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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

2965 - Mc Palestra Feliz


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5215                        Data:  22  de outubro  de 2015

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DIECKMANN COMO CHEFE

 

Um dia, um colega de trabalho me perguntou se o Roberto Dieckmann era pai de uma atriz da Globo, confirmei. Esse colega me disse que sempre ouviu falar dele como especialista de carros clássicos, que também adora e que não perdia uma exposição no Forte de Copacabana no dia 7 de setembro. Falei-lhe, então, do Dieckmann como chefe da Coordenadoria-Geral de Tranpostes Marítimos e como ele se assemelhava com o professor retratado no filme “A Sociedade dos Poetas Mortos”, que tentou oxigenar um ambiente emperrado por autoridades carrancudas.

Uma das marcas do Dieckmann como chefe foram as palestras, por ele promovidas, no ambiente de trabalho, o que não se viu mais desde a sua saída no final do ano 2002. Foram muitas, mas eu me lembro da primeira delas, por duas razões: refratário ao novo, assisti a ela um tanto contrariado e a segunda razão foi o assanhamento das minhas colegas com a beleza do conferencista. Tratava-se de um oficial da Marinha na faixa dos 40 anos que palestrou sobre o submarino Tupi. Eu e mais uns cinco chegamos com uns quinze minutos de atraso, provocando ruídos de cadeiras que se arrastavam com as alas que eram abertas, provocando reclamações das moçoilas que tiveram as suas visões prejudicadas. Na ocasião, percebi um resmungo do Dieckmann: “Agora que eles chegam...”

E vieram muitas outras como essa, concorridas apesar de os palestrantes que se seguiram não terem a aparência de galã do primeiro. Sérgio – recordo-me ainda do nome – por exemplo, estava mais para o ogro Shrek do que para príncipe encantado com os seus 110 quilos ou mais. Ele trabalhava numa empresa holandesa de salvatagem, a SMIT, precisamente e discorreu para nós sobre a Plataforma P-36, da Petrobras, que se encontrava adernada na Bacia de Campos depois de uma explosão. Explicou-nos o que era “manifold de produção” e outros termos técnicos que desconhecíamos.

Quando a plataforma afundou de vez, uma colega espirituosa afirmou que isso aconteceu porque não aguentou o peso do Sérgio quando subiu nela para salvá-la.

Sérgio voltou na tarde do dia em que o Brasil vencera a Inglaterra por 2 a 1, na Copa do Mundo de 2002 – não houve expediente no turno da manhã – para falar da operação de resgate do submarino atômico Kursk, da Armada da Rússia, que afundara no Mar de Barents. No final da sua fala, apertei-lhe a mão e uma amiga alarmista, que viu a cena, me repreendeu:

-Você é maluco?... Ele está radioativo.

Fernanda... Sim, também havia palestrantes do sexo feminino. Ela abordaria a necessidade de o nosso peso corporal ser controlado e a importância de uma reeducação alimentar. Quando eu soube que a White Martins era uma das empresas que acolhia seus os ensinamentos, entusiasmei-me, pois eu tinha laços afetivos com a White Martins por causa dos rendimentos das suas ações; assim, fui um dos primeiros a chegar à sala de reunião. Quando todos estávamos reunidos, Fernanda elogiou a minha magreza, ou melhor, compleição física – na época, eu corria uma hora todos os dias praticamente. Mas por que ela não elogiou alguém do seu sexo? Havia, ali, mulheres magras, pouquíssimas, é verdade, mas havia. Isso me aferrou ainda mais à ideia que uma mulher não elogia outra.

Mas de todas essas palestras, eu não tenho dúvida, que foi sobre postura a mais procurada; até funcionários de outros andares do Departamento de Marinha Mercante vieram à Coordenadoria-Geral de Transportes Marítimos assistir a ela. O conferencista tinha um vasto currículo, constando até uma passagem, como médico, pelo Bangu Atlético Clube.

Sem interrupções, ele só palestrou por uns quinze minutos, pois vieram as perguntas que ele respondia com uma paciência bíblica, de Jó, bem entendido e não de Eliseu, aquele profeta que matou 42 jovens porque foi chamado por eles de careca.

-Doutor, às vezes, as minhas mãos estão ocupadas e eu tenho de encaixar o telefone entre o rosto e o ombro para falar nele. Isso é ruim para a coluna cervical já que sinto o pescoço doer?  - perguntou a secretária do Fagundes, coordenador de outra área marítima, que trabalhava em um andar diferente do nosso.

-Doutor, depois de sentada, eu noto que as minhas nádegas escorregam vagarosamente pela cadeira; é por isso que eu tenho dores lombares?

-Doutor, meu filho de 8 anos de idade vê, às vezes, televisão de cabeça para baixo, as pernas deles se apoiam no encosto do sofá; isto, mais tarde, pode afetar a sua coluna?

Não sei quando cessou o bombardeio de perguntas, pois me retirei às 4h 30min, mas soube, no dia seguinte, que a palestra chegou às 6h, quando já anoitecia.

O doutor da postura prometeu voltar, para atender àqueles que não conseguiram expor seus problemas, mas nunca mais apareceu.

Dieckmann também trouxe um especialista em transportes marítimos de produtos químicos.  Ele não se ateve unicamente ao transporte, também aludiu aos produtos químicos e às suas combinações explosivas. Em dado momento, o palestrante disse que uma gota só de uma determinada mistura seria suficiente para matar todas as pessoas que estavam ali, naquela sala.

-Como se obtém essa gota? - perguntou o chefe de uma das divisões da coordenadoria de Transporte Marítimo, deixando alguns dos seus desafetos de cabelos em pé.

Mas os pelos de todos, sem exceção, ficaram arrepiados foi quando o conferencista informou que vinham embarcações com todo o espaço ocupado por produtos químicos para a Coca-Cola, que os importava. Durante uma semana, o pessoal não foi comer McLanche Feliz no Mc Donald's porque incluía esse refrigerante.

Com a reforma administrativa levada a cabo pelo ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, surgiram as agências reguladoras e, assim, fomos levados para uma delas, ficando para trás a Coordenadoria-Geral de Marinha Mercante, o cargo do Dieckmann e as palestras.

No novo órgão, essas inovações, como na turma do professor do filme “A Sociedade dos Poetas Mortos”, não eram vistas com bons olhos; ainda assim, o Dieckmann, meio na clandestinidade, deu uma palestra para os amigos dos velhos tempos, o assunto era o universo em expansão. Com a chegada dos novos chefes, ele não se expandiu muito.

Aquelas palestras deixaram saudades. (*)

 

(*) Se o objetivo desta reminiscência era obter uma saraivada de asteriscos, o redator se equivocou. Consultado, o Dieckmann disse, com a pureza de um desmemoriado, que não se lembra de nada disso e que quem gosta de passado é museu. Pelo jeito, ele não leu, mas, mesmo assim, o Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO, em nome de seus leitores, agradece a sua passagem pelo mundo maravilhoso da Marinha Mercante.

 

 

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