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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4228 Data: 12 de
julho de 2013
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GÊMEOS ATÉ NA VOZ
A voz do Sérgio Fortes anunciou o início
do primeiro Rádio Memória do mês de julho deste ano e logo soubemos do que ocorrera
com o titular do programa:
-Jonas Vieira foi vetado pelo
Departamento Médico ainda no vestiário.
Ele não estará presente, então, no seu
estúdio padrão FIFA na Roquette Pinto. - murmurei.
Sérgio não desanimou com a ausência do
parceiro.
-Teremos hoje uma edição muito luxuosa e
o Peter (que o Dieckmann garante que não é o das carrapetas) concorda.
E foi adiante:
-Nossos convidados são os irmãos
Santoro, Ricardo e Paulo Santoro, integrantes da Orquestra Sinfônica
Brasileira, que só acolhe grandes instrumentistas. Bom dia, Paulo e Ricardo
Santoro. O ouvinte já desperta com boa música.
Gosto de irmãos que se juntam para fazer
arte, por coincidência, tento rever, ultimamente, todos os filmes dos Irmãos
Marx. É evidente que todos sabem que a arte dos Irmãos Santoro não é a
representação humorística e sim musical.
Às palavras do Sérgio Fortes, os irmãos
gêmeos, Ricardo e Paulo Santoro, cumprimentaram o público efusivamente. Aqui um parêntese deste escriba: se eu
confundi o Jonas Vieira com o Jonas Resende, imaginem a confusão que farei com
os irmãos que são gêmeos até na voz; isso posto, desculpem-me se eu chamar o
Paulo Santoro de Ricardo Santoro e vice-versa.
-Vocês dois, formam o duo Santoro e
lançaram um CD apenas com música brasileira.
Ironia: Sérgio Fortes, que forma um duo
com Jonas Vieira, encontrava-se agora numa interpretação solo.
-Lançamos o CD “Bem Brasileiro.” -
enfatizaram os violoncelistas.
-A minha mulher diz: “Olha os Santoro na
televisão”. Abro os jornais e os vejo. O assessor de imprensa divulga o nome de
vocês extraordinariamente bem. Vocês devem pagar uma fortuna a eles?...
-Ele se chama Fabio Cézanne. Com um nome
desses tem de ser bom.
Estava coberto de razão o Ricardo (ou
seria o Paulo?) Santoro; Cézanne influenciou Picasso e Matisse. “Cézanne foi o
pai de todos nós” - afirmou Picasso (ou teria sido Matisse?).
-Nos encontros que tenho com os músicos
da Orquestra Sinfônica Brasileira, há uma ciumeira geral, uns tem o CD, outros
não têm...
Foi interrompido por um dos gêmeos.
-Para que a ciumeira não persista, o
nosso CD se acha na Livraria Cultural de todo Brasil. Basta entrar no site
da Livraria Cultural ou, então, dar um pulinho até a Senador Dantas.
E ainda havia mais opções de compra:
-O CD “Bem Brasileiro” também é
encontrado na loja da Apple Store.
Ainda bem que não anunciou a Arlequim
Loja, no Paço Imperial, onde eu já entro com as duas mãos para cima.
-Nós temos de nos vender ao mercado. Não
tem jeito.
Sérgio Fortes compreendeu inteiramente,
ele sabe que muitos compositores consagrados da música popular criaram canções
de protesto, nos anos 60 e 70, visando mais a rentabilidade que viria dos
inúmeros consumidores de discos insatisfeitos com a ditadura do que outra
coisa.
-Bem, vamos ouvir música. - deu por
encerrada, por minutos, aquela prosa.
-Vamos ouvir a faixa que abre o CD,
“Trenzinho do Caipira”, de Villa Lobos.
Lembrei-me logo do José Staneck tocando,
na gaita, o seu arranjo, no programa “Sem Censura” e, em seguida, do David Chew,
no violoncelo e a Cristina Ortiz, no piano, executando esse trecho da Bachiana
Brasileira nº 2 na extinta TV Educativa. Veio-me também à mente uma brincadeira
entre Wynton Marsalis e Yo-Yo Ma; o jazzista tocava uma nota e Yo-Yo Ma
reproduzia no violoncelo, até que ele tirou um som no trompete que não pôde ser
reproduzido, então, o Wynton Marsalis disse que, às vezes, temos de tirar o
caldo das notas. Parece-me que essa composição de Vila Lobos exige, em alguns
momentos, que se tire o caldo das notas.
-E a opção pelo violoncelo? - perguntou
o Sérgio logo que o trenzinho parou na estação.
Mas não parou nessa pergunta:
-Afinal, vocês são filhos do Sandrino
Santoro, que conviveu muito com meu pai. Até me emociono quando me lembro...
-Nosso pai, quando tocou no Paraná, foi
chamado de Paganini do contrabaixo. Ele foi o primeiro solista de um concerto
para contrabaixo, tocando com a Orquestra Sinfônica Brasileira nos Concertos
para a Juventude, em 1966, na Sala Cecília Meireles.
E responderam a pergunta:
-Como nós nos iniciamos na música com 4
anos de idade, o instrumento tinha de ser menor. Nosso pai teve, também, visão
mercadológica, quando nos incentivou a tocar violoncelo.
Sérgio Fortes retomou a palavra:
-Eu me lembro que meu pai (o barítono
Paulo Fortes) se dirigia aos músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira em
italiano, tantos eram os que vieram da Itália. - aludiu à nacionalidade do
grande contrabaixista.
Em seguida, pediu a segunda música a ser
ouvida no Rádio Memória.
-Trata-se de uma música composta
exclusivamente para o duo Santoro pelo Waldemar Szpilman: “Choro”.
E Ricardo Santoro apresentou mais
detalhes sobre o compositor:
-Waldemar Szpilman, grande violinista,
spalla, que veio pequeno da Polônia para o Brasil, tanto que não fala polonês.
Seu filho, Marcos Szpilman, criador do Rio Jazz Orquestra, ficou ainda mais
famoso que o pai.
E o primo de Waldemar Szpilman,
Wladyslaw Szpilman se tornou o mais famoso da família depois que foi retratado
no filme “O Pianista”, de Roman Polanski - acrescentamos nós, do Biscoito
Molhado.
Depois do “Choro”, Sérgio Fortes propôs
aos irmãos a seguinte hipótese: vocês vão tocar daqui a três meses com a
Filarmônica de Berlim, que compositor escolheriam? A resposta foi uníssona e
peremptória:
-Villa Lobos.
E vieram os motivos da escolha:
-Villa Lobos é conhecido em todo o
mundo. Além disso, o violoncelo foi o instrumento da formação musical de Villa
Lobos. Ele dominava o violoncelo e o violão. Os estudos para violão do Villa
Lobos é uma referência.
-Ele compôs muito para o violoncelo. -
acrescentou o Sérgio Fortes.
Ricardo Santoro citou a Fantasia
Concertante para 32 violoncelos, obra que só poderia ser criada por quem
conhece profundamente o instrumento. Citou também as bachianas (a primeira foi
composta para 8 violoncelos). Reportaram-se ainda a David Chew, que trocou a
Inglaterra pelo Brasil por causa de Villa Lobos.
-A tese de mestrado em violoncelo do
David Chew em Londres foi sobre Villa Lobos. - frisou Paulo Santoro.
-Vamos reverenciar Villa Lobos e Tom
Jobim, que também é conhecido em todo o mundo. - exagerou um dos irmãos na
comparação.
Tom Jobim se inspirou muito em Villa Lobos. Bem,
até Neil Sedaka, figura estelar do rock, revelou que já ouviu trechos de Villa
Lobos para se inspirar... Mas isso é outra história.
-E agora, o que vamos ouvir? - interveio
o Sérgio Fortes.
-Nós vamos ouvir agora Astor Piazzola.
Logo, Ricardo Santoro foi interrompido pelo
Sérgio Fortes, que se reportou a uma fantástica interpretação de uma composição
de Astor Piazzola na gaita de José Staneck num concerto do BNDES. E eu me
lembrava do grande gaitista interpretando uma gypmnopedie de Erick
Satie, na igreja, por ocasião do casamento de um parente da sua esposa.
Continua
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