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quarta-feira, 22 de maio de 2013

2392 - os cães ladram para Tijuana

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4192                                  Data:  21 de  Maio de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA DA BABÁ AOS UIVOS

A primeira obra musical (e que obra musical!) a ser citada na abertura do programa desse domingo, 19/05, foi o “O Rapto no Serralho” de Mozart. Isso porque o Jonas Vieira deu início aos trabalhos informando que o Luzer Machtyngier voltaria a ser um dos substitutos do Sérgio Fortes, enquanto reportava-se à apresentação da OSB em que seu convidado foi um dos violinistas do singspiel do divino Mozart.
Coube ao Dieckmann indicar a primeira gravação do Rádio Memória e ele não voltou muito no passado, optando pela “Diana”, com Paul Anka, que alcançou grande sucesso nos anos 60. Antes, explicou que a inspiradora dessa canção foi a sua babá. (*)
Logo me veio à mente o escândalo que Freud provocara quando palestrou para os seus pares sobre a sexualidade infantil. Reagiu o pai da psicanálise à indignação geral com uma frase apenas: “As babás sabem do que estou falando.”
Luzer foi para os Estados Unidos, sem recuar muito no tempo e solicitou uma gravação que juntou, em 1967, para o nosso regalo, dois dos maiores expoentes do século XX: Duke Ellington e Frank Sinatra.  Com destacados instrumentistas na orquestra do mestre do Jazz, Frank Sinatra teve de ceder espaço para alguns solos que abrilhantaram ainda mais “I like the Sunrise”. O arranjo era de Billy May. (**)
A gravação solicitada depois, pelo titular do programa, robusteceu ainda mais a minha decisão de sintonizar a Rádio Memória. Disse o Jonas essas palavras que tento reproduzir fielmente, embora saiba que a tentativa é vã:
-Luiz Barbosa era um cantor estilista. Hoje, está esquecido, mas foi ele que influenciou as interpretações de Ciro Monteiro e Moreira da Silva. Boêmio inveterado, morreu cedo. O samba que vamos ouvir, “Sou jogador” é do próprio Luiz Barbosa, e a letra é tão boa que vou lê-la.
E eu que não sabia até então da existência de tamanho talento!...Reconheci, enquanto o samba soava, que, em matéria de cultura popular brasileira, havia, em mim, uma lacuna que, agora, começava a ser preenchida. 
A bola voltou para o Dieckmann, que, além de não sair do Brasil, continuou com outro grande sambista, Ismael Silva. Optou pela música dele de que eu mais gosto, “Se você jurar”, mas sem se esquecer de falar do “Antonico”. Nesse samba, sem alterar uma letra de uma frase do Pixinguinha, Ismael Silva transformou-a em verso: “faça por ele como se fosse por mim”. Com essas palavras, Pixinguinha encerrou uma carta, de 1939, em que pedia ao historiador Mozart de Araújo/Antonico ajuda a um amigo (Ismael Silva), que passava por grandes dificuldades financeiras.
Houve uma pausa para a meditação (não sei se nesse momento) e foi lida pela voz empostada do José Maurício, a resenha de Quincas Borba, do grande Machado de Assis.
Luzer quis ouvir Scott Joplin, o compositor mais representativo do ragtime, que morreu louco, devido à sífilis, em 1917.  A música era “The Cascades”, inspirada na  Exposição  Internacional de Saint Louis, em 1904.
Enquanto o Dieckmann, além de ligar “Cascades” ao filme “O Golpe de Mestre”, dissertava sobre o Palácio Monroe, que foi edificado no Brasil graças a essa exposição, eu me recordava do programa da Rádio MEC do João Carlos Carino em que ele comparou “The Cascades” de Scott Joplin com “Ubiratan” de Pixinguinha. E concluiu-se que as duas composições eram primas, ou seja, tinham a mesma origem, era africana. Certo, mas que o Choro de Pixinguinha tem mais malemolência, não há dúvidas.
Jonas Resende me surpreendeu mais uma vez.  Agora, com o trompetista Rafael Mendez que transpôs do violino para o seu instrumento a peça mais difícil do mais virtuose violinista de todos os tempos, Nicolò Paganini, que é o “Moto Perpétuo”. Todos ficaram assombrados com o fôlego do trompetista; Luzer, encarregado pelo titular do programa a dar uma explicação, considerou que uma junta médica, com pneumologistas, seria mais indicada do que ele para explicar.
Eu, até aquela hora, conhecia apenas o “Moto Perpétuo” transcrito pelo Edu da Gaita.  O músico brasileiro precisou de onze anos de estudo, segundo o seu filho, para adaptar as mil e duzentas notas para a gaita e tocá-la em 3 minutos e 21 segundos. Conseguiu a façanha em 1956, acompanhado pelo piano do maestro Leo Peracchi.
Nos áureos tempos do Pasquim, Edu da Gaita concedeu uma entrevista e disse que orientou Villa Lobos, no concerto que este compôs para Gaita e Orquestra, mais foi ludibriado – garante – pois ele dedicou a obra ao conhecido, internacionalmente, como mestre da harmônica, o americano John Sebastian. Restou-lhe o consolo de ganhar a dedicatória do concerto para Gaita e Orquestra de Radamés Gnatalli. Mas isto é outra história.
Eu não sabia que Les Paul fora o inventor da guitarra elétrica, instrumento  que deixa o José Ramos Tinhorão de cabelo em pé.  E a música que soou ficara célebre com Glenn Miller; “In the mood” que, na versão de humorística de Aloysio de Oliveira, transformou-se em “Edmundo”.
Antes de a guitarra elétrica vibrar, há, na gravação de 1961, um falatório entre Les Paul e sua mulher, Mary Ford, que o manda arrumar um emprego.
Na vez do Luzer, ele apresentou uma das muitas obras-primas de Noel Rosa, “Pra que mentir?”, com a parceria do Vadico, compositor a quem cabia colocar música na peça em versos de Vinícius de Moraes, “Orfeu no Carnaval”. Ele declinou do convite por causa da sua agenda repleta, cabendo a missão a um jovem que iniciava na carreira, Antonio Carlos Jobim.
A letra de Noel Rosa confirma o Poeta da Vila como aquele que elevou as letras das canções populares a um patamar de excelência.
 A gravação era com Paulinho da Viola, cuja voz acaricia os nossos ouvidos.
A última música do programa desse domingo estava a cargo do Jonas Vieira e ele, antes de mostrá-la, discorreu sobre o apogeu e nadir das orquestras. O desaparecimento se deu nos anos 60, mas uma delas ainda resistiu bravamente, “Tijuana Brass”.  A gravação era “A Taste of Honey”.
Depois de tocada, Dieckmann comentou que ele e o Luzer se reportaram ao triunvirato Henry Mancini, Burt Bacharach e Herb Alpert.
Como a finalidade do programa é ativar as nossas reminiscências, sinto-me encorajado a dizer que eu, ao contrário dos dois, reportei-me ao Big e Veludo, cachorros da nossa casa da Rua Cachambi.
Meu irmão Claudio tinha o LP Herb Alpert & Tijuana Brass e predileção pela faixa “A Taste of Honey”, mas sempre que a colocava na vitrola, a nossa dupla canina uivava como lobos solitários à lua. Até então, Big e Veludo só uivavam com a sirene do bombeiro, mas o instinto melancólico, ou lá o que seja, passou a ser deflagrado também com o trompete de Herb Alpert. Era constrangedora a barulheira dos nossos cães, pois não havia o encanto dos uivos do coiote que Ennio Morricone transformou em notas musicais na trilha sonora do filme “Três Homens em Conflito”.
A coisa ficou tão séria que nossos pais proibiram a audição do “A Taste of  Honey” em casa. Não adiantou muito, pois eles passaram a uivar com a protofonia da ópera “O Guarany”, de Carlos Gomes, mais uma razão para que o rádio fosse desligado na “Voz do Brasil.”
E vieram as despedidas e alusão às férias do Sérgio Fortes na Europa que, caso não sejam férias de almirante, se encerram nos próximos dias. (***)
Bem, foi mais um Rádio Memória que cumpriu o seu objetivo: levar os ouvintes aos bons momentos do passado. 

(*) Se o seu O BISCOITO MOLHADO fosse escrito em latim, a construção da frase não deixaria dúvidas. A babá em questão é a do Paul Anka.

(**) o redator deste periódico devia estar sonolento. Luzer foi bem enfático quando disse que Sinatra fez o Billy May maneirar. Deixa os caras tocarem!

(***) Sérgio Fortes já voltou! Sérgio Fortes já voltou!

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