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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4064 Data: 15 de novembro de 2012
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SABADOIDO SEM
BARACK OBAMA
PARTE II
Cheguei à sessão do Sabadoido com o
intuito de falar da vitória do Barack Obama, mas a audiência estava atenta à
fala do Luca. Ele se reportava aos primeiros moradores da Rua Chaves Pinheiro.
Eu ainda pensei em citar o meu pai, que
nasceu em 1916, no Cachambi, mas não foi na Rua Chaves Pinheiro e sim, na Rua
Honório. Aliás, eu nunca entendi o porquê de ele nascer na mesma rua em que Luís Carlos
Prestes seria preso 23 anos depois, considerando que ele viveu a infância e a
juventude em dois bairros: Ilha do Governador e São Cristóvão.
Luca citou mais uns quatro nomes de
pioneiros até que interferi:
-O Seu Moura não foi um dos primeiros
moradores?
-Não, Carlinhos, esses que eu nomeei
vieram para a Chaves Pinheiro no tempo em que a casa do Seu Moura era o Tiro de
Guerra.
-Meu pai serviu no Tiro de Guerra. -
aproveitei o gancho.
Luca ainda escarafunchou a história da
rua, sem apartes da Gina e do Vagner, a não ser para se referirem aos moradores
citados que eles conheceram.
Adiante,
Luca falou das feições claras do meu sobrinho. Nesse momento, esqueci-me por
completo do Barack Obama.
-Os filhos da Jura (irmã da Gina) são
bem brancos, a menorzinha é loura.
-Luca, o Daniel nasceu louro, depois o
cabelo dele ficou acastanhado.
-Até uma determinada idade, a cor dos
cabelos e dos olhos podem mudar. - acrescentei essas palavras às do meu irmão.
-O meu pai era louro, o de vocês...
-Mais branco do que o Seu Amaury, Luca?
- interrompeu-o a Gina.
-Pois é, não tem uma fotografia dele
mais novo?
-Temos uma em que o papai servia o Tiro
de Guerra com o uniforme de soldado. - informei-lhe.
-Eu vi o documentário “Gonzaga, de Pai
pra Filho”, e está lá que o Gonzaguinha foi registrado como branco. - assinalou
meu irmão.
-As fotografias do Machado de Assis
jovem o mostram mulato, quase pardo, porém, quando mais velho, ele parece
branco. - intervim.
-Temos aí um caso reverso ao do
Gonzaguinha: nasceu preto e morreu branco.
-O filme é bom? - quis saber o Vagner e
os demais presentes (a Gina já dera a sua costumeira escapada da sessão).
-O filme é bom, mas eu ainda prefiro o
documentário feito sobre o Raul Seixas. - opinou o Claudio.
-Pode ser, mas no filme dos Gonzaga,
você vai ouvir melhor música. - afirmei.
-Carlinhos, num filme é baião, e, no
outro, rock. - retorquiu,
-Não é só baião, há os sambas urbanos do
Gonzaguinha, geralmente ótimos. -
contra-ataquei com serenidade, pois não pretendia debater isso.
Como o cinema foi trazido à baila, Luca
se reportou à Rosa, que citara filmes de detetive da década de 40, que até
anteciparam a série de fitas do 007.
-Luca, as primeiras histórias do James
Bond surgiram dos livros do Ian Fleming, que foram filmados.
-Mas esses filmes citados pela Rosa têm
até o Spencer Tracy como ator... Vocês têm uma memória boa para cinema.
Como ele não conseguiu se lembrar dos
nomes desses filmes, conformou-se em falar do último filme a que assistira na
televisão: “Crepúsculo dos Deuses”, de Billy Wilder.
-Grande filme! - enfatizou o Claudio.
-O Billy Wilder conta a história depois
de morto na piscina.
-Não interrompi o Luca para dizer que
Charles Chaplin, anos antes, fizera, em Monsieur Verdoux ,
a história ser narrada por um defunto, porque o Claudio se antecipara:
-O artista que faz o papel do mordomo
que alimenta os sonhos doidos da atriz decadente foi um grande diretor do
cinema.
-Erich von Stroheim. - identifiquei-o.
Luca sacou da maçaroca de papéis que
trouxera um recorte de jornal em que aparecia a Rita Lee, de costas para o
público, curvada, com as calças arriadas até os joelhos. Vagner e Claudio
olharam, um comentário depreciativo logo se segui, enquanto eu lamentava a
decadência da artista talentosa.
-A Rosa escreveu, abaixo da foto: “E
daí?...” - apontou o Luca.
E o julgamento do mensalão entrou
intempestivamente em cena.
-O vampiro brasileiro, o Lewandowski, é
uma lástima defendendo os interesses dos petistas. - bradou meu irmão.
-Até para dar a pena, ele prolonga o
voto com baboseiras. E a pena dele é sempre a mínima. - prosseguiu com a mesma
veemência.
-Houve um momento em que ele, depois de
citar uma pena, exasperá-la em tantos meses para atenuá-la, em seguida, em
outros tantos meses e chegar, depois de mais verborragia, à pena final, foi
aparteado pelo Joaquim Barbosa.
Tomei fôlego e prossegui:
-O relator do mensalão, então, disse:
“Vossa excelência foi abaixo da pena mínima e isso não pode.”
-E foi mesmo?- ficaram curiosos.
-Lewandowski, todo atrapalhado, revirou
a papelada que lera até constatar que não colocara a pena aquém da mínima. Eu
suspeito que o Joaquim Barbosa fez aquilo de propósito, para acentuar como o
ministro revisor é leniente com os réus, ricos, porque os pobres ele ferra como
o caso do sujeito que pescou doze camarões.
-Essas denúncias do Marcos Valério...
Ele está no desespero. - disse o Luca.
-Não resta a menor sombra de dúvida que
Marcos Valério é o maior arquivo vivo do país. Acredito que ele tenha deixado
quatro fitas gravadas para serem divulgadas em caso de ele ser morto.
-E é evidente que a “VEJA” tem essa
entrevista do Marcos Valério gravada. - seguiram-se às minhas as palavras do
meu irmão.
-A Carolina estava corrigindo provas,
quando me disse que mete a caneta mesmo. A minha filha não admite aprovar gente
que vai exercer a medicina sem conhecimento da matéria dela.
-É a nossa Joaquina Barbosa. - interveio
o Claudio com alegria.
-Ela corrigia as provas e ouvia músicas.
Quando tocou a marchinha “A, E, I, O, U, na cartilha das Juju”, eu disse que
era de Lamartine Babo.
-”Bem, aqui está escrito que é de Noel
Rosa.” - disse-me ela.
-Eu creio, também, que seja de Lamartine
Babo. - manifestei-me.
Meu irmão disse que a letra não estava à
altura da excelência dos versos de Noel Rosa e manteve seu parecer mesmo quando
lhe dissemos que se tratava de música de carnaval.
Gina reapareceu, e foi-lhe dada a
incumbência de encontrar no Google o nome do autor: Lamartine Babo ou Noel
Rosa.
A conversa descambou, então, para as
inaugurações. A primeira a ser citada foi a ponte Rio-Niterói.
-O primeiro pedágio foi pago por um
motociclista, que passou por todos os carros. - assegurou meu irmão.
-Noel Rosa é o autor. - informou a Gina.
Citei a inauguração do Colégio Jean
Mermoz, na Rua São Gabriel, em 1965, quando o Carlos Lacerda estava em campanha
para eleger como governador o Professor Flexa Ribeiro.
-Eu apareci no noticiário da televisão
sem camisa, com uma vara de pescar...
-Eu me lembro, Claudio, você ia pescar
rã. - manifestei-me.
-Há o filho do Flexa Ribeiro... disse o
Luca.
-Mas o candidato do Lacerda era, na
verdade, o Rafael de Almeida Magalhães, por imposição da Igreja, porque ele era
desquitado, ele teve de lançar mão do
seu Secretário de Educação.
Com o adiantado da hora, mais uma sessão
do Sabadoido se encerrou. Como faz costumeiramente, Luca deu carona a todos que
saíram.
Quando saltei do carro e me aproximei de
casa, veio-me à mente que eu não falara da eleição do Barack Obama
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