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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

2462 - impacto do escândalo e suicídio na quinta-feira



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4262                              Data:  31 de  agosto de 2013
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MOMENTOS DE IMPACTO NA SUNAMAM

2 – SUICÍDIO DO PAULO FERRAZ

O primeiro grande impacto na SUNAMAM, por nós testemunhados, foi a Guerra das Malvinas, que foi relatada na edição anterior do BM, o segundo, pela ordem cronológica, foi... Saberemos logo.
Passava das dez horas da manhã.
-Vergasta, que trabalha na Diretoria de Cabotagem, subiu alguns andares e foi até a sala do Bureau de Fretes.
-Ainda não sabe, Charlie Brown (era assim que me chamava desde um curso de inglês)?...
-Não sei de quê?
-Poxa, você trabalha com um radinho de pilha na mesa e não ouviu...
-Só ligo para ouvir as cotações da bolsa de valores, na Eldorado, e o pregão ainda não começou.
-O Paulo Ferraz deu um tiro no prédio aqui perto, no Edifício Índico.
-O Paulo Ferraz!... - exclamaram todos que se encontravam na cercania tomados pela perplexidade.
Uns sabiam que ele era o dono do Estaleiro Mauá, outros, que era o pai do ator Buza Ferraz, que atuava em novelas da TV Globo e da TV Manchete, e também pai do Hélio Paulo Ferraz, que fazia incursões no que o colunista social Ibrahim Sued chamava de “Jet Set”.
Logo, um chorrilho de informações se seguiram à manchete apregoada pelo Vergasta com um lide de jornalismo oral.
-O estaleiro dele está envolvido até o pescoço no Escândalo SUNAMAM.
-Ele apareceu hoje, para trabalhar, pouco depois do horário costumeiro, oito horas da manhã, sem demonstrar desespero.
-Subiu no elevador privativo até o 5º andar, onde fica seu escritório.
-Ele deu um tiro no peito com uma Magnum, calibre 38.
Quando liguei o rádio, o noticiário convergia para o drama que acometera o maior empresário brasileiro da construção naval e, logicamente, o Escândalo SUNAMAM veio à tona.
E nesse clima pesado, recebi a minha impressionável irmã com as duas filhas, uma de nove anos, Luciana e a outra de quatro,Verônica, que vieram de Niterói almoçar comigo. Elas adoravam o rosbife com batatas fritas mais refrigerante do Rick, uma lanchonete do empresário Ricardo Amaral na Praça Monte Castelo.
-Comentaram no elevador em que eu subi que o pai do Buza Ferraz se matou. - disse minha irmã.
-Eu vi “A Marquesa dos Anjos.” - interveio a Luciana, referindo-se à minissérie da Rede Manchete, com a alegria de quem desconhecia a tragédia com o pai do ator.
-Ele se matou aqui perto? - perguntou a minha irmã com o rosto cada vez mais crispado,
-Estamos no número 115 e o suicídio foi no 103...
-Se eu soubesse, não teria vindo.
Quando os ponteiros do relógio indicaram 11h 30min, a barriga vazia relaxou a expressão tensa da minha irmã:
-Vamos almoçar?... As meninas já estão me apressando.
-Vamos, estou com fome também.
Descemos no elevador, por coincidência, com o Superintendente da Sunamam, Jonas Correa Sobrinho, cuja presença silenciou até o Barão, o ascensorista que não sabia subir nem descer sem tagarelar. Minha irmã, notando que algo de estranho acontecia, aquietou as filhas, que pretendiam alegrar o ambiente que se tornou claustrofóbico. 
-Vai ver o corpo do Paulo Ferraz. - disse-lhe, quando, depois de a porta do elevador se abrir, o superintendente dobrar à direita sem mudar de calçada.
-Ele é o chefão da SUNAMAM?
Respondi afirmativamente com a cabeça.
-Ele tem culpa?... sussurrou-me.
-Não, Suzete; essas falcatruas vêm de 1975 e o Comandante Jonas veio para cá recentemente. Era o presidente do Lloyd Brasileiro antes de vir para cá. Mesmo os superintendentes anteriores a ele já assumiam com a ordem de não mexerem no diretor-financeiro, o Comandante Rodolpho, porque era homem do ministro Andreazza.
 -Então, o culpado é o diretor-financeiro?
-Como diz o Millor Fernandes sobre seus desafetos: “Eu não confiaria o meu cachorrinho a ele para um passeio.” Uma dinheirama foi desviada, muitos são os culpados, inclusive o morto.
-Esse Andreazza foi do DNER e papai dizia que ele era uma simpatia, falava com todos, mesmo os funcionários mais humildes e apertava todas as mãos.
-Suzete, esses são os mais perigosos.
-Na Convenção do PDS, eu torci por ele contra o Maluf. - falou a minha irmã no seu costumeiro tom passional.
-O que os dois gastaram de dinheiro para cabalar votos dos parlamentares... - deixei a frase interrompida para torná-la mais enfática.
-Carlinhos, o que é cabalar? - quis saber a Luciana, enquanto a minha irmã cortava o bife da Verônica.
-Coisas de adulto. - respondi.
-Eu sou adulta e não sei oque é. - manifestou-se minha irmã.
-Havia recepcionistas atraentes com pouca roupa, pró-Maluf e pró Andreazza, propagandeando os nomes dos seus candidatos. O dinheiro do Maluf, nós sabemos que vêm da Eucatex, do estado e da prefeitura de São Paulo, que ele é um milionário paulista. O Nélson Rodrigues até transformou em personagem, nas suas crônicas, o milionário paulista. Agora, o dinheiro da campanha do Mário Andreazza...
-Você acha que o suicídio do Paulo Ferraz tem alguma coisa a ver com isso?
O silêncio foi minha resposta.
-Eu não gosto disso. - afastou a alface para um canto do prato a Verônica.
-Eu gosto. - disse a sua irmã, recolhendo para si a folha.
Ela não insistiu na pergunta e exclamou:
-Adorei quando o Tancredo Neves derrotou o Maluf no Colégio Eleitoral! -
-Sabe que o Maluf, mesmo sendo do PDS, meteu dinheiro na campanha do Tancredo Neves, na campanha para governador de Minas Gerais em 1982, contra o Eliseu Resende?
-Por que ele fez isso se eram do mesmo partido?
-Porque o Eliseu Resende, ex-ministro dos Transportes, era homem do Mário Andreazza, e, caso se tornasse governador de Minas Gerais, fortalecia ao extremo a candidatura dele à presidência da República pelo PDS. Maluf é uma raposa no campo político.
-E o Eliseu Resende perdeu o governo de Minas Gerais para o Tancredo Neves por muito pouco voto. - lembrou ela.
-Porque rios de dinheiro jorraram na campanha do ex-ministro dos Transportes.
-E de onde veio esse dinheiro?
Outra pergunta da minha irmã que respondi com o silêncio.
Bem, a presença das duas meninas exigia uma conversa amena, sem que o infausto acontecimento daquele dia se sobressaísse e assim foi. Conversamos sobre os passeios na Praça Manet, em Del Castilho e as minhas imitações do temível Tutubarão nos banhos de piscininhas na Rua Chaves Pinheiro.
Levei-as até a estação das barcas e elas voltaram para casa, na Rua Vereador Duque Estrada, sem antes eu prometer às minhas sobrinhas que, dali a poucas semanas, as levaria para passear no Campo de São Bento.
No trabalho, o tema das conversas, obviamente, não mudou. Então, um colega, que estava na janela, gritou como um marinheiro do terra à vista.
-O rabecão chegou.
Debruçado na janela do décimo-primeiro andar, a minha visão era privilegiada. Estranhei o tamanho daquele rabecão, que me pareceu exagerado. O trânsito da Avenida Rio Branco parou, com as ordens dos policiais, para que o rabecão fosse posicionado de ré diante do Edifício Índico.  Passaram alguns longos minutos, até que o motorista acelerou levando o corpo do Paulo Ferraz.
Era uma quinta-feira, dia 7 de fevereiro de 1985, poucos dias antes do carnaval.

 




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