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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4220 Data: 30 de
junho de 2013
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SABADADOIDO FORA DE MODULAÇÃO
Gina se mostrou apreensiva:
-Esse negócio de a corrupção ser crime
hediondo... Vamos dizer que você pague a cervejinha do guarda...
-Eu?!!? - representou o Daniel o papel
de vítima de uma comédia.
-Pode ser o Carlinhos, mas ele não
dirige mais, eu também, não. Bem, Daniel, o único motorista em ação aqui,
atualmente, é você.
Conformado, ele tomou a palavra:
-Está bem; eu cometo uma infração de
trânsito, pago a cervejinha do policial, e eu e ele cometemos um crime
hediondo.
-É o me parece com essa lei que
aprovaram por causa do clamor das ruas.
-Esse ato do Daniel, meu, seu e de quase
todos os que guiam automóveis não contribui para o mau atendimento hospitalar,
para o ensino público caótico no Brasil. - argumentei.
-Mas no exemplo que dei estão o
corruptor e o corrupto. - retorquiu minha cunhada.
-Recebi nesta semana um e-mail do Sérgio
Fortes em que um articulista, que sabe usar as palavras, enumera deslizes como
esses, tão comuns, e pergunta se não é uma hipocrisia ir para as ruas com
faixas contra a corrupção.
-E não é, Carlinhos?
-Não, pelo motivo que já expus. Não sou
advogado, mas creio que é o Princípio da Bagatela que versa sobre os casos em
que não se deve julgar igualmente réus, ou lá o que seja, diferentes. Quanto eu
fiscalizo uma empresa de navegação pequena, não sou tão rigoroso quando a
empresa é grande.
Meu irmão, que vinha do quintal para a
cozinha, ouviu minhas últimas palavras e interveio:
-O cachorrinho do PT, o Ricardo
Lewandowski, ao mesmo tempo em que absolvia os ladrões do mensalão, condenava
um pescador que pegou 12 camarões.
-Eu me lembro, Claudio, mas ele foi voto
vencido.
-Esse Ricardo Lewandowski foi
condecorado pela Dilma pelos bons serviços prestados como juiz do Supremo
Tribunal Federal ao PT. - voltou a indignar-se.
E a palavra voltou para mim.
-Deixo bem claro que sou inteiramente
contrário a esses pequenos malfeitos que as pessoas do povo cometem. O diabo é
que o exemplo vem de cima, se colocarem os corruptos na cadeia, a sociedade, de
uma maneira geral, seguirá as leis.
-E vão colocar na cadeia, Carlinhos?...
- mostrou-se a Gina cética.
-Prenderam um deputado federal agora.
-Esse é boi de piranha para os outros
passarem incólumes. - continuou cética.
-A corrupção dolosa é que é crime
hediondo. - enfatizou meu irmão.
-Por causa dos cartuchos da minha
impressora estragados, eu imprimia uma e outra coisa no trabalho, mas me sentia
desconfortável. Comprei, então, na última terça-feira, uma impressora a laser.
-Carlão, você gastou mais de mil
reais?!... representou o Daniel, agora, um personagem assombrado.
-Eu sou amarrete, como o Fernando
Henrique Cardoso.
-O que é amarrete? - quis ele saber.
-Quando FHC era presidente da República,
ele disse que não gostava de gastar dinheiro, que era amarrete e
explicou que se tratava de um vocábulo que aprendeu no Chile, quando estava
exilado.
-Certamente, ele jantou com alguns
chilenos e, na hora da conta, não se coçou e os chilenos o chamaram dessa
palavra que você disse.
Nesse instante, o telefone tocou. Daniel
atendeu, era o Vagner.
Quando foi a vez do Luca telefonar, meu
sobrinho fez a festa.
-Como, Luca?... Voltou a ficar com a
perna ruim?... Não pode andar?... Já sei: quer colinho. Eu já lhe dei colo uma
vez, mas dou outro.
-Ele engessou a perna? - atrapalhei o
Daniel, que ainda estava ao telefone.
-Você não pode demorar por causa da
festa junina da Dona Zita?... Eu avisarei.
Com sua voz estentórica, não precisava
avisar mais, ainda assim o fez quando desligou. Voltei a fazer a pergunta
anterior.
-Não, ele ainda vai engessar a perna.
-Pouco depois de o Luca receber alta do
hospital, eu telefonava para a casa dele e, quase sempre, tinha que falar com a
Carolina, que dizia que era o momento da sintonia fina no tratamento da perna
acidentada, momento de ficar quieto, mas ele ia para rua. - observei.
-A idade chega, e temos de diminuir o
ritmo. Luca vinha jogando não sei quantas partidas de pingue-pongue por semana
e não duvido que ainda praticava caminhadas. - disse o Claudio, voltando para a
cozinha depois de fortificar as rolinhas com painço.
Vagner foi o primeiro a chegar, meu
irmão o recebeu, minutos depois, Gina e Daniel fizeram companhia aos dois.
Demorei mais um tempo para segui-los porque um artigo do Cristóvão Buarque de
Holanda, publicado no Globo daquele sábado, me interessara, sem falar no
noticiário sobre as manifestações públicas que espocam por todo o Brasil.
Daqui a pouco, será na Argentina, com
esses descalabros cometidos pela Cristina Kirchner - previ.
De repente, um rumor vindo do local da
sessão do Sabadoido desviou minha atenção do Globo. Era o Luca que chegava.
-Se alguém tem de falar alguma coisa,
fale rápido, porque, depois, não conseguirá. - pilheriou o Vagner antes da
aparição do amigo.
Daniel recepcionou o Luca do seu jeito
sempre brincalhão e ruidoso:
-Luca, eu estou endiaaaaaaaaaaabrado no
volante. Não há espaço pequeno em que
não eu estacione. Não dou folga a ônibus e a caminhões.
E repetiu as palavras, que decorou, do
Galvão Bueno na narrativa de uma vitória do Aírton Senna.
-Dou show no seco, no molhado, no
talento, na estratégia, no arrojo, na perseverança...
Luca o interrompeu para falar das
imitações da sua neta, mas como ela não é desinibida, não se pode pedir a ela
imitações diretamente.
-Deixa comigo. - disse meu sobrinho.
E eu imaginei o Daniel conversando com
ela como Maluf, e a Kiara como o apresentador da Record cujo nome não me
ocorre.
Em seguida, Daniel saiu com o carro e o
Luca falou da entrada do Fernando Henrique Cardoso na Academia Brasileira de
Letras.
-Não entendo porque o Ariano Suassuna se
absteve.
-Foi para evitar o que disse Nélson
Rodrigues, toda unanimidade é burra. - pensei sem me manifestar.
-Ele foi o único candidato?
-Não, Luca, quatro ou cinco concorreram,
mas não obtiveram um voto. - esclareci.
-Fernando Henrique não é literato, mas
isso não importa; pessoas notáveis devem ir para a Academia Brasileira de
Letras. Quando o Machado de Assis apontou o Barão do Rio Branco para a
Academia, alguém perguntou o que ele escrevera. “O mapa do Brasil” - respondeu
o Machado. (*)
-Fernando Henrique é o primeiro
ex-presidente da República a ser eleito. Prosseguiu depois de uma pausa.
Claudio interveio:
-Getúlio Vargas entrou para a Academia
em 1941, quando era ditador, José Sarney em 1980, quando era presidente do PDS,
partido do governo do General Figueiredo.
-Fernando Henrique foi o primeiro
político da oposição a ser eleito para a Academia Brasileira de Letras. -
declarei.
(*) Ontem
almocei com um bisneto de um dos fundadores da ABL – unha e carne com o Machadão
– que garantiu que a instituição segue
os mandamentos da academia francesa, onde a literatura tem vez, mas,
igualmente, personalidades de destaque.
Assim, podemos
esperar que a Dilma e o Lula pudessem ser eleitos sem que se ferisse qualquer
detalhe do estatuto, só que, felizmente, eles não são assinantes do seu O
BISCOITO MOLHADO e nem devem desconfiar dessa possibilidade.
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