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quarta-feira, 4 de setembro de 2013

2460 - o a-sim de Jonas Vieira 2



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4260                        Data:  30 de  agosto de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA COM AS ALEGRIAS DO PRESENTE
PARTE II

A “Pausa para Meditação”, na locução do José Maurício, nos transportou para uma sala de aula de português do curso ginasial. O trio de apresentadores fez gazeta, pois as palavras do Sérgio Fortes e do Jonas Vieira disseram tudo:
-Um uisquezinho não vai mal.
-Nunca vi alguém morrer por beber uísque.
Depois dos verbos de ligação, das concordâncias com o predicado direto e dos reclames, a voz do apresentador retornou:
-Aqui é a sua Roquette Pinto, 94.1. Programa Rádio Memória com a ilustre participação de Fernando Borer.
O titular do programa que quase foi ultrapassado pelo Dieckmann, no último domingo, titubeou, mas seu convidado meteu o pé no freio.
-Não é a minha vez, é a sua.
-Soy yo?... Não falo espanhol. Vai assim mesmo.
-Su jou. - aproveitou o Sérgio Fortes a pronúncia do seu parceiro para o trocadilho.
Jonas Vieira, na verdade, fala mesmo é alemão. Quem o ouviu cantarolando “Lili Marlene” sabe disso.
E ele deu início a uma pequena introdução:
-Pixinguinha era uma mente poderosa. Entre as suas criações está “Valsa dos Ausentes”; que é uma das coisas mais bonitas que conheço. O arranjo dessa gravação é dele também, com a Orquestra Sinfônica da Petrobras sob a regência de Sílvio Barbato.
-Sílvio Barbato... - lamentou o Sérgio Fortes, no tom da sua voz, a morte tão prematura do maestro naquele fatídico voo do Air France em 2009.
Tínhamos sintonizado a Rádio MEC, a menos de dez dias dessa viagem, em que ele proseava com o compositor Egberto Gismonti. Falava-lhe o compositor da fase da sua carreira em que se interessou pela música clássica contemporânea. Que, uma vez na Europa, num concerto, o maestro fuzilou a pianista com o olhar e esta revidou à altura. A plateia, julgando que aquilo fazia parte da música, aplaudiu entusiasticamente, ele, inclusive. Na verdade, revelou o Egberto Gismonti, aquilo nada tinha de encenação moderna, era o velho ódio que quase acabou em porrada.  A partir de então, ele pôs em dúvida se era aquilo que ele gostava mesmo. Sílvio Barbato o aparteava com comentários alegres e pertinentes.
Mas a valsa lânguida do grande Pixinguinha convergiu toda a nossa atenção. O que Robert Schumann disse sobre as valsas de Chopin se ajustava a essa criação do compositor brasileiro: foram feitas para os espíritos dançarem, não os corpos.
-E então, Sergio? - perguntou logo depois de o último compasso ternário soar.
-Sinfônico. - realçou o Sérgio mais uma das qualidades musicais do Pixinguinha que, campo da música, tinha todas.
-Uma maravilha de quem merecia muito mais do que um nome mencionado. - disse o Fernando Borer que, em seguida, foi cobrado pelo apresentador do Rádio Memória a apresentar sua gravação.
-Agora, Tom Jobim numa parceria com Billy Blanco. Gravação de 1954, quando Tom Jobim era pianista de boate.
Como o tempo urgia e rugia, Fernando Borer não podia se alongar nesse período da vida do maior compositor brasileiro dos últimos 50 anos, quando, além de pianista, ele se enfronhava nas composições de Villa Lobos e Debussy e muito aprendia com Radamés Gnatalli. 
-E quem vai cantar é uma dupla inesquecível: Dick Farney e Lúcio Alves. Dick Farney é o sexto dos cinco melhores cantores dos Estados Unidos; e Lúcio Alves faz uns arranjos vocais na sua interpretação. Ouçam: “Teresa da Praia”.
Eis um nome que nos confunde: Teresa com “s” ou com “z”? Mas essa confusão não foi nada, perto da indignação da esposa, na época, do Tom Jobim: Thereza Hermanny. Por que a leviana da canção, disputada pela dupla de cantores, que depois a rejeitariam, recebeu o nome de Teresa?  Antonio Carlos Jobim teve de praticar malabarismos de advogado para apresentar a sua defesa: a culpa foi do letrista Billy Blanco que se esquecera do nome da sua esposa e, quando soube, já era tarde demais.
-Maravilha. - exclamou o Borer satisfeito com o seu pedido.
-“No comments”. - foi a reação do Sérgio Fortes talvez sugestionado pelo americanismo do Dick Farney.
A palavra voltou para o Jonas Vieira.
-Eu quero registrar aqui um ouvinte assíduo do Rádio Memória: Carlos, que trabalha no condomínio “Três Mosqueteiros”.
Fernando Borer aproveitou o gancho para também citar um ouvinte: Fábio Sampaio. Julguei que esse trabalhasse no condomínio “O Conde de Monte Cristo”, mas não, tratava-se de um taxista que trouxe o doutor até a Rádio Roquette Pinto e mostrou-lhe  que conhecia toda a letra de “Teresa da Praia”.
-E agora, Sérgio? - instou-o  o titular do programa.
Ele escolheu um trecho do musical de 1927 “Show Boat”, de Jerome Kern com letra de Oscar Hammerstein II. Por que Sérgio Fortes, adepto da ópera, não escolheu a soprano Anna Moffo?... Suspeito que temeu os trocadilhos.  Da intérprete, talvez por causa do sobrenome Patton, o mesmo do General da Segunda Grande Guerra, o prenome me escapou.  Admitiu que julgava que encontraria poucos dados sobre ela, mas constatou seu engano.
-Ela é famosa à beça; fez filmes, teatro...
Depois de tocada a última nota de “Can't Help Man Loving That”, Jonas Vieira exclamou:
-Que piano!
-Daqui a doze encarnações, eu vou tocar piano assim. - declarou o Sérgio.
O clima de descontração se desfez porque o titular do programa Rádio Memória se voltou para o Brasil da atualidade:
-Parabéns ao governo de Pernambuco. Há passeata, em Pernambuco, tudo bem, mas mascarado não, leva cacete. Já está sacal esse negócio de protestar com violência.
E se reportou a uma senhora cardíaca que não pôde receber atendimento médico, porque um bando de baderneiros lhe tiraram o direito constitucional de ir e vir.
-Quero ver esses protestos em Cuba. -provocou.
Seu parceiro confessou que era tirano em casa, não atendendo aos protestos da sua esposa. (*)
Encerrados os comentários da atualidade, voltaram à alegria e à música.
-Para encerrar Pixinguinha, por hoje, vamos a uma criação dele com Vinícius de Moraes, “Mundo Melhor”, que foi gravada pela Elizeth Cardoso. Mas a que vamos ouvir é com a Elza Soares. O maravilhoso arranjo sinfônico é do próprio Pixinguinha, que contrasta com a voz da Elza Soares.
E soaram o arranjo de Pixinguinha, em que se sobressaíram os instrumentos de sopro e a voz peculiar da Elza Soares que, em alguns momentos, enveredava pelo “scat” de Louis Armstrong.
-”Mundo Melhor”, Pixinguinha e Vinícius de Moraes. - repetiu o Jonas Vieira depois da audição.
E coube ao Fernando Borer o encerramento do programa, que escolheu “Imagem”, de Luiz Eça e Aloysio de Oliveira, enaltecendo o pianista a quem comparou com Bill Evans, com a concordância de todos.
Houve ainda tempo para o Jonas Vieira registrar que o bandolinista Hamílton de Holanda está levando as composições do Pixinguinha para os músicos americanos ignorantes da sua genialidade. Caso do mais destacado animador cultural americano, o trompetista Winton Marsalis, que confessou a sua dificuldade em tocar o choro “Um a Zero”.

(*) Se parceiro significa Sergio Fortes, o Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO confirma a acusação e se dispõe a testemunhar em qualquer juízo, pois é avesso ao uso da força como argumento de convencimento expresso, seja lá o que isto queira dizer. Mas um cara com um sobrenome desses é mesmo chegado.



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