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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4341 Data: 03 de
janeiro de 2014
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EU E ELIO NA DERROCADA DE
WALL STREET
-Elio, onde estamos?
-Não vê pelas luzes
feéricas, pela movimentação frenética das pessoas, que estamos em Nova York.
-Sem o Empire States
Building, eu não reconheço Nova York. - reagi.
-Vivemos os “Loucos
Anos 20”. - deslumbrou-se.
E propôs em seguida:
-Vamos tomar um trago
para nos refazemos dessa viagem pelo tempo.
-Está maluco, Elio?...
ainda vigora a Lei Seca.
-Ora, Carlos, vamos
procurar um desses mafiosos que víamos, na televisão, na série “Os Intocáveis”,
e conseguiremos três garrafas de uísque, pelo menos.
-Nada de Al Capone, de
Lucky Luciano... Não quero saber de bandido barra pesada. Além disso, três
garrafas é muito, eu não bebo mais do que uma dose e, ainda assim, com um
iceberg no copo.
-Três garrafas de uísque talvez não sejam
suficientes.
E arrematou:
-Quem sabe se o Sérgio
Cabral não aparece por aqui.
-Da máfia, só quero
conversa com o Frank Sinatra.
-Ele deve ser ainda um
garoto. Basta fazer os cálculos: ele nasceu em 1915, estamos nos anos 20...
-Então, o George Raft.
- parti para a segunda opção, cortando o que ele falava.
Subitamente, um
vórtice nos tragou e fomos cuspidos em outra cidade.
-Olhe, Carlos, o Mount
Lee.
-Estou lendo
HOLLYWOOD. - disse-lhe.
-Você sabia que cada
letra dessa palavra mágica tem 9,1 metros de largura e 14 metros de altura com
4 mil lâmpadas espalhadas entre elas?
-Não vai me dizer,
Elio, que você aprendeu isso com Dona Sarita? A sua mãe, pelo que sei, é
professora de História.
-Aprendi com o locutor
José Maurício. Você sabia?... Eu tinha de sintonizar a Rádio Relógio para não
chegar atrasado ao Colégio Militar, se não, eu levaria umas chineladas da minha
mãe.
Enquanto ele falava,
peguei um jornal e constatei que apenas mudamos de lugar; continuávamos nos
anos 20.
-Carlos, já que
estamos na terra do cinema, aproveitemos. O que vamos fazer?
-Assistir às filmagens
de “Êxtase”, quero ver nua a Afrodite personificada na Hedy Lamarr. - foi a
primeira ideia que me ocorreu.
-Carlos, Hedy Lamarr
ainda está na Áustria, onde é chamada de Hedwig Eva Maria Kiesler.
-Já sei, só depois da
ascensão de Hitler, ela abandonou o marido estúpido, fugiu da Europa e veio
para cá, quando recebeu o pseudônimo de Hedy Lamarr.- manifestei-me,
irritadiço, porque o Elio me trouxe à realidade, que, em Hollywood, não era tão
real assim.
-Veja, Carlos, a
mansão do Charles Chaplin. - apontou depois de caminharmos um bom pedaço de
chão.
-Ele, que foi um
menino de rua em Londres e por pouco não se transformou em pivete, nos verá com
comiseração.
-Parecemos tão
maltrapilhos assim, Carlos?... - espantou-se o Elio, que ainda mantinha a sua
camisa de seda pura.
Charles Chaplin e
Douglas Fairbanks jogavam tênis; eu e o Elio nos aproximamos dos dois e
oferecemos nossos serviços de boleiros.
-Vocês são bem
grandinhos, mas se forem rápidos como os garotos... - acatou a nossa oferta com
reservas o Charles Chaplin.
Douglas Fairbanks se
limitou a menear a cabeça afirmativamente, e nós passamos a pegar aquelas
malditas bolinhas.
-Elio, eles estão
muito longe do brilhantismo do Roger Federer.
-Fala, baixo, se não,
perdemos o emprego.
A chegada intempestiva
da Mary Pickford, esposa do Douglas Fairbanks, ordenando que o marido fosse
para casa, acabou com o jogo.
-É uma cadela. -
ciciou o Carlitos, quando só ficamos os três na quadra de tênis.
De repente, ele nos
assombrou com uma pergunta inesperada:
-O que vocês acham de
eu vender todas as minhas ações? Li um artigo que diz que os preços de Wall
Street já subiram demasiadamente.
-Vende tudo, Carlitos,
tudo. - aconselhei-o com uma sofreguidão que o levou a rir.
-Venderei ainda hoje.
E prosseguiu atento a
nós:
-Tomem esses dólares e
dois convites para uma festa na mansão de um dos meus vizinhos, ator de cinema,
naturalmente.
Mal o Elio se despediu
do artista mais popular da arte cinematográfica, não desgrudou os olhos do
convite.
-Carlos, é uma festa
daqui a um mês com todo o mundo nu.
-Então, estou fora.
-Não sei, Carlos... É
só pensar que estamos numa praia de nudismo.
-Por já ter pensado,
resolvi não ir.
-Olha, aquele ali não
é o pai do John Kennedy? - desviou-se a sua atenção.
-Ele tem uma amante em
Hollywood, a atriz Gloria Swanson. Veio encontrar-se com ela. - imaginei.
-Mas o encontro dele
agora é um engraxate. - assinalou.
Nós nos aproximamos
dos dois e chegamos a ouvir o engraxate falando das suas ações em Wall Street.
Enquanto o rapaz, com a roupa manchada de graxa se afastava, Joseph Kennedy
murmurou:
-Se até os engraxates
estão ganhando dinheiro com ações, é hora de eu vender tudo.
E a máquina do tempo
nos trouxe de volta a Nova York.
-Elio, o dia 24 de
outubro de 1929 se aproxima; temos de estar em Wall Street.
-A Quinta-Feira
Negra... - disse ele com a entonação macabra dos locutores de história de
terror. (*)
No caminho, Elio
observou o delírio de grandeza de que todos os americanos estavam possuídos.
-Carlos, é
inacreditável que, em pouco tempo, eles passarão de um extremo ao outro.
-Os juros estão muito
baixos; eles compram ações através de empréstimos bancários. Iludem-se com o
lucro obtido e se endividam ainda mais, e uma bolha é inflada cada vez mais.
Quando a bolha estourar, e os preços das ações despencarem, eles constataram
que devem muito mais do que possuem. Sem
receber dos devedores, os bancos quebrarão.
E fui adiante:
-Mas isso não será só
com as ações. As mercadorias não terão compradores, a superprodução agrícola
apodrecerá nas fazendas, pois a crise atingirá todo o mundo ocidental.
Já em Wall Street,
testemunhamos o pânico que tomava conta da multidão. Naquele clima assustador,
duas frases se sobressaíam: “Vendam tudo”, “Ninguém quer comprar”.
Um suicida se atirou
de um prédio e, por pouco, não atingiu o Elio.
-Cuidado, Carlos.
Era a minha vez de
correr para não ser esmagado por outro suicida.
-Vamos sair daqui.
-Claro. - acatei
rapidamente a ordem do Elio.
-Será que ainda dá
tempo de ir àquela festa de Hollywood? - perguntou-me já refeito do susto.
-Elio, todos de Hollywood
eram investidores da bolsa; a festa, com toda certeza, foi suspensa.
(*) A quebra
da Bolsa em Nova Iorque foi um processo, não ocorreu apenas em um dia.
Considera-se que o ciclo dessa quebra encerrou-se em 1954. Da wikipedia:
No dia 24 de outubro de 1929, que ficou
conhecida como Quinta-Feira Negra, ocorreu o crash (quebra) da bolsa de valores de New
York. Nesse dia, as bolsas perderam 11% do seu valor em negociações muito
fortes. Vários líderes banqueiros da Wall Street
se reuniram para encontrar uma solução para o pânico e caos no pregão.
O encontro
contou com Thomas Lamont, chefe interino do Morgan
Bank, Albert Wiggin, chefe do Chase National Bank e Charles E. Mitchell,
presidente do National City Bank of New York. Eles escolheram Richard Whitney,
vice-presidente da Bolsa, para agir em seu nome. Com os banqueiros e seus
recursos financeiros, Whitney colocou uma oferta de compra de um grande bloco
de ações na U.S. Steel a um preço bem acima do mercado e muitos
investidores de ações quiseram vender rapidamente suas ações. 6.091.870 títulos
financeiros foram rapidamente vendidos no mesmo dia, tornando-se o terceiro
maior volume de negócios da história da bolsa.
Essa quebra fez com que empresas e bancos
fossem a falência e o valor das bolsas caiu muito de um dia para o outro. Essa
quebra repercutiu na maior parte dos países
capitalistas. Muitas pessoas perderam o emprego, havia pânico entre
as pessoas, levando algumas ao suicídio, inclusive 11 especuladores da bolsa. O
desemprego
aumentou a produção industrial americana ficou reduzida a 54%. O mercado perdeu
mais de 30 bilhões de dólares em dois dias.9
O mercado continuou a cair, chegando a um
número negativo histórico em 13 de novembro de 1929, com 198,60. O mercado se
recuperou durante vários meses, atingindo um pico de fechamento secundário de
294,07 em 17 de abril de 1930, antes de embarcar em um outro pico negativo, no
entanto esse foi mais forte, quando o Dow fechou em 41,22, o mais baixo do século 20.
Não voltaria a se recuperar entre setembro de 1929 até novembro de 1954.
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