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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4233 Data: 19 de
julho de 2013
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CARTAS DOS LEITORES
-Li sobre a visita que Chateaubriand
fez ao redator do Biscoito Molhado e fiquei curioso em conhecer o Filé à
Chateaubriand. Como esse prato é elaborado? Glutão das Laranjeiras.
BM: Glutão das Laranjeiras, apesar de você não ser um gourmet,
e sim um gourmand, vou pedir ao Roberto Dieckmann que envie seu pedido
ao filho, Fred Dieckmann, que é um ás da Arte Culinária. É verdade que a sua
especialidade é a comida mexicana, um filé à Cantinflas ou algo parecido, mas
acreditamos, com faca e garfo nas mãos, que ele faria um suculento Filé à
Chateaubriand.
“A sessão nostalgia matinal me trouxe à
combalida memória “Youth”, de Joseph Conrad, nascido na Polônia e endeusado
como um dos maiores escribas do idioma britânico. Ele pergunta ao leitor se
tudo era realmente melhor antes ou se o resplendor que vivíamos era a nossa
Juventude. Li-o muito no 86, esteve em moda com “Heart of Darkness”, que
inspirou o filme “Apocalypse Now”, talvez o mais conhecido seja “Lord Jim”.
Gostei muito de “Victory”, poderia citar mais uns três ou quatro, mas prefiro
não exagerar.”
“Trago à baila o Abbé Sieyès, na época
era famoso, mas só é citado na posteridade pela frase: “J' ai vécu”,
respondendo à questão “o que fizera durante a Revolução Francesa”, ao pé da
letra é “vivi”, mas ele enfatizava que “sobrevivera”. Posso dizer que “j' ai vécu”,
me esbaldei no mato e na praia, quebrei cama, aprendi a sobreviver com o rosto
paralisado e mesmo rastejando onde rebolava ainda localizo um saldo positivo e
não sinto revolta.”
“A respeito das outras damas da família,
nada asseguro, fui diferente de todas e espero merecer o que me disse a cunhada
Jabor: que sou valente.” Rosa
BM: Muitos foram os filmes baseados em histórias de Joseph Conrad, não vi
todos, sendo que, dos citados pela nossa erudita leitora, não assisti a “Youth”
e a “Victory”; tenho, porém, a certeza, mesmo assim, que nenhuma dessas
adaptações cinematográficas supera “Os Duelistas”.
Aqui vai um breve resumo.
D' Hubert, vivido por Keith Carradine, e
Feraud, por Harvey Keitel, são dois oficiais do exército de Napoleão Bonaparte.
Por um motivo pouco relevante, Feraud desafia D' Hubert para um duelo, eles
lutam, mas um motivo incontornável impede que haja um desfecho. E, durante 16
anos, foi assim; sempre que Hubert topava com o seu rival o obrigava a
reiniciar o duelo interrompido. Isso aconteceu até quando os dois se
encontravam derrotados na gélida campanha russa, em 1812 e, na parte final, na
restauração dos Bourbons, em 1815, quando D' Hubert, depois de um casamento
feliz, se ajustou â aristocracia, enquanto o obsessivo Féraud permanecia fiel
ao imperador. O último duelo, a pistola, com um número de terminado de balas
entre os contendores, de tão imaginoso, merece ser conhecido pela leitura do
livro de Joseph Conrad ou pelas cenas filmadas sob a direção de Ridley Scott.
Tomei a instigante história de Joseph
Conrad como uma parábola: Féraud seria Napoleão, que sempre obrigava a Europa,
D' Hubert, a desensarilhar as armas contra ele. Não li ensaio algum, até hoje,
sobre “Os Duelistas”, mas não vislumbro outra interpretação.
A película marcou as estreia de Ridley
Scott como diretor, e abiscoitou, com toda a justiça, o prêmio de melhor filme
do Festival de Cannes de 1977. É verdade que não vi os outros filmes da
disputa, mas isso não importa.
Se existissem filmes de cabeceira, como
há livros, “Os Duelistas” seria, para mim, um deles.
Em seguida, a nossa leitora (orgulho que
nutrimos, embora ela leia tudo, de Shakespeare à bula de remédio, recua no
tempo, salta da Inglaterra para a França, e de Joseph Conrad a Sieyès.
O Departamento de Pesquisas do Biscoito
Molhado entrou em campo e nos forneceu os esboços que se seguirão da vida de
Emmanuel Joseph Sieyès. Escritor, político e eclesiástico francês, Sieyès foi
um dos mais notórios participantes da criação da Assembleia Nacional, advinda
com a Revolução Francesa, devido à sua defesa das ideias constitucionalistas
que seus pares não colocavam em prática. Teve um desempenho incansável nos
Estados Gerais, quando representante da igreja e da aristocracia.
Partícipe do Clube dos Trinta quando a
Convenção se reuniu, em 1792, para julgar Luís XVI, votou pela execução do rei.
Descontente, desapareceu da arena
política para reaparecer como membro do Comitê da Salvação Pública, que articularia
o golpe do partido da Direita, os girondinos, que apearam do Poder Robespierre
e Saint-Just, dando fim ao Terror. Tal golpe ficou conhecido como “9 Termidor”,
por causa do calendário adotado pela Revolução Francesa, que, no calendário
gregoriano, este logo retornaria à
França, a data era 27 de julho de 1794.
Sieyès voltou, então a reivindicar uma
Constituição, mas, como no passado recente, não foi exitoso. Frustrado, recusou
os cargos públicos que lhe foram oferecidos. Conspirou e, junto com Napoleão
Bonaparte, participou do Golpe do 18 de Brumário (9 de novembro de 1799), que
tomou o poder e instalou o Consulado. Sieyès foi cônsul com Napoleão Bonaparte
e Roger Ducos. Mesmo quando Napoleão se mostrou ambicioso, tornando-se o
mandante único, como imperador, Sieyès
esteve ao seu lado, exilando-se, por questões políticas entre os anos de 1816 a 1830.
O seu texto mais emblemático foi “A Constituinte Burguesa” - “Qu' est-ce
que le tiers état?” (O que é o Terceiro Estado?). Nessa obra, Sieyès legitimava
a ascensão do povo (o Terceiro Estado) ao poder político, e traçou as linhas
mestras da Teoria do Poder Constituinte, matéria relevante no Direito
Constitucional.
De Joseph Conrad a Sieyès, que passou
por maus momentos, na defesa das suas ideias, principalmente quando o
sanguinário Robespierre esteve no poder guilhotinando até os que derrubaram o
regime monárquico, de fato sobreviveu, “J' ai vécu”, como citou a Rosa Grieco.
Ela atravessou maus momentos, que não narrou na sua carta, talvez porque já o
fizera em outras, e que a fez merecer o adjetivo de valente, dado pela sua
cunhada e também tia do Arnaldo Jabor. Valente e, acrescentamos nós, fogosa
pelas camas quebradas.
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