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quinta-feira, 11 de setembro de 2014

2692 - assovios nada tranquilizadores


 

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O BISCOITO MOLHADO

Edição 4942                                  Data:  09  de  setembro de 2014

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ASSOVIOS NO RÁDIO MEMÓRIA

PARTE I

 

-Hoje, não temos Sérgio Fortes.

-Mas temos Simon Khoury. - ouvimos o próprio com a sua inconfundível voz roufenha.

Com a ausência anunciada pelo Jonas Vieira, viu-se obrigado a se pôr no papel de Homem-Calendário, porque não podia deixar de aludir à independência do Brasil no dia 7 de setembro.

-Dom Pedro deu o grito de “Independência ou Morte” às margens do Ipiranga.

Não quis se alongar no tema, por isso preferiu a versão oficial que Pedro Américo consolidou na sua famosa pintura. Deixou para lá a crua realidade, que Dom Pedro montava uma mula, alimária bem mais resistente do que um cavalo e que sofria de diarreia. Tinha pressa de anunciar a atração do programa:

-Simon Khoury trouxe 200 músicas do mundo inteiro que têm o assovio como instrumento.

Já houve um Rádio Memória assoviada do princípio ao fim, há uns dois anos; também me lembrei de ter escrito, na ocasião, sobre a minha frustração de não ter embocadura para assoviar e sim, boca dura. E aludi, na ocasião, ao interessante documentário a que assisti, na TV a cabo: o Campeonato Mundial de Assobio, que ocorre todos os anos em Louisburg, Carolina do Norte. Vale nos determos por alguns parágrafos nesse festival de onde sai o “Campeão Mundial de Assobio”.

O começo se deu em 1973, quando um concorrente do festival de música, anterior ao campeonato, pediu aos juízes para assoviar a sua composição em vez de cantá-la. O êxito foi tamanho que o evento anual se tornou a Convenção Nacional de Assobiadores os Estados Unidos.

Muitos participantes bebem água gelada minutos antes de subir ao palco porque – dizem – o gelo contrai o tecido labial, tornando o som mais agradável e suave, permitindo que o ar flua correntemente. Evitam, por outro lado, selinhos, bitocas, beijos, principalmente os desentupidores de pia, porque deixam os lábios moles.

A grande vencedora de 2013 foi uma adolescente de 14 anos, a japonesa Marina Kato, que sempre assoviava enquanto fazia as tarefas escolares. Como se estuda muito no Japão, ela assoviou por muitas horas até que se tornou invencível nesse ano em Louisburg.

Fechados os parênteses, voltemos, agora, para o Rádio Memória.

-Que novidades teremos dessa vez?...

A curiosidade do titular do programa não era menor do que a dos ouvintes.

-Qual é a primeira, Simon?

-Para não entrar em detalhes, para não parecer majestoso, vamos lá.

Fez uma pequena introdução sobre o autor, o romeno Wladimir Cosma, cujo sobrenome lhe lembrava Joseph Kosma, que compôs a inspirada “Folhas Mortas”.

Depois da última nota assobiada, voltou o Simon Khoury.

-Que tal, senhores ouvintes? Essa seleção de músicas que o Simon Khoury trouxe não toca no Brasil nem que uma vaca cante ópera.

É verdade que Machado de Assis escreveu sobre baleia (ou seria elefante?) com rouxinol na garganta, na ópera, mas era também uma metáfora.

Como o Rádio Memória não é musical de ponta a ponta, também é uma tribuna, Simon Khoury reclamou dos serviços dos Correios, “uma das poucas coisas do governo que funcionava”. Logo, Jonas Vieira se juntou a ele, reclamando da demora da entrega de dois livros que enviou de Laranjeiras a Copacabana.

Para descontrair, mais assovios.

-Agora, um compositor que nós amamos de paixão, Luiz Bonfá: “Samba do Assobio”.

-Ele e a Maria Helena Toledo. - seguiram-se as palavras do Jonas Vieira às do Simon Khoury.

Após a gravação, os dois falaram deste periódico, enviaram-me demorados abraços e nós, penhorados, agradecemos. Simon Khoury foi além e nos dedicou o próximo número musical, nada mais nada menos do que a “Marcha Turca”, de Mozart, assobiada por um húngaro, cujo nome não escreveremos para não errar, só conseguimos escrever corretamente o nome dos jogadores da seleção magiar de 1954.

Que fôlego! Parecia o Jean-Pierre Rampal ou o Altamiro Carrilho tocando flauta. A homenagem do Simon Khoury foi caprichada.

Então, o Simon Khoury contou o primeiro causo do dia que, veremos, em seguida, serviria de introdução para a próxima música. Tratava-se de um voo de uma trupe de artistas para Manaus em que se encontrava o ator Hélio Ary.  Os artistas, muito medrosos, ficaram ainda mais assustados quando embarcaram duas vacas e um piano de cauda. Quando sobrevoavam a floresta amazônica, segundo o narrador, um dos motores da aeronave pegou fogo. As duas vacas foram atiradas para fora do avião. No meio do pânico, uma atriz lindíssima da peça se sobressaía pelos seus berros, foi quando o Hélio Ary avistou uma tabuleta. Disse o Simon Khoury que, tentando tranquilizar seus colegas, apontou para essa tabuleta e gritou: “Calma, gente, neste avião, John Wayne filmou “Um Fio de Esperança”. Alguém perguntou: “De quando é esse filme?” “De 1953.” - respondeu o Hélio Ary; e o sujeito caiu duro.

Agora, a entonação da voz do Simon Khoury não era de contador de causos.

-Eu quero mostrar para vocês a música da trilha sonora do “Um Fio de Esperança”, que se chama “The High and Mighty”.

- Dimitri Tiomkim, com a orquestra de Lester Young. - acrescentou o Jonas Vieira.

Sem mais delongas, diria o Sérgio Fortes, se lá estivesse, ouvimos a bela “The High and Mighty” soprada com a mais refinada arte. (*)

 

(*) No filme, John Wayne assovia a música.

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