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quinta-feira, 12 de setembro de 2013

2467 - de mal com o Cabral



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4267                         Data:  07 de  setembro de 2013
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166ª CONVERSA COM OS TAXISTAS

Peguei o táxi 151, do Meu Nobre.
-Olhe esse vento, é o sudoeste. - afirmei sem, no momento, saber indicar corretamente os pontos cardeais.
-Sudoeste?...- estranhou.
-Sempre que surge um vento que indica chuva, diz-se que é o sudoeste e eu sigo a manada. - confessei.
-Eu conhecia bem a direção do vento na época em que soltava pipa.
-E não solta mais?... Há gente com quase 70 anos de idade colocando a pipa no alto.
-Passou a minha fase de garoto e eu larguei essas brincadeiras. - resignou-se.
-Havia o tempo da pipa, que era o das férias escolares.
-Isso mesmo. - animou-se.
-Das brincadeiras de criança do meu período infanto-juvenil, muitas sumiram. Vê-se ainda pipas, pandorgas, papagaios no céu, mas quem empina, geralmente, são os adultos.
-Jogar pião com aquele cordel... Como se chama?...
-Fieira. - fui em seu auxílio.
-É isso; jogava-se o pião enrolado na fieira, puxava e ele vinha rodar na sua mão.
-Só os craques conseguiam isso. Eu não dava esse puxão com medo de ele voltar na minha cara. Se o pião, que eu arremessava ao chão, girasse, depois de desenrolado da feira, eu já me sentia realizado. - confessei.
-Nunca mais vi um menino brincando com pião, talvez ainda haja no nordeste. - manifestou-se.
-Na minha época de curso primário, não havia uma hora de recreio sem jogo de bola de gude.
-Hoje, vê-se bolas de gude, mas servindo de enfeites de antessalas de consultórios. - disse ele.
-Nunca mais vi aqueles triângulos riscados no chão, repletos de bolas de gude e a linha, mais adiante, onde, aqueles que arremessassem a sua bolinha de gude mais próxima dela ganhavam o direito de jogar antes dos demais.
-E, antes, do arremesso, o mais esperto gritava: “Marraio, feridô sou rei.”
Infelizmente, a corrida da Domingos de Magalhães até a Modigliani não demanda muito tempo, por isso, as nossas reminiscências foram interrompidas no melhor momento, aquele em que ele citou um bordão que repetíamos à exaustão, como muitos outros, iguais a papagaios, sem conhecer seu significado.
No dia seguinte, torci para pegar o carro 151 de novo, pois havia pesquisado, numa monografia sobre a história do jogo de bola de gude, que “Marraio, feridô sou rei” talvez tenha surgido do abrasileiramento de uma frase dita pelos ingleses que vinham trabalhar no nosso país: “My right fellow, I'll do so ray.” No entanto, o táxi que me aguardava era o 184, o do Vereador.
-O Sérgio Cabral tem de sair. - bradou.
O Vereador não consegue ficar dois minutos sem falar em política. - pensei, enquanto afivelava o cinto de cinto de segurança.
-E eu imagino os vizinhos dele, sem terem nada com isso, incomodados com aquele grupo de manifestantes que há mais de um mês se colocou em frente do prédio dele sem arredar o pé.
-Ele vai ter de sair porque o seu filho de 18 anos vai ser candidato a deputado.
Então, percebi que ele não se referia à saída da residência e sim do cargo.
-Sérgio Cabral já prepara um filho para a política?... Eu desconhecia isso.
-É uma dinastia que enche os bolsos com o nosso dinheiro. - indignou-se mais uma vez.
Veio-me, então, à mente uma defesa que fiz do Sérgio Cabral Pai, no Facebook, quando o compararam com o filho em malfeitos. Mas com o Vereador, eu não pretendia desperdiçar energia com polêmicas, ainda assim, o provoquei:
-E o Sérgio Cabral Pai?
-Ele era jornalista; entrou para a política...
-E escreveu quinze livros de música popular brasileira. - meu aparte se ajustava na minha intenção provocativa.
-Sim disso; mas o filho o colocou como ministro das contas do município. O que ele entende de contas públicas?... Nada. No entanto, embolsava um salário de 50 mil reais para não fazer nada.
-Mas não vejo Sérgio Cabral Pai envolvido em política. - contemporizei e, antes que ele retomasse a sua oratória, fui adiante:
-Ele faz, atualmente, um programa na Rádio Roquette Pinto, aos sábados, em que fala de música popular brasileira.
-Faz?... Eu gostava do programa do Jô Soares sobre blues.
-E Sérgio Cabral Pai fala de futebol. Eu o conheci na Mesa Redonda Facit da TV Globo defendendo o Vasco.
-Sim, Cabral Pai é um excelente papo. Um amigo meu jogava cartas com ele todo fim de semana, mas morreu...
Como deixara a frase incompleta, eu a preenchi.
-Morreu seu amigo, pois parece que a família Cabral é longeva; a mãe de um e avó de outro ainda está ainda viva, e lúcida com noventa e tantos anos.
Às minhas palavras, ele foi ainda mais enfático:
-Ela mora em Cavalcanti e não sai de lá. Ir para apartamentos no Leblon, mansões em Mangaratiba, fazendas em Minas Gerais não é com ela. Não quer saber das falcatruas dos seus descendentes e não troca Cavalcanti por esse luxo alimentado pelo nosso dinheiro.
A chegada à Rua Modigliani interrompeu o discurso.

Quando entro no táxi 134, o do Bob Esponja, preparo-me para ouvir mais do que falar. Algumas vezes, fico decepcionado, com essas corridas, outras, não.
-Nesse fim de semana passada, fiz uma boa féria, mais por causa de sábado, porque domingo não foi tão bom assim. Peguei, no sábado, a médica que vai para Campo Grande.
-Já ouvi falar dela. Seus colegas a disputam e ficam a postos, quando a feira-livre da Rua Van Gogh ainda está se formando.
-Isso mesmo. Levei-a até o hospital de Campo Grande e deu 90 reais.
-Ela fica umas duas, três horas, examinando os pacientes, depois volta para casa. O 184 me disse isso.
-Levei e fiquei esperando a saída dela. A maioria do pessoal não espera, preferem arriscar com umas corridas eventuais. Eu não faço isso, pois são 180 reais garantidos. Melhor parta mim e para ela, que fica mais tranquila no hospital sabendo que um taxista está à sua espera.
Depois, falou de assuntos pessoais, mas por poucos minutos, pois essa corrida não era para Campo Grande.

-Saiu mais cedo? - espantou-se o taxista da sexta-feira.
-Tenho muito crédito no banco de horas do meu trabalho. - justifiquei-me.
-Eu não vejo a hora de ir para Saquarema. Minha filha de três anos está mais ansiosa ainda, já pediu o biquíni dela para levar para lá.
-Uma amiga minha tem casa em Saquarema, perto do Centro de Vôlei.
-A casa do meu sogro, para onde vamos, fica no Boqueirão, é perto de lá.
-É bom para descansar a mente e o corpo.
-O corpo, eu não diria, pois me chamam para jogar futebol e outros esportes, fico esfalfado. Agora, retorno para o trabalho com a mente bem leve. 
-O principal é a cabeça estar bem, que tudo o mais se ajusta.
-É isso aí.
E, ouvindo loas a Saquarema, chegamos à Rua Modigliani.


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