2232 - o herdeiro

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 4032                               Data: 20 de setembro de 2012

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O SABADOIDO DA CULTURA  AO  TRIBUNAL

-Demitiram a irmã do Chico Buarque no seu melhor momento, ou seja, quando ela conseguiu um orçamento melhor para o Ministério da Cultura. - comentei.

-O governo concedeu essa verba porque já estava estabelecido que a Marta Suplicy iria para o lugar dela. - fez o Claudio a leitura correta dos fatos.

-A irmã do Chico não teve que correr porque o computador dela, no trabalho, seria desativado com todos os dados que ela arquivou?

-Foi, Daniel, ela até antecipou a volta para o Rio de Janeiro. - informou-lhe a Gina.

-Isso é coisa de bandidos, aliás o PT está cheio deles. - resmungou meu irmão.

-Mas por que a irmã do “Chiiiiiiiiico” se tornou ministra? - expressou curiosidade meu sobrinho sem perder o seu perfil gozador.

-Porque ela é irmã do “Chiiiiiiico”. - respondeu, agora pilheriando, meu irmão.

Tentei explicar-lhe.

-Daniel, não basta ler o noticiário, tem-se de saber interpretá-lo. Depois do escândalo do mensalão, o Chico Buarque não apareceu mais demonstrando apoio irrestrito ao PT. Veio a campanha eleitoral da Dilma Rousseff e, por coincidência, aconteceu o centenário da Dona Memélia, mulher do Sérgio Buarque de Holanda e mãe do compositor.

-Mãe do Chiiiiiiico. - interrompeu com mais uma das suas facécias.

-Quem apareceu na festa? O presidente Lula, sua candidata e demais palacianos petistas. O que ocorreu  depois desse encontro?

-O que ocorreu, Carlão? - brincou com a minha pergunta retórica.

-Poucos dias depois, Chico Buarque, numa reunião de artistas no Teatro Casa Grande, apresentou o seu apoio à Dilma Rousseff, em troca, a sua irmã foi indicada para o Ministério da Cultura.

-É o toma lá dá cá. - resumiu o Claudio, que prosseguiu sem tomar fôlego.

-O mesmo toma lá dá cá que é feito agora, porque a Marta Suplicy vai apoiar o Fernando Haddad, na prefeitura de São Paulo. Depois da rasteira que levou do Lula, ela recebeu o Ministério da Cultura e com a vantagem de a verba não ser tão irrisória quanto antes.

-Jean-Paul Sartre dizia que fazer política é meter a mão na merda. - citei.

-O Lula não coloca só a mão na merda, toma um banho de imersão. - manifestou-se a Gina.

-E o vídeo em que o Mitt Romney entrega de bandeja a vitória ao Barack Obama em novembro? - perguntei sem sair do assunto político, mas mudando os personagens.

-O sujeito esculhamba com 47% do eleitorado americano, que eles não querem trabalhar, que se aproveitam da proteção do governo, do plano de saúde...- comentou o Claudio.

-Esses sujeitos que já nascem em berço de ouro, que têm todas as regalias entregues na mãozinha, querem falar em trabalho. - indignou-se a Gina.

-O George W. Bush, quando veio ao mundo, o pai dele, que também foi presidente, já era sócio de uma companhia de petróleo do Texas. - exemplificou o Claudio.

-Por que você não era sócio de uma aqui também, velho, quando eu nasci? - não perdeu o Daniel a piada.

-Porque a Petrobras tinha o monopólio, o que me prejudicou muito. - justificou-se o Claudio.

Daniel entrou casa adentro, mas o diálogo prosseguiu.

-Aqui, no Brasil, já houve candidatos a presidente que cometeram gafes parecidas com a do Mitt Romney, como a dos marmiteiros.

E prossegui:

-O brigadeiro Eduardo Gomes, quando concorreu, em 1950, contra o Getúlio Vargas, disse que não queria o voto de marmiteiros, no sentido de voto de aproveitadores. Os getulistas distorceram a coisa e espalharam que ele não queria o voto dos trabalhadores que comem em marmita. Foi uma desgraça para a UDN.

-Tudo bem, Carlinhos, mas a besteira do Mitt Romney é tão grande que os democratas nem precisaram criar uma versão como os getulistas.

-Isso é verdade. - concordei.

-E o Barack Obama já foi ao programa do David Letterman, que é o Jô Soares dos Estados Unidos.

-É o contrário, Gina, o Jô Soares é que é o David Lerterman do Brasil.- corrigiu o Claudio.

-Um beijo do gordo. - gritou o Daniel que, mesmo sem aparecer, ouviu trechos dessa conversa.

Mudei definitivamente de assunto.

-Depois daquele programa “O Elo mais fraco”, assisto a outro de perguntas e respostas no canal português RTP. O apresentador é o mesmo de um anterior, o José Carlos Malato. Na época, ele era um mastodonte; lembra-me muito o Daniel...

-Ouvi isso. - gritou lá de dentro.

 -Falo de ele sempre estar alegre e, quando se mostra circunspecto, todos notam que é fingimento.

-O que tem? - apressou-me o Claudio.

-Ele, nesse programa atual, se encontro menos corpulento, pois se submete a uma dieta que lhe queimou 18 quilos.

-Não é aquela dieta do Tim Maia em que ele perdeu, em duas semanas, 14 dias?

-Não, Gina.

-Esse José Carlos Malato foi aquele que perguntou a uma concorrente que livro escreveu Machado de Assis, e ela, na múltipla escolha, optou por “Dom Quixote”.

-Ele mesmo, Claudio. Essa concorrente até me recordou uma personagem de “Os Maias”, de Eça de Queirós, que chamou a Sonata Patética de Beethoven de Sonata Pateta.

E prossegui:

-O programa do José Carlos Malato agora tem outro feitio, embora permaneçam as três opções para cada pergunta.

-E então? - mostrou-se impaciente a Gina com a minha falta de objetividade.

-E então que ele perguntou a um dos participantes: “O que aconteceu com o escritor Camilo Castelo Branco por ter praticado adultério com Ana Plácido”?

-Quais foram as opções? - quis saber meu irmão.

-a) foi absolvido; b) foi desterrado; c) foi multado.

-Eu diria que ele foi multado. - arriscou.

-Claudio, eu li poucos romances de Camilo Castelo Branco, comparando com a produção vastíssima que deixou.  Confesso que sabia da cegueira dele na velhice, problema de catarata, provavelmente, como Claude Monet...

-Você daria que resposta? - interferiu a Gina.

-Eu fiquei entre o desterro e a multa.

-Qual a resposta certa? – quis apressar-me a Gina.

-Antes de responder, o animador do programa cria uma ansiedade que eu qualificaria de didática.  Ele disse que Ana Plácida, com 19 anos de idade, casou-se com o capitalista brasileiro, de 43 anos, Manuel Ribeiro Alves. Quando ele descobriu que ela estava de amores com o escritor, denunciou-os por adultério e eles foram presos na Cadeia da Relação, no Porto.

Gina riu ao ouvir o nome “Cadeia da Relação”.

-Presídio predestinado. - comentou.

-Camilo Castelo Branco foi absolvido. - declarei a resposta certa.

-A mulher é que sofria. - concluiu açodadamente Gina.

-Ana Plácida se casou, mais tarde, com Camilo Castelo Branco, teve mais dois filhos, que se juntaram ao primogênito, cujo pai era o primeiro marido. Quando Manuel Ribeiro Alves morreu, os bens passaram para o garoto e, por isso, foram administrados por Ana Plácido. Uma propriedade do brasileiro é conhecida com o nome de Camilo Castelo Branco.

-A história só não terminou bem para o brasileiro. - concluiu o Claudio.