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quinta-feira, 5 de março de 2015

2805 - o culpado é o mordomo


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5055                               Data:  24 de fevereiro de 2015

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SABADOIDO COM FILMES E CABELOS

 

Passaram alguns minutos e nada de o Claudio aparecer para abrir o portão.

-Se demorar mais, sou assaltado, ou tenho de pôr à prova a minha paciência para recusar esmolas a cracudos.

Chamei pela segunda vez tentando a extensão de voz do Luca quando chamava pelo “Claudiomiro” em Sabadoidos pretéritos. Enfim, o Daniel apareceu.

-E, então, Carlão?

-O Fluminense não anda bem das pernas.

-Não anda e muito menos corre. - emendou com mau humor.

-O intelectual brasileiro não sabe bater escanteio.

-Não, entendi, Carlão.

-Eu também não. Estou com vontade de citar Nélson Rodrigues.

-O time do Fluminense deve estar cheio de intelectuais. - usou a citação para criticar a atual conjuntura do seu clube de coração, quando já chegávamos à cozinha.

O jornal espalhado pela mesa indicava que meu irmão já o tinha lido.

Daniel me fez companhia por alguns momentos.

-Cortei o cabelo e, como chegaria muito cedo aqui, fiz meia hora de palavras cruzadas na barbearia. Prevendo isso já levei um livrinho na pochete. - disse-lhe.

-É melhor do que levar um “tablet” e ser assaltado.

-Daniel, depois que o Biliu foi morto e parou esse negócio de pagar taxa de proteção a ele, nunca mais houve assaltos.

Com a aparição do meu irmão, Daniel rumou para o quarto, e eu previ que tocaria o “Nessun Dorma” no teclado.

-Claudio, o José Dirceu, nesse roubo do Petrolão, é o Bob?

-Bob era o que pegava o dinheiro para ele.

E acrescentou.

-O Marcelo Madureira, reportando-se ao desenho animado, disse que o Zé Dirceu é Bob Pai e quem pegava os petrodólares para ele, o Bob Filho.

Nesse instante, a Gina também surgiu. Dei-lhe um oi e prossegui:

-Lá, no Fonseca, só eu e mais um senhor cortávamos o cabelo, as conversas eram quase cochichadas, quando ouvi um brado:

-”Estive com aquele filho da puta do José Genoíno na alça da minha mira e não atirei.”

Quando ele saiu, perguntei ao Paulo, que ainda cortava o meu cabelo, se ele era militar; respondeu-me que não, que era sapateiro.

-Carlinhos, este Cachambi está cheio de maluco. - pronunciou-se a Gina.

Daniel reapareceu com a chave do carro, informando que ia sair com uma amiga. Gina o olhou, contrafeita, enquanto o Claudio comentou, risonhamente, que eu não teria carona de volta para casa.

-É bom, assim, eu dou uma caminhada. Essa saída do Daniel também faz bem a saúde.

Voltei-me para a Gina.

-No sábado de carnaval, o salão do cabeleireiro estava fechado, e agora?

-Não dá para ver que cortei o cabelo, Carlinhos? - ironizou a minha falta de atenção.

-Nesse dia, tocaram o telefone, era uma moça da NET, perguntando pelo Carlos Eduardo, respondi que ele estava almoçado, e eu estava mesmo. Em plena segunda-feira de carnaval, ligaram de novo...

-Em vez de desfilarem no Bangalafumenga, vão trabalhar. - interferiu o Claudio contra o que lhe parecia trabalho escravo.

-Ela me propôs abrir os canais HBO, Cinemax e outros por um preço atrativo.

-A qualidade dos filmes da HBO caiu muito. - manifestou-se a Gina.

-Eu sei disse, pois eu tinha os canais da HBO na extinta TVA. Para compensar o dinheiro que estava pagando a mais, saí à cata, nesses canais, de filmes de que eu pudesse gostar. Escolhi “O Mordomo do Presidente” e não me arrependi.

-Um negro que se tornou mordomo na Casa Branca?... não assisti ao filme, mas li sobre ele. - dizia meu irmão, enquanto a Gina se detinha no tablet, comprovando a profecia de Steve Job que esse invento superaria o computador pessoal.

-Um crítico escreveu que ele, Cecil Gaines, foi mordomo de doze presidentes.

-Não, Claudio, ele não trabalhou tanto tempo assim. O primeiro foi Eisenhower; vieram depois: John Kennedy, Lyndon Johnson, Richard Nixon, Gerald Ford e Ronald Reagan, quando ele se aposentou.

-Faltou o Jimmy Carter entre o Ford e o Reagan. - chamou-me a atenção.

-São sete, bem distante desses doze, Claudio.

-Há algumas coisas no filme meio incongruentes, por isso, pesquisei no Google sobre o que havia de realidade americana e de ficção hollywoodiana na vida desse mordomo.

Como o Claudio não se manifestou e a Gina prosseguia fixada no Tablet, prossegui:

-O Ronald Reagan foi o único presidente que atendeu ao pedido que ele vinha fazendo, há anos, de os empregados negros da Casa Branca não serem discriminados no salário; Reagan igualou tudo. Depois, ele conseguiu participar de um jantar, com a presença do casal presidencial e outros da nobreza, realizando o sonho da mulher de conhecer a Casa Branca.

-Então, é uma telenovela.

-Não deixa de ser, Claudio. Continuando: vem, então, a incongruência, é nesse governo, que o mordomo deixa de ser uma espécie de Pai Tomás e passa à rebeldia, aposentando-se e chegando a ser preso no meio de um protesto. A causa foi o Ronald Reagan não aprovar a lei contra o apartheid na África do Sul.  O filme não apresenta as razões do presidente: os países africanos vinham sendo submetidos um por um ao tacão comunista e ele não queria o mesmo fim para a África do Sul.

-E a África do Sul era o país mais desenvolvido do continente. - interveio o Claudio.

-Se o filme mostrasse essas contradições pertubando o presidente, a coisa não ficaria tão linear.

-Mas você gostou do filme?

-Quando digo gostei do filme quero dizer que valeu a pena assistir a ele. Só isso.

-Compararam o mordomo até com o Forrest Gump. - comentou rindo.

-No final, quando vieram os créditos, surpreendi-me com o nome da Jane Fonda. Foi uma falha minha lamentável, que tinha de ser corrigida rapidamente. Fui ao Google e descobri que ela faz o papel da Nancy Reagan. Voltei a gravação até a cena em que ela mais aparece.

-E qual é?

-A cena em que ela convida o mordomo e a mulher para participarem, com convidados ilustres, do tal jantar presidencial.

-Carlinhos, não foi o que o Lula fez com o Joaquim Barbosa nomeando-o para o Supremo: marketing?

-Ele se sentiu usado quando se tornou rebelde.

-Quando se tornou black bloc. - ironizou.

-Há uma cena que mostra o presidente John Kennedy deitado de costas no chão, para aliviar as dores na coluna e é dito que ele tomava 102 comprimidos por dia.

-Eu sabia que ele tomava muitos remédios, não tantos.

-A Tereza, a filha do Zé da Luz, me recomendou um filme por e-mail: “Só Nos Resta Chorar”.

-Sei, Carlinhos; é com o Roberto Benigni.

-Já encomendei pelo Mercado Livre.

-Do que vocês estavam falando? - indagou a Gina, enquanto desligava o tablet.

 

 

 

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