de futebol.

-Eu já pesquei muito, mas não havia, naquela época, a poluição que há hoje. - manifestou-se.

-Um amigo do Tom Jobim contou que, ao vê-lo de vara de pescar na mão, lançou mil elogios aos sabores dos peixes; surpreendeu-se com a reação do compositor, que disse que não suportava o gosto de peixe.

-Por que ele pescava, então?- indagou o Botafoguense.

-Foi a mesma pergunta que esse amigo do Tom Jobim fez antes de descobrir que há pessoas que pescam, não para comer, mas para relaxar. Pescar é ótimo para o estresse.

-Haja paciência para esperar o momento em que o peixe vai decidir morder a isca. - disse ele.

-Estive no início do mês no porto de Itaguaí e lá se encontra uma fábrica mineira, falida, que tinha, na sua produção, metais pesados, como cádmio, chumbo, mercúrio, entre outros. Quando vêm as enxurradas de verão, esses metais vão para o mar, a Baía de Sepetiba e alguns entram goela adentro dos peixes.

-E nós comemos esses peixes.

-Esse passivo ambiental no porto foi, agora, encapsulado, mas ainda persistem os riscos. Um fiscal de Itaguaí, disse-me que só come dourado e peixes de alto mar e falou que o nosso organismo absorve o cádmio como se fosse cálcio, trazendo essa toxidade para os nossos ossos.

-E a sardinha?- estremeceu o Botafoguense.

-Ele disse que apareceram peixes-espadas na Baía de Sepetiba, e como a sardinha está na sua cadeia alimentar...

-Nem posso mais tomar a minha cerveja com sardinha! - queixou-se, enquanto parava o táxi na Rua Modigliani.

Na terça-feira, a corrida foi com o 081. Fez um estardalhaço, no seu inconfundível sotaque lusitano, quando me viu. Ao percebê-lo, veio-me à mente um comentário, feito particularmente para mim pelo Flamenguista, sobre ele: “Vá viver, vá viver com esse dinheiro todo...”

Mas 081 foi trabalhar. Quando pisou a embreagem para passar a primeira marcha, notei que calçava sandália; perdeu um dedo do pé, por causa da diabetes, e o sapato passou a incomodá-lo. No horizonte, surgiram as nuvens negras.

-Você acha que chove?

-Vai chover, porém mais tarde. - respondi.

-O chato é quando vai chover e um passageiro pede para ir aonde Judas perdeu as botas.

Com essas palavras, entendi a razão da alegria quando percebeu que eu seria o seu passageiro.

-Já imaginou pegar um temporal longe de casa?

Não respondi, ao notar que passaríamos pela igreja, e antecipei-me:

-A igreja do Padre Rolim.

-Você sabia que o falecido Padre Rolinha era cachaceiro?

-O senhor me disse numa dessas corridas no seu táxi.

-Ele bebia muita Pitu. - bradou.

-Padre Rolim frequentava a casa do meu tio...

-Valtinho?!...

-Valtinho, não, meu tio, que morou aqui no fim da década de 60.

-Pensei que você tinha falado no Valtinho, que era o garoto que levava a garrafa de Pitu do armazém para o Padre Rolinha.

Pode dizer, 081, que esse armazém era uma das suas propriedades. - pensei, mas sem me manifestar.

-Modigliani. - gritou.

Na quarta-feira, entrei no carro do 017.

-Choveu bastante esta noite. - comentou.

-Esta manhã também, pois eu estava no porto do Rio de Janeiro, e tive de percorrer aquilo, com uns colegas de serviço, abrigados num carro, tanta era a chuva.

-E o porto? - mostrou curiosidade.

-Está melhorando; alguns armazéns foram reformados e existe limpeza no cais, o que não se via antes.

-Eu ouvi no rádio que morreu uma americana num cruzeiro marítimo. - manifestou-se um tanto timidamente.

-O gerente das Docas do Rio de Janeiro, que nos recebeu, disse que é comum o porto receber dois ou três cadáveres desses cruzeiros, pois a média de idade dos passageiros é por volta de 65 anos. No caso de hoje, porém, a mídia estava lá, aguardando...

-Por quê?

-Porque houve mais de setenta casos de problemas de gastrenterite na embarcação e não avisaram às autoridades sanitárias.

-Então, não foi só a morte da americana?...

-Esse cruzeiro, segundo o gerente das Docas, saiu de Nova York no início de outubro, passou pelo Chile, pela Patagônia, foi ao Caribe, desceu de novo pela América do Sul. Há alterações climáticas, repercussões na alimentação, o ambiente fica doentio. Esse gerente citou uma médica sanitarista da ANVISA que afirmou que uma viagem dessa não deveria durar mais de quatro dias.

Tagarela, prossegui:

-Também foi interessante que, na sede administrativa das Docas do Rio de Janeiro, tivemos de subir quatro lances de escada. Deparamo-nos com um corredor de uns oito metros de largura com uns sessenta de comprimento. Daria para jogar uma pelada lá. Ao descer as escadas, fomos informados que desistiram da instalação de um elevador, porque ficou constatado, nos exames médicos, que todos estavam ótimos de saúde de tanto circularem por aquelas escadas.

-Modigliani. - anunciou.

No dia seguinte, xinguei os taxistas, pois do alto da rampa da estação, não vi um carro sequer, nem mesmo o do Machado. Depois de caminhar pela calçada da rua, avistei um táxi bem recuado, fiz um sinal de positivo com o dedo para o motorista e ele balançou afirmativamente a cabeça. Como pertencia à outra cooperativa, não avançou na fatia alheia.

-Rua Modigliani.

-Onde fica?

-Perto da Praça Manet.

-A Praça Manet eu conheço. Tenho, aliás, alguns parentes que moram por lá.

E, para grande surpresa minha, ele citou o nome de várias ruas, Gauguin, Renoir, Rodin, Rouault, Corot num francês impecável. Coisa de deixar a Rosa Grieco reconciliada com os taxistas.

(*) neste período inicial do Estaleiro, a empresa contratante do Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO, manda um taxi às 8 da manhã para o leva e traz ao trabalho. Embora o agendamento seja semanal, só aparece táxi em Santa Teresa depois de 9 horas. Taxista no Rio é assim.

(**) A Batalha do Marne ocorreu em setembro de 1914 e este episódio marcou o patriotismo dos taxistas parisienses e a qualidade de seus carros Renault. Envolveu seis grupos de exército franceses e um inglês e o termo Aliados ainda não estava consolidado – embora a Inglaterra já estivesse aliada à França contra a Alemanha – pois a Guerra ainda não era Mundial (começou em julho de 1914).

terça-feira, 29 de novembro de 2011

2052 - almoçando 2

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3872 25 de novembro de 2011

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ENCONTRANDO-SE NO ALMOÇO

PARTE II

Como se fosse um Papai Noel antecipado, Carlos Alberto Torres distribuiu pen drives para os comensais da mesa com o acrônimo EPAMS. E disse o significado de cada letra que, infelizmente, escapuliu da minha memória. Era, provavelmente, brinde do seu trabalho – PAM Saint-Gobain. Agradeci, e segurando-o com os dedos em pinça, disse que aquele dispositivo roliço e avermelhado parecia um batom. Já me presenteara, antes de me conhecer, com o exuberante livro de Carlos Roque “Comidas de Samba Bebidas de Choro”.

Tenho muitos arquivos para armazenar – pensava, enquanto o Dieckmann se assenhoreava da palavra. Desatento por alguns segundos, fui obrigado a lhe fazer um pergunta.

-Que filme?

-Não viu o filme?! - reagiu com um misto de surpresa e censura.

Não se referia, com toda certeza, a alguma fita distribuída comercialmente e sim a Produções Triunpho 30, que o fez seguir os passos de Charles Chaplin, Douglas Fairbanks e Mary Pickford, que lançaram a United Artists.

-Estou com problema na banda larga do computador, mas verei o seu filme em breve. - desculpei-me.

Elio Fischberg passou às reminiscências do Colégio Militar, repetindo um caso que eu já ouvira no restaurante Westfália, o mesmo que fora cenário de uma crônica do Antonio Maria sobre uma senhora que sofria de TOC, doença semelhante à do ator Jack Nicholson no filme “Melhor É Impossível, de 1997”.

-Eu era muito fraco em matemática. - reconheceu o Causídico Verborrágico.

-Por isso, pertenceu à turma de Corte e Costura do Colégio Militar. - comentei para puxar pelas pilhérias do Dieckmann, mas este se achava naqueles raros momentos em que seu ouvido trabalhava mais do que sua língua.

A história do Elio teve um final feliz, tirou 10 em matemática, o que mereceu a seguinte explicação do Nei Abóbora, no Westfália:

-Você estava relaxado quando fez a prova, Elio.”

No El Gebal, nada foi dito sobre o 10 do Elio, pois chegara hora de escolher o prato principal, escolhido, Carlos Alberto Torres se manifestou:

-A minha mãe está com 91 anos de idade, eu compro, então, um remédio inglês para ela, que traz bons resultados.

-Conheço esse remédio e também trago para a minha mãe, que está com 86 anos de idade.

E arrematou o Elio:

-O remédio é bastante caro.

-O Elio não quer ouvir da mãe o que ela lhe disse muito no passado: “Já esqueceu do que eu falei, Elio”. - não perdeu a piada o Dieckmann.

Houve um momento de conversas paralelas e eu me reportei ao diálogo entre o Dieckmann e o neto.

-Aconteceu entre mim e o Daniel, meu sobrinho, algo parecido ao que houve na festa do seu aniversário. Nós estávamos num boteco cheio de operários, perto do Norte Shopping, quando o Daniel, com uns 5 anos de idade, depois de tomar um copo de Guaraná, arrotou. Chamei-lhe a atenção, mas um daqueles trabalhadores interveio: “O que esse menino fez foi maravilhoso.”

-Você ficou desarmado. - riu o Dieckmann.

Agora, todos participavam do mesmo assunto.

-Meu sobrinho aproveitou as fotografias do último aniversário do Dieckmann para realizar as montagens das danças do fim do ano passado, com exceção da foto do Muca... Como é o sobrenome dele?

-Muca Von der Schulenburg.

Dieckmann se aprofundou ainda mais na sua resposta:

-O avô do Muca foi prefeito de uma cidade da Alemanha; morreu enforcado porque participou de um complô contra Hitler. (*)

E o Elio trouxe a recente morte do Joe Frazier à baila.

-Ele conseguiu derrubar o Cassius Clay. - continuou.

-Mas perdeu as outras duas lutas. - intervim.

E prossegui:

-Existe um documentário muito bom, “Quando éramos reis”, sobre a luta do Cassius Clay e George Foreman, no Quênia; lá estão Norman Mailer e jornalistas de destaque.

Fiz um parêntese:

-Dieckmann reclama, quando escrevo sobre boxe no Biscoito Molhado.

-Pode falar, Biscoito.

E disse, voltado para todos:

-Cassius Clay apareceu em público e as pessoas ficaram assombradas com os tremores do corpo dele.

Retomei a palavra:

-Nesse documentário, um jornalista, que não era o Norman Mailer, depois da vitória do Cassius Clay sobre o Foreman, cita Nietzsche: “Se você não destruir aquilo que ama, aquilo que ama o destruirá. Cassius Clay gostava muito de lutar e, por isso, não abandonou a carreira na hora certa, sendo surrado até pelo sparring, Larry Holmes. Para mim, ele se viu obrigado a lutar porque precisava pagar inúmeras pensões a ex-mulheres.

Causídico Verborrágico ainda se ateve a dois lutadores brasileiros das décadas de 50 e 60, Luisão e Fernando Barreto, e eu enalteci o Archie Moore até que o anúncio da sobremesa nos calou por momento.

-O Leozinho, marido da Alba, foi reconduzido ao cargo do Hospital Mário Kröeff. - informou o Elio.

-Ele me chamou para fazer uma visita ao hospital, mas eu não tenho estrutura emocional para ver crianças doentes.

-Biscoito, eu não tenho estrutura emocional nem para ficar doente. - reagiu o Dieckmann às minhas palavras.

Agora, era o Carlos Alberto Torres que falava:

-Dia desses, eu urinei e não gostei do que vi. Fui ao médico e ele me prescreveu uns exames. Eu estava com um nódulo junto ao rim e, para se saber do que se tratava, só cirurgia. Havia 30% de chance de ser um tumor maligno. Rapaz, fiquei mal... Fui operado, fizeram a biópsia, mas o resultado não vem logo. Foi uma espera angustiante, mas, no fim, acabou bem.

-Você não perdeu parte alguma do rim?

-Não, Dieckmann.

Veio a conta, que foi rateada irmãmente. Na calçada da Rua Buenos Aires, Dieckmann informou que nos acompanharia até a Rua República do Líbano, CAT iria um pouco além.

-Resolvi fazer História. - disse-me o Carlos Alberto Torres.

-Mesmo com a vida ganha, com a aposentadoria, devemos fazer alguma coisa. - falei sem saber se era ouvido, pois o tumulto dos vendedores e compradores era grande.

-Submeti-me ao ENEM e entrei numa Faculdade de História.

Dieckmann dobrou à direita e a conversa prosseguiu entre nós três.

-Os historiadores dedicam a maior parte do tempo a arrasar com os livros de História. Eles destroem as obras do Laurentino Gomes.

-O Laurentino Gomes é jornalista. - interrompi o CAT.

-Ele era um excelente analista de economia.

-Muito conceituado. - ratificou o Elio Fischberg.

-O trabalho de pesquisa do Laurentino Gomes para escrever 1808 e 1822 é admirável, mas os historiadores não querem saber...

Carlos Alberto Torres virou, depois à esquerda e eu e Elio continuamos juntos até a Rua Uruguaiana.

(*) O parente do Muca que participou do Atentado de 20 de Julho e que comporia o futuro governo como Ministro do Exterior era chamado Friedrich-Werner Erdmann Matthias Johann Bernhard Erich Graf von der Schulenburg. Foi condenado e executado e foi o chamado que mais tempo levou, considerando os 7 prenomes.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

2051 - Lawrence do El Gebal

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3871 Data: 24 de novembro de 2011

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ENCONTRANDO-SE NO ALMOÇO

Não é concebível que um sobrinho não conheça o tio, mesmo que ele seja virtual, como é o caso do Tio Frank, que troca mensagens eletrônicas comigo há algum tempo. A oportunidade surgiu no ano passado, mas deixei-a escapulir. Dizem que ela não volta, mas ele retornou com a homenagem que seria prestada a ele, dia 24 deste mês, no restaurante árabe, El Gebal, da Rua Buenos Aires, próximo à Praça da República. Eu teria problemas no trabalho para ir, mas tinha de ultrapassar os obstáculos, ainda mais que o Elio Fischberg, mesmo correndo risco de um atentado terrorista, garantiu que não faltaria.

Assim, vinte minutos antes da hora marcada, saí do serviço e perdi a metade do tempo esperando o elevador. Às 12h 15min, eu já pisava o chão da rua do restaurante. Percorri tanto a Buenos Aires que imaginei chegar a Patagônia. Como será o Tio Frank?... Alto, careca, barrigudo ou baixo, cabeludo e esbelto?... Não era difícil especular com a aparência do meu parente virtual, pois, na minha caminhada, eu me deparava com os mais diferentes tipos de pessoa.

-Como dizia aquele criminoso internacional: o melhor passaporte que existe é de brasileiro, pois nascem no Brasil tanto um louro sonhado por Hitler quanto um negro retinto.

Avistei uma pracinha. Elio Fischberg havia me dado, como referência para chegar ao Árabe, uma pequena praça. Mais uns passos, eu revia a Faculdade Moraes Júnior. Nesse momento, fiz um balanço da minha situação: tenho de correr para as compras de Natal, após o almoço, pois os consumidores já começaram a gastar o 13º salário que ainda não receberam.

Vislumbrei, ao fundo, as árvores verdejantes da Praça da República.

-Mais um pouco e eu terei de espantar as cutias.

Parei no nº 328. Se eu soubesse que era tão longe, teria contratado um camelo.

-Carlos, você vai ver uma espécie de lanchonete, entre que há uma porta de vidro, lá é o restaurante. - instruíra-me o Elio, horas antes pelo telefone.

Empurrei a porta envidraçada e busquei com os olhos os meus amigos. Lá estavam eles à esquerda, junto à parede; Dieckmann, Causídico Verborrágico e... Tio Frank usava óculos, tinha a aparência risonha e, embora estivesse sentado, parecia de elevada estatura. Aproximei-me.

-Biscoito, o Skipper não pôde vir. - anunciou o Dieckmann.

-Pena, pois ainda não conheço o Tio Frank.

-Não está perdendo nada. - alfinetou o Dieckmann.

Apertei as mãos de todos, surpreso, pois ninguém me apresentara à pessoa que eu julgara o Tio Frank. Deduzi que era o Carlos Alberto Torres, xará do grande capitão da Copa de 1970, cuja presença fora aventada dias atrás.

-Biscoito, tive de colocar três asteriscos no Biscoito Molhado que você escreveu sobre o meu aniversário. Eu não fico na porta recebendo as pessoas; é chegar e entrar na minha casa.

E pediu a cumplicidade dos seus dois amigos:

-Não é assim?

Elio e CAT (tranformaram o Carlos Alberto Torres em gato para lhe dar nove vidas) confirmaram.

No asterisco, Dieckmann registrou que só ia até a porta para mandar os convidados embora, pois precisava trabalhar no dia seguinte.

-Lá não existe Rua do Fracasso, por isso eu moro na Rua Triunfo.- foi a sua segunda queixa.

A terceira, como eu já esperava, se referia à saparia em forma de teteias, em volta da piscina, que não era coisa do seu gosto refinado.

-É amanhã que a Dilma irá lá?- aludiram, para o Dieckmann, a presença da presidente da República na entrega do petroleiro Celso Furtado pela Petrobras.

-Montaram um palanque para ela... Julguei que a época do Stalin passara.

Ato contínuo à crítica ao culto da personalidade, Dieckmann assinalou:

-Comi no Adegão o bacalhau mais gostoso da minha vida. (*)

Trabalhar no Caju é ruim, mas tem as suas compensações. - pensei sem me manifestar.

Nesse instante, o celular do nosso amigo nórdico, tocou:

-Ô Skipper, todos aqui contando com sua presença e você não aparece, decepciona...

Depois dessas e de outras poucas palavras, o celular passou para a mão do Elio Fischberg. Quando o CAT terminou de falar com ele, chegara a mim vez.

-Continuo um sobrinho que não conhece o tio.

Ouvi uma risada do outro lado da linha. Tio Frank, em seguida, falou alguma coisa que não entendi, pois parecia que todos os frequentadores do El Gebal resolveram falar ao mesmo tempo. E como um artista que canta, mesmo sem ouvir a orquestra, ainda mantive a conversa no celular por um tempo razoável.

Entreguei o que os portugueses chamam de telemóvel ao dono, que constatou que o Tio Frank já desligara.

-O Skipper evita turma com pessoas mais jovens do que ele. Gosta de se reunir com gente mais velha e, assim, parecer o caçula. - comentou o Dieckmann.

Ele deveria, então, candidatar-se à Academia Brasileira de Letras. - imaginei.

-Skipper está com quantos anos? - indagou o Carlos Alberto Torres.

Dieckmann citou a própria idade, não citou a do Fischberg, que é mais novo do que ele, até atender à curiosidade do CAT:

-63 anos.

O Adegão, mencionado minutos antes, despertou, talvez, a lembrança do Luca na mente do Causídico Verborrágico:

-Vocês precisam conhecer o Luca. O Carlos já fala alguma coisa sobre ele no Sabadoido...

-Sim, conhecemos o Luca do Sabadoido. - interrompeu o Dieckmann, enquanto o Carlos Alberto Torres meneava a cabeça.

-Sim, mas as histórias que o Luca conta como segurança do Unibanco merecem ser ouvidas. - prosseguiu o Elio.

-Um suco de laranja. - pedi à senhora que servia.

-Para não ser o único da mesa a beber cerveja, traga-me um suco também...

-De quê? - perguntou ela.

-Suco de cevada.

Não, o Dieckmann perdeu a piada e pediu hortelã com abacaxi.

E, logo depois, ela atendia o nosso amigo de Santa Teresa trazendo um copo com um líquido de colorido marciano. CAT, como eu, preferiu as laranjas espremidas, enquanto o Elio se satisfazia com um refrigerante.

-Vamos pedir mais pão. - propôs o CAT.

Dieckmann, que já passara da pasta de grão de bico para a coalhada, como recheio do pão, concordou imediatamente.

Muito bom, Lawrence da Arábia aprovaria essa comida até agora.- disse com os meus botões.

(*) O redator do seu O BISCOITO MOLHADO não é mais o mesmo. Detesto o Adegão. O melhor bacalhau da minha vida e é verdade, comi no Adônis, no dia 14 de novembro. Lamento desapontar leitores que eventualmente me ofereceram de bom coração o luso peixe.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

2050 - a neve dos viciados

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3880 Data: 20 de novembro de 2011

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DA GRÉCIA PARA A RÚSSIA

Como lembrarão os leitores do Biscoito Molhado, eu e o Elio estávamos na Grécia, em meados da década de 70, no meio dos paparazzi que fotografavam a ex-primeira dama dos Estados Unidos, que se exercitava com os trajes de Eva antes da maçã.

-Elio, temos de voltar para o Brasil do ano 2011, se não, vamos perder a boca-livre do aniversário do Dieckmann.

-Carlos, o Dieckmann nunca se coçou quando a conta do restaurante chegava.

-É verdade; como o Carvalho Pinto, ele tinha um escorpião no bolso.

Elio voltou ao presente e era um presente de grego, isto é, a década de 70.

-Você viu como o filho do Aristóteles Onassis, o Alexandre, foi paciente com o filho da Jacqueline Onassis, o adolescente John-John Kennedy, ensinando-lhe a pilotar avião?

-Vi, Elio; Alexandre morrerá daqui a pouco pilotando e, décadas depois, será a vez do John-John. Depois deste relacionamento Onassis e Jacqueline Kennedy, um urubu pousou na sorte de muita gente. A Maria Callas foi a primeira vítima: já morreu de tristeza.

-É mesmo, Carlos; vamos fugir desta tragédia grega.

Dito isso, eu e Elio Fischberg sacamos ao mesmo tempo o nosso cachimbo de ópio e fumamos. Quando a névoa se desfez, nós nos vimos em outro lugar.

-Onde estamos?... Qual é o ano?...

Enquanto o Elio fazia perguntas, puxei um jornal que estava sob flocos de neve e vi a fotografia do Pelé vestido de soldado. Busquei outro jornal, a dois metros de mim, e lá estava o grande craque da Copa da Suécia com o uniforme do Exército brasileiro.

-Elio, voltamos para 1959.

-Mas aqui não é a Grécia, faz um frio de transformar os soldados de Napoleão em picolé.- manifestou-se o Causídico Verborrágico.

-Sim, estamos na Rússia. Eu peguei um jornal, que era o Pravda, peguei outro e era o Izvestia..

-Aqui só existem esses dois jornais, Carlos; Pravda quer dizer Verdade, e Izvestia, Notícias. Diz o povo russo que no Pravda não tem notícias, e no Izvestia, não tem verdade.

-Não há um jornal alternativo como o Biscoito Molhado? - perguntei.

-Se tivesse, não seria Biscoito Molhado, e sim, Biscoito Gelado.- respondeu.

-Napoleão Bonaparte dizia: “Raspe um russo, e encontrará um tártaro.”

-E Napoleão sabia das coisas.- concordou.

-O russo com essa tendência para ser escravizado... - comentou o Elio com um esgar.

-É verdade; as pessoas ligam à escravidão ao negro africano, mas a palavra escravo provém de eslavo.- acrescentou.

-Anton Tchekov escreveu que precisava espremer gota a gota a mentalidade de escravo de seu sangue para amadurecer como indivíduo.

-Já que estamos na Rússia ... - disse o Elio.

-É melhor nós andarmos um pouco, Elio, para aquecer.

-Nada disso, vamos fumar o nosso ópio e sair daqui.

-O fumo congelou, Elio.

-Que coisa! O idioma russo é difícil. É uma língua de acento tônico variável com função distintiva; possui dois sinais ortográficos, vinte consoantes e dez vogais. - lamentou.

-Console-se, Elio, poderíamos estar na Polônia, que possui trinta consoantes e uma vogal.

-Você brinca, mas nenhum livro de Dostoiewsky, Tolstoi, Turguenev, Gogol, nós lemos traduzidos diretamente do russo, sempre havia uma tradução francesa, ou inglesa, no meio do caminho até nós.

-Isso vem mudando, Elio.

Bem, o jeito é caminhar mesmo para aquecer.- conformou-se.

Andamos, andamos, até que topamos com um evento onde havia um grande número de pessoas, principalmente com máquinas fotográficas na mão.

-Algum evento importante acontece por aqui, Elio.

-Vamos ver.- mostrou curiosidade.

Dois homens caminhavam, enquanto várias pessoas o ladeavam.

-Elio, aquele baixinho gordo, de chapéu para esconder a calva, se parece com um professor de Desenho que tive no 2º ano ginasial.

Era o líder da União Soviética, Nikita Kruschev, que acompanhava o vice-presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, na exposição comercial americana em Moscou.

-Não seria o presidente dos Estados Unidos que deveria estar aqui, o Dwight Eisenhower?

-Quando comandou os exércitos aliados, na Segunda Guerra Mundial, a saúde dele estava ótima, mas no governo americano, teve vários enfartes. Talvez, Nixon o substituísse num desses enfartes.- aventei a hipótese.

-Parece que eles discutem. - apontou o Elio.

-Vamos chegar mais perto.

Esgueirando entre os jornalistas, aproximamo-nos dos dois líderes da guerra fria.

Quando passaram por uma cozinha com eletrodomésticos sofisticados para a época, Nixon vangloriou-se:

-Nos Estados Unidos, nós tratamos de facilitar a vida das mulheres.

-Nossos eletrodomésticos são ainda mais avançados do que esses.- replicou Kruschev.

-Comunista mentiroso.- sussurrou Nixon.

-O que você disse? - desconfiou o Chefe do Partido Comunista da União Soviética.

-Eu disse que as mulheres americanas são as mais felizes do mundo.

-O tratamento capitalista que vocês dão às mulheres não existe no comunismo.

-É claro que não. - concordou Nixon com a expressão irônica.

-Se este sujeito fosse russo, eu o mandava para Sibéria.- pensou Kruschev.

-Se este sujeito fosse americano, eu colocava o macartismo nos calcanhares dele.- pensou Richard Nixon.

-As casas que vocês, americanos, constroem, não duram mais de vinte anos, enquanto as casas da União Soviética resistem por várias gerações. - provocou o líder soviético.

-As casas americanas são duráveis, mas os cidadãos americanos gostam de ter acesso às últimas novidades tecnológicas. - retrucou Nixon.

-Não me diga? - pilheriou.

-Deixe que as pessoas escolham o tipo de casa, de sopa e de ideias que elas querem ter.- retrucou o vice-presidente dos Estados Unidos.

As intervenções de um e de outro eram aplaudidas diplomaticamente, além de arrancar sorrisos, mas as vozes aumentaram de volume e um desfecho desagradável se avizinhou.

-Carlos, os fotógrafos estão excitadíssimos.

-Não querem perder o melhor ângulo quando os dois saírem na porrada.

-Dois anos atrás, lançamos um Sputinik no espaço. Cadê os Estados Unidos?... Daqui a alguns anos, alcançaremos tamanha dianteira que, ao olharmos para trás, não veremos nada, então, bye, bye, bye...

A cada bye que dava, Nikita Kruschev, com um largo sorriso, acenava com um lenço debochadamente.

-Kruschev é um homem do povo, rude, de arrancar o sapato e bater com ele na mesa da ONU, o Nixon não vai conseguir se controlar.- cochichei no ouvido do Elio.

-Os dados econômico-financeiros estão em qualquer publicação séria para mostrar a superioridade do regime capitalista sobre o comunista. E quanto à corrida espacial, logo superaremos a União Soviética.

-Você parece bravo, como se quisesse brigar comigo. - queixou-se o soviético.

Nesse instante, diplomatas russos e americanos se aproximaram discretamente para impedir, se fosse necessário, que os dois se embolassem no chão da cozinha da exposição americana.

-Você ainda está bravo comigo?- provocou mais uma vez.

Resolvemos, então, sair do meio do tumulto.

-Elio, presenciamos um dos fatos mais célebres da guerra fria: o Debate da Cozinha.

-A coisa ficou tão quente que descongelou o nosso ópio, vamos fumar logo que é hora de voltarmos para o Brasil.-

2049 - triunfo e fracasso

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3879 Data: 19 de novembro de 2011

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AS TURMAS SE ENCONTRAM

Sim, é verdade, caro leitor do Biscoito Molhado, o aniversário do Dieckmann conseguiu transformar o sabadoido na segundona maluca ou segundadoida, como queiram. Tudo começou na manhã do dia 14 de novembro, quando, refestelado na poltrona da minha casa, telefonei para o aniversariante.

-Dieckmann, a Dilma sabotou o seu tradicional almoço comemorativo no Japonês perto do Paço Imperial.- disse, pensando no ato da presidente que procrastinou o feriado do dia do funcionário público.

-Pois é, Biscoito, fui sabotado pela Dilma.

Senti as suas palavras revestidas de tristeza, que se tornaram crescente quando acrescentou:

-Já estou aqui no Caju.

Reagi com surpresa, pois não imaginava que a Petrobras o enviaria tão cedo para perto do lugar onde Dom João VI, dentro de um barril, tomou banho pela primeira vez na vida.

-Está no Terminal da Briclog?

-Não, estamos reformando um estaleiro por aqui.- informou.

Enfatizei os meus votos de muitas felicidades buscando ser o mais convincente possível. Dieckmann agradeceu, sem a euforia de quem falava nos aniversários passados: “não se esqueça, lá no Japonês às 12 horas e 15 minutos”.

Como eu não trabalhava nesse dia, acionei, pelo telefone, a turma do sabadoido.

-Cláudio, o Dieckmann, de tão melancólico, só falta recitar que a Petrobras da Avenida Graça Aranha tem palmeiras onde canta o sabiá, que as aves que gorjeiam no Caju mais parecem a Maria Gadu.

-A Petrobras é a maior poluidora do país .- aparteou meu irmão com o seu ímpeto polemista.

Luca e Daniel compreenderam que, apesar de não o conhecer pessoalmente, alguma coisa deveria ser feita para animá-lo nessa segunda-feira.

-E tem mais, Luca, a casa do Dieckmann é frequentada, às segundas-feiras, pela Turma do Bondinho, e sabe, com esse descarrilamento que houve em Santa Tereza...

-Morreu alguém da Turma do Bondinho?... - assustou-se o Luca.

-Morreu o motorneiro, mas não era o Dieckmann, que estava no dia de folga.- esclareci.

Resumindo: às oito horas da noite, o Luca, seguindo as minhas instruções titubeantes, subiu, com seu caro, mais uma rua do bairro dos artistas.

-É aqui, defronte àquela casa.- apontei.

-Rua Triunfo.- disse o Daniel com a voz enfática.

-Dieckmann disse que um vencedor, como ele, tem de morar numa rua com esse nome. (*)

E acrescentei:

-Ele faz questão que todos os que visitam sua casa, pela primeira vez, deitem na sua cama para ver o seu despertador: o relógio da Central do Brasil.

-Então, ele está sempre atrasado.- alfinetou a Gina.

-Eu não me deito em cama de homem.- bradou meu irmão.

-Quando andarem pelo lado da piscina do Dieckmann, cuidado para não tropeçarem nas teteias que representam sapos tomando banho de sol. (**)

-Mais alguma advertência, Carlinhos?- perguntou a Gina.

-Sim, há um abacateiro por lá com frutas de quase 1 quilo, a maioria cai na piscina, mas cuidado, ainda assim, com o cocuruto.

Depois de estacionar o carro, no meio de muitos outros veículos. Luca saltou do mesmo e observou:

-Casa iluminada... Esses carros por aqui, parece que muita gente veio para esse aniversário.

E veio mesmo. Na porta, acolhendo os convidados, estava o aniversariante (***):

-Dieckmann, trouxe o sabadoido para agradecer, neste dia, à pessoa que fez nosso grupo conhecido até na Europa.

-Sim, eu envio o BM, com a turma do sabadoido, até para Portugal.- dizendo isso, apertou todas as mãos estendidas.

-Você é a Rosa Grieco.- tentou adivinhar a identidade da Gina.

-Não, ela é minha mãe.- antecipou-se o Daniel.

-Sei que você gosta muito de imitar as pessoas, esteja à vontade para me imitar. - deu o aniversariante o sinal verde.

-A Turma do Bondinho veio? - perguntei.

-Vieram a Turma do Bondinho, a Turma do Barquinho, a Turma do Trenzinho, todos estão aqui.

-Ótimo, poderei treinar o meu Yidish com o meu amigo Elio Fischberg.- animou-se o Luca.

-O Elio Fischberg, aproveitando o feriadão dos funcionários públicos, saiu da cidade.- informou o aniversariante.

-Será que o bolo dará para toda essa gente? - apesar de as palavras da Gina serem murmuradas, os ouvidos de morcego do Dieckmann as captou.

-A Branca levou 12 dias para fazer o bolo.

-A Gina está preocupada com o bolo, mas eu estou com a cerveja, Luca. A nossa sede será saciada?

-O amigo do Carlinhos deixará todos satisfeitos.- previu o Luca.

-Entrem, entrem.

E, obedecendo ao dono da casa, entramos.

-Carlão, há umas pessoas aqui que não me são estranhas. Aquele, por exemplo... - apontou o Daniel com a cabeça.

-Aquele é o Muca Schwarzenegger... ou algo parecido, um sobrenome complicado.

-Aquele também não me é desconhecido.

-É o Sérgio Fortes.

Então, eu me recordei do festejo do aniversário do Dieckmann um ano atrás.

-Daniel, no almoço do Japonês, foram tiradas algumas fotos dos que lá estavam, entre eles o Sérgio Fortes. Nas festas do fim do ano de 2010, quando você fez aquela montagem dos Menudos cantando “Não se reprima”, usou, a meu pedido, os rostos do Sérgio Fortes e do Elio...

-Também o rosto do Muca Schwarzenegger.- lembrou-se.

-Sim, mas a foto dele veio de outra ocasião.- expliquei.

-Carlão, precisamos de fotografias novas para as festas do fim do ano de 2011.

Fazendo as honras da casa, juntamente com a Branca, Dieckmann se aproximou do grupo composto pelo Cláudio, Luca e Gina. Chegou no instante em que Luca falava:

-Claudiomiro, Chico Buarque alcançou uma densidade inigualável quando disse que saudade é como limpar o quarto do filho que já morreu.

-Rapaz, as letras do Chico Buarque são extremamente depressivas, e de depressão eu quero distância.- interveio o aniversariante que, bom de garganta ( foi chamado de locutor da BBC pelo Faustão), acrescentou:

-As minhas preferências são pelo lado solar da música popular brasileira. Gosto muito do Moreira da Silva.

-Canto de frente pra trás, de trás pra frente.- declarou o Luca.

-Também gosto de Bossa Nova, que deu um basta naquelas letras pesadonas do samba-canção.

-Concordo, Dieckmann, mas não descarto o samba-canção.- disse o Luca.

-Mas eu descarto.- foi peremptório.

E se afastou o Dieckmann clamando:

-Alegria, alegria.

-Carlinhos, ele é adepto do Caetano Veloso?

-Luca, ele não está se referindo à alegria tropicalista.- esclareci.

A festa seguia animada, quando vi o aniversariante conversando com o neto animadamente.

-Vô, arrotar é bom?

-Não devemos prender...

-Então vamos soltar o arroto, vô.

-Gente, hora de cantar os parabéns.- convocou Branca a todos.

-Salvo pelo gongo.- pensei.

(*) Como se fosse possível encontrar e morar numa rua chamada Fracasso. Esse redator faz cada ilação...

(**) Mesmo depois desta visita o redator permanece obcecado por sapos inexistentes.

(***) Mais uma furada, a porta fica aberta, só apareço para mandar todo mundo embora