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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5092 Data: 25 de abril de 2015
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119ª VISITA À MINHA CASA
-Nikola Tesla, o homem que, para
muitos, criou a modernidade.
-Aposto que, nas escolas do seu país,
eu nunca sou lembrado.
-Certamente que, nas faculdades de engenharia
eletrotécnica, você é tão estudado quanto Keynes nas faculdades de economia.
-Não me fale em economia que eu perdi
tudo enquanto vivia.
-Deus o chamou em 7 de janeiro de 1943
para iluminar o paraíso.
-O inferno já estava bem aceso, e não
precisaram de mim, mas a sua imagem foi horrível. - criticou.
-A sua presença é tão surpreendente que
me deixou em estado de choque, atordoou-me, essa é a razão de eu falar
bobagens.
-Não se desvalorize; o que eu vi de
gente falando bobagens... e pior, colocando-as em prática. Se eles se
limitassem apenas à teoria...
-Eu tenho um amigo, o Sérgio Fortes,
que é trocadilhista militante e ele, se o visse, diria que você foi um homem
iluminado.
-Tive meus apagões. - não perdeu a
piada.
-O momento mais agitado da sua vida foi
“A Guerra das Correntes” contra Thomas Edison?
-Foram tantos os momentos agitados que
vivi, essa guerra foi uma delas.
-Thomas Edison inventou a lâmpada
elétrica e pretendia ganhar um oceano de dinheiro iluminando o mundo, Nova York
em primeiro lugar. Para isso, ele queria geradores de corrente contínua, porém,
eles teriam de ser muitos. A corrente alternada, que você, Nikola Tesla,
concebeu era bem mais eficiente e viável economicamente para o consumo da
eletricidade.
-Eu apresentei, em 1887, um pequeno
protótipo de motor de indução bifásico com rotor em curto-circuito. Era um
tanto tosco, não era ainda o ideal, mas George Westinghouse me deu um milhão de
dólares pela patente além de se comprometer a me pagar 1 dólar por HP que
viesse a produzir no futuro.
-Você não precisava se preocupar com
dinheiro mesmo que vivesse 100 anos.
-Como falei antes, perdi tudo ou quase
tudo, mas eu me preocupava mesmo era com a ciência.
-Com a sua patente, foi deflagrada a
terrível batalha entre George Westinghouse e Thomas Edison, este, querendo a
corrente contínua e aquele, a corrente alternada.
-Eles se preocupavam mais com os ganhos
financeiros, iluminando Nova York, os Estados Unidos e o mundo, do que com a
ciência propriamente dita.
-Para provar que a corrente alternada
era um perigo, Thomas Edison pagou à molecada pelos cachorros que eles lhe
traziam. Depois, esses cães, em exibições públicas, eram eletrocutados pela
corrente alternada para mostrar o perigo para a vida humana que ela
representava. Ele chegou ao ponto de eletrocutar elefantes...
-E, assim, Thomas Edison inventou a
cadeira elétrica.
E prosseguiu:
-Edison estava brigando com os fatos e,
mesmo que eletrocutasse todos os animais da África, perderia a guerra. -
observou.
-George Westinghouse convenceu o
governo dos Estados Unidos a adotar o modelo-padrão de corrente alternada como
o meio mais eficaz de distribuição de energia elétrica. O investimento que ele
fez na sua criação lhe deu um retorno financeiro em números siderais. Thomas
Edison perdeu essa parada.
-Mas ele soube ganhar muito dinheiro
com a lâmpada elétrica. A G&E não me deixa mentir. - disse-me.
-Você tinha trabalhado com ele?
-Cinco
anos antes, ou seja, 1882, fui para Paris e lá trabalhei, como engenheiro, na
“Continental Edison Company, desenhando aperfeiçoamentos em equipamentos
elétricos. Em 1884, eu me transferi para Nova York e me tornei assistente do
renomado Thomas Alva Edison. Eu tinha de receber um poupudo bônus dele, por
algumas descobertas e ele não me pagou alegando que se tratava de um chiste.
-Na chamada “Guerra das Correntes”,
você se vingou.
-Pelo menos, ficou menos bilionário.
-Marconi, que não era cientista e sim
empresário, enriqueceu também com a sua invenção, o rádio.
-Eu já fazia transmissões sem fios
desde 1894.
Peguei uma apostila na estante de
livros, enquanto Nikola Tesla observava os pombos no parapeito da janela e lhe
disse com os papéis nas mãos.
-Aqui, registraram que você viajou,
poucos depois dessa “guerra”, pelos Estados Unidos e pela Europa, apresentando novos
ensaios científicos, detalhando aplicações nunca imaginadas sobre a aplicação
da corrente alternada de alta frequência, além de outras descobertas
relacionadas com ela. Mais ainda: você desenvolveu um conjunto extenso de
inventos para produção e uso da eletricidade, como o motor elétrico, e
registrou incontáveis patentes, como o acoplamento de dois circuitos por
indução mútua, princípio adotado nos primeiros geradores industriais de ondas
hertz....
-... O princípio e metodologia de
criação de energia através de campo magnético rotativo, o motor assíncrono de
campo giratório. - interrompeu a minha fala com esses acréscimos.
-Neste papel, lê-se que você também
inventou a corrente polifásica, comutadores elétricos e ligação em estrela,
novos tipos de geradores e transformadores, comunicação sem fio, a lâmpada
fluorescente, o controle remoto por rádio e protótipos de transmissão de
energia.
Respirei e concluí:
-Sou analfabeto na sua ciência, apenas
usufruo da sua genialidade, como todo o mundo.
-Tudo bem; não gosto daqueles que
usaram as minhas criações como apoio de pseudociências, com teorias sobre OVNIs
e quejandos.
-Você era croata?
-Sim, nasci na aldeia de Smiljan que,
em 1856, pertencia ao império austríaco.
-Você era filho de um padre presbítero
da Igreja Ortodoxa e sua mãe, por sua vez, também era filha de padre.
-Minha mãe era por demais talentosa;
embora analfabeta, memorizou uma miríade de poemas épicos. Creio que herdei o
seu talento e a sua memória.
-O seu poder de memorização, Nikola
Tesla, é lendário, afirmam que você decorava livros inteiros. E como foi você
na escola?
-Estudei engenharia elétrica no
Politécnico Austríaco na cidade de Graz, mas não concluí o curso. Tive
dificuldades de adaptação. Quando garoto, deixaram-me fazer um curso de quatro
anos em três, adulto, não. No terceiro ano, deixei de assistir às aulas e sumi,
imaginaram que eu tivesse me afogado no rio. Reapareci, arrumei o meu primeiro
emprego como engenheiro assistente, mas meu pai me convenceu a frequentar uma
universidade na cidade de Praga. Fui, depois, para Budapeste, creio que em
1880.
-Lá você inventou o amplificador de
telefone?
-Ou alto-falante.
-Tesla, falam que você era misofóbico.
-De fato, eu queria tudo limpo e
higienizado. Já que vamos falar das minhas idiossincrasias, eu não suportava o
número 3 e seus múltiplos. Não aguentava olhar para uma pessoa obesa,
principalmente mulher.
-Mas amava os animais.
-Sim, nunca me esqueci do “Magnífico
Macak”, o gato que tive quando garoto. Como eu adorava os pombos do Central
Park, que eu alimentava diariamente, eles me adoravam também.
-Você teve uma doença rara na sua
infância; clarões de luz o cegavam e você tinha alucinações.
-Eu visualizava, no meu cérebro, as
invenções na sua forma exata antes de elas se tornarem concretas.
-Pensamento visual.
-Também, desde garoto, tinha visões de
acontecimentos anteriores ao meu nascimento.
-Não se casou?
-Não daria certo eu viver intimamente
com outra pessoa. Vivi meus últimos anos num quarto de hotel com o pouco
dinheiro que me restou. Viam-me como um cientista maluco. Bem, hora de ir.
Antes de partir, disse
espirituosamente:
-Espero que o caminho esteja iluminado.
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