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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4363 Data: 13 de fevereiro
de 2014
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174ª CONVERSA COM OS TAXISTAS
E passamos eu e Paizão a tratar da falta
de segurança na cidade.
-Eu lhe contei da dona que entrou na
quadra em que eu caminhava às 6h da manhã de um sábado, perguntando se podia
ficar comigo?
-Ficar com você? - estranhou.
-Nada entendi também na hora; mesmo ela
andando apressadamente, como uma atleta, percebi que não pretendia caminhar.
E o que ela queria?
Antes de eu falar alguma coisa,
dirigiu-se a mim com agressividade.
-Eu queria ver se um parente seu fosse
assaltado. Eu acabo de ser assaltada.
-O que a senhora quer que eu faça?-
foram as palavras que me vieram à boca. Ela nada disse, e subiu a Rua Vlamink,
ainda desarvorada, falando com todas as pessoas que passavam.
-Certamente, contava que acabou de ser
assaltada. - concluiu o Paizão.
-Depois, entendi por que ela me
perguntou se poderia ficar comigo, procurava proteção, mas ao se tornar
agressiva, queria que eu agisse como um policial.
-E os policiais pensam em agir em defesa
dos cidadãos? - reagiu o Paizão com sarcasmo mesclado com decepção.
-Já tive parentes assaltados, já fui
assaltado.
-E quem não foi?
-Das cinco e meia da manhã até cinco e
quarenta e cinco, o tempo que levo da minha casa à estação do metrô de Del
Castilho, são quinze minutos de risco de assalto que eu corro de segunda a
sexta-feira. -disse-lhe.
-Ainda está escuro nessa hora, mas mesmo
que estivesse claro, esses marginais não desistiriam de roubar os
trabalhadores.
Retomei a palavra:
-Semana passada, quando eu estava a uns
cinco metros do beco dos cracudos, que sou obrigado a atravessar , pois é
caminho para a estação de Del Castilho, deparei-me com uma moça com um capacete
de motociclista na mão, a pé, indagando-me onde se encontrava a cabine de PM
mais próxima. Indiquei-lhe a do Norte Shopping, e, em seguida, lembrei-me da
cabine bem mais próxima, após o viaduto de Del Castilho e lhe avisei que para
ir lá teria de subir por ele.
-Essa cabine do viaduto foi desativada
há muito tempo. -Informou-me e acrescentou:
-Você sabe o que aconteceu com a dona?
-Roubaram-lhe a motocicleta. - respondi.
-E você tem alguma dúvida?!...
Enquanto eu saltava do seu táxi, Paizão
comentava que a polícia estava mais interessada em dividir a receita da
madrugada com os traficantes.
Antes de o Albino me receber com a sua
pergunta infalível - como está o metrô?
– eu me antecipei.
-Tenho notado que as chamadas de
emergência no metrô caíram consideravelmente de 2012 para cá.
-Como eu só ando de carro, nada entendo
de metrô. Explique-me essa chamada de emergência.
-Se algum passageiro passa mal, um bom
samaritano quebra o lacre da emergência e informa ao maquinista da ocorrência.
A composição para, em seguida, e vem a pergunta que repercute por todos os
vagões: “Qual o motivo da emergência?”
-É assim? - apressou-se, cortando o
fluxo da minha tagarelice.
-Então, o metro reinicia a viagem até a
próxima estação, onde um segurança já aguarda o doente. Normalmente moças com
crise de pressão baixa causada por dietas.
Ele sorriu e eu prossegui.
-Quando se ouve a pergunta – Qual o
motivo da emergência? - as reações de contrariedade dos passageiros são
unânimes.
-Querem mais que o adoentado se dane. -
deduziu.
-Para eles é um estorvo, - acrescentei.
-É sempre assim no metrô?
-Essa solidariedade?... Por coincidência,
hoje, na volta do trabalho, quando as portas dos vagões abriram na estação da
Presidente Vargas, ouvi, atrás de mim (eu me amparava num balaústre), vindo dos
que entraram uma voz que dizia “uma gestante”. Vi, então, uma moça grávida de
seis ou sete meses.
-E não cederam lugar a ela no banco
destinado a idosos, deficientes físicos, grávidas?...
Antes de me manifestar, devo ter
expressado um sorriso de decepção.
-As duas mocinhas que se refestelavam
nesse banco, identificado pela cor laranja, fizeram cara de paisagem e a
grávida permaneceu em pé. Uma jovem, constrangida por esse absurdo, se levantou
e cedeu o lugar para ela.
-Infelizmente, são poucas as pessoas
como essa mocinha e isso em todo o lugar. - frisou, enquanto eu saltava na Rua
Modigliani.
-Hoje é a noite da minha peladinha.
Embora eu já tivesse ouvido mais de uma
vez o Bob Esponja louvar as suas façanhas sexuais, sabia que o assunto era
outro.
-Quarta-feira, não é isso?... O seu dia
de jogar futebol.
- Dia sagrado. - frisou.
Como me contou, meses atrás, que o nível
da sua glicose assustara o médico, perguntei-lhe sobre a diabete.
-A taxa de açúcar deve ter caído com as
peladinhas semanais.
-Por que não caminha pelo menos quatro
vezes por semana? - aconselhei.
-Com este calor?!... Há doidos, como o
081, que caminha pelas ruas; já foi assaltado na Rua Rocha Pita, Ele já teve um
dedo do pé amputado pela doença, Eu prefiro jogar bola a andar pelas ruas.
-E você dorme bem?
-O amigo quando desce a Van Gogh às
cinco e meia da manhã, geralmente me vê no ponto com o meu táxi.
-Sim, mas eu durmo às nove e meia da
noite. - retruquei.
-Não dá para eu dormir tão cedo; sou
exigido pela minha noiva e pelas mulheres que sempre aparecem... - deixou
escapar um sorriso safado.
-Disse que, depois dessas peladas, a
sede aumenta e seca algumas garrafas de cerveja.
-Com um churrasquinho. - acrescentou.
-Lembra-se do deputado federal Luís
Eduardo Magalhães?
Depois de breve esforço evocativo,
respondeu-me:
-O filho do ACM?!... Se não me engano,
morreu depois de uma caminhada sob o sol a pino em Brasília.
-Não foi o sol a pino que lhe provocou o
enfarte. Segundo o Nuno Cobra, que também foi personal-trainer do Aírton
Senna, Luís Eduardo Magalhães inverteu o processo.
Sem lhe dar chance de intervir, pois
desviaria o tema em questão, segui em frente.
-O processo se resume em primeiro lugar,
dormir bem; em segundo lugar, numa alimentação correta e nas horas certas, por
último, a atividade física. O Luís Eduardo Magalhães dormia mal, deitava-se de
madrugada; alimentava-se horrivelmente, pois frequentava aqueles restaurantes
de Brasília onde ingeria comidas gordurosas.
-E praticava exercícios físicos. -
aparteou-me porque se sente agoniado quando não fala por dois minutos num
diálogo.
-Por ter invertido o processo, isto é,
colocado o terceiro ítem da hierarquia em primeiro lugar, Luís Eduardo Magalhãs
apressou o deslocamento das placas de gorduras nas artérias que lhe provocaram
o infarto. Não seria a atividade física que neutralizaria os malefícios das
noites mal dormidas e da alimentação descontrolada.
-Rua Modigliani. - anunciou o Bob
Esponja o fim da corrida.
Desci do seu táxi sem ter a certeza de
que ele entendera o porquê de eu lhe lembrar o fim do promissor político baiano.
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