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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4316 Data: 23 de novembro
de 2013
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CARTAS DOS LEITORES
-Eu acordei domingo,
dia 17, às 8h 45min, ainda com remelas,
ouvi o Jonas Vieira dizendo que os dirigentes do Flamengo estão certo de cobrar
ingressos que vão de 200 a 800 reais, pois
o clube é de torcedores ricos? É isso mesmo, pois sou rubro-negro, quase
todos meus amigos também, e vivemos no miserê? ... Uóchinton
BM: Em primeiro lugar, você deveria colocar o relógio
para acordá-lo mais cedo, ou o alarme do despertador, pois assim, não perderia
os programas Almanaque e Rádio Memória que, até a hora em que você saiu dos
braços de Morfeu, o Sérgio Fortes, com o Peter nas carrapetas, deslumbrava os
ouvintes que apreciam boa música e boa piada.
Sim, Uóchinton, pelo
que entendi ficou para o Jonas Vieira assentado (desculpem-me a palavra, mas
tenho visto muitas sessões do STF) que o clube da Gávea é de torcedores ricos.
Seria o Flamengo voltando
às suas origens? Via-se jogador desvalido e de cabelo pixaim nos primeiros anos
da prática do “foot ball”, neste país, no Flamengo? Não, também não no
Fluminense, no Botafogo e no América. No
tricolor das Laranjeiras, um jogador com um bronzeado suspeito cobria-se de pó
de arroz para, como o Michael Jackson faria décadas depois, embranquecer. Veio
daí a ligação do Fluminense com o pó de arroz.
O Bangu formou times
com os pobres e os morenos que trabalhavam na fábrica de tecido do bairro, “os
mulatinhos rosados”, mas como não incomodava os grandes, seguiu adiante. Isso
não aconteceu com um clube que, vindo da terceira divisão, com brancos, negros
e mulatos, conquistou o título de campeão carioca de 1923: o Vasco da Gama.
O clube foi logo
hostilizado pelos aristocráticos Fluminense, Flamengo, Botafogo e América; e,
sob a desculpa que o Vasco da Gama não possuía um estádio de futebol, foi
tirado do campeonato deles. Houve,
então, uma extraordinária mobilização entre os torcedores, alguns deles comerciantes
de bacalhau, outros, apenas apreciadores desse peixe; e foi erguido, em 12
meses, o maior estádio do Brasil: São Januário. Estava afastado o empecilho e,
assim, os despossuídos e pardos ocuparam o seu lugar de direito no mais popular
esporte criado até hoje.
Houve recaídas, é
verdade. O “scratch” brasileiro de 1958, com o inconcebível argumento que os
negros não tinham estrutura emocional para ficar longe de casa por muito tempo,
iniciou a Copa do Mundo na Suécia com um time de brancos: Gilmar, De Sordi e
Belini, Zito, Orlando e Nílton Santos, Joel, Didi, Mazola, Dida e Zagalo. A
única exceção era Didi, o Príncipe Etíope de Rancho, segundo o Nélson
Rodrigues. Quando entraram os crioulos Djalma Santos e Pelé e mais o mulato
Garrincha, o nosso escrete conquistou o seu mais memorável título em Copa do
Mundo.
Antes de encerrarmos
essa resposta que se faz longa, voltemos ao pó de arroz.
Em 1914, num jogo
contra o América, o “player” Carlos Alberto estava mais empoado do que a Madame
Du Barry para ocultar sua cor morena. Ao suar, a cobertura se desfez, e a
torcida americana passou a gritar em tom de insulto: “Pó de arroz. Pó de
arroz”. Quase cem anos depois, esse
grito repercute.
-O redator de Biscoito
Molhado acredita que o Flamengo pós-Maracanã padrão FIFA é igual ao Flamengo das décadas de 10 e 20?
Bredi Piti
BM: Não; há uma
diferença: naquela época, o Flamengo não queria
negros no “team”, hoje, não os quer dentro do Maracanã a não ser que se
tornem sócios torcedores por livre e espontânea pressão.
Como os torcedores do
Flamengo comemorarão um gol no Maracanã padrão FIFA, num FLA x FLU, por
exemplo? Jaquiéle
BM: Ora, não é difícil prever. Comemorarão com rolhas de
Champagne Moët et Chandon espoucando e
bebendo nos sapatos de salto alto das flamenguistas.
-E o crioulo pau d´
água das esquinas gritando Flamengo tomado pela paixão, que o Nélson Rodrigues
tanto decantou?... Será esquecido? Maiquel Jaquison
BM: Sim, ele será
desprezado como o aficionado que
bebe água na cuia de um queijo Palmira. Há também essa passagem do pó de arroz
Nélson Rodrigues que vem a propósito: “Poucas instituições serão tão
abrangentemente nacionais quanto o Flamengo – a Igreja Católica, sem dúvida é
uma delas, e, talvez o jogo do bicho. E olha que o Flamengo não promete a vida
eterna e nem o enriquecimento fácil. Ao contrário, às vezes mata de enfarte e,
quase sempre, só dá despesas. Mas uma coisa ele tem em comum com a religião e o
bicho: a Fé!”
“Por onde vai, o
Rubro-Negro arrasta multidões fanatizadas. Há quem morra com o seu nome gravado
no coração, a ponta de canivete. O Flamengo tornou-se uma força da natureza e,
repito, no Flamengo venta, troveja, relampeja.”
“Cada brasileiro, vivo
ou morto já foi Flamengo por um instante ou por um dia.”
Esses flamenguistas,
caro leitor, o os dirigentes do Flamengo não querem mais.
-Com o Flamengo de
torcedores ricos, não teremos mais letras como a que inspirou o vascaíno de
quatro costados, Aldir Blanc, na canção
“Incompatibilidade de gênios”? Aqui vai um trecho dessa letra.
“Dotô,
jogava o Flamengo, eu
queria escutar.
Chegou, mudou de
estação, começou a cantar.
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Se eu tô devendo
dinheiro,
e um vem me cobrar,
Dotô,
a peste abre a porta
e ainda manda sentá.”
Obrigado pela atenção. Uélinton
BM: Não fique tão alarmado, Uélinton, pois ligar o
rádio para escutar os jogos do Flamengo pode, o que não vai dar mais é ir ao
Maracanã assistir aos jogos do seu time de coração; isto é, pode escutar desde
que você não tenha se casado com uma peste, e, como agravante, de dever dinheiro.
-Eu concordo com o
Jonas Veira, o Flamengo precisa de muito, mais de muito dinheiro para pagar a
enorme dívida que carrega, assim, tem de aumentar o preço dos ingressos de
maneira superlativa. Guido Mantega
BM: Nós diríamos que o clube do coração do Jonas precisa
de uma boa administração antes de qualquer outra coisa. Os dólares da
exportação do petróleo jorram na Venezuela, no entanto, por causa dos maus
governos, falta até papel higiênico lá.
-O Biscoito Molhado
encerrou de afogadilho a redação do exemplar sobre o Rádio Memória apresentado
pelo Sérgio Fortes, no dia 17 de novembro, que fiquei sem saber quais os
comentários sobre “Na Baixa do Sapateiro”, do Ary Barroso. Fica aqui meu
protesto e a minha ameaça de cancelar a assinatura. Ariovaldo
BM:
O rubro-negro fanático e locutor da gaitinha, Ary Barroso, certa vez, na década
de 30, indispôs-se com os dirigentes do Vasco. Proibido de entrar no estádio de
São Januário, transmitiu Vasco e Fluminense de cima do telhado de uma casa que,
dizem na família, era de uma tia-avó minha.
Mas você quer saber de
música, e não de futebol. Vamos, então, tentar corrigir esse erro, pelo menos,
a que a pressa nos levou naquela edição do BM.
Sérgio Fortes nos
informou que “Na Baixa do Sapateiro” foi gravada como faixa B, de um disco de
78 rpm, e, em seguida, expressou a sua estranheza pelo fato de a Carmem Miranda
não cantar essa prestigiosa composição num filme. Nesse instante, Jonas Vieira,
com todo o seu conhecimento enciclopédico de música popular, interveio para
esclarecer que Ary Barroso havia vendido para o Andre Kostelanetz os direitos
da música, não a autoria. Depois, declarou Jonas Vieira, Ary Barroso se
arrependeu à beça.
Bem, por hoje chega.
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