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sexta-feira, 15 de junho de 2012

2165 - velho lobo de outras batalhas


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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3965                                      Data: 07 de junho de 2012
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O SÁBADO EM QUE O SABADOIDO ENDOIDOU
2ª PARTE

Luca, falando da Rosa, sacou um papel do envelope que trouxera e me entregou. Tratava-se de uma estrofe de seis versos, com rima emparelhada, inspirado pelo Causídico Verborrágico. Aqui vai, pois merece uma leitura:
                AO ELIO
Desejado por homens e mulheres
É Banquete para duzentos talheres,
É uma obra-prima de Jeová,
Nada peço porque ele não dá,
Sábio como o Marco Aurélio?
Só pode ser o famoso Elio.

-Manda para o Elio. - pediu-me o Luca.
-Ele vai gostar, embora a Rosa tenha cometido uma injustiça no quarto verso; se ela comparecesse ao almoço dos 60 anos do Elio, no Jirau, ele teria pago a conta de vinte e um comensais.
Não me detive na boca livre promovida pelo nosso sábio amigo porque o Luca passou a falar de um vizinho de prédio.
-Ele passava por mim com um quipá na cabeça...
-Tinha aquelas barba e vestimenta preta?
-Não, Claudiomiro, esses são judeus ortodoxos.
-Dirigi-me a ele com palavras dobre o judaísmo, ele se mostrou confuso, mas eu esclareci que sou gói... Disse-lhe que, quando jovem, trabalhei com judeus de origem polonesa e aprendi um pouco de ídiche.
Meu irmão enveredou pela política bélica israelense, esquecendo-se do truísmo “se queres a paz, prepara-te para a guerra”, mas o Luca retornou à sua narrativa.
-Soube que ele se chama Joel e que é arquiteto. Perguntei-lhe, então, se ele conhecia o Elio Fischberg. “O juiz?...” - indagou ele – conheço. Fui aluno da Dona Sarita, a mãe dele.”
-Dona Sarita foi professora de História do Colégio Pedro II.”- acrescentei.
-E o Elio? - interessou-se o Cláudio.
-Creio que o Fischberg conhece toda a comunidade judaica do Rio de Janeiro. Reportei-me a esse vizinho, em um e-mail e o Elio não só falou dele como do seu irmão. Como eu me mostro interessado nos judeus provenientes da Polônia, Elio, no e-mail em que me respondeu, referiu-se a uma parente da Regina, que tem 91 anos e que pode falar tudo sobre essa ramificação judaica que veio para o Brasil. Para tanto, segundo o Elio, fala-se com o Carlinhos e marca-se  um almoço com ela em Copacabana.
-Nem cópia desse e-mail chegou à minha caia de correios internética. - pensei, mas disse outra coisa.
-A Regina é a esposa do Elio.
-A Rosa reclama que o Carlinhos escreve muito mais sobre o Elio do que sobre mim; expliquei-lhe que o Elio é conhecido por todos o que não é o meu caso.
-Causídico Verborrágico é boa gente. - frisei.
-Elio é extremamente atencioso, muito educado, um gentleman.
Aqui vão os elogios do Luca, que seriam omitidos caso fossem dirigidos ao Dieckmann, pois não quero perder os poucos leitores que ainda tenho.
-Tenho de justificar o apelido que a Rosa Grieco me deu de “Fonte dos Quatro Rios de Roma”. - falei, enquanto me levantei para urinar.
-Antes de ir ao banheiro, ouça esta. - deteve-me o Luca.
E falou de um amigo comum dele e do Vagner que conhecia pessoalmente a Rosa.
-Afirmou que ninguém é mais erudito do que a Rosa, exagerou.
Creio que não exagerou, pensei em direção ao banheiro. Aproveitei a proximidade e fui ao quarto do Daniel, que tocava teclado.
-Não tocou mais “It's a wonderful world”?... - critiquei com esta pergunta o rock que tocava.
-Eu filmei “It's a wonderful world” e você levou uma cópia no pendrive. Eu vestia uma camisa do Fluminense, lembra-se.
-Daniel, vista agora a camisa do Flamengo e canta “Meu mundo caiu.”
De volta à sessão do Sabadoido, Cláudio lidava com o copo de bebida enquanto o Luca e o Vagner o observavam. Passaram a tratar do crime passional que acontecera na padaria do antigo ponto de bonde do Cachambi. Um tenente-coronel da Polícia Militar se atracou com o filho do dono, pelo que entendi, e, em dado momento, fuzilou com um tiro de revólver o seu rival. Luca se deteve no mérito do homicídio, enquanto o Cláudio considerou os reflexos desse crime no trânsito.
-Houve engarrafamento em várias ruas.
Como eu peguei o camburão andando, ou seja, o bonde, apenas ouvi.
Em seguida, Caetano Veloso passou a ser o assunto.
-Há quatro colunas que ele não fala do Moreno. - pilheriou o Cláudio.
-Vamos ver quantos domingos ele consegue aguentar sem falar do filho.
A essas palavras, Luca emendou:
-Reinaldo voltou a elogiar o Caetano Veloso. Carlinhos fez a defesa do “ou não”, como o caminho que ele deixa aberto para a antítese...
-Caetano escreveu sobre os maus imitadores dele que falam “ou não”. - interferi.
-Mas Caetano Veloso esperou o Chico Anísio morrer para reclamar.
-Bem, Luca, Caetano Veloso encarou Paulo Francis como polemista. - argumentei.
-Eu sei que Caetano Veloso é muito inteligente, defende-se sozinho.
-Não precisa de ajuda de ninguém. - concordou o Cláudio com o Luca.
-O que o Chico Anísio e o Arnaud Rodrigues faziam com o Caetano Veloso e o Gilberto Gil estava mais para caricatura do que para imitação. - afirmei.
Depois, a conversa enveredou para os bailes de carnaval de outrora em clubes e teatros. Adepto do carnaval de rua, desinteressei-me por aquela conversa. O desinteresse encheu a minha bexiga e voltei ao banheiro; no meu retorno, o assunto era o mesmo. Falava-se no Monte Líbano. Por que não o “Cai do Líbano”, o carnaval dos áureos tempos do Cachambi, que reunia os moradores de todas as idades do bairro e adjacências, que, de lambuja, ainda proporcionava os desfiles do Unidos do Cabral, das Escolas de Samba Inferno Verde, Unidos do Jacarezinho e Unidos do Cabuçu?
Luca e Cláudio tratavam agora do baile de carnaval do Teatro Municipal.   Enquanto falavam, eu pensava que só mesmo um capricho do ex-presidente Juscelino Kubitschek o levou a confessar com Adolfo Bloch a frustração de nunca ter comparecido a um carnaval no templo da música clássica do Rio de Janeiro. Capricho e sovinice, pois o dono da Manchete lhe arrumou convites para o camarote; por que o JK não colocou a mão no bolso?...   No Sabadoido, não se discutia a presença do JK, e sim do Luca, no baile do Teatro Municipal.  E, então, deu-se uma discussão que por pouco não sai do controle,
Eu ouvia, e coçava a cabeça, acabrunhado.
-Caramba, no Sabadoyle eram proibidos futebol, política e religião, porque suscitam paixões desenfreadas, assuntos que, no Sabadoido, tratamos sem destempero. E brigamos por causa de carnaval?
-Mas tudo acabou bem, com a lembrança da atuação do extraordinário lateral direito Djalma Santos, que entrou na partida final contra a Suécia, na Copa de 58 e parou o melhor jogador adversário, o capitão Skoglund. E Oduvaldo Cozzi cunhou a bela frase, na sua narração: “Procuro Skoglund, o deus louro dos estádios escandinavos e encontro o negro Djalma Santos, velho lobo de outras batalhas.”



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