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quinta-feira, 17 de outubro de 2013

2491 - Saindo de 82 e caindo na música carioca



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4291                               Data:  14 de  outubro  de 2013
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SABADOIDO COM MAIS MÉDICOS E MAIS DOENTES
PARTE II

-João Saldanha, falando da seleção brasileira de 1982, dizia que o Brasil jogava torto, que o campo era um quadrilátero perfeito e que o Telê tinha uma teimosia siderúrgica porque deixava todo aquele latifúndio na direita inexplorado.
Enquanto o Claudio fazia considerações sobre o Saldanha comunista, que nunca foi preso porque não incomodava a ditadura, o Daniel se voltava para mim:
-Por que teimosia siderúrgica, Carlão?
-Talvez porque o Telê Saldanha fosse mineiro...
-Mas os ingleses só falaram da seleção que perdeu de 3 a 2 para a Itália, nesse programa?- esbravejou o Claudio.
-Não, eles mostraram cenas do jogo Alemanha Ocidental e França da semifinal dessa Copa.
-Foi 1 a 1 no tempo normal e 2 a 2 na prorrogação e a Alemanha ganhou nos pênaltis por 5 a 4. - afirmou o Daniel que tem na retentiva as partidas das últimas Copas do Mundo.
-A televisão inglesa expôs várias vezes a agressão do goleiro alemão Schumacher no Battiston.
-É o mal do nome. - alfinetou a Gina acompanhada de um sorriso de cumplicidade do filho.
E revivi o lance ainda fervente na minha cabeça.
-O Platini deu um passe de uns trinta metros que colocaria o Battiston na cara do gol, o Schumacher, percebendo o risco de gol, disparou para cima do atacante francês e arremessou o lado direito do seu corpo sobre o adversário, foi um autêntico abalroamento.
-Mais um metro e seria dentro da área. - disse o Claudio.
-Battiston saiu de maca com o Platini segurando a sua mão, penalizado com o sofrimento do amigo. Ele teve duas vértebras fraturadas.
-E o Schumacher não foi expulso. - disse o Daniel.
-Claudio, nem falta o juiz apitou. - indignei-me.
-Na partida final, eles tomaram um passeio da Itália. -relembrou meu sobrinho.
-E o Arnaldo César Coelho apitou esse jogo. - acrescentei.
 -Se o Schumacher fizesse a mesma coisa no Paolo Rossi, por exemplo, o Arnaldo César Coelho expulsaria?...
-Gina, a regra é clara; ele sairia algemado direto para o xilindró. - pilheriou o Daniel.
-Dos jogadores alemães, quem mais me encantava era o Briegel, não pelo talento, mas pelo vigor físico.
E prossegui:
-O Brito foi considerado o jogador com mais saúde da Copa de 70...
-Tinha saúde de vaca premiada. - aparteou o Daniel.
-No entanto, nas partidas do Brasil, ele não passava do meio de campo, o Briegel, não, corria por todos os lados do campo com um fôlego de gaitista tocando o Motu Perpetuo de Paganini.
-Mas o Briegel tinha sido decatleta. - garantiu o Claudio.
O telefonema do Luca e a chegada simultânea do Vagner impediriam que a prosa sobre futebol internacional da Copa do Mundo de 1982 prosperasse.
Agora, no local em que o Fusca 1968 da Gina ficava abrigado, reunimo-nos todos para mais uma sessão do Sabadoido, com exceção do Daniel, que foi tratar da higiene semanal do seu carro e da Gina, que foi cuidar dos seus afazeres.
-Alguém aqui considerou a dica do Claudio, na semana passada, e assistiu a “As Aventuras de Pi” no Telecine?
À minha pergunta, Luca apresentou uma desculpa e o Vagner se limitou a perguntar de que filme se tratava.
-Confesso que não estava animado em vê-lo por causa das acusações de plágio...
-Não do diretor da fita, o Ang Lee, mas de quem escreveu o livro. - interrompeu-me o Claudio.
-O grande escritor gaúcho, Moacyr Scliar, escreveu um livro em que um garoto judeu foge da Alemanha dividindo o espaço de um barco com um jaguar; no filme, o garoto no barco é indiano e o felino, tigre.
-O próprio Moacyr Scliar evitou a polêmica e não processou ninguém.
-Sei, Claudio, disseram que o filme de Alfred Hitchcock, “Rebecca, a mulher inesquecível”,  era  plágio do livro “A Sucessora”, de Carolina Nabuco, mas a acusação caiu no vazio.
Luca tomou a palavra para expor o seu encantamento com o “Dicionário Analógico da Língua Portuguesa”, que havia sido citado numa edição deste periódico.
-Muito bom o prefácio do Chico Buarque de Holanda. - vibrou.
-O Chico conta, na cinebiografia do Sérgio Buarque de Holanda, que, quando o pai o recebeu no escritório, deu-lhe esse dicionário que, de tão manuseado, as páginas se despregavam. - comentei.
Claudio e Vagner, percebendo que seria longa aquela prosa sobre o dicionário, iniciaram uma conversa paralela.
-Carlinhos, você falou do livro, mas não citou o autor.
Não procurei me defender, as críticas são inevitáveis, nem Shakespeare escapou delas, e, entre seus críticos estiveram intelectuais do porte de Leon Tolstoi e Voltaire, sendo que o filósofo iluminista considerou “Hamlet” obra de um dramaturgo bêbado.
-Você se lembra do nome do autor? - insistiu.
Como já assinalamos num Biscoito Molhado pretérito, o sábado está na origem da palavra sabatina, pois nesse dia da semana se realizavam os exames escolares.
-Não me lembro, Luca.
-Francisco Ferreira dos Santos Azevedo.
Em seguida, disse o porquê de o nome ser inesquecível para ele; havia referências que serviam como técnica mnemônica, mas não as citarei porque esqueci.
Esgotado esse tema, a atenção de todos os presentes se convergiram para um só assunto: a música popular brasileira. A palavra estava com o Luca.
-No programa do Sérgio Cabral que presta, na Roquette Pinto, ele citou os dois compositores mais cariocas que existiram. Quais foram?
-Um deles tem de ser o Tom Jobim, que compôs sobre Ipanema, Corcovado. - foi veemente meu irmão no seu parecer.
-Tem de ser um autor de samba.
Não considerei o Choro devido à influência da polca, que é europeia até a raiz dos cabelos.
-Eu colocaria como um dos dois o Noel Rosa. - apresentou o Luca seu voto.
-Concordo inteiramente com você,
Apressando-se,  pois ia trazer os copos de bebida, meu irmão insistiu na carioquice do Antonio Carlos Jobim.
-Claudio, o Tom Jobim é cosmopolita. -argumentei.
-Por isso mesmo.
Finalmente, o Luca declinou os dois nomes do Sérgio Cabral pai: Aldir Blanc e Nei Lopes. (**)
-Discordo.
-Todos nós discordamos, Claudiomiro, pois o Noel Rosa não foi considerado.
Quando meu irmão saiu, cochichei para o Luca e o Vagner:
-Tom Jobim foi influenciado por Debussy e o jazz americano, não fez música autenticamente carioca.
Depois, discorreu-se sobre amenidades até o final de mais um Sabadoido.
(**) Certamente os leitores de O BISCOITO MOLHADO perceberão que nenhum Sérgio Cabral presta.




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