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segunda-feira, 18 de março de 2013

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4137                                Data: 23 de fevereiro de 2013
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CARTAS DOS LEITORES

-“O papá nos anos 30 fez muitas traduções do inglês, e ele comprava livros em francês (como o Stendhal) além dos britânicos (Dickens, obras completas, belíssimas gravuras; era preciso escalar uma escada; a estante tomava uma parede inteira do chamado Pavilhão). O espanhol garantia Cervantes. Italiano talvez fosse o menos votado. Aprendi muita coisa em Roma; se lhe interessa, aprenda que calcinha de mulher é “mutandina”.
Eu morava numa pensão da Via Veneto, no porão havia uma boate, maior gozação quando altas horas, o porteiro, cheio de alamares, me cumprimentava calorosamente. Talvez esperando que eu descesse em vez de subir?
Maratona familiar: não posso calcular quem leu mais, eu ou papá. Comecei mais jovem, ele interrompia para trabalhar, foi Professor e pau-para-toda-obra de um Ministro que o impressionou com direito a carros oficiais na porta; viajava bastante; os livros sempre a mão. Dona GG (a irmã Gioconda) contava que na casa dos Pilares havia quatro filhos.
Chutando o Instituto de Educação (já foi tarde, nada a ver comigo) até conseguir liberação o Merré (Ministério das Relações Exteriores), que também não me faz falta, fiquei três anos enfurnada no Pavilhão, devorando “tutti quanti”, e nos bancos da estação do trem e da Central sempre lia, não dava se viajasse em pé, invejando os macacos que têm quatro mãos e um rabo para pendurar no balaustre.
Eu conseguia tempo ainda para ir à praia, ao cinema. Ele (Agrippino Grieco) não aceitava nenhum filme, eram todos considerados uma estopada (sic), e que eu tivesse namoros curtos, ele enxotava todos os destemidos candidatos, até o que foi pedir a mão e a quem garantiu que  eu iria desgraçá-lo (sic) porque passava o dia todo lendo.”  Rosa Grieco
BM:  Rosa Grieco se reporta a um BM em que foram confrontados pai e filha: Agrippino Grieco e Rosa Grieco. Quem leu mais? O destacado crítico literário  conhecia tantos idiomas quanto a filha?
Na segunda questão, eu garanti que a língua italiana era dominada por Agrippino Grieco, e citei a Divina Comédia de Dante Alighieri que ele considerava a obra magna da literatura universal.
 Agora, a Rosa redige essa missiva em que diz sobre o pai: “ Italiano talvez fosse menos votado”.
 Bem, a nosso ver, ele era um ítalo-brasileiro típico, haja vista os nomes que deu aos filhos: Donatelo, Gioconda... Apesar de a Rosa já ter dado a entender que a irmã não era nada alegre, carrega, no entanto, o nome italianíssimo tanto na pintura de Leonardo da Vinci quanto na ópera de Amilcare Ponchielli.
Nós lemos, evidentemente que sem a voracidade do pai e da filha, aqui confrontados, mas lemos. E um dos livros em que nos detivemos foi a biografia do Conde Francesco Matarazzo, elaborada pelo ex-político e atual historiador, Ronaldo Costa Couto.
Em algumas páginas do livro, o historiador se reporta às memórias do jornalista Joel Silveira, Tempo de Contar, em que este cita uma viagem de escritores  brasileiros à Itália, em 1936, convidados por Mussolini. Alguns desses escritores são nomeados: Agripino Grieco, Henrique Pongetti, Jorge de Maia, Licurgo Costa. Abner Mourão, e outros (a Rosa deve conhecer também os três últimos, eu desconheço inteiramente).
Agripino Grieco, pelo que está escrito, disse que o grupo tomou um banho de máquinas, canhões, colheitas de trigo, discursos e mais discursos e sobretudo de berros de Viva il Duce!  Que a cara  do ditador  estava afixada  em tudo que era muro e parede.
No parágrafo que se segue, o historiador não deixa bem explícito se o depoimento é do Joel Silveira ou do Agrippino Grieco, mas parece que é do pai da Rosa:
“Certo dia são levados pelo “gerarca” fascista Alfieri ao Palazzo Venezia. Numa grande sala, “quase do tamanho do Largo da Carioca”, eis finalmente Mussolini ao vivo, de pé detrás de mesa gigantesca, braços cruzados, todo empertigado. Como se já não soubesse a resposta, ele grita para Alfieri: “Quem são?! Que querem?!” E depois: “Já deu aos nossos visitantes uma ideia do fascismo?! Com um safanão, arranca o programa da mão do subordinado, dá uma olhada e berra: “Não deixem de ir a Herculanum! Têm que ir! Em nenhum lugar da Itália se encontram traços tão profundos de romanidade!”.
Em seguida, o historiador deixa bem claro que a palavra está com Agrippino Grieco.
-”Depois começou a falar do Brasil de Matarazzo, dos portugueses, do seu amigo Salazar, da raça latina, da tal romanidade e de canhões, aviões, cada vez mais berrante. E foi só, a coisa toda não demorou mais que dez minutos, talvez menos. De repente, deu-nos as costas e foi postar-se diante do janelão às suas costas, e dali ficou a olhar a praça lá embaixo. Era como se não existíssimos. Com um gesto, Alfieri sugeriu que era hora de darmos o fora.”
Então, Agrippino Grieco disse para Joel Silveira:
-”Em suma, Joel, meu pai tinha razão: o fascismo vaio acabar matando a Itália. A não ser que a Itália, a verdadeira, a dos museus, a dos pintores e escultores, acorde e mate o fascismo.”
Constata-se que o avô e o pai da Rosa eram bem mais lúcidos, em política, do que o Conde Francesco Matarazzo. O formidável empresário, que chegou pobre ao Brasil, lidando com banha de porco, e construiu um império econômico, se deixou levar pelo discurso fascista. Viu a Itália pobre, com seus habitantes saindo do país em busca de um mundo melhor, e empolgou-se com a personalidade de Mussolini, que resgatou o orgulho italiano ao se travestir num imperador da época dos Césares.
Voltando à carta da Rosa Grieco, afirmo que não fiquei convencido que o seu pai não estivesse impregnado de italianismo, não “romanidade”, bem entendido.

-Quando vamos almoçar, caro Elio? Luca
BM: trata-se de uma pergunta feita ao Elio, como se vê, mas endereçada a mim, isto porque a minha presença é solicitada, embora se trate de um dueto. Aqui está o busílis: os leitores do BM ficam em pânico quando os dois se encontram, principalmente o Dieckmann, por causa do repertório depressivo dos dois cantantes, ainda mais quando o flautista boliviano está por perto. Como disse o Dieckmann, recentemente, na Roquette Pinto, “música carregada de negatividade”.
Irei ao almoço, mas tentarei (viu Dieckmann?) pedir ao dueto que só cantem músicas do Moreira da Silva(*).
 
(*) Dieckmann declarou a este Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO que se esqueceu completamente do Morengueira e vai tratar de acertar isso no filme que fará com o Sergio Fortes e Jonas Vieira. Afinal, Morengueira, com sua malandragem e alegria era outro tiro nos nelsons gonçalves da época.

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