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sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

2296 - 1898

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4096                    Data: 22 de dezembro de 2012
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ESPANHA E ESTADOS UNIDOS EM GUERRA

Eu e Elio recuamos seis anos no tempo, saímos do Acre para Washington, quando, no caminho, vimos a explosão do navio norte-americano USS Maine no porto de Havana.
-O que é aquilo? - assustou-se o Elio quando viu as labaredas tomarem conta da embarcação.
-Os americanos dizem que a Espanha provocou essa explosão porque não os quer em Cuba, os demais afirmam que os próprios Estados Unidos causaram essa tragédia porque não querem ver os espanhóis em Cuba.
-Estamos, então, em fevereiro de 1898. Você conhece bem essa guerra, Carlos?
-Alguma coisa; escarafunchei a biografia do Theodore Roosevelt, e li muitos artigos do jornalista Newton Carlos.
-Pelo que minha mãe, Dona Sarita, me ensinou, na segunda série ginasial, de História da América, os estadunidenses ambicionavam dominar o Golfo do México para chegarem ao istmo do Panamá, área de potencial conexão entre os oceanos Atlântico e Pacífico. A presença da Espanha em algumas das suas antigas colônias contrariava seus planos.
-Isso mesmo, Elio; então a política externa americana era diametralmente oposta à Espanha. Os americanos até apoiavam as Filipinas na sua luta pela independência do país ibérico; é verdade que, nesses casos, pretendiam estender seus tentáculos ao sudeste asiático.
-Então, os Estados Unidos explodiram o USS Maine, um encouraçado de segunda classe, para terem o pretexto para a tão almejada guerra. - concluiu.
Essa conversa se estendeu até Washington, quando alguns dos jornais de William Randolph Hearst chegaram às nossas mãos.
-Leia, Carlos, esses jornais pregam apaixonadamente a guerra.
-Eu assisti ao “Cidadão Kane”, de Orson Welles, e o magnata da imprensa se gaba de ter influenciado os americanos a fazer guerra contra os espanhóis.  Afinal, os investigadores da explosão do encouraçado não chegaram a uma conclusão, mas os jornais de Hearst declaram acintosamente que os culpados eram os espanhóis. - disse-lhe.
O presidente McKinley enviou, então, um ultimato à Espanha, que rompeu suas relações diplomáticas com os Estados Unidos. Isso em 21 de abril, quando, horas depois, a Marinha norte-americana iniciava o bloqueio a Cuba. A guerra estava declarada.
-Elio, se a Espanha entregasse logo Cuba aos Estados Unidos, sem o esforço bélico, seria mais racional, pois não teria de se submeter a um combate implacável com deslocamentos da sua frota, já combalida pela Batalha de Trafalgar(*), para o Golfo do México e para o sudeste asiático.
-Carlos, os espanhóis não podem fugir da sua natureza, Lembre-se que Hernan Cortez queimou todos os seus navios para que não houvesse alternativa que não fosse a derrubada do império asteca.
Os jornais se referiam, também com destaque, aos combates dos rebeldes filipinos contra os hispânicos; eles, agora, receberiam ajuda, porque a Frota Norte-Americana do Pacífico rumava para lá. Li a notícia e murmurei com um sorriso irônico:
-Ajuda...
-Carlos, não são apenas as Filipinas que atraem os olhos cobiçosos dos beligerantes daqui, a Ilha de Guam, um importante local estratégico, também.
- Elio, podemos nos disfarçar de correspondente de guerra de um dos jornais do Cidadão Kane e acompanharmos esta guerra tanto no Pacífico como em Cuba.
-Vamos para Cuba, Carlos. - animou-se.
Quando chegamos em Havana,  abordamos um cubano, que nos recebeu com um sorriso de poucos dentes, porque o Elio se dirigiu a ele em inglês.
-Não entendi nada, mas acho ótima a chegada de vocês aqui, embora não os veja com os uniformes de soldados. - disse ele.
-Somos brasileiros. - esclareci.
-Ah, sim; os americanos nos auxiliarão nessa luta de décadas e décadas pela nossa independência.
-Coitado, tão iludido... - murmurei.
-O que você disse? - desconfiou.
-Eu disse que a Espanha enfrentará forças sobre-humanas. - tergiversei.
Antes mesmo de a conflagração ser declarada, a Flota de Ultramar, capitaneada pelo Almirante Pascual Cervera, partiu da Espanha, passou pelas Ilhas Canárias e chegou a Cabo Verde, quando Portugal declarou-se neutro. Partiram, então, para Martinica, em busca de carvão, mas lá foram informados que a França também manifestou a sua neutralidade. O Almirante Cervera rumou, então, com a Flota de Ultramar para Curaçao e lá conseguiu comprar 600 toneladas de carvão, quando necessitava de nove vezes mais do que isso para alimentar seus navios.
-A Baía de Guantánamo foi ocupada pelos americanos. - trouxe-me o Elio essa informação que obtivera de um militar de alta patente.
-E eles não sairão mais de lá. - acrescentei.
O Almirante Cervera partia, agora, com a sua frota, para a cidade de Santiago de Cuba. Lá, deu-se o mais importante combate naval da Guerra Hispano-Americana, a Batalha de Santiago de Cuba, quando o USS Brooklyn e o USS Texas bombardearam sem cessar o Infanta Maria Teresa, não deixando alternativa ao Almirante Cervera que não fosse encalhá-lo.
E outros navios da frota espanhola não conseguiam fazer frente ao USS Iowa, ao USS Gloucester, ao USS Indiana, ao USS Nova York.   O capitão Juan Lazaga Garay, vendo o seu navio em chamas, ordenou que a tripulação nadasse até a praia, mas lá foram recebidos a bala pelos cubanos, não lhe restou outra saída que não fosse o suicídio.
O cruzador blindado Cristóbal Colón, o mais moderno da frota espanhola, conseguiu escapar do USS Oregon, enquanto durou o carvão inglês, com a utilização do carvão cubano, de qualidade inferior, perdeu velocidade e foi encalhado pelos oficiais que o comandavam para não ir a pique, assim, foi o único navio espanhol que sobreviveu à batalha. O Almirante Cervera e mais 1612 marinheiros foram aprisionados e transportados para Portsmouth em New Hampshire.
Eu e Elio acompanhávamos as escaramuças, logo transformadas em batalhas, que ocorriam entre os soldados. Assistimos aos combates travados com 15 mil norte-americanos, mais 4 mil guerrilheiros, com 12 canhões contra 4 metralhadoras, comandados pelo General William R. Shafter, contra  900 espanhóis com 5 canhões, que se encontravam no topo da colina de San Juan, sob o comando do General Arsenio Linares.
-Quem é aquele coronel que se mostra tão destemido no meio dessa chuva de balas, na subida da colina Kettle?- indicou-me o Elio.
-È o Theodore Roosevelt, será presidente dos Estados Unidos com o assassinato de Mc Kinley; continuará, depois, no cargo pelo voto. Com a sua mão de ferro, ele construirá o Canal do Panamá.
Muitas foram as baixas entre os soldados dos Estados Unidos, mas eles conseguiram tomar essa colina e, em seguida, atacar a colina de San Juan com êxito.
-Agora, Theodore Roosevelt será visto como um herói no país que idolatra o heroísmo. - declarou o Elio.
Com a guerra praticamente vencida, eu e Elio retornamos a Washington para acompanhar o noticiário.
Em 12 de agosto de 1898, foi assinado o tratado que selou a paz entre os dois países. A Espanha cedeu suas colônias de Guam, Filipinas, Porto Rico e a Ilha Guantánamo para os Estados Unidos, e concedeu a independência de Cuba, que se tornaria um protetorado dos E.U.A. Os filipinos não gostaram, mas só seriam independentes, de fato, em 1945.
-E a Alemanha ganhou também muito com essa guerra.
-Como assim, Carlos?
-Elio, os espanhóis precisavam de dinheiro, assim, venderam por 25 milhões de pesetas, suas colônias asiáticas: Palau, Ilhas Marianas e Ilhas Carolinas. Com colônias na Ásia, a Alemanha pôde abastecer ainda mais as suas indústrias de matéria prima. A Alemanha possui, agora, a segunda marinha de guerra do mundo, só perde para a Britânica.
-Daqui a pouco, a Alemanha estará provocando uma guerra. - previu o Elio.
(*) A batalha de Trafalgar ocorreu em 21 de outubro de 1805. A guerra Hispano-Americana começou em fevereiro de 1898. Não é de admirar que os espanhois tenham perdido a guerra, se a esquadra permaneceu combalida 93 anos.





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