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segunda-feira, 13 de abril de 2015

2831 - pelo telefone


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5081                                  Data:  07  de abril de 2015

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SABADOIDO DE ALELUIA

 

-O Luca não esperou o sábado de aleluia e malhou o Judas. - puxei o assunto com o Claudio.

-Quem foi o Judas dele?- quis saber.

-O Zuenir Ventura. Luca estava indignado com a crônica em que narra a apoteose do concerto do Nélson Freire, no Teatro Municipal e o jantar, depois, com o pianista.

-Li a crônica. - disse meu irmão.

-O Zuenir Ventura ia tão bem no seu texto, mas no final desafinou vergonhosamente. - disse e acrescentei:

-Ele comparou as mãos do Nélson Freire com os pés do Neymar. - lembrou meu irmão com um sorriso maroto.

-Luca, ao ler essa comparação, subiu nas tamancas e com toda a razão. Ele estava possesso no telefone: “Nélson Freire com três anos de idade já tocava piano. O que esse Neymar com três anos fazia com os pés? E mais: o pianista também usa os pés, pois o piano tem 3 pedais”. Como o Zuenir Ventura faz uma comparação dessas?!...”

-Sim, mas quando o Nélson Freire começou a tocar, não alcançava os pedais.

-Sim, Claudio, mais uma razão para louvar o talento das suas mãozinhas nas teclas do piano.

-Sabe o que é Carlinhos, esses escritores temem parecer elitistas, querem se mostrar integrados ao povão, por isso sai uma comparação dessas de um concertista com um jogador de futebol.

-Eu contei para o Luca uma passagem do Zuenir Ventura na cadeia, narrada pelo próprio.

-Qual?

-O Nélson Rodrigues, que tinha trânsito entre os militares, durante a ditadura, foi ao presídio para tirar o amigo Hélio Pellegrino de lá, este disse que só sairia se libertassem o Zuenir Ventura também. Então, o Nélson perguntou se o Zuenir era de explodir bombas por aí, o Hélio Pellegrino garantiu que não, e os dois saíram da cadeia. Sabe o que o Luca me disse?... “Se era para fazer essa comparação das mãos do Nélson Freire com os pés do Neymar, deveria continuar preso.”

-Ele malhou o Judas com vontade. - concluiu.

Nesse instante, o Daniel e a Gina apareceram na cozinha vestidos para sair.

-Vão almoçar às 9h da manhã? - não perdi a piada.

-O Daniel vai fazer exame médico para poder ingressar na academia de ginástica. - esclareceu a Gina.

-Eu estou gordo, Carlão.

Apertou as carnes do abdômen e acrescentou:

-Antes que isto se transforme em pneus de Fórmula 1, eu tenho de agir.

-O Daniel começa empolgado e depois desiste. - demonstrou a Gina o seu ceticismo.

-Já estou quase tão gordo quanto o Válter do Fluminense; assim, nós dois não podemos mostrar todo o nosso talento nos campos de futebol.

Claudio interveio na conversa:

-O Daniel, depois que passou a trabalhar na Casa da Moeda, vai ao portão e o ônibus o leva para o serviço, na volta, o ônibus o traz até a porta de casa. Na hora do almoço, lá, não precisa se preocupar, porque tudo está perto. Resultado: engordou.

-Quando eu trabalhei nos Correios, eu estava magro e o meu bolso também. - observou.

-Carlinhos, é provável que nós voltemos a tempo para lhe dar uma carona até em casa. - disse-me a Gina, enquanto os dois saíam.

-Claudio, tem levado em um ou dois canais da HBO a série documental “Hoje é Dia de Música”, que é excelente.

-Carlinhos, eu não vejo, praticamente, nada na HBO.

-Então, trate de ver; são dez documentários, de 50 minutos cada, abordando a história da música popular brasileira. Assisti a três e todos muito bons. Acredito que eles se inspiraram na série documental de outro canal americano sobre a história do Jazz, e eu gravei todos: 20 CDs.  

Para que ele se interessasse mais, persisti com o tema.

-O episódio com Pixinguinha, Donga e João da Baiana foi muito bom. Havia música nas grandes casas do início do século XX; na sala, tocava-se choro; na cozinha e no quintal, samba. Pixinguinha, que começou a aprender teoria musical com o pai, tocava na sala, mas, atraído também pelo samba, ficava um tempo na cozinha e no quintal.

-”Batuque na cozinha, sinhá não quer.” - citou meu irmão o sucesso do João da Baiana revivido pelo sambista Martinho da Vila.

-Referem-se, no programa, ao “Pelo Telefone” do Donga, que teve o mérito de fazer o primeiro registro em disco da palavra samba.

-É um samba que tem quase tudo de maxixe.

-Sim, Claudio, eles disseram que muitos, entre eles o China, irmão do Pixinguinha, já faziam sambas antes do “Pelo Telefone”, e que o ritmo definitivo do samba veio mesmo dos sambistas do Estácio, na década de 30, mas acentuaram a importância do Sinhô, para essa travessia, com os seus sambas na década de 20.

-Quem conhece bem a origem do samba é o Nei Lopes.

-Há um depoimento do Nei Lopes, nesse episódio, que diz que o  samba foi concebido na  África, nasceu na Bahia e se desenvolveu no Rio de Janeiro.

-Falaram dos “Oito Batutas”, da viagem que fizeram a Paris?

-Claro. Como o grupo durou de 1919 a 1923, por aí, não difundiu ainda o samba autêntico, na Europa, e sim o maxixe, cateretê, batuque e, evidentemente, o choro.

-Eles fizeram sucesso no exterior, pois ficaram  meses tocando numa boate parisiense. - acentuou.

 -Nesse episódio, tratam do ostracismo a que foi relegado o samba com a ascensão da bossa nova na virada dos anos 50 para os 60, e que o Chico Buarque surgiu como o novo Noel Rosa trazendo o passado de volta.

-Na época, houve compositores que o criticaram por levar toda a música para trás.

-Eles pensam que nós temos memória curta, Claudio, mas havia rivalidade entre aqueles artistas que surgiram na década de 60. Mas deixe-me prosseguir.

-Prossiga.

-Então, a Hebe Camargo, sempre antenada, no programa dela, uniu João da Baiana, Donga, Pixinguinha e Chico Buarque.

-Chico Buarque era novinho.

-Parecia o Michael Corleone dançando com a Apollonia no Poderoso Chefão III. - comparei.

-Reprisam, de vez em quando, esse encontro no programa dela. O Chico canta com o Donga “Pelo Telefone”. - disse ele.

-No depoimento do Chico Buarque, Claudio, ele diz que aprendeu a letra com o pai, mas a errada, a da paródia.

-”Pelo telefone, chefe da polícia manda me avisar, que na Carioca tem uma roleta para se jogar...”- entoou meu irmão a paródia.

-O Donga, então, o corrige - disse. No filme, não se nota isso, o Donga está empolgadíssimo, cantando e dançando, enquanto o Chico Buarque ri muito e repete as palavras cantadas pelo Donga.

-Quando vai ser o próximo “Hoje é Dia de Música”?

-Claudio, soube, agora, que entrou no ar em outubro do ano passado, espero que a reprise persista por mais alguns meses.

Passamos a falar de outros assuntos, até que a Gina e o Daniel voltaram do exame médico.

 

 

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