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terça-feira, 29 de novembro de 2011

2052 - almoçando 2

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 3872 25 de novembro de 2011

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ENCONTRANDO-SE NO ALMOÇO

PARTE II

Como se fosse um Papai Noel antecipado, Carlos Alberto Torres distribuiu pen drives para os comensais da mesa com o acrônimo EPAMS. E disse o significado de cada letra que, infelizmente, escapuliu da minha memória. Era, provavelmente, brinde do seu trabalho – PAM Saint-Gobain. Agradeci, e segurando-o com os dedos em pinça, disse que aquele dispositivo roliço e avermelhado parecia um batom. Já me presenteara, antes de me conhecer, com o exuberante livro de Carlos Roque “Comidas de Samba Bebidas de Choro”.

Tenho muitos arquivos para armazenar – pensava, enquanto o Dieckmann se assenhoreava da palavra. Desatento por alguns segundos, fui obrigado a lhe fazer um pergunta.

-Que filme?

-Não viu o filme?! - reagiu com um misto de surpresa e censura.

Não se referia, com toda certeza, a alguma fita distribuída comercialmente e sim a Produções Triunpho 30, que o fez seguir os passos de Charles Chaplin, Douglas Fairbanks e Mary Pickford, que lançaram a United Artists.

-Estou com problema na banda larga do computador, mas verei o seu filme em breve. - desculpei-me.

Elio Fischberg passou às reminiscências do Colégio Militar, repetindo um caso que eu já ouvira no restaurante Westfália, o mesmo que fora cenário de uma crônica do Antonio Maria sobre uma senhora que sofria de TOC, doença semelhante à do ator Jack Nicholson no filme “Melhor É Impossível, de 1997”.

-Eu era muito fraco em matemática. - reconheceu o Causídico Verborrágico.

-Por isso, pertenceu à turma de Corte e Costura do Colégio Militar. - comentei para puxar pelas pilhérias do Dieckmann, mas este se achava naqueles raros momentos em que seu ouvido trabalhava mais do que sua língua.

A história do Elio teve um final feliz, tirou 10 em matemática, o que mereceu a seguinte explicação do Nei Abóbora, no Westfália:

-Você estava relaxado quando fez a prova, Elio.”

No El Gebal, nada foi dito sobre o 10 do Elio, pois chegara hora de escolher o prato principal, escolhido, Carlos Alberto Torres se manifestou:

-A minha mãe está com 91 anos de idade, eu compro, então, um remédio inglês para ela, que traz bons resultados.

-Conheço esse remédio e também trago para a minha mãe, que está com 86 anos de idade.

E arrematou o Elio:

-O remédio é bastante caro.

-O Elio não quer ouvir da mãe o que ela lhe disse muito no passado: “Já esqueceu do que eu falei, Elio”. - não perdeu a piada o Dieckmann.

Houve um momento de conversas paralelas e eu me reportei ao diálogo entre o Dieckmann e o neto.

-Aconteceu entre mim e o Daniel, meu sobrinho, algo parecido ao que houve na festa do seu aniversário. Nós estávamos num boteco cheio de operários, perto do Norte Shopping, quando o Daniel, com uns 5 anos de idade, depois de tomar um copo de Guaraná, arrotou. Chamei-lhe a atenção, mas um daqueles trabalhadores interveio: “O que esse menino fez foi maravilhoso.”

-Você ficou desarmado. - riu o Dieckmann.

Agora, todos participavam do mesmo assunto.

-Meu sobrinho aproveitou as fotografias do último aniversário do Dieckmann para realizar as montagens das danças do fim do ano passado, com exceção da foto do Muca... Como é o sobrenome dele?

-Muca Von der Schulenburg.

Dieckmann se aprofundou ainda mais na sua resposta:

-O avô do Muca foi prefeito de uma cidade da Alemanha; morreu enforcado porque participou de um complô contra Hitler. (*)

E o Elio trouxe a recente morte do Joe Frazier à baila.

-Ele conseguiu derrubar o Cassius Clay. - continuou.

-Mas perdeu as outras duas lutas. - intervim.

E prossegui:

-Existe um documentário muito bom, “Quando éramos reis”, sobre a luta do Cassius Clay e George Foreman, no Quênia; lá estão Norman Mailer e jornalistas de destaque.

Fiz um parêntese:

-Dieckmann reclama, quando escrevo sobre boxe no Biscoito Molhado.

-Pode falar, Biscoito.

E disse, voltado para todos:

-Cassius Clay apareceu em público e as pessoas ficaram assombradas com os tremores do corpo dele.

Retomei a palavra:

-Nesse documentário, um jornalista, que não era o Norman Mailer, depois da vitória do Cassius Clay sobre o Foreman, cita Nietzsche: “Se você não destruir aquilo que ama, aquilo que ama o destruirá. Cassius Clay gostava muito de lutar e, por isso, não abandonou a carreira na hora certa, sendo surrado até pelo sparring, Larry Holmes. Para mim, ele se viu obrigado a lutar porque precisava pagar inúmeras pensões a ex-mulheres.

Causídico Verborrágico ainda se ateve a dois lutadores brasileiros das décadas de 50 e 60, Luisão e Fernando Barreto, e eu enalteci o Archie Moore até que o anúncio da sobremesa nos calou por momento.

-O Leozinho, marido da Alba, foi reconduzido ao cargo do Hospital Mário Kröeff. - informou o Elio.

-Ele me chamou para fazer uma visita ao hospital, mas eu não tenho estrutura emocional para ver crianças doentes.

-Biscoito, eu não tenho estrutura emocional nem para ficar doente. - reagiu o Dieckmann às minhas palavras.

Agora, era o Carlos Alberto Torres que falava:

-Dia desses, eu urinei e não gostei do que vi. Fui ao médico e ele me prescreveu uns exames. Eu estava com um nódulo junto ao rim e, para se saber do que se tratava, só cirurgia. Havia 30% de chance de ser um tumor maligno. Rapaz, fiquei mal... Fui operado, fizeram a biópsia, mas o resultado não vem logo. Foi uma espera angustiante, mas, no fim, acabou bem.

-Você não perdeu parte alguma do rim?

-Não, Dieckmann.

Veio a conta, que foi rateada irmãmente. Na calçada da Rua Buenos Aires, Dieckmann informou que nos acompanharia até a Rua República do Líbano, CAT iria um pouco além.

-Resolvi fazer História. - disse-me o Carlos Alberto Torres.

-Mesmo com a vida ganha, com a aposentadoria, devemos fazer alguma coisa. - falei sem saber se era ouvido, pois o tumulto dos vendedores e compradores era grande.

-Submeti-me ao ENEM e entrei numa Faculdade de História.

Dieckmann dobrou à direita e a conversa prosseguiu entre nós três.

-Os historiadores dedicam a maior parte do tempo a arrasar com os livros de História. Eles destroem as obras do Laurentino Gomes.

-O Laurentino Gomes é jornalista. - interrompi o CAT.

-Ele era um excelente analista de economia.

-Muito conceituado. - ratificou o Elio Fischberg.

-O trabalho de pesquisa do Laurentino Gomes para escrever 1808 e 1822 é admirável, mas os historiadores não querem saber...

Carlos Alberto Torres virou, depois à esquerda e eu e Elio continuamos juntos até a Rua Uruguaiana.

(*) O parente do Muca que participou do Atentado de 20 de Julho e que comporia o futuro governo como Ministro do Exterior era chamado Friedrich-Werner Erdmann Matthias Johann Bernhard Erich Graf von der Schulenburg. Foi condenado e executado e foi o chamado que mais tempo levou, considerando os 7 prenomes.

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