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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4218 Data: 28 de
junho de 2013
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A MÃE DA RÁDIO FM E DO SIMON KHOURY
PARTE II
No princípio, era só uma FM, a Rádio
Imprensa.
-Nós ligávamos a FM à música ambiente. -
comentou o Sérgio Fortes.
-Sim, mamãe não queria música de
impacto, que tirasse a atenção de quem estava trabalhando.
-Era também a música dos elevadores.
-lembraram.
A palavra voltou para o filho da grande
pioneira da radiodifusão do nosso país.
-O seu pai, Serginho (o barítono Paulo
Fortes), sabia melhor do que ninguém que o sucesso vinha de baixo para cima.
Talvez ele aludisse, sem verbalizar, ao
fato de Verdi ter escondido, até a estreia do Rigoletto, a ária La donna e
mobile, já prevendo o êxito popular
estrondoso que alcançaria.
-O povo é que fazia o sucesso, cantando
marchinhas no carnaval, por exemplo. O sucesso vinha de baixo para cima em todo
lugar, como o Torna Sorriento, La Paloma... Hoje, é o contrário: a mídia é que impõe. Coloca-se, por
exemplo, uma titica numa dessas telenovelas da Globo e está todo mundo ouvindo,
cantando essa porcaria.- prosseguiu Simon Khoury com palavras ainda mais
contundentes do que as que aqui estão reproduzidas.
Jonas Vieira interveio com uma exceção:
a novela das 9h “Amor à Vida”.
-Uma trama muito bem urdida a dessa
novela do Walcyr Carrasco.
Foi interrompido pelo seu convidado:
-Você sabe que o Walcyr Carrasco tem uma
teoria, que todos somos homossexuais, mas que alguns relutam, não querem
brincar?...
-Jonas está na linha do Arthur Xexéo,
que diz que não assiste mais às novelas.
-Não se tratada disso – retorquiu – os
atores são excelentes, o enredo é muito bem amarrado.
Sérgio Fortes citou os clichês das
telenovelas, Simon Khoury acrescentou mais alguns. Jonas Vieira, diante da
provocação, disse que não discutiria isso, mas acentuou que as exigências
mercadológicas muitas vezes obrigam o autor a espichar os capítulos, o que é
lamentável. E citou a palavra inglesa que expressa uma história bem urdida.
-Você sabe como é café em árabe?-
devolveu o Simon Khoury.
-Qahwa. - respondeu.
Antes que um fumegante qahwa
fosse servido, Jonas Vieira lhe pediu a próxima música a ir ao ar.
-Eu cantei a pedra que “O Artista”
ganharia o Oscar de 2012. - foi a sua introdução antes da escolha.
-A trilha sonora é do Ludovico Bource e
é uma das suas composições que vamos ouvir.
-C' est magnifique. - foi a reação
afrancesada do Jonas Vieira.
Simon Khoury se queixou do lixo musical
que varejam nos nossos ouvidos, enquanto fica de fora, no Brasil, um compositor
francês e arranjador, como Ludovico Bource, que é influenciado por Ravel,
Debussy e Prokofiev.
Depois, o titular do programa aludiu
rapidamente ao avanço da FM, Sérgio Fortes acrescentou o AM digital, talvez com
um som ainda mais limpo, e o diálogo enveredou para o avanço da ciência. Jonas
Vieira enalteceu a criatividade tecnológica dos americanos, Sérgio Fortes
ressaltou que esses cientistas são os estrangeiros que vão para os Estados
Unidos, Simon Khoury concordou:
-Não vou discutir isso, mas, na verdade,
são os americanos.
A nosso ver, os Estados Unidos deveriam
se chamar Países Unidos da América do Norte, pois foram os imigrantes que para
lá foram que tornaram esse país tão avançado no amplo espectro da ciência, sem
esquecer os cientistas alemães aprisionados na Segunda Grande Guerra. Na
política, dois dos maiores presidentes desse país tinham ascendência holandesa,
Theodore Roosevelt e Franklin Delano Roosevelt.
Jonas Vieira investia agora, com toda
razão a nosso ver, contra os brasileiros que, em geral, discutem o sexo dos
anjos. Incrivelmente, Simon Khoury ouviu a palavra sexo e não contou piada
alguma.
Chegou, então, a pausa para meditação,
crônica do Fernando Milfont na locução do José Maurício.
Aproveito e faço também a minha
meditação. Nos anos 70, quando frequentei assiduamente o consultório do Dr.
Jerônymo, a sintonia na Rádio Imprensa era imprescindível para que todos
ficassem relaxados. Em 1977, quando trabalhei no Jornal do Brasil, no faraônico
prédio da Avenida Brasil 500, que afundou de vez os órgãos de imprensa do
Nascimento Brito, o orgulho de todos lá era a Rádio Cidade, mas sobre ela,
Simon Khoury falaria mais tarde.
Descobri, depois, que o Edoardo Pacelli,
que já mencionamos, apresentava um programa na Rádio Imprensa com trechos
operísticos, nas noites de domingos e me tornei ouvinte assíduo. Recentemente,
soube que apresentava um programa na Rádio Roquette Pinto, Italiamiga, em
que tive oportunidade de ouvir o Hino Nacional Italiano na soberba voz do tenor
Mario Del Monaco. Falando em hino, o da Espanha até que poderia ser tocada na
Rádio Imprensa, pois não tem letra.
Encerrada a pausa para meditação, Jonas
Vieira pediu uma música ao seu convidado.
Simon Koury surpreendeu com o tango Por
una cabeza, dos turfistas Carlos Gardel e Alfredo Le Pera, gravação do “Sax
at the Movies”, num arranjo que mistura saxofone e bandoneón.
Sérgio Fortes e Jonas Vieira teceram
elogios a esse tango e ao gênero musical num sentido mais amplo.
-Quem foi o saxofonista?
-Foram cinco saxofonistas se revezando.
- esclareceu Simon Khoury.
Na gravação seguinte, Simon Khoury
exacerbou a expectativa de todos falando que se tratava de um tema que teve 14
versões diferentes. Constatou-se, depois, que era um tema por demais conhecido
dos apreciadores da boa música instrumental. Simon Khoury fez uma correção, não
era Ray Anthony, e sim Ray Conniff.
-São todos da família Ray. -
contemporizou o Sérgio Fortes.
O titular do programa depois de afirmar
a sua preferência por Ray Anthony, disse que os dois pertenceram à orquestra de
Glenn Miller.
-Glenn Miller é como o Noel Rosa no
Brasil, está sempre presente. - arrematou.
-Simon, quando começou a propagação da
FM?
À pergunta do Sérgio Fortes, ele se
reportou a um sobrinho da Condessa Pereira Carneiro, diretora-presidente do
Jornal do Brasil, que, ao viajar para Miami, trouxe de volta uma emissora FM
para jovens, nos mesmos moldes de lá, que viria ser a Rádio Cidade. Era o
avesso da programação da Rádio Imprensa.
Quando foi abordado para optar pela
próxima gravação, Simon Khoury deu mais um presente aos “madrugadores” daquele
domingo: um arranjo do Henry Mancini de um pout-pourri que começava e fechava
com composições de Michel Legrand e, no meio, uma dolente música de Francis
Lay.
No meio dos elogios ao convidado, Sérgio
Fortes registrou que o cachê do Simon Khoury é apenas 14 copos de café ou qahwa.
E o ponteiro do relógio correu muito e
já se aproximava das 9h da manhã. Tempo ainda para Simon Khoury acentuar,
orgulhosamente, que nasceu na mesma data de Antônio Carlos Jobim.
-Tom Jobim está em péssima companhia. -
não perdeu o Jonas Vieira a piada.
Enquanto ele e Sérgio Fortes terminavam
o brilhante programa daquele domingo, nós encerraremos esta edição do Biscoito
Molhado com as palavras do Edoardo Pacelli.
“A Rádio Imprensa FM tem o mérito,
também, de ter realizado o primeiro transmissor construído no Brasil, devido às
dificuldades de importação. E a própria emissora, com o comando da sua
Presidente, teve de iniciar a primeira indústria de rádios receptores de FM. Com
programação exclusivamente musical, sem qualquer locução, a Rádio Imprensa era,
até 1976, a
única emissora em FM no ar no Brasil. Somente 20 anos depois de sua
inauguração, com o boom das FM, surgiram as outras emissoras.”
“Anna Khoury, a pioneira, a mulher que
soube fazer de um sonho dourado, um Eldorado sonho.”
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