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sexta-feira, 5 de outubro de 2012

2235 - Brasil-Portugal!


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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4035                               Data: 26 de setembro de 2012
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CARTAS DOS LEITORES

-Como você reage quando escuta um pleonasmo? Dieckmann
BM- Quando eu estava com uns quinze anos de idade, costumava brincar de “Brasil-Portugal”. Se alguém da turma dissesse uma besteira, outro o denunciava com o brado “Brasil-Portugal” e todos os presentes estapeavam as costas do ignorante. Esta era basicamente a brincadeira.
Um dia, o Bacalhau (um garoto magrinho, o que explica o apelido), contando um caso com ele, disse que recuou para trás. Gritei “Brasil-Portugal”, esfreguei as mãos, mas os componentes da turma afirmaram que não houve erro, pois ele não dissera que recuou para frente. Irritado, dei por encerrada a minha participação naquela brincadeira.
Com dezesseis anos, li “O Monge de Cister”, de Alexandre Dumas, da coleção Saraiva, e me sentia incomodado quando me deparava com incontáveis pleonasmos do objeto direto e indireto: “Entregou-me a mim... Falou-lhe a ele...”
Fiz essa breve volta ao passado para tecer algumas considerações sobre o vídeo que recebi, semana retrasada, sobre um sujeito neurastênico com os pleonasmos que se fala e escreve no dia a dia. Vociferava, num palco de teatro, contra o que ouvia:  “Há vinte anos atrás... Elo de ligação... Subir para cima.” E o público gargalhava. Tratava-se de um humorismo que lembra de leve o do Chico Anísio quando contracenava, no papel de Pantaleão, com Pedro Bó. Não me refiro aqui à sua personalidade de mentiroso e sim ao seu curtíssimo pavio com as “sandices” ditas pelo Pedro Bó, pintado como o paradigma da imbecilidade?
-”É você, Pantaleão?”...
-Não, é o Roberto Carlos, Pedro Bó.
Os espectadores riam, mas a pergunta do Pedro Bó expressa, acima de tudo, a sua surpresa. A ignorância, nesse caso, é do personagem do Chico Anísio que, na sua intolerância, quer retirar a emotividade das palavras, a sua força. Assim ocorre, em alguns casos, com o neurastênico do vídeo que me remeteram, que investe contra todos os pleonasmos.
O que dizem os gramáticos sobre isso? Que o pleonasmo é uma figura de linguagem. Rocha Lima escreveu que: “Há o pleonasmo grosseiro, decorrente da ignorância da significação das palavras (hemorragia de sangue, subir para cima) e o literário, que serve à ênfase, ao vigor da expressão.” E exemplifica com um parágrafo do escritor de Grande Sertão Veredas:
-”Era véspera de Natal, as horas passavam, ele devia de querer estar ao lado de iá-Dijina, em sua casa deles dois, da outra banda, na Lapa-Lage.” (Guimarães Rosa).
Digamos, caro leitor,que você esteja trabalhando no computador, no escritório  e lá fora, a poucos metros,  acontece  uma festa; você, então, vai para esta festa. Se você escrever que estava no computador e saiu, eu vou pensar que você saiu do computador, mas se você escrever que estava no computador e saiu para fora, eu entenderei perfeitamente que você foi para a festa. Penso que “sair pra fora”, nesse contexto, não é um pleonasmo grosseiro.

 -Como aficionado da música de Dmitri Shostakovitch, venho reclamar da omissão a muitas passagens da vida do grande compositor russo por ocasião da visita que ele fez à casa do redator deste periódico. Causídico Verborrágico.
BM – Meu caro, Causídico, o eminente compositor partiu lá de casa antes da segunda garrafa de vodca, ou seja, não durou muito tempo a sua visita.
A sua filha Flora Litvinova, para contar uma das características da sua personalidade, narrou que seu pai não conseguia dizer não para ninguém. Devido a essa tibieza, assinou declarações oficiais, inclusive o repúdio ao dissidente Andrei Sakharov, em 1973, de que se arrependeu amargamente.
Muito significativa também era a apreciação ambígua por Igor Stravinsky, um dos maiores, senão o maior compositor do século XX. Dizia Shostakovitch: “Stravinsky, o compositor que eu idolatro. Stravinsky, o pensador que eu desprezo.”
Dmitri Shostakovitch, contam os seus biógrafos, era extremamente atraído pela Sinfonia dos Salmos. Quando Stravinsky, que vivia nos Estados Unidos, visitou a União Soviética, em 1962, Shostakovitch lhe ofereceu a sua versão para piano dessa obra, um preito da sua admiração. Esse encontro, no entanto, foi um malogro, segundo as testemunhas: Shostakovitch se apresentou com visível nervosismo, enquanto Stravinsky o desdenhava.
Li, alhures, digo para comparar, que informaram Tolstoi que Dostoievsky se encontrava nas proximidades, que pretendiam reunir os dois. “Não quero conhecer ninguém.” - teria respondido Tolstoi.
Coisas de russos.

-O Biscoito Molhado não se deteve na ligação de Noel Rosa com o cinema. Lanço daqui o meu protesto. Tinoco
BM: Os cineastas procuraram, evidentemente, direcionar a sua arte na figura de um dos mais representativos brasileiros da nossa cultura.
Rogério Sganzerla foi um desses cineasta; tendo realizado o curta-metragem Noel por Noel, em 1978, e Isto é Noel, em 1991.  Pretendia realizar um longa-metragem, mas a carência de recursos financeiros e a morte, que o atingiu, em 2004, impediram.  Admirava Orson Welles e Noel Rosa, ainda conseguiu homenagear o autor de “O Cidadão Kane” com o filme “Nem Tudo é Verdade”, de 1986.
Quanto ao cineasta Júlio Bressane, integrante do Cinema Marginal, como Rogério Sganzerla, mostrou nas telas, em 1995, a vida do cantor Mário Reis, no filme “O Mandarim”. Chico Buarque de Holanda representa, nessa fita, o papel de Noel Rosa.
Nas efemérides do centenário do filósofo do samba, revi um filme que exibe Noel Rosa cantando com o Bando de Tangarás em que se vêem outras personalidades famosas da música popular brasileira, como Almirante. Soube que essa imagem é raríssima, pertencente ao curta-metragem Vamos Falá do Norte, 1929, de Paulo Benedetti, que foi descoberto em 1994 por Alexandre Dias da Silva. Ele juntou essa fita a cenas de cinejornais de 1929, com mais outros filmes, e lançou uma espécie de patchwork, que intitulou O Cantor de Samba.
Noel Rosa, que passou como um meteoro deslumbrando a todos, no Brasil, compareceu na trilha sonora de inúmeros filmes. Na comédia musical  Alô Alô Carnaval – produção da Cinédia de 1936, constam duas composições do Poeta da Vila, Pierrô Apaixonado, parceria com Heitor dos Prazeres, e Não Resta a Menor Dúvida, com Hervé Cordovil.
Ainda em 1936, ele compôs com Vadico, seis músicas para Cidade-Mulher, de Humberto Mauro: Cidade-Mulher, interpretada por Orlando Silva, Dama do Cabaré, Tarzan, o Filho do Alfaiate, Morena Sereia, Numa Noite À Beira-Mar e Na Bahia.
No filme Perdida, de 1975, há uma cena num bordel com a gravação original de Quem dá mais, de 1932, na voz de Noel Rosa.
E muito mais, mas encerramos esta Cara dos Leitores por ora.



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