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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3926 Data: 8 de abril de 2012
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LIVRE COMO UM TÁXI
Entrei no táxi do Paizão, que logo acionou a primeira marcha e pôs o carro em movimento numa velocidade vagarosa.
-Você está calado. - estranhou.
Com a morte do Millor Fernandes, uma frase dele me veio à mente: “A boca é o órgão excretor do cérebro”.
-A espremedura porque passei agora no metrô tirou-me o ânimo para falar. - justifiquei-me.
-Vi ontem, na televisão, a propaganda do Partido Verde. Eles vão brigar pelo funcionamento do metrô por 24 horas. Já imaginou? Será uma festa para os assaltantes.
-Aquele corredor por onde os passageiros do metrô, que saltam
-Porque policiamento nesses lugares o governo do estado não vai colocar mesmo.
-Se essa medida sair do papel, o que eu não acredito tão cedo, haverá seleção das estações; apenas aquelas situadas em locais mais movimentados de madrugada funcionarão. - previ.
-Mas ninguém, na cidade, está andando de madrugada a pé com medo da falta de segurança. - argumentou.
Depois de uma pausa, prosseguiu.
-Agora, às 8 horas da manhã, fui atualizar a minha tabela de taxista. Cheguei e nada de ser atendido. O passageiro na rua, necessitando de táxi. Reclamei e um funcionário apareceu para saber o que havia comigo.
Nesse instante, tentou imprimir maior realismo à sua narrativa.
-“Não há nada comigo, há com vocês, que marcam 8 horas da manhã e já passa das 8 e meia.” Resumindo, meu caro, só fui atendido 9 horas.
Quando paizão chegou ao resumo, já havia parado o carro defronte a minha casa. Saquei uma nota de 10 reais para deixar 2 de gorjeta, como faço desde a época que a corrida não passava de R$ 6,50.
-Olhe, como essa nova tabela, ainda fica longe dos 8 reais.- disse, enquanto eu atentava para o valor de R$ 7,15 no taxímetro.
Mostrou-me com o dedo nos valores que R$ 7,15 correspondiam a R$ 7, 65.
-Um aumento de 50 centavos, que ninguém pediu.
-Não chega a 10%%. - calculei.
-Sabe o que é isso?... Eleições para prefeito este ano. Dão um aumento para agradar 35 mil taxistas, ao mesmo tempo, baixinho, para não desagradar os eleitores que andam de táxi.
Ouvi a apreciação acima já pisando a calçada da minha rua.
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Não adianta: mais cedo ou mais tarde a Lei de Murphy se faz valer contra nós.
No dia subsequente, uma reunião de trabalho me obrigou a rumar para a estação Carioca do Metrô meia hora depois do horário usual. Previ, agoniado, um trem repleto de gente, mas me surpreendi; nem naqueles que eu entrava às 4 horas da tarde estavam com menos passageiros do que este. Fui para dentro, logo que as portas foram escancaradas e me encostei numa parte do vagão, onde, se quisesse, poderia até puxar a VEJA da mochila e ler.
Saltei em Maria da Graça, de bom humor. Do alto da rampa, divisei dois táxis, depois de contornar a segunda das três rampas, só vi um. Foi chamado pelo rádio – supus. Não há problemas, alguns taxistas posicionam seus carros bem atrás do local correto. Quando já caminhava para o ponto, não havia táxi algum e, pior ainda, nem sombra daqueles que ficam recuados.
-E eu que imaginava ter escapado da Lei de Murphy! - reclamei da minha ingenuidade.
Mal sentei no banquinho do castigo, aquele em que sentam taxistas que aguardam passageiros, e passageiros que aguardam taxistas, saquei o meu celular da mochila. Em contato com a central da Metrô-Táxi, pedi um táxi para o ponto da rua Domingo de Magalhães, em Maria da Graça.
-Enviaremos reforço. - prometeu uma voz feminina.
Via os ônibus pararem e controlava o impulso de embarcar num deles. Teria, porém, de subir a pé a Rua Van Gogh, onde já fugi de pivetes que estavam com revólveres nas mãos.
Passaram quase dez minutos e nada.
-Porra! - foi-se embora o meu bom-humor.
Daqui a pouco vem o outro metrô e isso enche de gente.- previ.
Realmente veio outro metrô, mas uma senhora, apenas, se dirigiu para o banco do castigo.
-O que houve?- perguntou a minha mais recente companheira de infortúnio.
-Telefonei para lá, e disseram que mandariam reforço.
-Sempre encontro táxis aqui...
Mal ela acabou de falar, surgiu um, que passara pela Rua Miguel Ângelo.
Era o táxi 140 e eu entrei nele sem demora.
-Chame pelo rádio um táxi para mim. - pediu ela.
-Farei isso. - prometeu.
Acionou rapidamente seu FIAT e foi em frente.
-Esta senhora pega os nossos táxis todos os dias em que vem do trabalho.
-Eu, também.
-Eu sei.
-Ontem, o ponto estava coalhado de táxis, até o Machado apareceu em busca de uma rebarba. - registrei.
-Não sei o que acontece hoje... Talvez muitos estejam presos no trânsito, porque não existe mais hora para tudo ficar engarrafado. Isto aqui vai virar São Paulo, se já não virou. - disse ele.
-A hora da saída das crianças da escola também engarrafa o trânsito. - comentei.
-Eu gosto de rodar por aqui mesmo. Recusei uma corrida para Laranjeiras, o colega atrás de mim, na fila, me substituiu.
Paguei-lhe, logo que chegamos. Ele guardou o dinheiro, enquanto dizia:
-Será que aquela senhora ainda está no ponto?
E rumou para lá. Nesse momento, eu notei que ele não chamara táxi algum para ela pelo rádio.
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No dia seguinte, o táxi que me levou a Rua Modigliani foi o 119.
-Não costumo trabalhar muito por este lado de Maria da Graça.
Apesar do pouco convívio, a conversa seguiu animada e o tema eram os taxistas da cooperativa que eu conhecia e ele, logicamente, também.
-Certa vez, por esta hora, ouvi um taxista berrando “zero cinquenta e três”. Entrou uma voz masculina e o repreendeu: “Você não modula assim.”
-Eu ouvi também pelo rádio, eu rodava nesse instante.
-Depois de repreendido, ele disse mansamente: “zero cinquenta e três.”
-Ele podia ser suspenso por meia hora, ou seja, durante esse período ele não poderia pedir corrida pelo rádio. - esclareceu.
-Eu não sabia.
-É o 014 que faz a fiscalização e ele tem esse poder. Se um taxista se dirige às moças da central da cooperativa, pelo rádio, com a voz alterada, ele entra no circuito e avisa: “Você está fora da modulação.”
-Interessante. - disse, enquanto saltava no segundo poste da rua Modigliani.
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