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terça-feira, 2 de dezembro de 2014

2744 - o sindicalista agitador 2


           

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 4994                                       Data: 28  de  novembro de 2014

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COUTINHO, SEM PELÉ, NO RÁDIO MEMÓRIA

3ª PARTE

 

Jorge Coutinho, o agitador cultural do Teatro Opinião, nos anos de chumbo, falava agora, no Rádio Memória, como presidente do sindicato dos artistas. Dizia-se regalado com o apoio que recebe, ficando entusiasmado em tomar diversas iniciativas, como a de ir à Assembleia Legislativa falar dos baixos salários na FUNARJ e ser bem sucedido.

-Jonas, ficaram sensibilizados e houve uma pressão muito grande na FUNARJ, do próprio Teatro Municipal, coro, dança, todo o mundo, enfim, para que eu  me tornasse secretário da Cultura do Rio de Janeiro. Eu não posso dizer não, sou um homem de partido, do PMDB. Eu não estou fazendo campanha, a categoria está pedindo...

-Muito bem. - aprovou o Jonas Vieira.

-Eu recebi apoio de oitenta grupos de teatro do interior.

Reportou-se em seguida a uma reunião no Teatro Princesa Isabel, lotado de pessoas, que tratam de cultura, incentivando o obter esse cargo.

-O que me preocupa muito, Simon, Jonas, senhores ouvintes, é que, no momento, somos 65%, na arte cênica, sem trabalhar. Isso é muito grave!

-Caramba! - abismou-se o Jonas Vieira e, certamente, todos.

-Dentre uma das consequências perversas desse desemprego, têm-se equipamentos de teatro e de música sem serem utilizados. - assinalou.

Jorge Coutinho, que faz parte do Conselho Municipal de Cultura e do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional afirmou que, na sua visão, a secretaria de Cultura tem de estar interligada com as outras secretarias do estado do Rio de Janeiro.

-A cultura precisa ser levantada.

-É evidente, Jorginho, ela tem de penetrar em todos os segmentos da sociedade. - concordou o Jonas Vieira.

Em seguida, o candidato a secretário falou da necessidade de a Rádio Roquette Pinto ter uma ligação mais estreita com a Secretaria de Cultura, algo, a nosso ver, parecido com a gestão de Artur da Távola como secretário das Culturas, que poderia ser mais detalhado pelo Sérgio Fortes, mas, infelizmente, ele só falou do calendário do dia 23 de novembro e teve de sair devido a compromissos prementes. (*)

Jorge Coutinho se deteve, depois, na situação dos nossos museus, que deviam ser melhores. Disse que, como membro do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, foi com um grupo à sede do bispado, onde o arcebispo Orani Tempesta recebeu, como anfitrião, o Papa Francisco. Lá, viu a modesta cama em que dormiu o Sumo Pontífice, bandeirinhas e demais objetos relacionados a essa visita e lamentou que tudo aquilo estava oculto, não estava aberto à visitação pública.

Nós, ouvintes, já estávamos preocupados com a mudez do Simon Khoury, e, apesar de ocupado em dar o seu recado, o convidado também estranhou.

-O olhar de ternura do Simon para mim...

-Eu quero fazer uma pergunta.

-Coloque uma música, Simon, depois pergunte. - estabeleceu o Jonas Vieira as regras.

Com muitas palavras represadas, ele teve de fazer um comentário antes de atender ao titular do programa.

-Eu tenho 90 laudas sobre o Mílton Gonçalves, não fiz o livro porque não tinha fotografias dele no teatro, agora, tenho. O Mílton me falou da volta das valsas e é verdade, todos os filmes, seja de que país for, tem valsa, valsa, valsa.

Depois de tentar o compasso ternário na sua fala, disse que Milton Gonçalves lhe pedira a Valsa-Jazz n° 2 de Shostakovsky.  E a gravação escolhida era com a orquestra de Alexandre Desplat.

-Esse é o meu russo favorito. - extasiou-se tanto o Jonas Vieira que se esquecera de Tchaikovsky.

-Obra-prima. -orgulhou-se o Simon Khoury da escolha do seu amigo.

-Essa música integra uma suíte de jazz que Shostakovsky compôs em 1930. Há coisas, como a valsa que ouvimos que nada têm a ver com o jazz, evidentemente, americano. - comentou o Jonas Vieira.

Simon Khoury, com crédito pela boa gravação ouvida, tinha agora a palavra. Citou alguns amigos seus e se deteve naquele que lhe é inesquecível, Carlos Kroeber, lembrou que ele foi um grande administrador de teatro no Rio de Janeiro, mas, para tanto, teve de recusar trabalhos como ator. E veio a pergunta que fora procrastinada:

-Você não teme a mesma coisa, Jorginho?

Ele respondeu que o seu objetivo é não ficar parado, não quer ficar no palco, prefere os bastidores. Instigado pelo Simon Khoury, afirmou que a sua preocupação maior são os 65% desempregados na classe artística. Hoje – acentuou –  o trabalho no estúdio de televisão não o empolga mais, porque os artistas são dirigidos por diferentes diretores, cada qual com a sua maneira, e assim,  a pessoa não tem ideia do que está fazendo. Expressou a sua nostalgia pela Janete Clair, que escrevia toda a novela, os artistas pegavam os capítulos, no Jardim Botânico, numa sexta-feira, para decorar e gravar.

-As novelas, de hoje, não me agradam. - concluiu.

-Não agradam a ninguém. - foi o Jonas Vieira mais incisivo.

-Um diretor corta a cena de um lado, o outro corta diferentemente.

Jorge Coutinho foi interrompido por uma observação do Simon Khoury:

-O ator começa heterossexual, no meio da novela, não tem noção do seu sexo, vira bissexual e acaba bichona.

Depois da Pausa para Meditação, Jonas Vieira pediu mais música. Simon Khoury, alegando que o caricaturista Aroeira, homenageado por uma composição sua, não a ouvira como devia, anunciou “Aroeira” como a próxima atração musical.

Apesar das gozações do Jonas Vieira, de que Simon se pôs a lamber a sua cria, “Aroeira”, a nosso ver, é de deixar os irmãos Caruso com inveja.

-Onde nós encontramos seu disco, Simon?

-Na “Loja Arlequim”.

Sérgio Fortes afirma que Jonas Vieira e Simon Khoury brigam há 50 anos, e parece que é verdade, pois, agora, discutiam se a “Arlequim” é loja ou livraria.

-Só se encontra lá na livraria?

-Há outras lojas, Simon, mas esqueci os nomes. - foi a resposta do Simon.

Depois de o Jorge Coutinho ter revelado a sua idade, 80 anos, o que suscitou piadas do compositor de “Aroeira” sobre o seu desempenho sexual, a seriedade retornou com as informações trazidas pelo convidado do Rádio Memória.

- Fui à Brasília porque a tônica era acabar com o trabalho infantil na televisão. Eu estava lá sozinho, como presidente do sindicato dos artistas, no meio de advogados e desembargadores; a TV Globo não enviou um representante, a TV Record, a Bandeirante, o SBT, também, não.

Na época, passava uma novela na TV Globo em que a Camila Pitanga e o Lázaro Ramos formavam um casal, e o objetivo, nessa reunião, era substituir o filho dos dois por um anão.

-Falei com eles que é difícil encontrar um anão no sindicato, ainda mais anão preto.

Argumentaram – disse ele – que as crianças do filme “Cidade de Deus”, para chorarem, foram espetadas com agulhas.

-Não é nada disso, contestei, disse a eles que existe o método Stanislavski, há outros processos para se chorar. O Marlon Brando, que foi um excelente ator, nunca chorou.

Aqui um adendo: o diretor Bernardo Bertolucci, num documentário sobre “O Último Tango em Paris”, aludiu à terrível dificuldade de o Marlon Brando chorar na cena capital do filme, que ele acabou superando.

Jorge Coutinho encerrou seu depoimento pedindo que os artistas esqueçam o glamour do estrelato e tomem consciência que há 65% de desempregados na classe artística.

Com a música escolhida pelo Simon Khoury do seu compositor vivo preferido, Ennio Morricone, do filme “Quando Explode a Vingança”, o programa chegou ao fim.

 

(*) O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO compartilha a sua preocupação, pois o Sergio Fortes só tem atendido a compromissos prementes e tem faltado a todo o resto.

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