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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

2498 - o beagle do Bob



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4298                                   Data: 22 de outubro de 2013
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169ª CONVERSA COM OS TAXISTAS

E lá estava o táxi do Bob Esponja ponteando a fila do ponto da Rua Domingo de Magalhães. Olhei para os lados e para trás, na esperança que viesse alguém para eu diminuir o passo e até parar, se fosse possível, e, assim, pegar o segundo ou o terceiro da fila, mas ninguém apareceu, Além de o Bob Esponja não me agradar pela supervalorização que faz de si mesmo, decepcionou-me ainda mais quando o Vereador, disse-me que ele fez piada de cunho sexual com um colega deles da Cooperativa no instante em que enfartara.
Com tal retrospecto, eu só podia demonstrar contrariedade quando entrei no seu carro.
Bob Esponja, no entanto, nem me olhou nesse momento; a sua atenção se convergiu inteiramente para um cachorro que eu mal via, pois estava do lado oposto do seu carro.
-Vamos, garoto, saia para não se machucar.
Quando ele obedeceu, indo para a calçada, pude ver que era um vira-lata de pelo ruço, tamanho médio.
-O safado do dono desse cachorro tratou bem dele enquanto foi filhote, agora, larga o bicho na rua. - disse logo que passou a primeira marcha e saiu com o táxi.
-Espero mais um pouco e se ele continuar largado na rua, correndo o risco de ser atropelado, apanho para mim. - continuou indignado.
-Ele foi abandonado pelo dono?
-Se eu tivesse certeza disso, já tinha adotado esse cachorro.
-Certa vez, caminhando pela Praça Manet, abandonaram um desses cachorros de raça de tamanho diminuto. Caramba, o bicho ficou desatinado, latia um lamento, seguia-me para todos os lados e embaralhava-se nas minhas pernas.
-Eu levava para minha casa. - interrompeu-me.
E prosseguiu:
-Esse cachorro que vimos, agora, penso em ficar com ele, dar-lhe um bom banho, levá-lo para uma tosa e alimentá-lo com ração. Vou gastar dinheiro, mas corto outros gastos para não pesar no meu orçamento.
O diabo não é tão mal quanto nós pintamos, reconheci. Se estivesse em São Paulo, no dia 19 de outubro, certamente o Bob Esponja seria um dos invasores do Instituto Royal que resgataram dezenas de cachorros da raça do Snoopy. - imaginei ao saltar na Rua Modigliani.

Era pouco mais de meio-dia quando desembarquei na estação de Maria da Graça faminto e pessimista, pois, nessa hora, os taxistas da Metrô Táxi estão fazendo o que eu ainda não fizera: almoçando. Dei sorte, pois o 014 estava no ponto à espera de um passageiro.
-Veio mais cedo hoje? - estranhou.
-Fui a uma empresa de navegação na Avenida Graça Aranha, e a coisa terminou logo, Nos casos de serviço externo, fico livre do ponto eletrônico e volto, então, para casa.
-Depois dessa corrida, vou almoçar. - disse ele.
-Somos dois.
-Eu só estou com um copo de café com leite na barriga. - informou-me.
-Durante muitos anos, eu só ficava com um copo de café com leite na barriga até o almoço, tentei mudar esse hábito, mas não conseguia, pois me bastava comer um pedaço de pão com queijo para sentir-me enjoado.
-Mas, na hora do almoço, batia aquele prato de peão de obra. - deduziu com um sorriso.
-Eu comia como um leão depois da caçada das suas leoas, mas isso não é saudável.
-Por que não?...
-Porque da hora do jantar até a do almoço transcorre muito tempo para você ficar apenas com um copo de leite no bucho; no meu caso, eram cerca de dezessete horas. - expliquei.
-Mas você se sentia saudável, não se sentia? - insistiu ele em ficar mal alimentado até o almoço.
-Só uma vez, com 15 anos de idade, tive vertigem enquanto esperava o bonde Cachambi para ir à escola. É verdade que desci a Rua São Gabriel capengando, pois um pé estava enfaixado: pisei, inadvertidamente, o prato de leite do Fluminense, o nosso gato.
-Depois que a vertigem passou, seguiu para a escola?
-Segui, eu tinha prova no Visconde de Cairu, mas, mesmo que não tivesse, não voltaria para casa.
-Eu vejo meus colegas de táxi, de manhã, comendo empadas, pasteizinhos, joelhos, bolinhos de aipim sempre acompanhados com Coca-Cola ou Guaraná, eu  fico longe.
-Nesse caso, é melhor ficar, mesmo, só com uma xícara de café na barriga. - afirmei, enquanto saltava do seu táxi.

Dessa vez, o táxi era de outra cooperativa e eu não ia para Maria da Graça e sim, para o Lins de Vasconcelos. O motorista, embora desconhecido para mim, se revelou mais do que os velhos conhecidos.
-Nós poderíamos passar pela padaria do Abílio, Conhece o Abílio?
-Conheci o filho do dono da padaria da Rua Cachambi que foi assassinado. - respondi.
-Eu também conheci, ele era tricolor.
-Pegava mulheres casadas e se deu mal.
-O cara que matou mora nesse prédio. - apontou, enquanto passávamos pela Cachambi na altura da Rua São Gabriel.
E continuou:
-Ele era PM, soube quem “pegava” a mulher dele e foi tomar satisfações. Sabe o que o amante falou?
-O que ele falou? - devolvi a pergunta.
-Pego a sua mulher e vou continuar pegando. Ele foi, então, em casa, e fuzilou o sujeito lá na padaria mesmo.
-Pois é, esses caras já lidam com armas de fogo no dia a dia, são íntimos delas. - comentei.
-Nem preso ele foi, não tem um negócio aí chamado... Como é mesmo o nome?
-Você fala em legítima defesa da honra, que foi inventado pelo Evandro Lins e Silva quando defendeu o Doca Street no julgamento do assassinato da Ângela Diniz em Búzios?
Confirmou com a cabeça.
-Eu sou de Volta Redonda, todos lá me conhecem e me consideram uma boa pessoa. Um dia, minha mulher me deixou. Quando a vi, dias depois, com o namorado, senti um impacto.
Nesse momento, tirou uma das mãos do volante e colocou no coração.
-Não vale a pena tomar medidas drásticas, pois a paixão é fogo de palha. Você se lembra do caso Van e Lou?
-Sim.
-Ele matou os antigos amantes da namorada e, no julgamento, um acusava o outro. Mais recentemente, aquele casal que matou a filha da Glória Perez, por causa de ciúmes...  Não passou muito tempo e o par de assassinos se separou.
Concordando comigo que a paixão é efêmera, prosseguiu:
-O sujeito não cuidava da aparência, bebia... Então, um dia ela quis voltar para mim.
-E você não aceitou?
-Aceitei; mas depois do que passou, ela tinha de ter mais experiência, me dar mais valor... Que nada! O amor, mesmo da minha parte, não era mais o mesmo.
-E se separaram de novo?
-Com o tempo, um entende os defeitos do outro, as qualidades, fica uma espécie de amizade entre marido e mulher... Nosso filho fez agora 22 anos.
-Certamente. -disse-lhe ao saltar do seu táxi na Rua Camarista Méier.



 

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