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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4993 Data: 26 de novembro de 2014
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COUTINHO, SEM PELÉ, NO RÁDIO MEMÓRIA
2ª PARTE
Com a ausência do Sérgio Fortes, lá
estava o Simon Khoury, mas com a presença dele, também estaria. O apresentador
do “Noturno”, da extinta Rádio Jornal do Brasil, não se prende a essas
formalidades.
Jonas Vieira trouxe, como convidado,
uma personalidade que tem de ser mais conhecida, como vimos no desenrolar no
programa: Jorge Coutinho. Este lembrou, primeiramente, o que o trio que lá estava
fizeram na Roquette Pinto, levando a emissora ao terceiro lugar em audiência.
Foi interrompido por uma reminiscência
do Simon Khoury:
-Eu e o Jorge Coutinho nos aventuramos
a trabalhar na peça “Os Rapazes da Banda”; eram oito viados. Logo no primeiro
ensaio, gritaram “Fora”para nós e nos aconselharam um curso na Socila para
aprendermos a ser viados.
-Você aprendeu rápido. - disse-lhe o
Jonas Vieira.
-Nós tínhamos de imitar o Jonas. -
devolveu o Simon Khoury.
A peça, que era estrangeira, seria
proibida no Brasil.
-Oito viados, hoje, seriam a glória. -
contextualizou o Jonas Vieira.
Depois, o titular do programa informou
que o seu convidado é presidente do Sindicato dos Artistas.
-Já estou no terceiro mandato.
-É um agitador, no bom sentido,
cultural. No teatro Opinião, o Jorge
Coutinho comandou um programa de grande repercussão. - assinalou o Jonas
Vieira.
-Foram mais de onze anos no Teatro Opinião.
- suspirou saudoso.
Citou dois ou três companheiros que
saíam da UNE para o Teatro Opinião e prosseguiu:
-Nós demos uma guinada, unimos a zona
norte, os compositores populares, com a zona sul. Quando escuto a Maria
Betânia, eu me pergunto: Quem diria que ela surgiu no Teatro Opinião. Ela
cantava “Carcará”, do João do Vale, e eu lhe aconselhava a colocar um lápis na
boca para que a sua dicção fosse perfeita.
Neste momento do depoimento do Jorge
Coutinho, ocorreu-me que eu guardava rolhas de garrafas de vinho para a minha
sobrinha que, trabalhando como fonoaudióloga, pedia que seus pacientes falassem
com elas entre os dentes. Demóstenes, que era gago, se tornou o maior orador
grego treinando com pedras na boca. Mas isso é outra história. Maria Betânia
colocava dois erres nas palavras com um só e punha quatro nas que tinham dois.
-Quem diria que o Cartola foi muito
mais gravado no Teatro Opinião. O Zé Keti, que deu nome ao teatro...
E Jorge Coutinho, entusiasmado, pôs-se
a trautear: “Podem me prender/ podem me bater/ que eu não mudo de opinião...”
Listou mais artistas:
-João do Vale, Nélson Cavaquinho,
Ademilde Fonseca... tanta gente boa.
-Foi lá que eu ouvi, pela primeira vez,
o Lupicínio Rodrigues. - interveio o Jonas Vieira.
-Ele vem ao Rio com o patrocínio da
Última Hora. Não tínhamos dinheiro para bancar a passagem dele.
-Justamente, e eu fui fazer a matéria
sobre o Lupicínio Rodrigues para a Última Hora. Eu era repórter da Última Hora.
Jonas Vieira se entusiasmou com as
recordações.
-Eu fui o primeiro a entrevistar a
Maria Betânia; ela chegou para substituir a Nara Leão.
-A Nara ficou dodói, entraram a Odete
Lara, a filha do Vinícius de Moraes, e não dava certo... Há um retrato meu com
a Nara Leão no corredor da Roquette Pinto que estou louco para achar.
Da suavidade vocal da musa da Bossa
Nova, Jorge Coutinho voltou ao que chamou de vozeirão da Maria Betânia.
Como a memória do Jonas Vieira estava
bem afiada, interrompeu seu convidado.
-Era uma tarde de quinta-feira, chovia à
beça, quando eu entrevistei pela primeira vez a Maria Betânia.
-Faria hoje? - o tom do Simon Khoury
era de quem estava sisudo.
-Hoje, ela é inalcançável. - disse o
Jonas.
Ainda bem – pensamos nós do Biscoito
Molhado. A sisudez do Simon Khoury persistia.
-Ela não tem nada para dizer.
A palavra retornou ao convidado do
programa:
-Eles ficam famosos e esquecem. Jorge
Aragão, ao contrário, num programa de televisão, falou de mim. Eu nem me
lembrava mais que fiz shows com ele no Teatro Rival. O Zeca Pagodinho também
reconhece a gente. Ele aparecia de bermuda, canela fina, com um copo de cerveja,
ao meio-dia, para um show que começava ao meio-dia. Mas há artistas, por
exemplo, que dizem não conhecer o Simon Khoury e cansaram de pedir especiais a
ele para serem entrevistados.
De novo o Simon Khoury:
-Suely Franco, Toni Ramos, Fernanda
Montenegro... grandes artistas que são palpáveis, que falam com você. Eu não
tenho a menor vontade de entrevistar essa senhora que tem de botar um lápis na
boca...
-A Betânia chegou muito dura, ele veio
direto da Bahia para cá. São coisas da vida. Foi no Teatro Opinião que muitas
coisas boas aconteceram:. Candeia, Clarinha Nunes, Leci Brandão. Eu tenho
orgulho disso.
Foram momentos que o agitador cultural
não podia deixar cair no esquecimento:
-Virou um filme e eu, que era sempre
contra os Estados Unidos, fui a um festival em Nova York e fiquei fã dos
Estados Unidos, quero voltar sempre. Passaram lá o filme, foi uma coisa
fantástica. Muita gente fazia pergunta, queria saber o que era aquilo.
-Os americanos são extraordinários
neste sentido, querem saber de tudo.- aflorou a admiração do Jonas Vieira pelo
grande país do norte.
-Jorginho, vamos ouvir um pouco de
música? - propôs.
Simon Khoury tinha sido escalado como
discotecário, o seu ponto forte.
-Eu trouxe uma gravação de 1963, do
Henry Mancini, de um fox de Duke Ellington.
Ao pronunciar o nome do fox, Simon
Khoury arrancou gargalhadas.
-Isso é japonês. - zombou o Jonas Vieira do inglês macarrônico
do discotecário.
Reinou, por minutos, absoluta, a
música.
-”C Jam Blues” - identificou o Jonas
Vieira o nome da composição e prosseguiu:
-Quando ouvi, pela primeira vez, Duke
Ellington, fiquei deslumbrado; o mesmo aconteceu quando ouvi Beethoven. Ele
sempre foi meu ídolo. Simon Khoury, você está de parabéns.
-Eu e o Jorge Coutinho.
Voltou-se
para o seu convidado:
-Jorge Coutinho, como vai o sindicado?
-Está bem; nosso secretário é o Mílton
Gonçalves. A sede é nossa, conseguimos pagar por ela. É bom a garotada se
sindicalizar, o telefone é 2220 8147. O sindicato fica na Alcino Guanabara, em
cima do Teatro Dulcina, 18º andar, a partir das 11h. Temos dentistas,
fonoaudiólogos, clínica geral, Ruth Cardoso é a nossa diretora; há muita gente
boa.
E arrematou:
-Eu tenho responsabilidade com os 76%
dos votos que recebi.
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