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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4299 Data: 23 de
outubro de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA DE 20 DE
OUTUBRO
-Hoje é o Dia do
Poeta. - informou o Sérgio Fortes após o “muitíssimo bom-dia” do titular do
programa.
Parece-nos que a
gravação ocorreu dois dias antes, ou seja, no Dia do Médico e, coincidência ou
não, o Doutor Fernando Borer lá estava, como convidado, com o seu refinado
gosto musical.
Coube ao doutor a
primeira escolha e ele não decepcionou, pediu o choro “Já lhe Digo”, cuja primeira gravação ocorreu
em 1919.
-Trata-se de uma
resposta dada por Pixinguinha a Sinhô numa polêmica em que ele se envolveu com
o seu irmão China. - esclareceu.
Os músicos Zé da Velha
e Silvério Pontes, com seus respectivos instrumentos e talentos, mostraram que
essa composição do Pixinguinha, quase centenária, não envelhecerá.
Na vez do Sérgio
Fortes, ele recorreu a um recente musical da Broadway:
-Recente porque é de
1992. - comentou jocosamente.
Como não tem,
compreensivelmente, com os musicais da Broadway o mesmo traquejo que possui com
o mundo da ópera, mostrou-se titubeante.
-Conhece, Jonas, o
musical “Five Guys Named Moe”?... A canção,que vamos ouvir, foi composta por
Alex Kramer e Joan Whitney, é “Ain't
nobody here but us chickens.”
Bem o Departamento de
Pesquisas do Biscoito Molhado consultou o Google, o pai dos burros virtuais e
se deparou com uma confusão dos diabos. A canção é de 1946, mas o musical, com
o nome “Five Guys Named Moe” é baseada numa peça de 1943, Ela estreou em 1990,
no Reino Unido, com letra e música de Louis Jordan e, depois de passar pelo
West End, apareceu na Broadway em 1992, como assinalara o Sérgio Fortes.
E chegou a vez do
Jonas Vieira, que mostrou, como dizia o Nélson Rodrigues, uma fúria de Zola
contra as injustiças cometidas contra o Capitão Dreyfus. No caso, o injustiçado
era Francisco Alves, o Rei da Voz. Jonas não se conformava com o esquecimento a
que ele foi relegado.
-Francisco Alves é de
uma importância fundamental para a música popular brasileira. E cito quatro
razões; primeira: pelo seu repertório; segunda, foi ele que lançou Orlando
Silva, que foi desacreditado como cantor, sendo até gongado pelo Renato Murce;
terceira; aproximou Noel Rosa dos sambistas do Estácio, promovendo Ismael
Silva, entre outros; quarta: juntou-se ao Orestes Barbosa e divulgou as
serestas por todo o Brasil.
E arrematou:
-Fosse o Brasil um
país sério e teríamos minisséries sobre esse personagem tão rico pessoal e
artisticamente.
Como Zola, Jonas
Vieira estava inteiramente certo.
A gravação que ouvimos
foi “Nervos de Aço”, de Lupicínio Rodrigues.
Mas não há nervos, por
mais temperado que esteja o aço, que aguentem a atual situação do Brasil, e o
Jonas Vieira investia, agora, contra a proliferação da mediocridade. Temos a
acrescentar que uns 30 anos atrás, Nélson Rodrigues, com a sua cintilante
inteligência, previu a Revolução dos Idiotas, declarando que eles, vendo que
são bem mais numerosos, não se limitariam a babar na gravata e tomariam o
poder. E tomaram.
O Fernando Borer
desanuviou o ambiente solicitando uma gravação em que homenageou postumamente
dois artistas recém-falecidos, Norma Benguel e Oscar Castro Neves.
-”Você”, composta por
Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli, com Dick Farney e Norma Bengell, arranjo de
Lindolfo Gaia e violão de Oscar Castro Neves.
Enquanto Fernando
Borer recebia congratulações dos presentes e dos ouvintes ausentes, Sérgio
Fortes elogiava a afinação da cantora. Bem, Norma Bengell era filha única de um
alemão afinador de pianos, não podia decepcionar nesse quesito.
Depois das referências
a um LP esquecido em que ela canta composições francesas, Jonas Vieira passou a
bola para o Sérgio Fortes.
-Vou trazer de novo o
conjunto instrumental “Rabo de Lagartixa”, com destaques para o contrabaixista
Alexandre Garcia e para o solo de saxofone da Daniela Spielmann. A música é “Diabinho Maluco”, do Jacob do
Bandolim.
-Maravilha! - vibrou o
Jonas Vieira que, em seguida, recomendou dois livros: o do diálogo do Papa
Francisco com o rabino Abraham Skorka e o do Olavo de Carvalho, “O mínimo que
você precisa saber para não ser um idiota”.
E nós, do Biscoito Molhado, recomendamos um terceiro livro: “Humor
Eclético”, de Sérgio Schechter.
E voltou a reverenciar
Francisco Alves, agora, com uma gravação de 1937, “Misterioso Amor”.
Após o desfrute,
Sérgio Fortes enalteceu os instrumentistas e o cantor.
-Nos anos 40,
Francisco Alves empostou a voz, nos anos 30, não.
-A voz dele esta pura.
- acrescentou o Fernando Borer suas considerações às do Jonas Vieira.
Veio a Pausa para
Meditação, do Fernando Milfond, seguida pela Pausa para a Espinafração do
titular do programa, Nessa pausa, argumentou que a causa dessa cizânia das
biografias se deve ao vírus da censura que está impregnado na história do
Brasil: Império, República Velha, ditadura do Getúlio Vargas, ditadura Militar.
O censurado ontem é o censor hoje.
-A biografia
autorizada não seria mais do que um lance promocional. - comentou o doutor
Fernando Borer com muita felicidade.
E era a sua vez de
indicar o que seria tocado, e ele escolheu uma gravação que me faz parar com
tudo, até mesmo de escrever O Biscoito Molhado, para ouvir: “So in love”, de
Cole Porter. E Sérgio Fortes fez a pergunta que não queria calar:
“Quem canta?”
Fernando Borer disse
que ninguém, que se tratava apenas de uma orquestra, a Brazilian Tropical
Orchestra, que seria comparada pelo Jonas Vieira às americanas.
Certo, mas letra e
música de “So in love” estão de tal maneira imbricadas, ao nosso ver, que não
podem ser separadas. A canção é pura emoção, e como dizia Orson Welles: “A voz
é um elemento comovente.”
A canção pertence à
peça musical, de 1948, “Kiss me, Kate”, baseada na peça de Shakespeare “A
Megera Domada”, que, com mais de mil reapresentações, na Broadway, desmentiu os que previram o fim da inspiração
do Cole Porter depois do acidente com um
cavalo.
-Sérgio Fortes, para
manter o nível de refinamento, recorreu a George Gershwin e a seu irmão Ira,
indicando como a próxima canção “They can't take that way from me”, canção gravada em 1937, por Fred
Astaire, mas que seria ouvida, no Rádio Memória, por Frank Sinatra e Natalie Cole.
Coube a Fernando Borer
encerrar musicalmente o programa. E ele anunciou uma plêiade da música popular
brasileira: Noel Rosa, Jacob do Bandolim, Elizeth Cardoso, Época de Ouro,
Horondino José da Silva, o Dino Sete Cordas. Com essa constelação de artistas,
ouviríamos, anunciou, “Três Apitos”, de Noel Rosa, pinçado de um memorável
show, no João Caetano, em 2 de fevereiro de 1968.
Para começar bem o
domingo, o Rádio Memória cumpriu a contento a sua missão.
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