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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4202 Data: 05 de
Junho de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA
ANTES TARDE DO QUE NUNCA
2ª PARTE
Jonas Vieira fez uma menção aos
convidados ausentes e Sérgio Fortes nomeou um deles, Luzer, e justificou sua
ausência: participaria com a Orquestra
Sinfônica Brasileira do projeto Concerto para a Juventude no Teatro Municipal.
A hora – informou - 11h da manhã e o preço era simbólico, 1 real. Esperava que
todos comparecessem.
Em se tratando de concertos domingueiros
matinais, descobri no you tube uma exibição do Beniamino Gigli no
Teatro João Caetano, às 10 horas e 30 minutos, com transmissão da PRF 4 - Rádio Jornal do Brasil.
Correspondendo ao imenso amor que o povo brasileiro lhe dedicava, o tenor com a voz mais bela do século XX encontrou uma
brecha na sua agenda nesse horário. Pelos aplausos que recebia a cada ária que
cantava, notava-se que o teatro estava à cunha, como escrevia Camilo Castelo
Branco e outros autores do século XIX.
Jonas Vieira aludiu às obras primas da
música popular brasileira e exemplificou com a composição de Ernesto Nazareth,
“Bambino.”
-Catulo da Paixão Cearense, muito
sabido, colocou letra. - comentou.
Sabido até de mais - acentuamos nós. Tentou pôr em prática o que dissera Heitor
dos Prazeres: “Música é que nem passarinho, é de quem pegar primeiro”. Assim,
tentou se apossar da música de João Pernambuco, violonista admirado por Villa
Lobos, em que pôs os versos do “Luar do Sertão.”
Conta Medeiros de Albuquerque que Catulo
da Paixão Cearense, ao ver Alberto de Oliveira, considerado um dos três maiores
poetas parnasianos, juntamente com Olavo Bilac e Raimundo de Oliveira,
apresentou-se como colega.
-Colega?... Você também é farmacêutico?-
devolveu Alberto de Oliveira.
Apesar desses deslizes, escreveu letras
inspiradas e a que fez para “Bambino” foi adjetivada pelo Jonas Vieira de
“pomposa”.
O cantor era mais um daqueles que o
titular do programa ressuscita, pelo menos para mim e que surpreendem pela bela
voz: Zé Carlos.
Depois de ouvida a gravação, Sérgio
Fortes enalteceu a participação de Dino Sete Cordas, ídolo de virtuoses do
violão como Rafael Rabelo.
É um engano julgar que tudo é pretérito
no Rádio Memória, há momentos em que se fala do presente com o objetivo de se
preparar o futuro. Aliás, sem incorporar o passado ao presente não se chega a
um bom futuro. Temos de aprender a conjugar os verbos em todos os tempos.
Isso posto, que mais parece uma segunda
pausa para meditação, vamos adiante. O tema atual, que é sempre comentado nesse
horário, foi a maioridade penal.
Mas voltemos às músicas. Com o ânimo de quem já esquecera a derrota do
Fluminense para o Olímpia, Sérgio Fortes se reportou a uma canção do filme
“Candelabro Italiano”. Recordou o extraordinário sucesso que esse filme
alcançou com Troy Donahue, Suzanne Pleshette, Angie Dickinson e Rossano Brazzi.
Sem sair dos bons tempos, afirmou que foi o primeiro filme a que assistiu com
18 anos de idade, legalmente, pois os que vira, até então, não o foram (no meu
caso, o único filme proibido em que me impediram de entrar no cinema, quando
“dimenor”, foi “E deus criou a mulher”).
Para tanto, recordou o tricolor, rumou
para o Cine Rian, de calça Lee branca, sapatos do Moreira da (*) Silva (se
fosse do André Victor Correia certamente escorregaria) e camisa da moda. Imaginou – disse – que conquistaria todas as
mulheres com que se deparasse, mas nada fora da rotina aconteceu.
Para o consolo do nosso amigo, confesso
que, além dos meios que ele usou para conquistar as mulheres, cultivei topetes
dos maiores galãs do cinema, até mesmo do Troy Donahue e também não consegui
fazer carreira de Casanova.
Quanto ao filme, de fato, o sucesso foi
tamanho, que até inspirou um dos mais infames trocadilhos já perpetrados: cão
de lábio italiano.
A música era “Al Di La” e ele pediu a
gravação com o trompetista Al Hirt, sem deixar de citar que Connie Francis a
cantou. Essa alusão à Connie Francis reportou-me ao Pasquim, em que um gaiato
(não me lembro qual) referindo-se ao estupro que Connie Francis sofrera, disse
que ela cantava tão mal, que o estuprador fez justiça.
Depois do trompete de Al Hirt, soou uma
voz que não nos era desconhecida. Era a voz do Dieckmann. Com apenas 45 minutos
de atraso, para um programa de 60 minutos, ele chegou. (**)
Antes tarde do que nunca.
E pensar que o Dieckmann, como chefe, no
Departamento de Marinha Mercante, instituiu reuniões todas as segundas-feiras,
às 8h 30min da manhã, com vaias para quem chegasse atrasado.
Sem constrangimento, pelo contrário,
pimpão como o Sérgio Fortes quando assistiu “Candelabro Italiano”, comentou o
triângulo amoroso do filme e concluiu com uma risada:
-O Rossano Brazzi dançou.
No clima de alegria, Jonas Vieira me
surpreendeu com outro bom cantor que eu desconhecia, Luís Cláudio. Conhecido
seu, vive em Guaratinguetá, depois de largar a vida artística e seguir a
arquitetura, ou seja, fez o caminho inverso de Tom Jobim, Chico Buarque e
outros menos votados.
A gravação, segundo o Jonas Vieira (tomo
o máximo cuidado para não trocar o seu sobrenome), é de 1955. Era uma valsa
intitulada “Folhas Soltas”.
Encerrada a música, sobressaiu a voz do
Dieckmann que, como dizia a Marilyn Monroe sobre os atrasos dela: “Erro a hora,
mas não erro o dia”
-A música que ouvimos, pelo seu
andamento, pelo som de acordeon, lembra as músicas de Mon Oncle (Meu
Tio), de Jacques Tati.
E prosseguiu:
-Trata-se de uma valsinha...
E logo se corrigiu:
-Valsinha é coisa do Vinícius. Valsa.
Por incrível que pareça, na composição
“Valsinha”, Chico Buarque ficou encarregado das palavras e Vinícius de Moraes
das notas musicais.
-E você Dieckmann? - passou-lhe a bola o
titular do programa.
-Eu trouxe...
Dieckmann colocou tanta ênfase nessas
duas palavras que os ouvintes, como eu, esperaram um samba inédito do Noel Rosa
ou uma raridade do Pixinguinha, ou mesmo a décima sinfonia de Beethoven
completa. Mas não foi uma má escolha: Madalena do Ivan Lins.
Disse que o compositor não lhe agrada
muito, mas que estava inspirado nessa canção. O nome da cantora deixou para
depois, como surpresa.
Timbre, swing, sotaque deixaram claro
quem era a intérprete.
-Queridos ouvintes, vocês ouviram
“Madalena”, com Ella Fitzgerald. Quero que todos saibam que tomei contato com
essa gravação no fabuloso bar “O Ponto da Cerveja”, em Porto Alegre.
Caramba, mesmo atrasado, o Dieckmann
quer se apossar do programa.
Para encerrar o Rádio Memória, Jonas
Vieira recorreu a um sucesso do carnaval de 1948, de Aníbal Silva, Éden Silva e
Noel Rosa de Oliveira, regravado pela Elza Soares: “Falam de mim.”.
-Se eu soubesse, teria trazido a minha
fantasia de Arlequim. - não perdeu a piada o Dieckmann.
Por que não a fantasia de Pierrô?...
Porque ele, diferentemente do Rossano Brazzi, não samba nos triângulos
amorosos. (***)
Quanto a Noel Rosa de Oliveira, com o
samba “Chica da Silva”, de 1963, transformou-me em Salgueirense.
Num clima de confraternização,
encerrou-se mais um Rádio Memória.
(*) Moreira
da Silva foi um cantor. O sapato sob medida do Sergio Fortes era do Moreira.
(**) O
Dieckmann ficou uma arara com essa afirmação. Disse que até processaria o
redator, o jornal e este modesto Distribuidor, por divulgarmos notícias sem
verificação. A versão da irada ex-Autoridade Marítima é que o Sergio Fortes o
convocou para a gravação às 13 horas e que ele chegou no estúdio 20 minutos
antes, como lhe é peculiar comparecer antes de hora marcada, quando ainda estava rolando o Al Di La.
(***) Nessa,
não deu para segurar o Dieckmann, vai dar processo de difamação.
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