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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4344 Data: 07 de janeiro
de 2014
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O PRIMEIRO DO ANO
Com tantos Rádio
Amnésia, nada como o Rádio Memória.
Foi o primeiro
“muitíssimo bom-dia” do ano 2014.
-Jonas faltam 360 dias
para o encerramento do ano. - deu o Sérgio Fortes a essas palavras a mesma
entonação do último programa de 2013, quando lembrou que faltavam 9 dias para o
seu término e, assim, obteve um efeito hilariante.
No papel de homem-calendário,
ele anunciou os santos do dia 5 de janeiro que, por serem muitos, não
listaremos aqui, com exceção de São Telésforo, que ensejou uma piada com
fósforo a longa distância. Que os jesuítas do Santo Inácio não tenham ouvido o
seu ex-aluno.
Sérgio não teve,
certamente, tempo para dedicar-se à sua pesquisa, pois não deixaria passar que,
no dia 5 de janeiro de 1988, o dono do maior bigode do mundo, 2 metros e 35
centímetros, foi decapitado no estado do Rajastão, na Índia, onde ocorre uma
acirrada disputa pelo posto. Ficaria mais à mão, julgamos nós, que ele fosse
enforcado no próprio bigode.
Quem ouviu já sabe, mas
quem prolongou o sono no primeiro domingo do ano, não sabe: Jonas Vieira estava
abrasileirado, e Sérgio Fortes mais americanizado do que Carmem Miranda.
Isso posto, Jonas
Vieira anunciou a música a ser tocada.
“Pelo Telefone”, do
Donga e Mauro de Almeida, lançado em 20 de janeiro de 1917.
-Falam que é o primeiro
samba, mas há muito maxixe nele. O samba com batuque vem do Estácio com Ismael
Silva. - sublinhou o Jonas Vieira.
E teceu elogios ao
intérprete, Almirante, a maior patente do rádio, além de aludir à irreverência
carioca que transformou o chefe da folia em chefe da polícia que avisa que na
Carioca há uma roleta para se jogar. E poderia
falar ainda nas rimas ricas como questione/telefone, rapaz/trás.
A sonoridade da voz do
Almirante, que torna audíveis todas as sílabas de todas as palavras cantadas,
impressionou o Sérgio Fortes que disse ser ele o Pavarotti da MPB.
E pensar que testemunhamos,
como espectador de televisão, nos anos 70, o sensacionalista apresentador
Flávio Cavalcanti desrespeitá-lo, o que levou o Almirante a agarrar o microfone
e não soltá-lo, obrigando a interrupção daquele programa que mais parecia um
circo dos horrores filmado por Fellini em “Ginger e Roger”.
Em seguida, Sérgio
Fortes conduziu, musicalmente falando, o Rádio Memória para a Broadway, através
da canção “I'm Old Fashioned”, de Jerome Kern, com letra de Johnny Mercer, do
musical “You Were Never Lovelier”, ano 1942. Transformado em filme, recebeu o
nome de “Bonita como Nunca”. A bonita era Rita Hayworth e o seu par foi aquele
que tinha todos os ritmos nos pés: Fred Astaire.
Para cantar “I'm Old
Fashionad”, Sérgio Fortes anunciou a bela soprano neozelandesa Kiri Te Kanawa:
-Dizem que ela é a
minha queridinha.
Sejamos mais
específicos: minha mãe disse isso desde o tempo de “As Melhores Vozes do
Mundo”, quando ele demonstrava nítida preferência pela Kiri Te Kanawa em
detrimento da Mirella Freni, ídolo da minha genitora.
Com Jonas Vieira, a
música popular brasileira retornou, agora, na voz inconfundível do Martinho da
Vila em “Batuque na Cozinha”, composto por João da Baiana em 1917 e só gravado
em 1968.
-Passei a gostar menos
do Martinho da Vila quando ele se avermelhou. - observação que provocou risos
do Sérgio Fortes.
Martinho da Vila, a
nosso ver, tinha uma atenuante: os esquerdistas festivos formavam um lucrativo
mercado consumidor, e ele fez, de maneira tênue, o que muitos já faziam:
transformar a ideologia em investimento.
Tango. Sérgio Fortes é
fiel a esse gênero musical (piadas de argentinos à parte) desde o já citado “As
Melhores Vozes do Mundo”, e pediu que tocassem “Don Augustin Bardi”, de Horácio
Salgan que, assim, homenageou o seu paradigma, compositor que viveu de 1884 a
1941. Os intérpretes da gravação
solicitada formavam um trio fantástico: Daniel Barenboim, no piano, Rodolfo
Mederos, no bandoneón e Hector Console, no contrabaixo.
Luzer, violinista da
OSB, informou ao Sérgio Fortes - disse- que Rodolfo Mederos já tocara com a
citada orquestra.
Jonas Vieira pediu “Se
Você Jurar” e “Pra me Livrar do Mal”, de Ismael Silva, Depois de “Pelo
Telefone”, considerando a primeira gravação, de Donga, um maxixe sob o disfarce
de samba, veio o autêntico gênero musical com Ismael Silva. Duas ótimas
pedidas.
Jonas Vieira, apesar de abrasileirado, não
esquece o pragmatismo dos americanos; e exaltou a liberação da maconha no
estado do Colorado, o que neutraliza os traficantes além de render impostos
para o governo. Reportou-se à Lei Seca que, ao ser derrubada por Franklin
Delano Roosevelt, golpeou duramente a máfia que traficava com bebida alcoólica.
Sérgio Fortes, com uma entonação galhofeira na voz, citou a liberação da
maconha no Uruguai de José Mujica.
Bem, o presidente José
Mujica, comparecendo a solenidades roto e maltrapilho, com sapatos precisando
de meia sola, desrespeita a liturgia do cargo que ocupa. Dá a impressão que
vive com um baseado nas ideias.
Sobre os malefícios da
maconha como droga estupefaciente, eles preferiram não opinar, deixando a cargo
do doutor Borer e do Luzer, que também é médico, esclarecerem o assunto
posteriormente.
Luzer, além dos
conhecimentos de medicina, é músico, priva do mundo das partituras. Louis
Armstrong transportava numa pastinha a sua “marijuana”, e, certa vez, Richard
Nixon, encontrando-o num aeroporto, fez questão de carregá-la, sem saber, é
evidente, o que havia lá dentro. Dizem que “Muggles”, gravação de Louis
Armstrong, aludia à “marijuana”.
Voltemos às músicas do
Rádio Memória.
Depois da queridinha,
veio a pestinha do Sérgio Fortes, Kathleen Battle. Ele não consegue falar dela
sem se referir à sua antipatia. A música a ser interpretada era “Melodia
Sentimental”, de Villa Lobos, com letra da embaixatriz Dora Vasconcelos.
-Villa Lobos inserira
esse tema na “Floresta Amazônica”, escrito para o filme da Metro Goldwin Mayer,
“Green Mansions”. Não gostou do que viu na tela e separou essa peça a ser
cantada por um soprano, na época, Bidu Saião.
E registrou o Sérgio
Fortes que o filme, de 1959, foi
dirigido por Mel Ferrer, estrelando a sua esposa Audrey Hepburn com Anthony Perkins.
E a “Melodia
Sentimental” calou todo o mundo enquanto foi tocada.
-Que voz! É
impressionante a voz dela! - Jonas Vieira ficou tão encantado que, por pouco, a
pestinha do Sérgio Fortes não se transformou na queridinha do Jonas Vieira.
Não foi nesse momento,
em que o Rádio Memória contornava a curva de chegada e entrava na reta final
(não, isso não é um introito para se ouvir “Por Una Cabeza”, de Gardel) e sim
minutos depois de iniciado o programa, que veio a fala inusitada. Jonas Vieira
lançou uma informação reticente, era algo que os assustava no estúdio.
-”Apertem o cinto, o
piloto sumiu.” (*)
Não houve um único
ouvinte, desperto às 8h 15 min, que não tenha indagado: “Quem é esse piloto?”
No que nos diz
respeito, imaginamos que o Peter, o operador de som, fosse esse piloto
presuntivo, mas como ele, pouco depois, foi citado de maneira descontraída,
ficou claro que não era ele. Como a dupla não esclareceu nada, fica isso como o
primeiro enigma de 2014 do Rádio Memória.
Mas voltemos à música,
o mote do programa.
Jonas Vieira continuou
com os brasileiros, Geraldo Pereira, autor de “Cabritada Mal Sucedida” em que
todos foram presos, inclusive o cabrito; e Sérgio Fortes continuou com os
americanos, no caso, Louis Armstrong, com “High Society Calipso”, de Cole
Porter.
-Música do filme de
1956, o último da Grace Kelly antes de se tornar princesa, e mais Bing Crosby e
Frank Sinatra. - assinalou.
Jonas Vieira pediu o
primeiro sucesso de carnaval do Orlando Silva, 1938, “Abre a Janela”, de
Marques Júnior, e Sérgio Fortes escolheu “Stomping at the Savoy” com a
orquestra de Benny Goodman. Música de Edgard Sampson, que tocou sax alto na Orquestra
de Chick Webb, de 1934.
O demorado abraço do
Jonas Vieira encerrou o primeiro Rádio Memória de 2014.
(*)
Certamente o redator do seu O BISCOITO MOLHADO sucumbiu ao cansaço matutino,
talvez da noitada do sábado – quem sabe? e não prestou a devida atenção.
Felizmente, para o nosso leitor, este Distribuidor estava sintonizado nesse
momento em que os apresentadores do programa lembravam desmandos do atual
Governo do Brasil, culminado com a observação do piloto que sumiu, no caso, a
Presidenta. Não, portanto, nenhum mistério, a não ser se foi uma mosca tsé-tsé
a picar o farináceo redator. Ou terá sido um besouro?
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