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quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

2533 - Pra que discutir com Madame?

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4333                         Data: 23 de dezembro  de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA NATALINO

-Muitíssimo bom-dia.
Estava dado o pontapé inicial do programa natalino.
-Conosco mais uma vez o Fernando Borer.
-Rouco de tanto cantar o “Jingle Bell.” - acrescentou o Sérgio Fortes.
Após os cumprimentos de praxe, foi dado ao convidado o direito de fazer a primeira escolha musical do dia.
-”O Bonde São Januário”, de Wilson Batista e Ataulfo Alves.
  Com o pontapé inicial dado, falou-se, inevitavelmente, de futebol.
-Era o bonde que ia até o estádio do Vasco da Gama que, naquela época era poderoso, era quem mandava os outros para a segunda divisão.
-O pranteado Vasco da Gama.- lamentou ou regozijou-se o Fernando Borer, pela entonação da voz não dava para perceber, enquanto o Sérgio Fortes aludia à queda do clube para a segunda divisão.
-A gravação de Ciro Monteiro é de 1940 e a original de  Ataulfo Alves.-  frisou o convidado.
Jonas Vieira, mesmo dizendo-se admirador de Wilson Batista, foi fiel à história e afirmou que ele exaltou o trabalho, mas foi um dos maiores vagabundos que existiu.
“O Bonde São Januário” foi grande sucesso do carnaval de 1941, quando vigia no Brasil a ditadura do Getúlio Vargas.
Eis alguma coisa que soubemos sobre esse samba.
A letra original “O Bonde de São Januário/leva mais um sócio otário/só eu vou trabalhar.”  O DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda – determinou que a letra fosse modificada, e ficou: “O Bonde são Januário” leva mais um operário/ sou eu que vou trabalhar.”
A concretização do Estado Novo não via com bons olhos a exaltação da boemia, da vagabundagem, defendia a formação de um homem novo, lutador, trabalhador. A censura do samba foi provocada por isso e não pelo fato de o Vasco da Gama ter sido  ironizado, aliás, nem vascaíno o Getúlio Vargas era.
Sérgio Fortes conduziu a parte musical de São Cristóvão para a Broadway, anunciando a cantora Kim Criswell na música “He's a Right Guy”, de Cole Porter. Trata-se da ária do primeiro ato  do musical “Something For The Boys”, que abriu a temporada da Broadway de 1943, mas foi lançado antes, em Boston, Massachusetts, precisamente no dia 18 de dezembro de 1942, no Schubert Theatre.
-Cole Porter.- ciciou o Jonas Vieira embevecido.
Quando a bola passou para ele enalteceu os músicos dos Estados Unidos, fixando-se em Oliver Nelson, eminente compositor e arranjador. A orquestra que iria executar a sua composição e do Quincy Jones era do não menos talentoso Countie Basie.  E o operador de áudio, Peter, pôs a música para tocar. Era um caleidoscópio de timbres, com a gaita se destacando até soarem as primeiras notas do piano de Countie Basie.
Os elogios à gaita levaram o Jonas Vieira a citar, com muitos elogios, Maurício Einhorn, com a concordância de todos.  Nós, aqui do Biscoito Molhado, aproveitamos também a oportunidade para falar do Rildo Hora e do José Staneck, este, integrante da família de uma amiga de algumas décadas, a quem vi tocando, num casamento, uma das três Gymnopédies compostas por Eric Satie para o piano que ele, José Staneck, transpôs brilhantemente para gaita.
Com o doutor Fernando Borer, retornamos à música popular brasileira.
-A próxima apresentação é uma obra-prima de Janet de Almeida e Haroldo Barbosa, “Pra que Discutir com Madame”.
Depois das referências à aptidão do Haroldo Barbosa  em vários campos e ao fato de Janet de Almeida ser irmão do cantor e compositor Joel de Almeida, e também à versão bossa-novista do João Gilberto, chegaram à pernóstica madame. Magdala da Gama Oliveira, que escrevia sob o pseudônimo de Mag, no Diário de Notícias, que, nos seus textos, desdenhava o samba.
Guardadas as devidas proporções, havia uma semelhança com Ruy Barbosa que, senador da República, proferiu um furioso discurso contra o governo Hermes da Fonseca porque promoveu, em 1914, um sarau no Palácio do Catete com músicas da Chiquinha Gonzaga. Sinhô, cinco anos depois, ironizaria o pedantismo do verborrágico tribuno baiano  com a marchinha de carnaval “Fala, Meu Louro.”
Quando Mag, a madame, escrevia no Diário de Notícias, o meu pai trabalhava na revisão desse jornal fundado por Orlando Dantas e, segundo ele, afundado pela viúva.
Recordo-me das críticas que meu pai fazia à Mag e à Eneida, mãe do jogador do Botafogo, Otávio de Moraes, que, por sua vez, enaltecia o samba na sua coluna. Meu pai admirava o Nestor de Holanda e nutria simpatia pelo Ibrahim Sued, amigo de longa data do meu avô. Contou-me, certa vez, quando o Ibrahim Sued se desentendeu com o Roberto Marinho, no governo do “Seu Arthur”, o Marechal Costa e Silva, e foi escrever sua coluna no Diário de Notícias, que ele, num dia, procurou os revisores e pediu que não corrigissem seus erros de português, pois aquilo era o seu estilo.
-Acatamos o seu pedido, mas sal com “c”  e cedilha nós iríamos corrigir. - disse-me meu pai em tom de blague.
“Pra que Discutir com Madame” foi composto em 1941, mas Fernando Borer optou pela gravação de 1945, cantado por Janet de Almeida com o conjunto do flautista e parceiro de Pixinguinha, Benedito Lacerda.
E, para agradar a todos, principalmente ao Luca, fã do Chico Buarque de Holanda, e a si próprio, como veremos em seguida, Sérgio Fortes pediu  “A Rita”.
-Trata-se de uma gravação com Mauro Senise no sax alto (sax soprano) e maravilhosos músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira. Deixa-me puxar a brasa para a minha sardinha...
E pôs-se a nomear os músicos da OSB que participaram do disco:
-Ana de Oliveira, violinista que foi spalla da orquestra; Ubiratan Rodrigues, violinista; Nairan Peçanha, violista; David Chew, violoncelo; e o trombone excepcional de Vittor Santos.
E se detiveram na violinista:
-Ela não está mais na orquestra, mas já foi spalla.
-Encontrei-me com Ana de Oliveira, informou-me que ia à Àfrica.
-Fazer o quê?
-Tocar.
-Ela, na verdade, rumava para a Ilha da Madeira, que fica a caminho da África. - emendou a sua informação o Jonas Vieira.
A leitura jazzística desses notáveis músicos enriqueceram  tanto “A Rita” do Chico Buarque que ela se multiplicou  em  várias mulheres: Marta. Margarida, Laura, Teresa, etc.
 Sérgio Fortes fez uma escolha que conseguiu a unanimidade de todos, dentro ou fora da Rádio Roquette Pinto.

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