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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5200 Data: 01 de outubro de
2015
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210ª CONVERSA COM OS TAXISTAS
O taxista desse dia era o Bob Esponja.
-Hoje, subindo a Vlaminck, rumo ao trabalho, passa por
mim um táxi, para na esquina dessa rua com a Van Gogh e dele salta uma cracuda.
-Você viu se era da cooperativa?... O número?... –
perguntou-me num vórtice de curiosidade.
-A minha preocupação com assaltantes é tamanha, no meu
caminho até a estação do metrô de Del Castilho, que fico alheio aos detalhes,
como nome da cooperativa e número, garanto, apenas, que era um táxi.
-Há colegas, aqui da cooperativa, que pegam essas
cracudas que vagam pela madrugada.
-Você me disse isso uns dois anos atrás.
-Continuam pegando. - falou com um sorriso mordaz.
-Ela, então, desceu a pé os 200 metros, mais ou menos,
da Van Gogh ao mesmo tempo do que eu numa sincronia constrangedora.
-Grudou em você, toda a descida da rua, pedindo
dinheiro?
-O meu temor foi esse, por isso, guardei uma distância
segura; ela, numa calçada e eu na outra. Na verdade, ela caminhava pelo meio da
rua e eu não podia andar sempre pela calçada, porque são muitas as armadilhas
para nos derrubarem, muitas as rachaduras.
-Se a cracuda não lhe pediu dinheiro, é sinal que tinha
o suficiente para a pedrinha. Aquele taxista não deve ter sido o primeiro,
porque os caras são sovinas.
-Como era descarnada... com pouca carne.
-Pode falar difícil, amigo, estudei Ciências Contábeis
na faculdade.
-Desculpe-me. Creio que, mesmo envelhecida pela
miséria e o vício, ela não chegava aos 18 anos de idade. Como estava imunda!
-Se você pega uma dessas meninas e coloca numa
banheira de água limpa, em dez minutos, vira um lamaçal. - exagerou.
-Uma pena. - lastimei.
-Modigliani. - anunciou.
No dia subsequente, peguei o táxi do Paizão. Antes de
me entender com o cinto de segurança, puxei conversa.
-O que senhor acha de ter o Eduardo Paes como colega
de profissão?
-Isso que ele está fazendo, de passar por taxista e
pegar pessoas na rua, o Gugu já fazia. - reportou-se ao animador de televisão.
-Sim, mas o Gugu atuava para um quadro do programa
dele, enquanto o Eduardo Paes está em plena campanha à presidência da República
pelo PMDB.
-Você acha que aquelas raposas do PMDB vão deixar um
político jovem se candidatar a presidente da República?... Porque ele é jovem,
deve ter uns quarenta e poucos anos.
-Não há uma raposa velha do PMDB que não tenha um
esqueleto no armário, que não tenha um malfeito no seu currículo. Muitos deles,
na realidade, têm folha corrida.
-O Eduardo Paes, não?
-Contra ele, o que se sabe, até agora, são pecados que
o eleitor engole.
-Eleitor brasileiro tem estômago de avestruz; engole
tudo.
-Acredito que a bandalheira dos políticos foi tamanha,
nesses últimos anos, que o eleitor, de um modo geral, se enjoou dos corruptos
cascudos.
-O Eduardo Paes não é um deles? - mostrou-se cético
com a moral do nosso alcaide.
-Lembra-se das construções dos estádios da Copa do
Mundo? Houve superfaturamento em quase todos eles; até o preço da grama do
Estádio Mané Garrincha, em Brasília, foi superfaturado.
-Lá em Brasília, está o covil. - interveio.
-Compare, agora, as obras da Copa do Mundo com as
Olimpíadas de 2016? Não houve, até o momento, nenhuma denúncia de falcatrua.
-Até o momento... insistiu na sua desilusão com a
honestidade dos políticos.
-Até o fim das obras, provavelmente, porque o Eduardo
Paes não quer dar munição aos seus opositores quando alçar voo para cargos mais
elevados.
-Não vou negar que a zona portuária está ficando bonita,
a duplicação do elevado do Joá, também.
-A Fernanda Torres, filha da Fernanda Montenegro,
escreveu uma crônica, na Veja, em que se disse maravilhada com a Praça Mauá e
escreveu, no parágrafo final, que o Eduardo Paes iria deixar saudades. Na
semana seguinte, uma leitora, depois de elogiar os textos da Fernanda Torres, a
criticou por não comentar a situação dos hospitais do município, que estão
largados.
-As escolas também... as professoras ganham uma
merreca.
-Sei disso; as minhas sobrinhas são professoras do
município e descem a ripa no Eduardo Paes sempre que eu falo dele.
Riu com minhas palavras, e prossegui:
-O Joãozinho Trinta acertou em cheio quando disse que
povo gosta é de luxo. Numa campanha eleitoral, com as obras de embelezamento do
Rio de Janeiro, o eleitor vai se esquecer do mau atendimento hospitalar, do
ensino municipal precário, como a Fernanda Torres esqueceu, e vai votar nele.
-Ele quer fazer pelo Rio o que o Carlos Lacerda fez. -
observou e eu logo discordei.
-O Eduardo Paes está a anos-luz do Carlos Lacerda, que
criou milhares de escolas, hospitais...
-O Hospital Salgado Filho foi inaugurado por ele. -
lembrou.
-Sei, antes, minha mãe me carregava para o SAMDU, mas
quando o prato de leite do gato se espatifou sob os meus pés, ela me levou para
o Salgado Filho. Foi em 1963, recordo-me porque estava no 3º ano ginasial do
Visconde de Cairu.
-Então, o hospital estava estalando de novo.
Na Rua Modigliani, despedi-me dele com um até amanhã.
Mas o táxi que peguei, no dia seguinte, foi, novamente,
o do Bob Esponja.
-Hoje, é o dia da sua pelada? – perguntei após uma
longa pausa.
-Não; o dia é quarta-feira. A pelada, amigo, é um
pretexto para a cerveja que vem depois.
-Correm atrás da bola e ficam com mais sede.
-Eu sei que a cerveja não é o hidratante ideal, mas
não quero nem saber.
-Você ainda tem o problema da diabetes.
-Evito os refrigerantes e já está de bom tamanho. Um
conhecido meu, com diabetes tipo 1, bebia um litro de Coca-Cola, ficou cego.
Não viveu muito.
-Um contínuo do meu trabalho, lá pelos anos 80, dizia
que essa doença, a começar pelo nome, tinha parte com o diabo.
-O 081 perdeu um dedo do pé devido a diabetes.
-Ele tem uns 80 anos, cheio de garoupas no bolso, mais
de 20 imóveis, diabetes (acentuou bem) e ainda trabalha!... Só para atrapalhar
a nossa vida, pois não precisa.
-Garoupas?- estranhei.
-Os peixes das notas de 100 reais.- esclareceu.
-O 081 me disse que tem se cuidado; caminha trinta
minutos quase todos os dias. Na última corrida, no táxi dele, disse-me que até
a mulher tem caminhado.
-Qual delas: a oficial ou oficiosa? - maldou.
-Parece que a oficial.
-Não dá conta de uma, quer ter duas. - expressou sua
intolerância com o 081.
-A amante é jovem?
-Nada. Ele é esperto, sabe que uma amante nova suga
mais dinheiro.
-É verdade.
-Modigliani. – anunciou.
-Modigliani. - informou.
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