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sexta-feira, 4 de abril de 2014

2586 - quem espera, sempre alcança



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4386                            Data: 20 de março de 2014
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FRASES E COMENTÁRIOS

“Não vá o sapateiro além do sapato.”
Quando se fala em provérbios, pensamos logo que são provenientes da China, mas, nesse caso, ele é romano.
Shakespeare também cita um sapateiro, logo no início da sua peça “Júlio César”. Ele é desancado, não porque se pôs a opinar sobre assuntos que vão além de remendos de solas de sapato, tanto que se defende com estas palavras:
-”... É certo, senhor; vivo exclusivamente de minha sovela. Não me meto em assuntos de mercadores, nem de mulheres; só me ocupo com a minha sovela. Para dizer tudo, senhor, sou um cirurgião de sapatos velhos; quando estes se acham em grande perigo, restituo-lhes a saúde. Não há gente fina que ande sobre couro de boi, que não pise em trabalho feito por estas mãos.”
Para os que não se lembram mais dessa peça de Shakespeare, a razão de o sapateiro se explicar foi porque, com outros trabalhadores, saiu à rua em dia de trabalho sem portar o símbolo do seu ofício.
Contudo, nada é mais contrariado do que esse provérbio romano. Todos vão além dos sapatos, uns mais outros menos.
O encanto do Sabadoido era tal que falávamos de economia com penacho de Schumpeter, medicina com pretensões de Miguel Couto, música popular brasileira com fumaças de Ricardo Cravo Albin, direito com a jatância de Nélson Hungria e por aí iríamos. (*)
Agora, quando o Supremo Tribunal Federal tem de julgar, como julgou, as pesquisas sobre células-tronco, a interrupção de gravidez em casos de anencefalia, etc. , os sapateiros estão indo além dos sapatos com consequências para a sociedade. É verdade que os ministros do STF podem ser assessorados por especialistas da matéria em julgamento, mas como muitos demonstram sofrer de uma vaidade extremada, ficamos com a impressão de que eles se colocam acima dos especialistas.

“A história é um conjunto de mentiras sobre as quais se chegou a um acordo.”
Assim falou Napoleão Bonaparte.
Assisti em minissérie sobre o imperador francês uma cena que o mostra, depois de uma batalha, descrevendo o que ocorreu nela para que fosse publicado nos jornais. É sabido que o imperador não dormia mais de cinco horas por dia e trabalhava incansavelmente, mas nos parece exagero que, após comandar uma batalha, ele mesmo escrevesse o que tinha de ser publicado nos jornais.
Mas que ele amoldava os fatos ao seu poder, muitos são os exemplos. Sua mãe, Maria Letícia Bonaparte, detestava a nora, Josephina de Beauharnais e, possuidora de um temperamento forte (o filho teve a quem puxar)  não compareceu à esplendorosa cerimônia, com a presença do Papa, da coroação do imperador e da imperatriz. No entanto, quando David (primo de Debret), pintor oficial da corte, reproduziu na tela esse evento, recebeu ordem de Napoleão de pintar a sua mãe entre seus familiares que lá estiveram e assim foi feito.
Na ditadura do regime soviético, ocorria o contrário: os dirigentes que caíam em desgraça eram apagados das fotografias.  E como foram muitos os expurgos no regime soviético, os retocadores de fotos trabalharam bastante.
No romance “1984”, de George Orwell, há um incinerador onde são jogados documentos que o governo julga inconvenientes, um distópico denominado “buraco de memória”. Com isso, o passado é destruído e a História é reescrita pelo Ministério da Verdade.
Tentaram, poucos anos atrás, algo parecido no Brasil com o governo que assumiu o poder e tentou desqualificar o governo anterior, que havia estruturado economicamente o Brasil, dando fim à hiperinflação. Apesar de propagandearem maciçamente o discurso da “herança maldita”, só enganaram os desinformados, pois não estamos numa ditadura e, consequentemente, não existe um Ministério da Verdade para reescrever a história.

“A pontualidade é a cortesia dos reis e obrigação dos educados.”

Outro provérbio que não é chinês, embora o povo vivesse séculos e mais séculos submetidos à dinastia com seus reis. Esse provérbio é inglês.
Nessa questão de pontualidade, vamos nos restringir a uma das maiores divas do cinema, senão, a maior, Marilyn Monroe.
Ela sempre chegava duas ou três horas atrasada nas suas entrevistas à imprensa.
Seus atrasos nos estúdios de filmagem pedem páginas e mais páginas para serem abordados. A própria Marilyn Monroe chegou a dizer que podia errar a hora, mas não errava o dia.
Nas filmagens de “Quanto mais quente melhor” (1959), filme dirigido por Billy Wilder, que foi eleita a melhor comédia de todos os tempos pelo American Film Institute.  Jack Lemmon deu um depoimento sobre Marilyn Monroe à biógrafa de Billy Wilder, Charlotte Chandler, do qual transcrevemos este trecho:
“Esperar por ela no set deixava-me irritado, às vezes, mas nunca deixei isso transparecer. Ela ficava em seu trailer e não saía durante algumas horas, até que se sentisse preparada. Dizia a mim mesmo que era um problema pior para ela do que para mim.”
“Enquanto esperávamos (ele e Tony Curtis) tirávamos os saltos para aliviar nossos pés inchados. Depois, quando ela aparecia, não conseguíamos mais calçar os sapatos.”
Tony Curtis, que fazia o par romântico com ela no filme, não foi tão condescendente na sua entrevista com a mencionada biógrafa:
-”Podíamos sempre contar com ela – para chegar atrasada. Dava para acertar o relógio por isso. Havia algumas centenas de pessoas esperando, dentre os quais seus protagonistas e eu, e ela finalmente chegava dizendo: “Eu me perdi no caminho para o estúdio. Sinto muito.” Sete anos  indo para o estúdio e ainda se perdia no caminho.  No começo, eu não achava que ela estivesse falando a verdade. Depois, piorou. Acreditava que ela estivesse falando a verdade.”
Eis o que disse o grande diretor Billy Wilder sobre o problema dela com a hora marcada:
“... É aquela velha história que conto há anos: se quisesse alguém para chegar no horário e dizer as falas corretamente, tenho uma velha tia em Viena que estaria no set às cinco horas da manhã e jamais esqueceria uma palavra. Mas quem vai querer vê-la?
Lawrence Olivier, por outro lado, que atuou com Marilyn Monroe, além de contracenar com ela em “O Príncipe e o Corista” (1957), educado dentro dos padrões britânicos, dentre eles a pontualidade, quase foi à loucura. No seu livro de memórias derramou a sua bílis sobre o comportamento da atriz, além de se irritar com o fato de ela dar mais atenção a Paula Strasberg, esposa de Lee Strasberg, guru do Actor’s Studio, do que ao diretor. O mesmo problema ocorreu com Billy Wilder, que engoliu e metabolizou essa ingerência no seu trabalho. Isso não aconteceu com Lawrence Olivier, que ficou extremamente irritado.
Conta ele, nas suas memórias, que não quis saber de “O Príncipe e a Corista” durante anos. Certa vez, com um grupo de amigos, resolveu com eles, assistir ao filme, e todos ficaram encantados com a atriz.
Valia a pena esperar pela Marilyn Monroe.

(*) O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO tem certeza que o nome do Elio Fischberg estava programado no lugar do Nelson Hungria, assim como o do Roberto Dieckmann entraria no lugar de Noé. Alguma reivindicação trabalhista, entretanto, afastou o redator das pretensões iniciais.




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