Total de visualizações de página

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

2042 - casa, separa, casa, separa

--------------------------------------------------------------------------------------

O BISCOITO MOLHADO

Edição 3872 Data: 30 de outubro de 2011

----------------------------------------------------------------------------

69ª VISITA DOS ESCRITORES À MINHA CASA

-Chaplin, você foi um bom jogador de xadrez.

-Joguei contra Samuel Reshevsky, menino prodígio que se tornou campeão dos Estados Unidos. Mas o xadrez exige muito tempo, e eu precisava trabalhar, não me tornei, por isso, um enxadrista.

--Você colocava, mesmo, o trabalho acima de tudo. A deslumbrante Paulette Goddard, sua esposa, o chamava para sair, mas você permanecia dedicado à montagem dos seus filmes, deixando-a sem companhia. Bem, pelo menos há uma cena igual a essa quando o retrataram no cinema.

-Não fugiram muito da realidade. - reconheceu.

-George Gershwin era apaixonado por Paulette Goddard, mas ela preferiu a arte cinematográfica à música.

-Você se esquece que, de 1969 até 1976, eu musiquei meus filmes mudos. Compus, antes, músicas que alcançaram mais êxito do que alguns filmes meus.

-Sim, você compôs a canção-tema do criticado “A Condessa de Hong Kong”, cantada pela Petula Clark, “This is my song”, que alcançou sucesso em todo o mundo, em 1967 e se tornou a canção mais ouvida no Reino Unido por ocasião do lançamento do filme. Isso para não falar das canções-temas de “Tempos Modernos” e “Luzes da Ribalta”.

-É verdade que George Gershwin foi um compositor extraordinário, mas, infelizmente, viveu apenas 39 anos.

-Quantos anos tinha Paulette Goddard quando se casou com você?

-Eu, 47 anos, e ela 25. Nós nos casamos em 1936 e a separação veio em 1942. Você perguntou a idade dela porque eu me casava com mulheres de 16 anos? Era comum as nossas avós casarem com 14 anos e ninguém falava em pedofilia.

-Sabemos que as atividades anticomunistas dos Estados Unidos o caluniaram enquanto puderam.

Depois de uma pausa, fiz a Charles Chaplin outra pergunta:

-Você teve muitas esposas e filhos?

-Casei-me em 1918 com Mildred Harris, que tinha 16 anos, eu, 28.Tivemos um filho que viveu três dias: Norman Spencer Chaplin. Separamo-nos dois anos depois e namorei Peggy Hopkins Joyce, que inspirou “Casamento ou luxo?”, filme que dirigi e fiz uma pequena ponta.

E prosseguiu:

-Em 1924, casei-me com Lita Grey, que também tinha 16 anos. Tivemos dois filhos, Charles Chaplin Junior e Sydney Chaplin. Separamo-nos em 1926. Veio, em seguida, Paulette Godard.

-A sua musa de “Tempos Modernos” e “O grande Ditador”.

Separado de Paulette Godard, namorei Joan Barry, atriz de 22 anos. Essa relação foi um tormento para mim, pois ela teve um filho que eu sabia que não era meu.

-Chaplin, você ganhava uma fortuna, que não se esboroou na quebra da Bolsa de Nova York, porque você vendeu antes todas as suas ações. - lembrei.

-Li um artigo sobre o crescimento cíclico do regime capitalista e, vislumbrando que chegariam os anos das vacas magras, vendi todas as minhas ações ainda na alta.

-No Brasil, as mulheres que cobiçam o dinheiro dos jogadores de futebol são chamadas de Maria-Chuteira, as que cobiçam o dinheiro dos pilotos de carro de Maria-Gasolina. Você foi vítima de uma Maria-Celuloide.

-A lei entendeu que, mesmo eu não sendo o pai biológico, fui o último homem a ser visto com Joan Barry; tive, com isso, de custear as despesas da criança e a pagar 75 dólares por semana até ele completar 21 anos.

-Então, você conheceu a mulher definitiva da sua vida, Oona O´Neill.

-Eu tinha 54 anos, e ela 17. Casamo-no em 16 de junho de 1943. O pai dela foi contra a nossa união.

-Era o consagrado dramaturgo Eugene O´Neill, autor da peça “Longa Viagem Noite Adentro”.

-Com Oona, tivemos Geraldine, Michael, Josephine, Victoria, Eugene, Jane, Annette e Christopher. A primogênita nasceu em 1944 e o caçula, em 1962.

-Você foi pai com 72 anos de idade.

-No filme “Harry e Sally, feitos um para o outro”, brincam com esse fato: dizem que você fez o filho, mas não tinha força para carregá-lo.

-Vivi, ainda, até os 88 anos de idade.

-Você nunca revelou a sua técnica de filmar.

-Seria como um mágico revelar a plateia os seus truques.

-O que se imagina é que, antes dos seus filmes falados, você partia de um tema. As ideias vinham e eram filmadas, começava, então, a emergir uma estrutura narrativa, e algumas ideias eram rejeitadas, enquanto outras surgiam formando a estrutura. Esse método implicava em muitas refilmagens. O animador Chuck Jones, que morou perto de um estúdio seu, conta que o pai dele dizia que o viu filmar uma cena mais de cem vezes.

-”Luzes da Cidade” me deu muito trabalho, porque a protagonista era muito rebelde, ao contrário de Jackie Coogan, que interpretou “O Garoto”. Eu sempre disse que aquele menino era um gênio.

-Escreveram que o seu ajuste da improvisação com o perfeccionismo resultava em muitos dias de suor e de milhares de metros de filmes desperdiçados, com um enorme custo. Muitas vezes, você descarregou sua raiva e frustração sobre os atores.

-Eu exigia muito de todos, principalmente de mim. Repeti, por exemplo, incontáveis vezes, cenas em que imitei o Hitler, em “O Grande Ditador”.

-O macarthismo o perseguiu porque o julgou como um esquerdista com atividades antiamericanas.

-O macarthismo foi uma página negra na história dos Estados Unidos. - declarou.

-O chefe do FBI, J. Edgar Hoover, instruiu seus homens a seguir cada passo que você dava e a manter um extenso arquivo sobre tudo o que você fazia.

-Quando eu pedia uma segunda frente na Europa, durante a Segunda Guerra, desagradei a muitos extremistas da direita. Meu filme Monsieur Verdoux, de 1947, considerado uma crítica ao regime capitalista, foi boicotado em muitas cidades americanas, além de mal recebido.

-Os europeus gostaram muito do Monsieur Verdoux, principalmente os franceses. O Congresso dos Estados Unidos não o convocou para um interrogatório público, como fez com vários artistas, tidos como “comunistas”, porque temeu que você satirizasse os interrogadores e mostrasse ao povo o quanto aquilo era ridículo.

-Quando viajou para o Reino Unido, em 1952, no lançamento do “Luzes da Ribalta”, J. Edgar Hoover, negociou com o Serviço Secreto de Imigração para revogar o seu visto, exilando-o.

-Na ocasião, eu declarei: “Desde o fim da última guerra mundial, eu tenho sido alvo de mentiras e propagandas por poderosos grupos reacionários que, por sua influência e com a ajuda da imprensa marrom, criaram um ambiente doentio no qual indivíduos de mente liberal passam a ser apontados e perseguidos. Nestas condições, acho que é praticamente impossível continuar meu trabalho do ramo do cinema e, portanto, me desfiz de minha residência nos Estados Unidos.”

-Voltou em 1972, para receber a maior ovação da história de Hollywood, quando o agraciaram com o Oscar Honorário.

Nenhum comentário:

Postar um comentário