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terça-feira, 13 de março de 2012

2111 - ecos de Momo

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3911 Data: 5 de março de 2012

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OS TAXISTAS DEPOIS DO CARNAVAL

PARTE II

-Brinquei muito carnaval no passado. - revelou o Flamenguista no seu táxi.

-Apesar de louvável essa medida da prefeitura de revitalização dos blocos, não há como reviver o carnaval de outrora por causa, principalmente, do fim dos bondes. - falei.

-Havia também os clubes dos bailes infantis e...

Rindo, completou:

-Os bailes dos bacanais.

-Evoé! - exclamei como a Rosa Grieco nas suas cartas, deixando-o, por momentos, com a expressão enigmática.

-Meu pai me disse que a história das saídas reprimidas dos blocos vinha de 1940, mais ou menos.

Sim, é negócio de muitos anos. - concordei.

-Eu morei no Engenho de Dentro, nos anos 60 e 70, onde o carnaval mais animado era o do bloco do Chave de Ouro. - animou-se.

-Lembro-me: a grande expectativa de toda cidade do Rio de Janeiro era saber se o bloco conseguiria sair ou não, nas quartas-feiras.

-E sempre saía, apesar de a polícia se colocar nas redondezas, as Rádios Patrulhas ficavam espalhadas pela Rua Adolpho Bergamini, principalmente. Os foliões elaboravam uma estratégia, combinavam locais diferentes, onde se reuniam grupos, marcavam uma hora e, então, se juntavam, quando a polícia via, o bloco estava na rua.

-Os repórteres já partiam para o Engenho de Dentro para registrar mais um êxito do Chave de Ouro contra a polícia.- assinalei.

-Eu era menino e corria para encorpar o bloco e, assim, muita gente. Era uma farra.

Em seguida, sua voz perdeu a intensidade:

-Veio, então, aquele delegado e liberou a saída do nosso bloco.

-Foi o José Gomes Sobrinho, ele também era árbitro de futebol. Um homem corpulento, que não mostrava truculência... Árbitro que o meu pai não gostava, daquele tempo, era o Eunápio de Queirós, porque dizia que roubava o Fluminense. Meu pai o chamava de Larápio de Queirós.

-O Flamenguista interrompeu a minha digressão para voltar à folia de Momo.

Depois que legalizaram o carnaval do Chave de Ouro, nas quartas-feiras de cinzas, a coisa perdeu a graça e o bloco murchou até morrer. - lamentou.

-O ser humano é assim: ele gosta quando é proibido, desde Adão e Eva.- falei.

Com uma gargalhada, anunciou que chegávamos à Rua Modigliani.

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Desci a última rampa da estação do metrô de Maria da Graça e estuguei os passos porque só havia um táxi. Na calçada, Bob Esponja abocanhava um sanduíche e esvaziava goela adentro uma latinha de Coca-Cola Zero. Titubeei, quando atravessei a rua e vi que outro táxi se aproximava.

-Vai nele. - disse o Bob Esponja.

Entrei no carro do Gaguinho com um comentário.

-Ele não sabe se se alimenta ou se pega passageiros.

-É uma falta de respeito... Por que posicionou o carro na dianteira do ponto?... Porque não quer perder um minuto; come, mas não deixa de ser o primeiro a pegar passageiro logo depois da última dentada no pão. - estrilou.

-E o carnaval? - procurei desanuviar o clima.

-Fiquei sem ar condicionado no táxi desde sábado à noite. Só consegui consertar na quinta-feira, pois não abriu nada no carnaval. Eu avisava logo os passageiros que acenavam: “não funciona o ar condicionado.”

-Calculo que pegou passageiros assim mesmo.

-Peguei, porque a procura por táxi foi muito grande.

-O meu cunhado e minha irmã buscaram um táxi, às 6 horas da manhã, num domingo, da Central do Brasil ao Méier e pediam 200 reais no ‘tiro’.

-Eu rodei todos os dias de carnaval por aqui mesmo, já que conheço todos os caminhos. Não me arrisquei a ir para longe e ficar encaixotado num desses blocos durante horas.

-Lembrei-me agora dos festejos da Copa de 70. Esse mesmo cunhado colocou no táxi dele minha irmã, eu e um casal de amigos, e rumou para uma confeitaria do Méier. Um bloco de torcedores fechou parte da Coração de Maria e muitos deles passaram a socar a carroçaria dos carros. Minha irmã ficou apavorada.

E concluí:

-E os torcedores de 40 anos atrás eram bem mais civilizados do que os de hoje.

-Amigo, nessa Copa de 2014, eu nem penso em colocar o nariz na rua. Se o Brasil perder, o que é possível, não sobrará nada.

Essas palavras acima foram pronunciadas com o seu táxi parado defronte ao segundo poste da Rua Modigliani.

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Vi o 081 trabalhando no sábado de carnaval e, pensando nos mais de vinte imóveis de que é proprietário, perguntei maliciosamente:

-Descansou bem neste carnaval?

-Trabalhei os quatro dias.

-Sim, eu o vi no sábado, pouco depois da 8 horas da manhã, na Avenida Suburbana, quando eu ia para a casa do meu irmão.

-Trabalhei... Você não come todos os dias?

Ele tem necessidade do trabalho como de comida. - disse para mim mesmo, enquanto me vinha à mente uma frase do Paizão, ambos com 70 e muitos anos de idade, falando-me que, se o 081 parar de trabalhar, morre. “Ele e o irmão começaram muito cedo, em Portugal e têm de ir até o fim.” - foram as suas palavras exatas.

-O carnaval é uma época boa para faturar. - declarei.

-Sim, muito boa para ganhar dinheiro. - concordou.

-De noite, mais ainda.

-Sim, mas eu paro com o meu táxi por volta das 5 horas da tarde.

-O senhor começa no serviço antes do sol nascer?

-Ainda está escuro. Eu durmo muito cedo, às 7 horas da noite. Às 4 horas da manhã, já estou de pé.

-Meu cunhado, com minha irmã, buscou um táxi no sábado de carnaval às 6 horas da manhã, da Central do Brasil ao Méier e cobravam 200 reais.

-Virgem! É muito dinheiro. - assustou-se o 081.

Diferentemente das outras corridas, o 081 subiu toda a Rua Domingo de Magalhães, enfrentando o cruzamento perigoso, onde confluem esta rua, a Miranda Vale e a Conde de Azambuja. Assim, não passou pela igreja do Padre Rolim, dos anos 60 e não falou da sua queda pelos copos de Pitu.

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-Sinto uma dorzinha no joelho... - revelou o Bob Esponja com um esgar que enfatizava o seu incômodo.

Mantive-me silencioso, enquanto ele prosseguia.

-Acordei assim.

-Não foram os exageros do carnaval?

-Não sou de brincar como esses foliões que vão em tudo que é bloco que aparece, sou de apreciar a loucura alheia.

-Eu me lembro de você ter dito isso na corrida passada. - interrompi o taxista.

-Não contava com esse joelho dolorido.

-Não sabe, então, como foi?

-Acordei assim. Meu colchão está agora no chão, onde eu durmo. Devo ter sonhado que estava no alto, como nas noites anteriores e machuquei o joelho, porque a dor é no osso.

Retomei a palavra:

-Às vezes, nós acordamos avariados. Já acordei com umas ranhuras nas costas e nem posso dizer que foram as mulheres da internet.

Bob Esponja sorriu e gastou o restante da viagem contando as mordomias que as mulheres que conhece pela internet lhe proporcionam, como suco gelado na mãozinha e café da manhã na cama.

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