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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

2468 - diversas validades vencidas - de Baden Baden a Pétain, via Caetano



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4268                         Data:  08 de  setembro de 2013
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SABADOIDO DE SETE DE SETEMBRO

-No Dia da Independência, nós acordávamos com o barulho dos tanques de guerra passando por aqui em direção à cidade.
-Mesmo depois de a capital mudar para Brasília, eles passavam, Gina?
-Sim, Carlinhos; da Vila militar e Deodoro até o Centro, a passagem era por aqui,
-Então, você assistia à Parada antes das autoridades na Avenida Presidente Vargas. - interveio o Daniel.
-Eu preferia continuar dormindo, mas a mamãe agitava tanto que nos levantávamos e íamos, eu e a Jura, sentar no murinho para ver tanques e incontáveis veículos transportando soldados.
-Depois do desfile militar, o grande acontecimento por aqui foi o desfile da escola de samba Beija-flor. Isso aconteceu para celebrar o alargamento da Avenida Suburbana. Você lembra quando foi?
-Carlinhos, foi logo no início dos anos 70. - respondeu-me ela.
Estávamos apenas nós três na casa, pois o Claudio, indignado com a demora da entrega do jornal, rumou para o Carrefour.
Proseávamos sobre futebol, quando se ouviu um baque.
-Chegou o jornal. - disse ela.
Ergui-me da cadeira, apesar dos seus protesto, e peguei o jornal lá fora.
-Vai ler?
Como ela respondeu que agora não, voltei a sentar e abri as páginas do Globo.
-Eu, na cadeira de leitura do Globo do Claudio, tomando a frente dele.
-O velho só não gosta que os cadernos do jornal estejam fora do lugar.
-Vê se não falta nada, Carlinhos. - pediu a Gina.
Quem faltava era o meu irmão, mas não por muito tempo, ele surgiu com uma sacola de compras e com a expressão vitoriosa.
-Devolvendo o seu lugar... - fiz menção de me levantar.
-Fique aí; a hora de eu ler o Globo já passou, só de tarde, agora.
Sentou-se, então, na sua cadeira de descascar metodicamente laranjas e chupá-las. Com a saída da mulher e filho para o interior da casa, pôs-se a narrar a sua ida ao supermercado.
-Quem achar uma mercadoria fora da validade, ganha o direito, no Carrefour, de ficar com uma de graça.
-Eu não sabia disso. - confessei.
-Então, no meio das garrafas de cerveja, encontrei uma Baden Baden com o prazo de validade vencido. Levei-a a um funcionário do Carrefour, que me pediu para esperar a garrafa de Baden Baden que ele me daria. Disse-lhe para me dar aquela mesmo, ele falou que não podia, que tinha de entregar um produto dentro do prazo legal. Ora, iogurte e outras mercadorias perecíveis têm esse problema, cerveja, não; você pode beber daqui a alguns meses que ainda está boa. A Baden Baden custa 14 reais. (*)
-Lembro-me que, numa sexta-feira, eu e uma turma do trabalho, uns sete ou oito, entramos no Alentejano para almoçar e, mal sentamos, o Dieckmann telefonou, de um pé-sujo, avisando que serviam Baden Baden. Levantamo-nos e nos dirigimos para lá.
-Era um pé-sujo? - estranhou.
-Bem, não havia muita comodidade, mas se achava lá um piano que, de noite, era tocado para os frequentadores comerem, beberem e relaxarem, não, necessariamente, nessa ordem.
Ele voltou à sua narrativa.
-Esse funcionário do Carrefour me disse que eles jogam no lixo, em média, 70 mil reais por mês de produtos fora do prazo; que, antes, eles doavam, mas que não podem mais.
-Ouvi, no noticiário do rádio, hoje, por coincidência, que várias crianças passaram mal depois de comerem alimentos com prazos vencidos.
-Parece que foi numa escola da Bahia. - disse ele.
E prosseguiu
-A Baden Baden que achei iria para o lixo, disse-me o tal funcionário, enquanto me entregava uma garrafa nova, que já guardei.
-Será que vai mesmo para a lixeira a Baden Baden que você encontrou?...
-Ele vai beber, Carlão. - chamou-me como o Daniel costuma fazer com uma sonora risada.
-Ele lhe disse isso?
-Claro que não, é uma suposição minha.
-Hoje é 7 de setembro e penso que o Luca não vem. - previu a Gina de volta à cozinha.
-Por que não viria?... Ele vai marchar?...
A garrafa gratuita de Baden Baden melhorara muito o humor do meu irmão naquela manhã em que o Globo chegou com horas de atraso.
-Se não for para marchar, vai para as manifestações. - devolveu a Gina.
-Depois que o Caetano Veloso colocou a burca dos “Black Blocs”?...
Vendo a foto do compositor no Globo, tomei a palavra.
-O Caetano teve um apagão mental; pois se mascarou como os “Black Blocs”,  para se mostrar favorável à não violência e ao carnaval, como se esse grupo não fosse constituído de vândalos e como se o Brasil festejasse o carnaval 365 dias por ano.
-Se você, que gosta do Caetano, está esculhambando com ele, imagino o Luca, quando chegar aqui. - disse o Claudio.
-Eu já não entendia por que ele enaltecia tanto, ultimamente, o Carlos Lamarca, compondo até música para ele.
-Eu ainda não ouvi. - aparteou-me o Claudio.
-O Carlos Lamarca foi capitão do exército, guerrilheiro comunista que pretendia colocar a ditadura da esquerda no lugar da que se estabelecera aqui; Caetano, não, foi preso e exilado em Londres porque cantava a democracia, não era ligado a grupo algum comunista.
-Creio que o Caetano viajou pouquíssimas vezes para Cuba. E, quando para lá foi, a motivação era a curiosidade, não a ideologia.
-O próprio Vladimir Palmeira, muito mais engajado no confronto com a ditadura militar, declarou na televisão, que não gostou quando os guerrilheiros o levaram para Cuba, pois o que pretendia mesmo era ir para Paris.
-Eu vi, Carlinhos, essa entrevista dele no Canal Câmara.
-Li artigos em que falam que a idade está afetando a lucidez do Caetano Veloso, e o comparam ao General Pétain que, de herói francês da Primeira Guerra Mundial, se transformou em títere do nazismo. Mas o General Pétain era octogenário, Caetano ainda é um garoto.
-O que é isso, Carlinhos? Só nós envelhecemos? - protestou a Gina.
-É o Luca. - disse meu irmão ao ouvir o som do telefone.

(*) Biscoito Peg-e-Lev, órgão de defesa da economia popular do seu O BISCOITO MOLHADO, informa: no Mundial, a Baden Baden sai por 12 reais.






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