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sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

2070 - um oscar em mãos trocadas

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3870 Data: 26 de dezembro de 2011

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SABADOIDO DE NATAL

PARTE II

FALANDO DE INJUSTIÇADOS

Por que não procurei o site IMS – Instituto Moreira Sales – para ouvir a flauta que o Pixinguinha tocava aos17 anos de idade?... Segundo, um flautista da Orquestra Sinfônica Brasileira, parecia que ele passou vinte anos estudando o instrumento, tamanho o prodígio. Eu tinha de xingar a memória de vigarista, como o Nélson Rodrigues. “Não há nada mais relapso do que a memória. Atrevo-me mesmo a dizer que a memória é uma vigarista, uma emérita falsificadora de fatos e figuras.”

As inúmeras mensagens virtuais com que me deparei, quando acessei o meu provedor, induziram-me a esse esquecimento. Tudo bem: haveria outras oportunidades para eu ficar diante do computador do Daniel.

Enquanto isso, Vagner e Luca já tinham chegado, e a sessão do Sabadoido se desenrolava.

“Luca, logo que chegou, se referiu ao Programa de Natal da TV Globo, no dia 23 de dezembro, que juntou Ivete Sangalo, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Eu já preparava os meus ouvidos para as suas críticas, quando, estranhamente, ele se põe a tecer elogios. Ivete Sangalo interpretou “Atrás da Porta” do Chico Buarque com tanta emoção, que todo o mundo chorou. Eu, então, perguntei: “Luca, você não estava assistindo ao velório do ditador da Coreia do Norte?”

O texto aspado acima foi uma narrativa do meu irmão, pois eu ainda me encontrava diante do computador. Depois de escutar o Cláudio, indaguei:

-E o Francis Hime?... Não se falou do autor da música?...

Quando me fiz presente, Luca lia alguns recortes dos jornais da semana. Ocupava-se, agora, das crônicas de 500 palavras do Ruy Castro para a Folha de São Paulo. Aproveitando o gancho, o leilão com lance mínimo de 1 milhão de dólares do Oscar do Cidadão Kane, ele discorreu sobre a relação do Orson Welles com a estatueta de Hollywood.

“Foi o único Oscar que “Kane” recebeu, dos nove a que foi indicado, e o único que Orson levou por um filme...”

-Oscar de melhor roteiro. - esclareceu meu irmão.

Ruy Castro prosseguia a frase com as palavras “... e olhe que dividido com Herman J. Mankiewcz.”; porém o Luca não se arriscou a pronunciar um nome que a Rosa Grieco adjetivaria de sesquipedal.

Luca leu que naquele ano, 1941, John Ford recebeu o prêmio de melhor filme com “Como Era Verde Meu Vale” e Gary Cooper, o de melhor ator com Sargento York. Ruy Castro afirmou que o Oscar, por ser um boneco cego, foi ao cinema e não enxergou nada, mas meu irmão enalteceu o filme de John Ford.

-Tudo bem, Cláudio, o próprio Orson Welles colocava o John Ford em primeiro lugar como diretor, mas o “Cidadão Kane” revolucionou a arte do cinema. - argumentei.

Luca prosseguiu na leitura:

-”O filme seguinte de Orson, “Soberba”, também foi indicado entre os melhores de 1942, mas perdeu para o correto, quadrado e apenas oportuno “Rosa de Esperança”, drama de guerra de William Wyler.”

-Orson Welles deixou “Soberba” nos rolos e viajou para o Brasil para filmar “Tudo é Verdade”. Nesse ínterim, os amigos dele que estavam na direção da RKO perderam os cargos e a nova administração resolveu fazer a montagem da “Soberba”, cortando a duração do filme, estragando, enfim, o que seria uma obra-prima.- manifestei-me.

-Olhem o que Ruy Castro disse aqui. - chamou-nos a atenção o Luca.

-”E mais até do que o magnífico George Sanders em “A Malvada”, era Orson, no papel de Harry Lime, quem merecia ser o melhor ator coadjuvante de 1950, por “O Terceiro Homem”.

Enquanto meu irmão, sob os olhares do Vagner, exaltava a excelência da “A Malvada”, minha mente ia para a fita baseada numa história de Graham Greene. Apesar do talento do escritor inglês, Orson Welles melhorou seu personagem, escrevendo as suas falas, inclusive a da “contribuição” da Suíça para as artes. Criou, assim, um dos personagens mais instigantes da história do cinema, eu, porém, não me entusiasmava muito com Orson Welles como ator.

No filme “A Marca da Maldade”, porém, meu parecer mudou: ele esteve soberbo no papel de um criminoso.

Eis o que Ruy Castro escreveu e o Luca nos transmitiu na sua voz sonora:

-“O caso mais escandaloso, no entanto, foi o de “A Marca da Maldade”, ignorado de alto a baixo em 1958 e pelo qual Welles deveria ter ganhado, no mínimo, os Oscars de melhor filme, diretor e ator – nos quais couberam, respectivamente, ao musical “Gigi”, ao diretor deste, Vincent Minneli e a David Niven por Vidas Separadas”. (*)

“A Marca da Maldade” se inicia com um plano-sequência que até hoje provoca babas de admiração dos espectadores que veem o cinema como uma arte.

Não tive tempo de externalizar as palavras acima, porque o Luca se aproximava do fim da leitura.

-“E por que a estatueta de ator coadjuvante em 1959 coube a Hugh Griffith por “Ben Hur” e não a Orson no papel do advogado em “Estranha Compulsão”, de Richard Fleischer?”

E arrematou Ruy Castro:

“Pensando bem, talvez Us$ 1 milhão seja muito dinheiro por um boneco cego.”

-Certo estava Charles Chaplin que usava o Oscar que ganhou em 1929 para não deixar a porta bater. - comentei.

Como o assunto é premiação, vale narrar um momento ocorrido há dois Sabadoidos, e que não foi registrado no nosso periódico.

-Claudiomiro, quem, de língua portuguesa, ganhou o primeiro Nobel?

-Eu penso, Luca, que foi o José Saramago.

-E você, Carlinhos?

-Só me ocorre o nome do José Saramago.

Luca sacou, então, um recorte da Folha de São Paulo. Ouvimos, então, um pedaço da biografia de Egas Moniz:

-”Neurocirurgião português, Egas Moniz introduziu a lobotomia pré-frontal, processo cirúrgico para o tratamento da esquizofrenia e da paranoia.”

-Criou zumbis. - critiquei.

-Ganhou o Prêmio Nobel por isso? - espantou-se meu irmão.

-Sim, Claudiomiro, o Nobel de Medicina de 1949.

-O patriarca dos Kennedy, Joseph Kennedy, que tinha ambições políticas para a família, mandou que se lobotomizasse a filha doente, temendo que ela se envolvesse em escândalos, quando os normais da família é que se envolveriam. - comentei.

Não citamos na ocasião – injustiça cometida pelas nossas memórias – o cientista da língua portuguesa, ou brasileira, que merecia o Prêmio Nobel: Carlos Chagas. Além de identificar o agente e o transmissor da doença que leva o seu nome, foi um dos primeiros cientistas a demonstrar a importância da higienização para a saúde, editando o primeiro Código Sanitário do Brasil.

Mas a justiça é cega como a estatueta chamada de Oscar.

(*) sem entrar na incômoda polêmica sobre o mérito do Oscar, o Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO aproveita a deixa para dizer que Vidas Separadas (Separated Tables) é um ótimo filme e que pouco passa na TV.

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