Total de visualizações de página

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

2950 - Amante do prefeito


-----------------------------------------------------------

O BISCOITO MOLHADO

Edição 5200                                       Data:  01 de outubro  de 2015

-----------------------------------------------------------

 

210ª CONVERSA COM OS TAXISTAS

 

O taxista desse dia era o Bob Esponja.

-Hoje, subindo a Vlaminck, rumo ao trabalho, passa por mim um táxi, para na esquina dessa rua com a Van Gogh e dele salta uma cracuda.

-Você viu se era da cooperativa?... O número?... – perguntou-me num vórtice de curiosidade.

-A minha preocupação com assaltantes é tamanha, no meu caminho até a estação do metrô de Del Castilho, que fico alheio aos detalhes, como nome da cooperativa e número, garanto, apenas, que era um táxi.

-Há colegas, aqui da cooperativa, que pegam essas cracudas que vagam pela madrugada.

-Você me disse isso uns dois anos atrás.

-Continuam pegando. - falou com um sorriso mordaz.

-Ela, então, desceu a pé os 200 metros, mais ou menos, da Van Gogh ao mesmo tempo do que eu numa sincronia constrangedora.

-Grudou em você, toda a descida da rua, pedindo dinheiro?

-O meu temor foi esse, por isso, guardei uma distância segura; ela, numa calçada e eu na outra. Na verdade, ela caminhava pelo meio da rua e eu não podia andar sempre pela calçada, porque são muitas as armadilhas para nos derrubarem, muitas as rachaduras.

-Se a cracuda não lhe pediu dinheiro, é sinal que tinha o suficiente para a pedrinha. Aquele taxista não deve ter sido o primeiro, porque os caras são sovinas.

-Como era descarnada... com pouca carne.

-Pode falar difícil, amigo, estudei Ciências Contábeis na faculdade.

-Desculpe-me. Creio que, mesmo envelhecida pela miséria e o vício, ela não chegava aos 18 anos de idade. Como estava imunda!

-Se você pega uma dessas meninas e coloca numa banheira de água limpa, em dez minutos, vira um lamaçal. - exagerou.

-Uma pena. - lastimei.

-Modigliani. - anunciou.

 

No dia subsequente, peguei o táxi do Paizão. Antes de me entender com o cinto de segurança, puxei conversa.

-O que senhor acha de ter o Eduardo Paes como colega de profissão?

-Isso que ele está fazendo, de passar por taxista e pegar pessoas na rua, o Gugu já fazia. - reportou-se ao animador de televisão.

-Sim, mas o Gugu atuava para um quadro do programa dele, enquanto o Eduardo Paes está em plena campanha à presidência da República pelo PMDB.

-Você acha que aquelas raposas do PMDB vão deixar um político jovem se candidatar a presidente da República?... Porque ele é jovem, deve ter uns quarenta e poucos anos.

-Não há uma raposa velha do PMDB que não tenha um esqueleto no armário, que não tenha um malfeito no seu currículo. Muitos deles, na realidade, têm folha corrida.

-O Eduardo Paes, não?

-Contra ele, o que se sabe, até agora, são pecados que o eleitor engole.

-Eleitor brasileiro tem estômago de avestruz; engole tudo.

-Acredito que a bandalheira dos políticos foi tamanha, nesses últimos anos, que o eleitor, de um modo geral, se enjoou dos corruptos cascudos.

-O Eduardo Paes não é um deles? - mostrou-se cético com a moral do nosso alcaide.

-Lembra-se das construções dos estádios da Copa do Mundo? Houve superfaturamento em quase todos eles; até o preço da grama do Estádio Mané Garrincha, em Brasília, foi superfaturado.

-Lá em Brasília, está o covil. - interveio.

-Compare, agora, as obras da Copa do Mundo com as Olimpíadas de 2016? Não houve, até o momento, nenhuma denúncia de falcatrua.

-Até o momento... insistiu na sua desilusão com a honestidade dos políticos.

-Até o fim das obras, provavelmente, porque o Eduardo Paes não quer dar munição aos seus opositores quando alçar voo para cargos mais elevados.

-Não vou negar que a zona portuária está ficando bonita, a duplicação do elevado do Joá, também.

-A Fernanda Torres, filha da Fernanda Montenegro, escreveu uma crônica, na Veja, em que se disse maravilhada com a Praça Mauá e escreveu, no parágrafo final, que o Eduardo Paes iria deixar saudades. Na semana seguinte, uma leitora, depois de elogiar os textos da Fernanda Torres, a criticou por não comentar a situação dos hospitais do município, que estão largados.

-As escolas também... as professoras ganham uma merreca.

-Sei disso; as minhas sobrinhas são professoras do município e descem a ripa no Eduardo Paes sempre que eu falo dele.

Riu com minhas palavras, e prossegui:

-O Joãozinho Trinta acertou em cheio quando disse que povo gosta é de luxo. Numa campanha eleitoral, com as obras de embelezamento do Rio de Janeiro, o eleitor vai se esquecer do mau atendimento hospitalar, do ensino municipal precário, como a Fernanda Torres esqueceu, e vai votar nele.

-Ele quer fazer pelo Rio o que o Carlos Lacerda fez. - observou e eu logo discordei.

-O Eduardo Paes está a anos-luz do Carlos Lacerda, que criou milhares de escolas, hospitais...

-O Hospital Salgado Filho foi inaugurado por ele. - lembrou.

-Sei, antes, minha mãe me carregava para o SAMDU, mas quando o prato de leite do gato se espatifou sob os meus pés, ela me levou para o Salgado Filho. Foi em 1963, recordo-me porque estava no 3º ano ginasial do Visconde de Cairu.

-Então, o hospital estava estalando de novo.

Na Rua Modigliani, despedi-me dele com um até amanhã.

Mas o táxi que peguei, no dia seguinte, foi, novamente, o do Bob Esponja.

-Hoje, é o dia da sua pelada? – perguntei após uma longa pausa.

-Não; o dia é quarta-feira. A pelada, amigo, é um pretexto para a cerveja que vem depois.

-Correm atrás da bola e ficam com mais sede.

-Eu sei que a cerveja não é o hidratante ideal, mas não quero nem saber.

-Você ainda tem o problema da diabetes.

-Evito os refrigerantes e já está de bom tamanho. Um conhecido meu, com diabetes tipo 1, bebia um litro de Coca-Cola, ficou cego. Não viveu muito.

-Um contínuo do meu trabalho, lá pelos anos 80, dizia que essa doença, a começar pelo nome, tinha parte com o diabo.

-O 081 perdeu um dedo do pé devido a diabetes.

-Ele tem uns 80 anos, cheio de garoupas no bolso, mais de 20 imóveis, diabetes (acentuou bem) e ainda trabalha!... Só para atrapalhar a nossa vida, pois não precisa.

-Garoupas?- estranhei.

-Os peixes das notas de 100 reais.- esclareceu.

-O 081 me disse que tem se cuidado; caminha trinta minutos quase todos os dias. Na última corrida, no táxi dele, disse-me que até a mulher tem caminhado.

-Qual delas: a oficial ou oficiosa? - maldou.

-Parece que a oficial.

-Não dá conta de uma, quer ter duas. - expressou sua intolerância com o 081.

-A amante é jovem?

-Nada. Ele é esperto, sabe que uma amante nova suga mais dinheiro.

-É verdade.

-Modigliani. – anunciou.

-Modigliani. - informou.    

Nenhum comentário:

Postar um comentário