Total de visualizações de página

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

2085 - bancos e alcovas

-------------------------------------------------------------------------------------

O BISCOITO MOLHADO

Edição 3885 Data: 21 de janeiro de 2012

------------------------------------------------------------------------------------

CAMELOT NO SABADOIDO

Daniel abriu o portão quando eu chamei.

-E, então, Carlão?...

-Será que o Bezerra cai, Daniel?

-Mais um ministro...

-Dizem que ele mamou como uma bezerra nas tetas da nação.

Estávamos agora na cozinha, onde o Cláudio lia o Globo, sentado numa das cadeiras junto à mesa. Daniel rumou para o teclado e eu me acomodei no sofá de alvenaria coberto de almofadas.

-E o Daniel na Casa da Moeda, Cláudio?...

-O ônibus da empresa o deixa aqui, na porta, às seis e meia da noite, invariavelmente. Nos Correios, a hora da chegada era sempre incerta. Quando estourava o caixa de algum colega dele e o Daniel ficava, para ajudar, aparecia aqui por volta das dez horas da noite.

Apesar de não largar o jornal, prosseguiu. Passou a falar da nossa família, com duras críticas. Passei, então, para outra família.

-Tenho acompanhado a minissérie, em oito capítulos, “Os Kennedys”.

-É bom? - quis saber.

-Bem, Cláudio, os Kennedys são um mito nos Estados Unidos. No excelente filme “Nixon”, do Oliver Stone”, quando o presidente se sente esmagado pela repercussão da guerra do Vietnã e do caso Watergate, ele olha para um retrato do John Kennedy e diz: “As pessoas do povo me veem como elas são, mas o veem (o John Kennedy) como elas gostariam de ser.”

-Chamaram o governo do Kennedy de Camelot, coisa da lenda do Rei Arthur. Eu tenho o disco do musical e assisti ao filme. - disse ele.

-A minissérie tenta depurar a ficção da realidade, e, por isso, não passou nas televisões americanas.

-É contra o John Kennedy?

-Eu diria que não, mas mostra o patriarca da família, o Joseph Kennedy, como uma personalidade que estava com um pé na máfia.

-Ele estava com os dois, Carlinhos; acumulou uma fortuna com venda de bebida alcoólica na Lei Seca, manipulou ações na bolsa...

-Bem, ele contribuiu com rios de dinheiro para o Franklin Delano Roosevelt chegar à presidência dos Estados Unidos e ganhou o cargo de Chairman do órgão criado para sanear Wall Street, o SEC. Quando criticaram Roosevelt, por nomear um especulador, ele respondeu: “É fogo contra fogo.”

-Fernando Henrique Cardoso fez algo parecido quando nomeou Armínio Fraga, braço direito do investidor George Soros, presidente do Banco Central. Mais tarde, consideraram Armínio Fraga um dos dez maiores economistas do Brasil.

-A minissérie mostra o Joe Kennedy recebendo a nomeação de embaixador dos Estados Unidos na Inglaterra, no tempo em que Hitler mostrava as suas garras.

-Eu soube que, no início, o pai do Kennedy teve uma queda pelo Hitler.

-Como, na época, o povo americano era contra o envolvimento do país na guerra, ele pretendia se contrapor ao beligerante Roosevelt e derrotá-lo na indicação do candidato a presidente pelo Partido Democrata, na próxima campanha eleitoral. Assim, fez um discurso, como embaixador, favorável à política de Hitler, quando ele se assenhoreou da Tchecoslováquia.

-Roosevelt lhe deu um pé na bunda. - antecipou-se meu irmão.

-Na minissérie, Joe Kennedy culpa os assessores judeus de Franklin Delano Roosevelt pela sua demissão.

E prossegui:

-Ele escala, então, o seu primogênito, Joseph Kennedy Junior, para ser o futuro presidente dos Estados Unidos. O rapaz já era formado em Harvard, tinha, agora, de lutar na Segunda Guerra Mundial.

-John Kennedy, também formado em Harvard, foi para a guerra. - aparteou-me o Cláudio.

-É claro, mas teve de insistir muito com os pais para se alistar.

-John Kennedy foi considerado herói, porque a embarcação dele foi atingida pelos japoneses e ele ficou desaparecido por dias. Uma história mal contada...

-Sim, Cláudio; quando os irmãos estão em casa, depois de uma licença...

E fiz uma ressalta antes de continuar.

-Reporto-me à minissérie. Em casa, o Joseph Kennedy Jr considera um absurdo a medalha que o irmão ganhou e brada que as pessoas pensariam que ele, o primogênito, foi à guerra para tomar chá quando, na verdade, participou de vinte e seis missões de voo.

-Ele já pensava, como o pai queria, em cargos eletivos, quando a paz viesse.

-Bem, Claudio, há uma cena, logo depois desse desabafo, em que ele diz que voltará para participar de mais missões na guerra. John Kennedy lhe pediu, então, que não fizesse isso.

-Ele volta para a guerra e morre. - atalhou meu irmão.

-Quando a família recebe a notícia da morte do filho mais velho, há aquele desespero irlandês, rezas de católicos, com críticas severas do patriarca aos desígnios de Deus. Em seguida, ele chama o John Kennedy e lhe passa o bastão.

-John Kennedy tinha de lutar, a partir de então, para ser, no futuro, presidente dos Estados Unidos da América.

-E a mulher do Kennedy mafioso?... Não dava um pio? - largou o jornal que lia o meu irmão.

-A Rose Fitzgerald Kennedy fazia o papel subalterno das mulheres do século XIX que colocavam a união da família acima de tudo. - respondi.

-A atriz Gloria Swanson era amante dele e todo o mundo sabia. - interveio.

-A minissérie o mostra, apesar dos muitos cabelos brancos, dando umas bitocas na Michelle, sua secretária. Rose Kennedy os surpreende diversas vezes, pois ela trabalhava na residência da família, mas nada diz; importava para ela os familiares unidos.

-Assim como existem mulheres com furor uterino, há homens com satiríase. Os Kennedys não podiam ficar sem sexo com mulheres diferentes, durante muito tempo...

-Há um momento – interrompi – em que John Kennedy, enfarado com a vida política, afirma que gostaria de dar aulas de História e pegar umas mulheres.

-Bem, a Jacqueline Kennedy não era igual a sogra, pelo contrário, tinha cultura e era uma mulher do seu tempo. Como suportou as traições do marido?

-Voltando à minissérie, ela diz para o chefão, quando o esposo era senador, que entraria na justiça com um pedido de divórcio. Joe Kennedy acusa o golpe e lhe diz que, assim, a carreira política do seu filho estaria destroçada. Ela não se mostra penalizada e ele lhe oferece, então, um fundo de um milhão de dólares para manter o casamento até a eleição do marido.

-E ela aceita?

-O filme deixou a questão em aberto. Talvez ela tenha aceitado, pois, quando viúva, o De Gaulle, depois de conversar com ela, previu que se casaria com um armador grego.

-Carlinhos, talvez o fato de ser a primeira dama dos Estados Unidos já a satisfizesse.

A música do teclado cessou.

-Carlão, o computador está à sua disposição. - anunciou o Daniel.

Nenhum comentário:

Postar um comentário