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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3899 Data: 09 de fevereiro de 2012
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SABADOIDO MUSICAL
PARTE II
Abri a minha caixa de correspondência, no computador e me deparei com quase vinte e-mails relacionados a uma foto da Avenida Atlântica de 1957 com banhistas e, o mais importante para os remetentes, carros, quatro ou cinco. Uma questão foi proposta de início: quais as marcas dos automóveis que posaram para a prosperidade? Quanto às marcas, não restaram dúvidas, pois a turma do Dieckmann está apta a responder sobre veículos no “Céu é o limite”. Um parêntese, já que citamos o antigo programa televisivo de perguntas e citamos o holandês voador: “dizem que, quando jovem, Dieckmann tinha o pé direito tão pesado, ao dirigir, que o céu era mesmo o limite”.
Confesso que não li todas as respostas e comentários, pois o automobilismo não é minha praia, apesar da Avenida Atlântica, mas vi que um deles discordou do ano da foto, seria anos 40 e não, 1957.
Passei para outra mensagem eletrônica, seu título: “Não compre esse GPS”. Cliquei no vídeo e surgiu um motorista, dirigindo numa rua, enquanto uma voz feminina vinda de um GPS o instruía: “Entre a esquerda, seu imbecil. Por aí não, seu idiota?...”
-Isso é GPS ou é a sogra do motorista no banco de trás do carro?
Ao fazer-me esta pergunta, o Daniel e a Kiara entraram na minha Lan House, ou seja, no quarto.
-Daniel, veja este vídeo. - e cliquei no replay.
-Carlinhos, isto é sacanagem. - manifestou-se prontamente a Kiara.
-Se vendessem GPS igual a esse, eu compraria um para dar de presente. - comentou o Daniel.
-Kiara, antes de eu liberar o computador, tenho de enviar um e-mail.
-Sim, Carlinhos... Não tem pressa.
Enquanto eu esclarecia a um colega de trabalho que determinada frase era da autoria do Barão de Itararé e não uma das Leis de Murphy, a neta do Luca informava que o seu tio Benjamim aparecera no Globo Rural. Daniel reagiu com uma gargalhada e a menina ficou ressabiada. Ele teve de se explicar. Em seguida, ela apresentou outra novidade.
-Vou começar a fazer um curso de inglês.
-Don’t you think that your English is good enough to go to Barra da Tijuca?...
Depois dessa pergunta, Daniel prosseguiu com mais duas frases em inglês, titubeou, perdeu a fluência, e concluiu:
-Minha saída dos Correios enferrujou o meu inglês.
-Não há mais os turistas para atender?- indaguei.
-Principalmente, os alemães, eles são muito alegres e adoram conversar...
-Eles adoram conversar na língua da Margareth Thatcher. (*) - interrompi.
Avisei, em seguida, a Kiara que o computador estava liberado para os joguinhos dela e fui à sessão do Sabadoido onde já se achavam o Cláudio, o Luca e o Vagner.
-Ninguém interpretava Free Again com a carga passional da cozinheira da Dona Nonô. - lembrava o Luca.
-Ela superava a Barbra Streisand. - cheguei dentro do espírito da brincadeira.
-No momento em que ela cantava but, free again, ela socava ainda com mais força a carne para amolecê-la. - prosseguiu nas reminiscências dos anos 70 da rua Chaves Pinheiro o Luca.
-Cláudio cantando Alone Again do Gilbert O' Sullivan também emocionava. - recordaram.
-Era o meu cavalo de batalha daquela época. - admitiu meu irmão.
-Ninguém cantava como o Careca “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos.” - falei.
-O Careca morreu.
-Há algum tempo.
-Faz uns anos...
Ouvindo essas frases dos meus três interlocutores, reagi com tristeza:
-O Careca, irmão da Cristina, filho do Zorro, que era garoto quando éramos rapazes?
-Ele mesmo. - confirmaram a má notícia.
Feitos do Careca saíram imediatamente debaixo das cinzas da minha memória.
-Lembra-se, Cláudio, quando o Careca lhe fez companhia, no ponto, e quando você entrou no ônibus, que estava cheio, ele gritou com um passageiro levantar-se para lhe dar o lugar?
-Eu ri sozinho durante uma boa parte da viagem. - disse.
-O Careca não viajou nesse ônibus? - quis saber o Vagner.
-Não, ele esmurrou, do lado de fora, a carroçaria do ônibus, e quando o passageiro, sentado, olhou pela janela, levou esse esporro do Careca. - explicou.
Luca puxou um dos recortes de jornal que trouxera, um artigo do Ruy Castro e leu que o centenário do Nélson Rodrigues será apoteótico.
-Nem tudo está perdido. - pensei sem me manifestar.
-Nélson Rodrigues falava que seria esquecido.
E acrescentou com uma frase do dramaturgo:
-O morto só descansa realmente em paz quando é esquecido.
Em seguida, reproduziu parágrafos do autor do “Anjo Pornográfico” sobre os eventos que estavam agendados para os 100 anos do Nélson Rodrigues.
-Ele é um dos autores mais citados pelo Carlinhos.
Caramba, eu nem tentei expressar o meu encantamento quando me deparei com as suas crônicas esportivas, quando adolescente. Anos depois, o deslumbramento prosseguiu com as suas “Confissões” e, já adulto, com os seus textos da tragédia carioca para o teatro.
-Nélson Rodrigues morreu com 68 anos de idade, em 1980.
-Novo – interrompeu-se o Luca, que se aproxima dessa idade.
-A tuberculose o golpeou fortemente deixando sequelas por toda a sua vida. - pensei.
-A fala do Nélson era arrastada, elástica, bovina. Apesar da idade, morreu velhíssimo. - leu e comentou o Luca.
-Hoje, com 68 anos, canta-se rock, anda-se de motocicleta... - foi a vez do Cláudio interromper sob o olhar de aprovação do Vagner.
Luca passou a falar sobre seu encontro com um Paulinho que é conhecido por todos ali, da sessão do Sabadoido, menos por mim.
-Pelo que ouço de vocês, é uma figura folclórica.
-Carlinhos, você precisa conhecer o sujeito. - aconselhou o Vagner com mordacidade.
-Ele gosta mais do Chico Buarque do que eu. - admitiu o Luca, que não deixava ninguém lhe tomar a palavra como um jogador individualista que não passa a bola.
-Ele diz que escuta todos os músicos de jazz e que nenhum deles supera o Chico. E ele escuta mesmo jazz, pois herdou os discos do pai. Na música popular, de que país for, ainda não apareceu quem compusesse como o Chico, é o que o Paulinho garante.
-Ele é doido. - protestou o Cláudio.
-Eu falei com o Paulinho que nós fechamos com o Chico, mas para ele não bobear com o Claudiomiro, que é “piranho” velho em matéria de música. - disse o Luca.
-Esse tal de Paulinho deve ser uma pessoa que adquiriu muito conhecimento sem que o seu cérebro estivesse capacitado a processá-lo, por isso, fala disparates e é visto como uma pessoa folclórica pelos amigos. - julguei, sem nada falar.
-Kiara, hora de ir embora. - gritou o seu avô depois que percebeu que já passava das doze horas.
(*) Há uma razão para cariocas e alemães se entenderem bem em Inglês (isto não vale para paulistas): A pronúncia do Alemão e do Português é muito assemelhada, praticamente se fala tudo como se lê – exceção para ei, eu e outras pequenas diferenças. Além disso, cariocas tem um erre gutural que cai bem com alemães e holandeses e que os faz sentirem-se em casa, mas que faz a diferença entre os nativos de língua inglesa. Já paulistas, mineiros e outros interioranos falam door igualzinho aos ingleses.
O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO atalhou:
ResponderExcluirSugiro parar por aqui porque qualquer comentário vai pro blog.
Carlos Alberto Torres comentou:
ResponderExcluirTrata-se de uma das mais importantes passagens do Veteran Car RJ, o QUIZ.
Um dos sócios, de maneira geral os que frequentam o Clube do Bondinho as 2 fs. na Rua Triunfo, envia uma foto, em que os carros devem ser identificados.
A confusão entre 1957 e 1940, foi pq um dos copistas anexou uma foto dos anos 40 a resposta....
O Sr. Distribuidor do BM é dos que tem o maior indice de acerto, além ser implacavel com as identificações equivocadas. O cara é mau feito o pica pau....