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terça-feira, 17 de setembro de 2013

2469 - Tiro liro liro, Tiro liro ló



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4269                         Data:  09 de  setembro de 2013
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SABADOIDO DE SETE DE SETEMBRO
2ª PARTE

Menos de cinco minutos depois da chegada do Luca, surgiu o Vagner, que logo se acomodou na sua cadeira.
-O cavalo já estava cansado de substituir os ausentes. - lançou a farpa o Claudio, alisando o peso de papel.
Luca sacou umas tiras de uma farmácia da Dias da Cruz em que constavam sua pressão arterial, seu índice de gordura que, a princípio, foi confundido com o índice da massa corporal.
-O IMC ideal é até 25.
-Se eu não estivesse com esta barriga, o meu índice da massa corporal estaria bom.
-Para calcular esse índice, você divide o seu peso pela medida da sua altura elevada ao quadrado.
Mal falei essas palavras e encontrei, numa das quatro tirinhas que me passara, o seu índice.
-Está bom, Luca: 25,8. Você tem 1,68m e está com 73 quilos.
A conversa prosseguiu no campo médico, sem alusões à vinda dos cubanos que vieram para o Brasil trabalhar com a parte mais substanciosa dos seus salários indo para os irmãos Castro.
-Luca, aquele vibrador que massageia os locais doloridos, que você me deu, uma colega minha viu por 39 reais.
-Um roubo, Carlinhos. Eu vi, em promoção na Casa e Vídeo, por 16 reais e com mais recursos do que o seu.
-Eu sentia um incômodo debaixo das costelas à direita e julguei que fosse pedra na vesícula, pois minha avó e a minha mãe sofreram disso. Falei com a Gina, e ela me perguntou se eu me sentia enjoado, disse-lhe que não: “Isso é problema muscular, nada tem a ver com vesícula.” Eu vibrava esse aparelhinho no local dolorido, sentia um alívio, mas bastava afastá-lo para a dorzinha voltar. Emplastrei, então, o local da dor com pomada anti-inflamatória, e o resultado foi bem melhor.
-Eu, depois das partidas de pingue-pongue, passo o vibrador pelas costas, braços, e ainda tomo PACO - Paracetamol com Codeína.
-Aposto que, daqui a pouco, o Gordo telefonará marcando jogos de pingue-pongue para hoje, às 5 horas da tarde. - previu meu irmão,  sabendo, como se diz no turfe, que era “poule” de dez.
-Kiara foi à Bienal. - levou o Luca o rumo da conversa para o  tema que, atualmente, agita a vida cultural da cidade do Rio de Janeiro, apesar da ministra da Cultura promover desfiles de moda com as verbas da  Lei Rouanet.
-Eu e a Glória demos dinheiro para ela adquirir livros e lanchar.
E prosseguiu:
-Com a Kiarinha foi uma colega com 200 reais. Sabe o que essa menina fez?
Era uma pergunta retórica, pois não esperou por respostas ou adivinhações.
-Ela comprou um livro para ela, outro, para o irmão; um terceiro, para o pai, e ainda outro para a mãe. Gastou todo o dinheiro que tinha com livros.
Ela é uma Rosa Grieco mirim. - pensei sem verbalizar meu pensamento.
-Sem dinheiro, a Kiarinha pagou o lanche dela.
-Comesse o livro. - sugeriu o Vagner.
  Riram, mas na loucura do Vagner havia método, apesar de ele não seu um Hamlet se fingindo de doido. Há pessoas que leem um livro, como se o comesse, e levam anos e anos fazendo digestão (às vezes, a vida inteira) até pegar outro livro.
-O trânsito da Barra da Tijuca esteve uma loucura.
-Devido à multidão que foi à Bienal do Livro, Claudiomiro, não era para menos.
Dessa vez, fui eu que mudei de assunto.
-Assisti, ontem, a uma entrevista com o Carlo Manga na TV a cabo.
-Quem entrevistou?
-Um aluno do 5º período de Comunicação da SUAM. A vantagem é que, não sendo um nome consagrado, não há perigo de um entrevistador querer mais os holofotes sobre ele do que sobre o entrevistado, ainda mais que se tratava do Carlos Manga.
-”Manga não, manga é um perigo, quem provou quase morreu”. - cantou o Luca, com um sorriso sarcástico, a canção com que o Juca Chaves se referiu à tentativa de suicídio da Cidinha Campos (Suicidinha Campos) por causa do seu amor contrariado pelo Carlos Manga.
-Com mais de 80 anos, o diretor da Atlântida, vez ou outra,  era abandonado pela memória e pedia ajuda ao estudante, que, por ser jovem, não vivera aquela época passada.
-Desde o início dos anos 50, o Carlos Manga já dirigia filmes.- manifestou-se o Claudio.
-O Carlos Manga citou  “O Marginal”, filme de …..
E tentei reproduzir, sem caricaturá-lo,  o seu esquecimento de fatos importantes da sua vida.
-”O galã é um antigo, da TV Globo, um dos melhores que houve...”
E prossegui:
-O rapaz se mostrou constrangido, diante da expressão torturada do grande diretor brasileiro, até que se ouviu uma voz ao fundo: Tarcísio Meira.
-Tarcísio Meira – explodiu o Carlos Manga de alegria. Uma joia de pessoa, amababilíssima.
-Então, ele expressou sofrimento ainda maior porque não lhe vinha `a mente o nome da artista principal de “O Marginal”.
-Uma loura... muito bonita...
-Não era muito burra? - lançaram a farpa no Sabadoido.
-Carlos Manga afirmou que, além de bonita, também extremamente dócil para atuar, obedecendo ao que se pedia. Como, dessa vez, ninguém soprou o nome, atrás das câmeras, ele capitulou:
-”Aqui vai o meu pedido de perdão a ela, e o meu beijo.” - disse ele, contrito e, jogando um beijo com as duas mãos para a câmera.
-E quem essa atriz? -perguntou o Luca.
-Fiquei curioso também e, depois da entrevista, corri para o pai dos burros virtual, o Google: era a Darlene Glória.
-Assistir a um programa, assim, em que um entrevistado esquece tudo, não vale a pena. - demonstrou o Claudio sua impaciência.
-É claro que ele não possui a memória de uma Barbara Heliodora, com 90 anos, de uma Bibi Ferreira, com essa idade também, mas ele não se saiu mal. Em meia hora de entrevista, em que falou bastante, só não lhe vieram à mente esses dois artistas.
Antes que a direção da nossa prosa se alterasse, destaquei uma pergunta que lhe foi dirigida sobre os seus feitos sexuais com as artistas de cinema e televisão.
-Mas como você é indiscreto!
Apesar dessa reação, Carlos Manga satisfez a curiosidade do estudante e de todos: as que eram fáceis, não havia problemas, as que eram difíceis, ele tentava. E enfatizou com a voz bem firme: nunca o respeito faltou.
-O respeito é muito importante. - concordou o Luca.
-Hoje, poucos se preocupam com a própria privacidade. - comentaram.
Ergui-me da cadeira dizendo que, como a Rosa Grieco diz que eu inundo como a Fontana dei Quattro Fiumi (Fonte dos Quatros Rios) de Bernini, vou ao banheiro.
-Rosa escreveu, Carlinhos, que, se você tem um monte de livros para ler, ela tem um Everest. - disse o Luca, indicando-me um papel dobrado, mais uma das suas cartas.
-A Rosa, como leitora, é insuperável. - reconheci.
Quando retornei à sessão do Sabadoido, Claudio e Luca discutiam sobre Fado. Luca cantou o trecho inicial da paródia maliciosa que Dona Anacleta, antiga vizinha nossa da Chaves Pinheiro, fazia do sucesso da Amália Rodrigues: Tiro liro liro, Tiro liro ló” .
Gina, que se aproximava, tudo ouviu e, citando a sua vizinha de outrora, Dona Floripes, entoou, do início ao fim, um alegre Fado de Viseu.
E, com as canções lusitanas, encerrou-se o Sabadoido do Dia da Independência do Brasil.

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